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Primeira Guerra Mundial, em preto e branco e a cores

Jochen Kürten
11 de novembro de 2018

Em 1918, terminava o horror nos campos de batalha. O cinema mantém viva a memória do conflito em grandes clássicos e um documentário sensacional.

Cena do filme "They shall not grow old"
"They shall not grow old" foi colorizado e sonorizado digitalmenteFoto: IWM

O que se conhece da Primeira Guerra Mundial é em preto e branco e geralmente sem som, pois assim as primeiras fotografias e filmes documentaram o conflito para a posteridade. Apesar de já existirem na época métodos simples de fotografia a cores, eles só se propagaram nos anos 1930, e no cinema ainda mais tarde. O filme sonoro só foi inventado uma década após o término da Primeira Guerra.

As novas técnicas digitais tornaram agora possível colorir perfeitamente antigos filmes em preto e branco e sonorizá-los. No Festival de Cinema em Londres, estreou recentemente um documentário que muitos espectadores consideram uma grande sensação: They shall not grow old  (literalmente: Eles não envelhecerão), de Peter Jackson.

Primeira Guerra atualizada digitalmente

Nascido na Nova Zelândia, Jackson é conhecido pelo grande público por sua trilogia O Senhor dos Anéis. Ele assistiu e selecionou 600 horas de filmagens do arquivo do Imperial War Museum de Londres, e montou um documentário de 100 minutos. O detalhe especial é que as imagens foram ulteriormente coloridas com perfeição, através de técnicas digitais. Além disso, Jackson sonorizou o material mudo, para isso recorrendo também a especialistas em leitura de lábios.

O resultado foi aclamado em Londres. O crítico da revista Variety  disse que Jackson ajudou a concretizar uma realidade que estava prestes a desaparecer. Foi elogiado em particular o esforço do cineasta em apresentar a vida cotidiana de muitos jovens soldados, que mais tarde morreriam aos milhares no front.

O jornal The Guardian  se expressou de forma semelhante após a estreia em Londres: "O efeito é eletrizante. Os soldados retornam diante dos nossos olhos a uma vida estranha e hiperreal, como espíritos ou espectros evocados numa sessão. Os rostos são inesquecíveis." They shall not grow old  será apresentado pela BBC em 11 de novembro e provavelmente poderá ser visto fora do Reino Unido em breve.

Novas edições de clássicos famosos

Até agora espectadores do mundo inteiro só assistiram documentários e filmes sobre a Primeira Guerra Mundial em preto e branco. Por ocasião do centenário do fim do conflito, várias distribuidoras de filmes lançaram DVDs, em edições especiais de luxo, recordando como o cinema se ocupou desse marco histórico. Em seguida, três obras-primas cinematográficas.

"Guerra, flagelo de Deus" não poupa o espectador das facetas mais terríveis do conflito bélicoFoto: picture-alliance/Everett Collection

Guerra, flagelo de Deus  (1930)

Guerra, flagelo de Deus, de Georg Wilhelm Pabst, conta as experiências no front de quatro soldados alemães no último ano da guerra e apresenta episódios das folgas passadas em casa.

Um dos primeiros filmes sonoros da Alemanha, ele é frequentemente comparado com o ainda mais famoso Nada de novo no front, lançado praticamente na mesma época. Ambos são, sem dúvida, antibélicos, mas críticos contemporâneos e posteriores consideram o filme de Pabst bem mais consequente nesse aspecto.

O cineasta optou por um estilo de narrativa bem realista, em som e imagem. Ao contrário de tantos filmes populares na época, que glorificavam os combates, Guerra, flagelo de Deus  a apresenta em todas as suas facetas cruéis: morte, ferimentos, loucura. Sobre essa obra implacável de Pabst, o historiador cinematográfico Enno Patalas escreveu: "O filme Guerra, flagelo de Deus  recusa a idealização da guerra, por mais oculta que seja, em favor de mostrar a provação humana."

O filme foi proibido em 1933. Os nazistas perceberam exatamente a mensagem pacifista que o cineasta oferecia a um público que na época deveria ser direcionado para um caminho bem diferente, em direção à ideologia nacionalista.

Tema central de "A tragédia da mina" é camaradagem, acima das barrerias nacionaisFoto: Stiftung Deutsche Kinemathek

A tragédia da mina  (1931)

Um ano depois, Pabst filmou A tragédia da mina. Apesar de a trama não se passar durante a Primeira Guerra, trata-se de um documento do pós-guerra, expondo as consequências fatais de um conflito armado, da profunda desconfiança entre franceses e alemães após 1918.

Passados dez anos do fim da guerra, acontece um terrível acidente numa mina na França, próximo à fronteira alemã. Os camaradas alemães se arriscam numa temerária operação de socorro, conseguindo salvar a vida de muitos mineiros, franceses e alemães ajudam-se mutuamente.

Um aspecto especial em A tragédia da mina  é ele ter sido realizado em dois idiomas. Nas filmagens, os alemães falavam alemão e os franceses, francês. Abriu-se mão de dublagem e de legendas.

"Várias cenas e viradas na ação vivem exatamente disto, dos mal-entendidos que surgem por falta de uma língua comum", comenta Martin Koerber da Deutschen Kinemathek, um dos responsáveis pela restauração do filme. Ainda hoje, o espectador se identifica tanto com essa desconfiança, quanto com a tentativa de superar a falta de compreensão.

A tragédia da mina  é um filme muito atual, sobretudo com a Europa cada vez mais voltada para interesses nacionais. Afinal, a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço, fundada em 1951, foi a base da atual União Europeia. A organização tinha por objetivo harmonizar a política do carvão e aço dos dois países vizinhos. O filme de Georg Wilhelm Pabst A tragédia da mina, uma coprodução franco-alemã, é um primeiro documento cinematográfico dessa cooperação internacional.

Diretor Stanley Kubrick (dir.) ao lado do ator e produtor Kirk Douglas, no st de filmagem de "Glória feita de sangue"Foto: imago

Glória feita de sangue  (1957)

O que distingue essencialmente A tragédia da mina  (título original: Kameradschaft  – Camaradagem) vale também para um dos mais famosos filmes antibélicos da história do cinema, lançado um quarto de século mais tarde: o tema da camaradagem, a "solidariedade emocional acima das fronteiras nacionais", como definem os especialistas Bodo Traber e Hansjörg Edling.

Glória feita de sangue, de Stanley Kubrick, é sobretudo um filme contra a divisão de classes, relatando de forma dura e impiedosa como a guerra também é entre as diferentes classes sociais, o soldado comum e o oficial. Assim como Pabst, Kubrick coloca a luta de trincheira entre alemães e franceses no centro da ação. Mas neste caso o foco é exclusivamente no lado francês.

A ordem de conquistar uma posição alemã está fadada ao fracasso desde o início. Os oficiais franceses sabem disso. No entanto, contra todo o bom senso, o comando fatídico é dado. Centenas de soldados morrem. Por fim, a matança continua de maneira absurda, mas do lado da França, pois os franceses processam os próprios soldados por insubordinação e "covardia diante do inimigo".

Kubrick mostra a guerra e suas terríveis circunstâncias com grande clareza. Isso teve consequências. Glória feita de sangue  foi proibido em diversos países e censurado. Só apresentado na França em 1974, ele foi retirado da programação da Berlinale na Alemanha, censurado para o Exército suíço, e as Forças Armadas americanas proibiram apresentações em suas bases europeias.

 

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