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Programa alemão para salvar empregos pode ter fôlego curto

Nik Martin md
17 de maio de 2020

"Kurzarbeit" tem dado sobrevida a empresas e funcionários durante a pandemia. No entanto, analistas alertam que, se a economia não for retomada nas próximas semanas, um aumento drástico do desemprego pode ser inevitável.

Trabalhador com roupa de proteção em linha de envase de garrafas
Cerca de 370 mil empresas na Alemanha pediram adesão ao programa estatal de redução de jornada de trabalho durante a pandemiaFoto: Imago/J. Heinrich

Metade das empresas alemãs se cadastrou para colocar alguns ou todos os seus funcionários no programa governamental de jornada de trabalho reduzida, calculou nesta semana o Instituto de Pesquisa Econômica (Ifo), sediado em Munique.

Como resultado da pandemia de coronavírus, mais de 97% das empresas do setor hoteleiro e de  gastronomia e 94% no setor automotivo se beneficiaram do sistema. Chamado de Kurzarbeit (trabalho de curta duração), o programa estatal permite às empresas reduzir o horário de trabalho e receber subsídios generosos para continuar pagando pelo menos 60% do salário de seus funcionários. Outras indústrias também estão reduzindo jornadas de trabalho em níveis sem precedentes.

O Kurzarbeit deu resultados ao atender um número comparativamente pequeno de demissões durante a crise financeira de 2008/2009. No final de 2009, o desemprego na Alemanha era menor do que no ano anterior, enquanto nos EUA o número de desempregados dobrou no mesmo período. Em vez de reduzir postos de trabalho, as empresas alemãs tiveram flexibilidade para reduzir as jornadas de trabalho, podendo se beneficiar com uma força de trabalho pronta para atuar quando os negócios se reaqueceram.

Circunstâncias excepcionais

No entanto, durante a atual emergência sanitária, cerca de 370 mil empresas solicitaram o subsídio estatal, potencialmente colocando até 10 milhões de trabalhadores – um quarto da força de trabalho – no esquema de jornada reduzida. Essa demanda sem precedentes por subsídios do governo e a queda recorde de 6,6% do Produto Interno Bruto (PIB) projetada para este ano têm preocupado políticos e economistas, que temem que a economia possa levar vários anos para retornar aos níveis pré-coronavírus. Eles dizem que uma recessão mais profunda forçaria dezenas de milhares de empresas à falência e levaria outras a encolher.

De fato, o Ifo divulgou nesta segunda-feira (11/05) novos dados, revelando que 39% das empresas automotivas, 50% dos hotéis, 58% dos restaurantes e 43% das agências de viagens já haviam demitido funcionários em abril. Também vem ocorrendo demissões acima da média em muitos outros setores, com exceção da indústria farmacêutica. "A partir de agora, a crise terá um impacto no mercado de trabalho alemão", diz o economista Klaus Wohlrabe, chefe do setor de sondagens do instituto.

Em um estudo separado do Ifo publicado no mês passado, quase um terço das empresas alemãs disse que sobreviveria apenas três meses se muitas das restrições impostas devido à pandemia permanecessem, enquanto pouco mais da metade apontou que poderia aguentar por seis meses. Isso apesar de cerca de 750 bilhões de euros em ajuda e empréstimos do governo terem sido disponibilizados desde março.

Embora se espere que a crise da saúde seja um choque a curto prazo, qualquer pandemia duradoura provavelmente aumentará as mudanças estruturais que a economia alemã já enfrenta. A indústria automotiva, por exemplo, alertou que precisará de muito menos trabalhadores na era da eletromobilidade, as mudanças climáticas já estão forçando a mudança para energias renováveis, e o aumento da automação provavelmente significará mais turbulência no mercado de trabalho.

Uma segunda onda de infecções por coronavírus ou o uso prolongado de medidas de distanciamento social dificultariam ainda mais os esforços para aumentar as exportações – que representam 40% do PIB da Alemanha – e manteriam a demanda doméstica fraca por algum tempo.

"Se for necessária uma mudança estrutural [na economia], o Kurzarbeit não funcionará", afirma à DW Lars Feld, presidente do Conselho Alemão de Especialistas Econômicos. Ele acredita que, se a crise persistir, subsídios para jornadas reduzidas de trabalho manterão à tona empresas zumbis. "Mas, mais importante, o capital humano poderia ser melhor implantado por empresas com modelos de negócios mais orientados para o futuro", diz Feld.

Quanto mais tempo o Kurzarbeit continuar em vigor, mais pressão o governo alemão enfrentará para aumentar a quantia que os trabalhadores recebem como compensação pela perda de renda. Visar trabalhadores de baixa renda com ajuda adicional também é uma grande prioridade para os políticos, mas é improvável que a medida impulsione o consumo enquanto as medidas de distanciamento social continuarem reprimindo a demanda.

Os trabalhadores vão querer voltar?

Os ministros já aprovaram um aumento no salário médio pago àqueles em jornada reduzida de 60% para 70% de seus salários. Mas isso reacendeu as preocupações com a dependência de ajuda social e de que alguns funcionários relutariam em retornar ao horário integral quando a economia se recuperar. Da mesma forma, tem havido relatos nos EUA de trabalhadores com salário mínimo solicitando que sejam dispensados, já que os benefícios sociais temporários do Estado são superiores ao salário que ganham.

"Os governos estão em pânico de que essa possa ser a maior crise em 100 anos, mas os incentivos econômicos que eles introduziram podem enfraquecer a recuperação quando ela vier", alerta Moritz Kuhn, professor de economia da Universidade de Bonn.

Um cético em relação ao programa Kurzarbeit, Kuhn questiona se a redução de jornada protegeria suficientemente trabalhadores da demissão e observa que os salários reduzidos e o benefício de desemprego ao qual a maioria dos trabalhadores tem direito têm quase os mesmos valores.

Reformas trabalhistas anteriores ainda ajudam economia

Ele acredita que a economia alemã passou ao largo da Grande Recessão por causa das reformas bem-sucedidas do mercado de trabalho introduzidas no início dos anos 2000, que desincentivaram pedidos de benefício social e mantiveram estagnados os salários dos trabalhadores.

"Não encontro argumentos muito fortes que apoiem a ideia de que a jornada reduzida tenha ajudado a Alemanha a atravessar a crise financeira", argumenta Kuhn. Ele diz que as taxas de desemprego caíram drasticamente devido às reformas anteriores, mas "os pedidos de auxílio desemprego ainda aumentaram 30% em 2008".

Feld, por outro lado, acha que o Kurzarbeit é mais eficaz do que os programas de estímulo frequentemente usados para ajudar a economia a se recuperar após uma recessão. Ele avalia que a redução das jornadas de trabalho é um instrumento emergencial que ajuda os trabalhadores imediatamente durante uma crise.

"As medidas de estímulo frequentemente vêm com uma longa demora entre a decisão e a implementação e então acabam sendo procíclicas", frisa o especialista. Elas geralmente são excedentes às exigências no momento em que entram em ação.

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