Regime de transição foi primeiro eleito democraticamente na Alemanha Oriental e ficou menos de seis meses no poder. Gabinete liderado por Lothar de Maizière é tema de portal online, que expõe documentos e fotos da época.
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"Nós éramos atores amadores, mas éramos bons atores amadores", diz Herbert Schirmer. Maquinista por formação, livreiro e jornalista, ela era um nome conhecido na cena cultural da Alemanha Oriental. Mas se tornou famoso por outro emprego: ministro da cultura nos últimos meses de existência do país.
Vinte e cinco anos depois da formação do último governo da Alemanha Oriental, ele se encontrou pela primeira vez com seus ex-colegas. São membros do gabinete de Lothar de Maizière, nas instalações da Fundação Federal para Avaliação da Ditadura do SED (Partido Socialista Unitário da Alemanha Oriental), a convite de Anna Kaminsky, diretora da instituição, e da atual ministra alemã da Cultura, Monika Grütters.
A reunião ocorreu durante a apresentação do projeto multimídia Aufbruch und Einheit – Die letzte DDR-Regierung ("despertar e união, o último governo da RDA", em tradução livre), sobre o primeiro – e último – governo da Alemanha Oriental eleito democraticamente.
O projeto permite, pela primeira vez, o acesso ao público a cem documentos originais, 200 fotos e 50 vídeos, além de entrevistas de testemunhas da época, através da internet. Kaminsky afirma que o site deve não só documentar o trabalho dos 23 ministérios, que permaneceram menos de seis meses no poder, mas, especialmente, também servir como uma homenagem.
Reunificação na perspectiva oriental
"Um ponto sensível para os ex-ministros e secretários de Estado é que a pesquisa histórica da Reunificação ainda é baseada num mito", argumenta Markus Meckel, ministro do Exterior da Alemanha Oriental entre abril a agosto de 1990. "O mito é que o Muro caiu e, então, Helmut Kohl veio e fez a unidade", afirma.
Meckel diz que até hoje sente falta de uma narrativa histórica sobre o último governo da Alemanha Oriental e sua relação com a unidade alemã. "Nele, não somente ocorreu um processo de unificação, mas também começou uma transformação."
Ele destaca que a tarefa daquele governo era modelar e construir uma democracia, do zero, a partir de uma ditadura. "Através dessa documentação, pela primeira vez, o foco sobre a negociação da Reunificação é colocado na política do lado oriental desse processo. E, assim, nos torna cientes de que houve um processo de negociação."
A visão do lado oriental das negociações não era, entretanto, uniforme. A coalizão eleitoral que surpreendeu ao vencer as eleições, a "Aliança para a Alemanha", reunia, ela própria, diversas correntes políticas.
E, para formar um governo, ela ainda teve que se unir em coalizão ao Partido Social-Democrata da Alemanha Oriental e aos liberais. Em 12 de abril de 1990, era confirmado, oficialmente, o novo governo da Alemanha Oriental, com Lothar de Maizière como primeiro-ministro. O governo de transição era uma reunião de diversas forças políticas, com uma tarefa política específica, e não chegava a ser um círculo de amigos.
A solidariedade suprapartidária não durou muito tempo. Todos sabiam o que não queriam, mas as divergências começaram a surgir quando a tarefa era definir o que se queria realizar.
Um problema no último governo da Alemanha Oriental não era apenas sua fragmentação interna. Muitos ministros não tinham experiência alguma de governo e administração. E eles tinham tarefas árduas, como estabelecer eleições locais, elaborar novas diretrizes públicas, segundo princípios democráticos.
"E, de repente, vem um homem e diz: 'Meu Deus, estes atores amadores. Não poderíamos substituí-los, de alguma forma?'", lembra Schirmer, citando o então governador do estado alemão-ocidental da Baviera, Max Streibel. O comentário tocava no sentimento de inferioridade nutrido pelos alemães orientais. "Aquilo soou meio estranho", destacao ex-ministro.
Hoje, Schirmer vê a coisa se forma mais descontraída. "O homem tinha razão. Afinal, éramos, sim, atores amadores." Mas o que o persegue até hoje é a ideia de que a autoconfiança alemã-oriental foi crescendo em algum momento.
Arquitetura alemã-oriental em Berlim
Quem quiser saber mais sobre a história de Berlim Oriental deve partir da praça Alexanderplatz e seguir pela avenida Karl Marx. Num espaço relativamente curto, uma série de construções conta a história da era comunista.
Foto: picture-alliance/dpa
Marco na Alexanderplatz
A mais alta construção da Alemanha também define a silhueta de sua capital. Inicialmente controversa, a torre de televisão da praça Alexanderplatz tornou-se um símbolo político de Berlim Oriental. Sua inauguração, em 1969, não só melhorou as transmissões na Alemanha Oriental como também evidenciou a vontade do regime de demonstrar modernidade e eficiência. Hoje a torre é patrimônio histórico.
Foto: DW/E. Jahn
Relógio universal
Há poucos metros da torre, também na Alexanderplatz, está o Relógio Universal Urania. Sobre uma coluna de alumínio gira um cilindro com 24 segmentos, que mostra a hora em várias cidades do mundo. As esferas rotativas sobre o cilindro simbolizam o planeta. Assim como antes da queda do Muro, o relógio é um popular ponto de encontro.
Foto: DW/E. Jahn
Transformação urbana
Mas a transformação da Alexanderplatz em praça central começou anos antes. Em 1964 foi inaugurada a Haus des Lehrers (Casa do Professor), o primeiro edifício da praça. Ao lado de um centro de convenções e contando com biblioteca, restaurante e salas de reuniões, o local era ponto de encontro de pedagogos. Há alguns anos, após uma reforma, foi convertido em prédio de escritórios.
Foto: DW/E. Jahn
Arte no prédio
O painel na fachada do edifício chama a atenção até hoje. Com 125 metros de comprimento, o mosaico "Unser Leben" (nossa vida), do artista Walter Womacka, rodeia todo o prédio e conta com cerca de 800 mil pedras. Um exemplo de realismo socialista, a obra combina o ideal de vida comunista com cenas do cotidiano da Alemanha Oriental.
Foto: DW/E. Jahn
A avenida da Alemanha Oriental
Da Alexanderplatz parte uma avenida de mais de dois quilômetros de extensão no sentido leste. Originalmente chamada de avenida Stalin, ela foi renomeada para avenida Karl Marx em 1961. Suas primeiras quadras são dominadas por edifícios pré-fabricados, conhecidos por Plattenbauten e construídos entre 1959 e 1965. Também aqui ficavam as tribunas de onde os líderes acompanhavam as paradas cívicas.
Foto: DW/E. Jahn
Cinema de boa qualidade
Um pouco mais adiante foram construídos locais de convívio social. Até hoje, o cinema Kino International, inaugurado em 1963, é palco de grandes estreias cinematográficas. Sua fachada de vidro e seu ótimo sistema de som continuam atraindo muitos visitantes. Especialmente durantes os festivais de cinema, como a Berlinale, os ingressos para as suas sessões são muito disputados.
Foto: DW/E. Jahn
Culinária dos países irmãos
Em frente ao cinema fica o Café Moscou, que perdeu muito do glamour original. Durante o regime comunista, o local era um restaurante que servia a culinária de sete nações, dando aos clientes a oportunidade de provar especialidades dos países irmãos. O Sputnik, um presente da embaixada soviética, ainda paira sobre o letreiro na fachada do prédio, cujas salas, hoje, são alugadas para eventos.
Foto: DW/E. Jahn
Um futuro melhor
A mais antiga e imponente parte da avenida Karl Marx começa na altura da Strausberger Platz, onde pomposos edifícios podem ser vistos em ambos os lados da ampla avenida. Numa Berlim devastada pela guerra, os chamados "palácios dos trabalhadores" deveriam simbolizar, para os cidadãos da Alemanha Oriental, a promessa que o socialismo traria um futuro melhor.
Foto: DW/E. Jahn
Moscou como modelo
A partir de 1951, Henselmann Hermann, até então diretor da Escola Bauhaus em Weimar, passou a ser o arquiteto responsável pela mais famosa avenida da Alemanha Oriental. Embora ele estivesse ligado ao modernismo, os líderes do partido impuseram suas ideias do neoclassicismo soviético. Mais de 70% dos tijolos usados nas construções foram retirados das ruínas da Berlim do pós-Guerra.
Foto: DW/E. Jahn
Inauguração no aniversário do Stalin
Em dezembro de 1952, os primeiros moradores se mudaram para os cobiçados apartamentos na Stalinallee. As novas moradias eram bem mais confortáveis, com grandes terraços, elevadores, pisos de parquê, aquecimento central, sistema de interfone e uma linha telefônica – um dos maiores objetos de desejo da Alemanha Oriental.
Foto: DW/E. Jahn
Só ficou o letreiro
No térreo dos novos edifícios foram inaugurados cafés e lojas, incluindo a livraria Karl Marx. Durante décadas, ela apresentou aos leitores de Berlim Oriental nomes como Thomas Mann, Christa Wolf e Bertolt Brecht. O local também serviu de locação para o filme "A vida dos outros". Devido ao aluguel elevado, a livraria encerrou suas atividades em 2008, deixando apenas o letreiro da fachada.
Foto: DW/E. Jahn
Símbolo do terror
Seguindo adiante, a avenida muda de nome e se torna Frankfurter Allee. Depois de quatro quilômetros chega-se a Lichtenberg, o bairro que abrigava a sede da Stasi, o serviço secreto da Alemanha Oriental. A casa 1, onde ficava o escritório do ministro Erich Mielke, é hoje um museu e um centro de pesquisa voltado para o passado da instituição.
Foto: DW/E. Jahn
O coração de um sistema de espionagem
Ao longo de vários andares, uma exposição mostra os métodos de monitoramento da Stasi, além de contar a história da resistência na Alemanha Oriental. O ponto alto da visita é o escritório original de Erich Mielke, onde ele organizou, entre 1957 e 1989, o monitoramento dos cidadãos do país. Muitas pessoas atribuem um grande valor simbólico ao fato de essas salas serem hoje de livre acesso.