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Acusada em caso de terrorismo neonazista nega crimes

9 de dezembro de 2015

Beate Zschäpe, a principal acusada do caso NSU, nega conhecimento prévio dos assassinatos cometidos por seus companheiros, mas diz que se sente "moralmente culpada". Familiares de vítimas reagem com indignação.

Zschäpe entre os advogados Borchert (e) e GraselFoto: Reuters/M. Dalder

A suposta terrorista Beate Zschäpe, de 40 anos, principal acusada pelos crimes atribuídos ao grupo Clandestinidade Nacional-Socialista (NSU, na sigla em alemão), negou nesta quarta-feira (09/12) qualquer participação no planejamento e execução dos assassinatos e atentados atribuídos ao grupo.

Naquele que é o seu primeiro depoimento desde o início do processo, em maio de 2013, Zschäpe negou até mesmo que fosse integrante do NSU. As afirmações constam de uma declaração de 53 páginas lida pelo advogado dela, Mathias Grasel, perante o Tribunal Superior de Munique.

Zschäpe afirmou que só tomou conhecimento dos assassinatos, segundo ela cometidos por seus amigos Uwe Böhnhardt e Uwe Mundlos, depois de eles terem ocorrido, quando os dois homens contavam a ela o que haviam feito. Ela afirmou ter ficado chocada, mas que, mesmo assim, acabava optando por não delatar Böhnhardt e Mundlos. "Os dois eram a minha família."

Além dos assassinatos de dez pessoas (nove homens imigrantes de ascendência turca ou grega e uma policial alemã), ocorridos entre 2000 e 2007, o NSU é suspeito de dois ataques a bomba e de uma série de assaltos a bancos. Zschäpe é a principal suspeita do caso, no qual também estão sendo julgados quatro pessoas acusadas de ajudarem o NSU.

Segundo Zschäpe, ela pensou em avisar a polícia após o primeiro assassinato e também em todos os casos seguintes, mas Böhnhardt e Mundlos ameaçavam se suicidar se ela fizesse isso. Por isso, ela disse que acabou desistindo e se resignou. "Ficou claro para mim que eu vivia com duas pessoas que não davam valor para uma vida humana."

Apesar de achar os crimes de Böhnhardt e Mundlos repugnantes, Zschäpe disse ter aceitado o destino de continuar a viver ao lado deles. "Eles não precisavam de mim, eu precisava deles", argumentou. Ela rejeitou a acusação de integrar uma organização terrorista de nome NSU, afirmando que o grupo nunca existiu e que essa sigla era uma criação de Mundlos. "Nunca me vi como integrante, nem na época nem hoje."

Assim, ela disse se considerar inocente do ponto de vista jurídico, mas ressalvou: "Sinto-me moralmente culpada por não ter conseguido impedir dez assassinatos e dois atentados a bomba". Ela pediu desculpas a todas as vítimas e seus familiares por todos os crimes "cometidos por Uwe Mundlos e Uwe Böhnhardt". A ré afirmou ainda que não se identificava com a motivação ideológica de seus dois amigos e afirmou desejar que os crimes nunca tivessem ocorrido.

Zschäpe se mostrou sorridente na audiênciaFoto: picture-alliance/dpa/T. Hase

O depoimento lido pelo advogado descreve também uma infância e adolescência difíceis na então Alemanha Oriental, mencionando o pai ausente e a mãe alcoólatra.

Ao entrar na sala do tribunal, Zschäpe conversava sorridente com seus advogados e não evitou as câmeras dos fotógrafos posicionados à sua frente, como costumava fazer. É a primeira vez que ela concorda em falar, depois de quase 250 audiências.

Incêndio de esconderijo

A polícia e os serviços secretos internos alemães levaram mais de uma década para descobrir que a série de crimes havia sido cometida por um único grupo, evidenciando erros investigativos. O grupo só foi descoberto em 4 de novembro de 2011, depois de um assalto a banco em Eisenach.

Naquele dia, Böhnhardt e Mundlos aparentemente se mataram num trailer. Zschäpe contou que ficou sabendo da morte dos dois amigos pelo noticiário e se deu conta de que "o dia que sempre temia havia chegado".

Böhnhardt e Mundlos haviam pedido a ela que divulgasse uma gravação em DVD que haviam feito contando detalhes sobre os assassinatos e que se livrasse de todas as provas no apartamento que os três dividiam caso os dois morressem.

Ela admitiu que ateou fogo ao último esconderijo do grupo, em Zwickau, mas disse que fez todo o possível para alertar os outros moradores, tocando campainhas e batendo nas portas para verificar se havia alguém no prédio.

A ré é acusada de provocar o incêndio mesmo sabendo que colocaria em risco um homem que trabalhava no piso superior. Zschäpe negou essa acusação e disse que gritou para tentar avisar quem estivesse por lá, mas, como não ouviu resposta, prosseguiu com seus planos.

Reações

A encarregada do governo alemão para o caso NSU, Barbara John, afirmou que se apresentar como a "11ª vítima de Böhnhardt e Mundlos, que supostamente teriam agido sozinhos, é a coisa mais simples que se pode fazer", já que os dois estão mortos e não podem mais se defender.

Kubasik disse que o depoimento é "totalmente inventado"Foto: picture-alliance/dpa/A. Gebert

A filha de uma das vítimas, Gamze Kubasik, disse que a declaração de Zschäpe é "totalmente inventada" e que não aceita "esse suposto pedido de desculpas" pelos crimes que teriam sido cometidos apenas por Böhnhardt e Mundlos. Outros parentes de vítimas também expressaram incredulidade e indignação com as declarações.

O advogado Peer Stolle, que defende vítimas do NSU, afirmou que o depoimento de Zschäpe é uma declaração de culpa. "O que ela disse soa tão construído e fora da realidade que fica claro para todo mundo que ela está falando mentiras e tem algo para esconder."

Depois da leitura do depoimento, a batalha de bastidores entre os advogados de Zschäpe se tornou evidente. Grasel, que leu o depoimento, acusou os demais advogados, Wolfgang Heer, Wolfgang Stahl e Anja Sturm, de tentarem prejudicar Zschäpe. A acusação foi rejeitada pelos três.

Grasel pediu ao tribunal que os três advogados sejam afastados do caso. Ele disse que eles não tiveram nenhuma participação no depoimento. Os três sempre foram contra essa opção, o que não corresponderia à vontade de Zschäpe. Somente depois que ele e o advogado Hermann Borchert assumiram o caso, o depoimento foi possível.

A corte entrou em recesso após a leitura da declaração. Os juízes poderão interrogar a ré, mas, a pedido dos advogados, deverão fazê-lo por escrito e em outra data, o que deverá ocorrer na próxima semana.

RC/dw/dpa/afp

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