Na Alemanha, perfis de pessoas sem foto evidente do rosto ou com nomes alterados são comuns para proteger a privacidade. Compartilhar detalhes da vida pessoal nas redes sociais é, em geral, evitado.
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O alemão de quem sou mais próxima – meu namorado – tem apenas 54 amigos no Facebook. São pessoas com quem ele ainda quer manter contato ou laço de amizade. A própria mãe não está na lista, porque ele não quer "ser bisbilhotado” até pela própria família. Nunca vi o nome completo dele nas redes sociais, muito menos fotos de perfil que mostram muito detalhes da face. A justificativa é nada mais do que preservar a privacidade.
A vida dos alemães geralmente não é um livro aberto. A privacidade pessoal, principalmente nas redes sociais, é preservada ao máximo possível. E já começa pela foto de perfil. Será uma silhueta, meio rosto ou uma foto com um ou mais amigos. O nome, na maioria das vezes, é falso, uma abreviação do primeiro nome e do sobrenome ou apenas as iniciais.
Para alguns pode parecer exagero, mas na Alemanha preservar a vida privada é essencial. Fotos de cenas do cotidiano pessoal – na academia, no trabalho, no parque, na viagem – não servem como exibicionismo, mas como lembranças que são compartilhadas apenas com amigos muito próximos. Por esse motivo, as configurações de privacidade dos alemães nas redes sociais são bem restritas. É comum terem uma lista com os contatos mais próximos e criarem restrições de visualização de posts para a maioria dos contatos.
Expor detalhes da rotina é visto com grande cautela na Alemanha. A discrição não é apenas uma forma de prevenir a "invasão” de privacidade, mas de garantir a própria segurança e a da família. Postar fotos de bebês e crianças não é tão comum. Tirar foto do seu próprio filho no jardim de infância ou na escola pode virar um problema. Outros pais ou a direção da escola pode fazer uma advertência.
As instituições de ensino exigem que os pais assinem documentos autorizando ou não que a escola faça fotos da criança, mesmo para motivos institucionais, e um termo de compromisso para não fazer fotos das crianças ou de professores na escola. Algumas escolas no estado da Renânia do Norte-Vestfália oferecem no currículo aulas sobre privacidade online aos alunos como forma de alertar os estudantes sobre possíveis abusos e perigos de compartilhar informações pessoais nas redes sociais.
Paranoia ou discrição? A valorização extrema da privacidade também é refletida nas políticas do governo alemão. A Alemanha quer proibir, por exemplo, que o Facebook processe dados dos usuários gerados em outros sites, entre muitas outras medidas para preservar a privacidade. Em 2016, um tribunal alemão declarou como ilegal a ferramenta "encontrar amigos” do Facebook, obrigando a rede social a fazer alterações na plataforma. Um levantamento da agência Reuters mostra que os alemães têm menos contas ativas no Facebook do que usuários, por exemplo, nos Estados Unidos e Reino Unido, com apenas 41%.
Além de ser parte da personalidade de muitos alemães, a valorização da privacidade se explica em parte pelo passado do país. As ações de vigilância sobre cada detalhe da vida dos cidadãos pelo regime totalitário nazista e, mais tarde, na Alemanha Oriental, deixaram um legado de desconfiança e hiperproteção da vida privada.
Na coluna Alemanices, publicada às sextas-feiras, Karina Gomes escreve crônicas sobre os hábitos alemães, com os quais ainda tenta se acostumar. A repórter da DW Brasil e DW África tem prêmios jornalísticos na área de sustentabilidade e é mestre em Direitos Humanos.
Hábitos tipicamente alemães no trabalho
Pontualidade, vinho espumante durante o dia, cumprimentos no elevador: conheça alguns costumes dos alemães no trabalho que surpreendem estrangeiros.
Foto: picture alliance/PhotoAlto/S. Olsson
Pontualidade é essencial
Embora algumas pessoas tenham horário flexível de expediente, a maioria tem hora certa para começar a trabalhar. Na Alemanha, é correto chegar ao local de trabalho cinco minutos antes da hora marcada. Dez minutos antes é muito cedo, a não ser que você tenha as chaves do escritório.
Foto: Stauke - Fotolia.com
Cumprimentos no elevador
Pessoas que trabalham em um prédio de vários andares estarão familiarizadas com este costume: os alemães cumprimentam-se uns aos outros quando entram num elevador e também se despedem ao sair. Este pequeno ritual pode se tornar cansativo ao longo do dia, principalmente para os que trabalham nos andares mais altos de um prédio. Ao menos esta tradição é melhor do que aquele silêncio constrangedor.
Foto: Imago/Westend61
A máquina de café
Em seu primeiro dia no escritório, além de ser apresentado aos colegas e conhecer seu local de trabalho, você conhecerá – muito importante – a máquina de café. Se você costuma beber café regularmente, conheça primeiro a cultura do café em seu escritório. É bom se informar sobre algumas regras, como o sistema de pagamento, quem está na vez de fazer o café ou mesmo limpar a máquina.
Foto: picture alliance/dpa/C. Klose
Rígidas hierarquias
As hierarquias são expressas diariamente através do idioma, pois o alemão tem duas formas para dizer "você": "du" (informal) e "Sie" (formal), um desafio para estrangeiros. O mais seguro é começar usando "Sie" para todos (chamando a pessoa pelo sobrenome), até que ela se apresente pelo primeiro nome. Este momento exige um aperto de mãos e a recíproca, em que você informa seu primeiro nome.
Foto: picture-alliance/Denkou Images
Tudo tem de ser por escrito
Cada alemão consome uma média de 250 quilos de papel por ano, tornando o país um dos maiores consumidores de papel do mundo. Embora essa quantia certamente possa ser reduzida, manter um registro escrito de praticamente tudo ainda é um hábito praticado nos escritórios alemães. O que estiver registrado por escrito sempre será válido sobre qualquer decisão tomada apenas de forma oral.
Foto: picture-alliance/dpa/T. Eisenhuth
Pouco tempo para almoço
Embora os alemães dispensem só de 30 a 40 minutos para o almoço, esta é uma refeição considerada importante no país. Dependendo da região, os alemães também se cumprimentam no horário de almoço com a expressão "Mahlzeit!" que ao pé da letra significa "refeição". Pode parecer estranho para estrangeiros, mas a saudação originalmente era "gesegnete Mahlezeit", ou seja, "refeição abençoada".
Foto: Picture alliance/dpa/C. Seidel
Bolo é uma necessidade
Muitas coisas são celebradas em um escritório alemão. Espera-se que os recém-chegados tragam um bolo quando começam no novo emprego, uma celebração conhecida como "Einstand". Os alemães também organizam uma pequena celebração quando deixam o emprego ou fazem uma pausa mais longa. E, claro, em dia de aniversário é preciso levar bolo.
Foto: picture-alliance/chromorange/B. Jürgens
Vinho espumante também faz parte
Não se surpreenda se, junto com o bolo, for servido vinho espumante nessas muitas celebrações em um escritório alemão – e isso pode acontecer a qualquer hora do dia.
Foto: Fotolia
Bater de leve na porta e entrar
Se você tem uma reunião marcada no escritório de um colega que está com a porta fechada – o que é frequente na Alemanha – você deve simplesmente bater na porta e entrar imediatamente, sem esperar convite para entrar.
Foto: imago/Westend61
Excursões são parte da cultura corporativa
Os alemães mantêm uma clara separação entre trabalho e vida privada. Ainda assim, excursões com os colegas de trabalho são organizadas regularmente para que os funcionários socializem e se conheçam melhor. Participar dessas excursões, conhecidas como "Betriebsausflüge", é uma forma de mostrar o interesse na equipe e pela empresa. Nessas oportunidades, deve-se evitar falar de assuntos de trabalho.
Foto: picture alliance/Sputnik/dpa/A. Kudenko
Saída mais cedo às sextas
Os alemães têm até uma palavra para designar o tempo livre após o expediente: "Feierabend", que literalmente se traduz como "noite de festa". Quando os alemães se desejam "Schönen Feierabend!" não significa que, ao terminarem o trabalho, todos vão direto para o bar. Eles podem tanto ir para o esporte como para casa tomar uma cervejinha. Às sextas-feiras, geralmente o "Feierabend" começa mais cedo.