Na Alemanha, a presidência é historicamente um cargo simbólico. Mas impasse político forçou Frank-Walter Steinmeier a ir além do cerimonialismo: ele é figura-chave para evitar que país tenha que realizar novas eleições.
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Em circunstâncias normais, a chanceler federal é a política mais poderosa e a verdadeira líder na Alemanha, mas o presidente é o chefe de Estado. Embora seja em grande parte simbólica, a presidência tem a responsabilidade de garantir a funcionalidade da democracia alemã. Isso faz com que o papel do presidente Frank-Walter Steinmeier seja crucial para resolver o impasse que bloqueia atualmente a formação do próximo governo em Berlim.
O sistema alemão opera com base no princípio de que os políticos têm a responsabilidade de colocar em prática a vontade dos eleitores, expressada nas eleições. É por isso que Steinmeier lembrou aos partidos, na última segunda-feira, que eles tinham antes o dever de chegar a um acordo e formar alianças de governo em vez de exigir novas eleições.
As negociações para formar a chamada coalizão "Jamaica" – entre os conservadores da União CDU/CSU (União Democrata Cristã/União Social Cristã), chefiada por Angela Merkel; o Partido Liberal Democrático (FDP, na sigla em alemão); e o Partido Verde – desmoronou no último domingo. O nome dessa fracassada coalizão se deve às cores dos partidos envolvidos que, juntas, lembram a bandeira do país caribenho.
O primeiro passo de Steinmeier é convocar os líderes desses partidos, mais o Partido Social-Democrata (SPD), para discutir seus problemas e tentar negociar um consenso. Nesta terça-feira (21/11), o presidente se reuniu com os verdes e os liberais do FDP. Na quarta-feira, ele se encontra com o chefe do SPD, Martin Schulz.
Não se esperam avanços. O FDP foi, reportadamente, o responsável pelo fracasso das negociações no domingo, e o SPD tem descartado, repetida e categoricamente, estender a grande coalizão de governo liderada por Angela Merkel no último período legislativo.
De qualquer forma, as discussões devem ser interessantes, principalmente aquelas entre Steinmeier e Schulz, já que eles eram membros do mesmo partido até o início deste ano, quando o atual presidente alemão assumiu o seu cargo.
Um ex-social-democrata
Steinmeier, de 61 anos, foi vice-chanceler federal, duas vezes ministro alemão das Relações Exteriores e candidato à Chancelaria Federal pelo SPD. Ele é conhecido, sobretudo, por seu pragmatismo. Ele tanto serviu a Merkel quanto concorreu contra ela – e agora será uma das principais pessoas a tentar salvar a pele da chefe alemã de governo.
Uma ironia adicional é o fato de essa tarefa colocá-lo em curso de colisão com Schulz, que tem sido um grande crítico de Merkel desde que perdeu para ela o pleito legislativo de 24 de setembro último, afirmando agora se a favor de novas eleições.
Steinmeier, ele próprio um veterano de duas grandes coalizões lideradas por Angela Merkel, declarou que os alemães não devem ser convocados a votar novamente e apelou ao SPD para que desista de sua postura linha-dura.
Assim, Schulz e os social-democratas não devem esperar ser tratados a pão-de-ló. Steinmeier suspendeu sua filiação partidária ao se tornar presidente. E como chefe da Casa Civil no governo do ex-chanceler federal Gerhard Schröder, sabe como utilizar o seu peso político para obter resultados.
Os principais partidos tradicionais alemães podem não gostar do que Steinmeier tem a dizer, mas eles não têm escolha a não ser agir ao menos como se estivessem levando a sério as sugestões do presidente alemão.
No atual cenário político, ainda é muito pouco provável que Steinmeier seja capaz de organizar uma aliança "Jamaica" ou uma grande coalizão. Nesse caso, ele terá que fazer duras escolhas – que podem ter grande impacto no futuro da Alemanha.
O "chefe" de Merkel
Mesmo que não se chegue a nenhum acordo de coalizão, Steinmeier ainda precisa nomear em breve alguém para o cargo de chanceler federal. É quase certo que será Angela Merkel. O nome do candidato precisa da aprovação do Parlamento e, em última análise, ele ou ela precisa somente da pluralidade simples dos votos (maior número de votos), o que Merkel possui, para ser eleita.
"É uma situação que nunca ocorreu na história da Alemanha"
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Mas se o nome do ou da chanceler federal for confirmado por meio de uma pluralidade, isso não abre um caminho claro para a formação de um governo. Nesse caso, Steinmeier tem sete dias para decidir se o ou a nova chefe de governo deve formar um governo de minoria ou se a situação é tão instável que o Parlamento precisa ser dissolvido, para que novas eleições sejam convocadas.
Curiosamente, o desejo da chanceler federal em tudo isso é apenas de importância secundária. Por exemplo, mesmo que Angela Merkel diga que queira novas eleições, como afirmou na última segunda-feira numa entrevista à TV, Steinmeier pode ignorar as suas vontades. Na verdade, o presidente pode ordenar que a chanceler federal forme um governo que ela não queria liderar. Nesse aspecto, Steinmeier é o chefe de Merkel.
No caso de o presidente colocá-la numa posição que ela considere insustentável, a única opção real para a chanceler federal é renunciar. Nesse caso, o chefe de Estado deverá propor outro candidato à chefia de governo ao Bundestag, e a ladainha recomeça desde o início.
Normalmente, nenhuma dessas situações hipotéticas deverá acontecer, porque a futura chanceler federal assegurou uma maioria parlamentar funcional. O ano de 2017, no entanto, não é um ano político comum.
Ao aceitar a presidência, em março, Frank-Walter Steinmeier pode ter pensado estar assumindo um cargo amplamente simbólico, trocando o Ministério do Exterior pela residência presidencial . Mas ele ocupará as manchetes e poderá tomar decisões que são tudo menos simbólicas, enquanto a República alemã tenta resolver o maior impasse de sua história.
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A história da eleição alemã
Após Segunda Guerra, Alemanha já realizou 18 pleitos para eleger um Parlamento nacional e, subsequentemente, um ou uma chanceler federal. Veja quem ganhou.
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1949: Adenauer vence eleições pós-guerra
A primeira eleição após a Segunda Guerra Mundial foi, sem dúvida, a mais importante na história da República Federal da Alemanha e, certamente, a mais apertada. Konrad Adenauer, candidato da União Democrata Cristã (CDU), tornou-se o primeiro chanceler federal da então Alemanha Ocidental pela margem de um voto – o seu próprio. Seu governo se mostraria muito estável. E muito popular.
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1953: Konrad Adenauer é reeleito
Se a primeira eleição da antiga Alemanha Ocidental foi dramática, a segunda foi arrebatadora. Sob a liderança de Konrad Adenauer, a CDU levou 45,2% dos votos contra 28,8% do Partido Social-Democrata (SPD). Graças à coalizão com três outros partidos, Adenauer desfrutou uma maioria de dois terços no Parlamento.
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1957: Adenauer ganha segunda reeleição
Na terceira eleição da Alemanha Ocidental pós-guerra, a CDU de Adenauer aliou-se ao partido conservador da Baviera, a União Social Cristã (CSU), para formar a CDU/CSU, aliança que muitas vezes é denominada de "União". Juntas, as duas legendas levaram mais de 50% dos votos. Adenauer tinha 81 anos quando iniciou seu terceiro mandato como chanceler federal.
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1961: Última vitória eleitoral de Adenauer
Aos 85 anos, Konrad Adenauer venceu sua última eleição, mas seu mandato não foi feliz. Seus críticos o acusaram de não responder adequadamente à construção do Muro de Berlim. Em 1963, ele renunciou a favor do seu vice e ministro da Economia, o político conservador Ludwig Erhard. Em 1961, o Parlamento alemão era composto somente por três bancadas: CDU/CSU, SPD e Partido Liberal Democrático (FDP).
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1965: Milagre econômico leva Erhard à vitória
Ludwig Erhard (dir.) conseguiu estender a série de vitórias eleitorais dos conservadores, embora isso viesse a acabar em breve. O ex-ministro da Economia ganhou pontos pela prosperidade da Alemanha Ocidental, mas não teve sucesso em política externa e renunciou no meio de seu mandato. Seu substituto, Kurt Georg Kiesinger, foi o único chanceler federal a nunca ter vencido eleição para o cargo.
Os anos 1960 foram um período em que as pessoas na Alemanha Ocidental, como em outras partes do mundo, passaram a questionar tradições e, no último ano da década, o prefeito da antiga Berlim Ocidental, Willy Brandt, se tornou o primeiro chanceler federal social-democrata. Na realidade, o SPD recebera menos votos que a União CDU/CSU, mas uma coalizão com os liberais do FDP lhe garantiu o poder.
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1972: Brandt vence, mas não por muito tempo
As eleições alemãs seguintes foram adiantadas um ano depois que Brandt foi afastado através de uma moção de confiança. Essa medida foi negativa para os conservadores. Pela primeira vez no pós-guerra, o SPD obteve mais votos que CDU/CSU nas eleições gerais. Mas um companheiro próximo de Brandt revelou-se espião da Alemanha Oriental, e Willy Brandt renunciou a favor de Helmut Schmidt.
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1976: Helmut Schmidt solidifica o poder
Helmut Schmidt, sucessor de Brandt, conseguiu manter-se à frente da Chancelaria Federal em 1976, apesar de o SPD ter obtido 6 pontos percentuais a menos que a União CDU/CSU. Graças ao parceiro de coalizão, o Partido Liberal Democrático (FDP), a balança pendeu a favor do SPD. Essa foi a primeira eleição na Alemanha Ocidental em que jovens de 18 anos puderam votar. Antes, a idade mínima era 21.
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1980: Schmidt é reeleito, mas parceiro se vai
A reeleição de Schmidt foi relativamente fácil, em parte porque, pela primeira vez, o candidato dos conservadores vinha da União Social Cristã (CSU). Schmidt, no entanto, não conseguiu apoio popular para o seu governo. Em 1982, o parceiro de coalizão FDP deixou o governo, aliando-se à União CDU/CSU para substituir Helmut Schmidt por um chanceler federal conservador.
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1983: Helmut Kohl dá início a longo reinado
Para ganhar legitimidade, o chanceler federal Helmut Kohl, da CDU, adiantou as eleições gerais para 1983. A jogada valeu a pena, pois os conservadores venceram os social-democratas por 48,8% contra 38,2% dos votos. Muitos esquerdistas consideravam Kohl uma figura grosseira demais para ficar muito tempo no poder. Mas estavam errados. Nesse pleito, os verdes entraram pela primeira vez no Parlamento.
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1987: Kohl se reelege em onda conservadora
Os anos 1980 foram conservadores, com Ronald Reagan nos EUA, Margaret Thatcher no Reino Unido e Kohl na Alemanha. E o político da CDU aproveitou a onda para se reeleger. Para Kohl, foi uma alegria ter aparecido junto a Reagan em seu famoso discurso "Sr. Gorbachev, derrube este muro". Mas poucos imaginavam que ele iria cair em breve e que aquelas seriam as últimas eleições da Alemanha Ocidental.
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1990: Kohl vence sob signo da Reunificação
Kohl (dir.) brindou a reunificação da Alemanha com o primeiro-ministro da Alemanha Oriental, Lothar de Maizière, em 3 de outubro de 1990, e dois meses depois, eleitores de todo o país foram convocados a votar em outra eleição antecipada. O clima era de euforia, e não havia quem vencesse o "chanceler da Reunificação". Kohl foi eleito para um terceiro período legislativo.
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1994: Triunfo final para Kohl
Em 1994, cinco anos depois da queda do Muro de Berlim, os primeiros problemas sociais causados pela Reunificação se tornaram visíveis. Mesmo assim, a reeleição de Kohl foi relativamente confortável. Isso se deveu em parte a um fraco adversário social-democrata, que ficou conhecido, entre outros, por tropeçar na diferença entre líquido e bruto na TV alemã.
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1998: Schröder inicia experiência de coalizão
Em 1998, os eleitores estavam cansados de Kohl, e o social-democrata Gerhard Schröder (esq.) soube se aproveitar disso. O SPD venceu a União CDU/CSU por 40,9% contra 35,1% dos votos e formou uma coalizão com o Partido Verde, liderado por Joschka Fischer (c.). Esta foi a primeira eleição em que o PDS (hoje A Esquerda), sucessor do antigo partido socialista alemão-oriental, entrou para o Parlamento.
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2002: Schröder vence reeleição após 11/9
Na eleição de 2002, SPD e a União CDU/CSU tiraram a mesma porcentagem de votos: 38,5%. Schröder conseguiu se reeleger por seu parceiro de coalizão, os Verdes, ser mais forte que o FDP. Uma das tarefas mais árduas de Schröder foi lidar com George W. Bush. Depois do 11 de setembro, o chanceler federal proclamou "solidariedade ilimitada" com os EUA, mas a Alemanha não apoiou a Guerra do Iraque.
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2005: Início da era Merkel
Em 2005, Angela Merkel tornou-se a primeira mulher a governar a Alemanha, após Schröder, que em meio a críticas por seus programas de austeridade econômica, antecipou mais uma eleição. A política da antiga Alemanha Oriental ganhou por pouco. A vantagem dos conservadores sobre o SPD foi inferior a 1% e, em seu primeiro mandato, Merkel passou a chefiar uma "grande coalizão" com o principal rival.
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2009: Merkel realiza "coalizão dos sonhos"
O resultado do segundo pleito parlamentar de Merkel foi muito mais claro que o primeiro. Enquanto o apoio ao SPD despencava, os liberais do FDP, liderados por Guido Westerwelle, ganhavam votos. Como resultado, os conservadores foram capazes de formar uma coalizão com seus parceiros prediletos. Para a centrista Merkel, essa coalizão parecia ter saído de um sonho.
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2013: Merkel comemora terceiro mandato
Em 2013, Merkel estava consolidada como a política mais popular da Alemanha, e os conservadores terminaram à frente do SPD nas eleições. Mas como os liberais não conseguiram alcançar o limite de 5% dos votos para entrar no Parlamento, a chanceler federal reeleita teve que formar outra grande coalizão. Isso não impediu "Angie", como é conhecida carinhosamente hoje em dia, de saborear uma cerveja.
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2017: Ascensão dos populistas de direita
CDU/CSU e SPD foram os partidos mais votados, mas tiveram seu pior resultado desde o pós-guerra. Enquanto os liberais voltaram a ser representados no Bundestag, a grande vitória foi da legenda populista Alternativa para a Alemanha (AfD) – pela primeira vez desde a 2ª Guerra, um partido nacionalista está representado no Parlamento alemão.