Acadêmicos e artistas usaram a tecnologia para identificar qual seria o próximo alvo das sátiras do dramaturgo francês. Comédia inédita será encenada no próximo ano no Palácio de Versalhes.
Molière viveu de 1619 a 1690 e é considerado um dos maiores dramaturgos francesesFoto: akg-images/Fototeca Gilardi/epd
Anúncio
Qual teria sido a próxima peça de Molière se o dramaturgo francês do século 17 não tivesse morrido após desmaiar no palco durante a apresentação de O Doente Imaginário? Essa é a pergunta que acadêmicos, artistas e uma empresa de inteligência artificial (IA) franceses uniram forças para responder.
O resultado é L'Astrologue ou les Faux Presages (O Astrólogo ou os Falsos Presságios, em tradução livre), uma comédia que estreará no próximo ano no Palácio de Versalhes, onde Luís 14, mecenas de Molière, mantinha sua corte séculos atrás.
"Pensamos que poderíamos tentar recriar parte do processo criativo de Molière usando o estado atual da inteligência artificial", explicou Hugo Caselles-Dupre, pesquisador na área de uso da inteligência artificial para a criação artística, que participou do projeto.
"Reviver" um ícone francês
Molière é um ícone na França, a ponto de o idioma francês ser às vezes chamado de "a língua de Molière". Suas peças, caracterizadas pelo humor satírico e pela crítica social, são amplamente estudadas nas escolas francesas e encenadas em teatros por todo o mundo francófono.
"O Misantropo" é uma das peças mais famosas de MolièreFoto: akg-images/Fototeca Gilardi/epd
Apesar do patrocínio de Luís 14, Molière viveu na pobreza durante muitos anos e morreu de exaustão aos 51 anos, deixando seus admiradores se perguntando quem seria seu próximo alvo de críticas.
Segundo o projeto Molière Ex Machina, apoiado pela empresa francesa de inteligência artificial Mistral AI, o dramaturgo poderia ter se revoltado contra os astrólogos. "Investigamos que tipo de obra Molière poderia ter escrito. Um dos temas que ele abordou, embora sutilmente presente em várias de suas outras obras, é a astrologia", afirmou Mickael Bouffard, historiador e diretor da peça.
A trama gira em torno de Geronte, um burguês ingênuo que cai na lábia de um astrólogo fraudulento que planeja casar a filha de Geronte com um fabricante de perucas desonesto, apesar do amor dela por outro. O modelo de inteligência artificial não foi operado sem supervisão. A produção foi aprimorada por acadêmicos e pesquisadores que corrigiram imprecisões históricas e outros detalhes.
O modelo ofereceu aos estudiosos uma compreensão profunda da arte de Molière, mais de 350 anos após sua morte. "Aprendi coisas sobre Molière que eu havia ignorado porque estão muito dispersas por toda a sua obra", disse Bouffard.
le/cn (Reuters)
Dez autores franceses que você precisa conhecer
Conheça dez dos maiores escritores franceses da atualidade.
Foto: Imago/El Mundo
Michel Houellebecq
Ele é considerado a estrela da literatura francesa moderna e é o mais famoso escritor do país. Nenhum outro autor concentra tanto o foco da opinião política e literária como o francês nascido na ilha da Reunião em 1956. Houellebecq, que também é poeta e diretor de cinema, alcançou sucesso mundial com "Partículas elementares", de 1998.
Foto: Getty Images/AFP/E. Munoz Alvarez
Virginie Despentes
Como Houellebecq, Despentes lança um olhar cínico sobre a realidade, mas difere dele nas opiniões sobre esclarecimento e posição social da mulher. A última parte de sua trilogia "Vernon Subutex", sobre degradação social e precariedade na França, foi lançada este ano em seu país. O romance descreve as mais variadas facetas da sociedade e lhe rendeu comparações com Honoré de Balzac (1799 – 1850).
Foto: picture-alliance/dpa/J.C.Hidalgo
Yasmina Reza
Yasmina Reza é a autora francesa de maior sucesso. Encenadas internacionalmente, suas peças de teatro – como "Deus da Carnificina" – contribuíram para a sua fama. Há alguns anos, Reza também tem êxito com romances. Seu livro "Babylone", dotado com o prêmio Renaudot, mostra seus pontos fortes: um olhar de fundo sobre a sociedade, envolto num texto que entretém.
Foto: Getty Images/P. Cuadra
Tristan Garcia
Nascido em Toulouse em 1981, Garcia é mais conhecido como filósofo na França. Seu romance "Faber, le destructeur" ("Faber, o destruidor", em tradução livre) mostra que sua prosa também é brilhante. Trata-se de uma obra misteriosa e cheia de nuances sobre a juventude e a chegada da idade adulta.
Foto: Imago/Leemage
Leïla Slimani
Leïla Slimani também nasceu em 1981, em Rabat, capital do Marrocos. Também ela pertence a uma geração de jovens escritores responsável por uma ruptura na literatura francesa. Seu romance "Chanson douce" ("Canção doce") foi premiado com o Goncourt, a maior distinção literária da França, em 2016. O sucesso de crítica e público e trata de um infanticídio.
Foto: picture-alliance/AP Photo/F. Mori
Édouard Louis
Édouard Louis já é uma estrela da literatura francesa. Aos 24 anos, publicou duas obras de sucesso. A mais recente é "Histoire de la violence" ("História da violência"), uma denúncia da marginalização de imigrantes argelinos. Louis escreve sobre a origem social, a oposição entre cidade e província, a homossexualidade e a vida no norte da França, derrocada tanto econômica quanto socialmente.
Foto: picture-alliance/dpa/E.Naranj
Didier Eribon
O filósofo Didier Eribon é próximo de Louis, que dedicou o seu primeiro romance a ele. Nascido em Reims em 1953, Eribon é um dos sociólogos mais conhecidos da França e se dedica à reflexão sobre origens e identidade – objetos de sua obra "Retour à Reims" ("Retorno a Reims"), de 2009. Eribon também é conhecido por sua biografia de Michel Foucault, publicada em 1989 e traduzida em diversas línguas.
Foto: picture-alliance/dpa/H. Galuschka
Annie Ernaux
Os livros autobiográficos de Annie Ernaux se destacam pela visão sociológica sobre o mundo. Apesar de também tratar de sua vida, a obra "Les Années" ("Os Anos"), de 2008, foi considerada "atípica" pela rádio France Inter. "Ela inventou a ficção documental através do filtro de sua própria história e conjuga memória individual e coletiva num caleidoscópio de memórias", avaliou a crítica Laura Adler.
Filósofo e professor, Jérôme Ferrari nasceu em Paris em 1968. A carreira do perspicaz tradutor e intelectual se desenvolveu na capital francesa, na Córsega, em Argel e em Abu Dabi. Os romances de Ferrari apresentam um olhar culto e original sobre a História e a sociedade. Foi premiado com o Goncourt de 2012 pelo "Sermão sobre a queda de Roma", publicado no Brasil em 2013.
Foto: picture-alliance/dpa/A.Burgi
Delphine de Vigan
A romancista e diretora de cinema Delphine de Vigan se tornou fenômeno da literatura na França com a autobiografia "Rien ne s'oppose à la nuit" ("Nada se opõe à noite", em tradução livre). De Vigan costuma analisar o papel de seus pais em suas obras. Atualmente objeto de filmagens por Roman Polanski, "Baseado em fatos reais" foi seu primeiro romance lançado no Brasil, em 2016.