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Projetos de lei podem alterar licença-maternidade

Laís Modelli de São Paulo
9 de abril de 2019

Aumento do afastamento para 180 dias e da estabilidade gestacional no emprego e adicional de insalubridade são algumas das propostas que tramitam no Congresso.

Projetos de lei trazem propostas para aumentar estabilidade das mães que trabalham
Projetos de lei trazem propostas para aumentar estabilidade das mães que trabalhamFoto: picture-alliance/dpa

Em 2011, a executiva de marketing de uma empresa multinacional no Brasil Vivian Abukater se tornou mãe e, ao voltar ao trabalho depois de quatro meses de licença-maternidade, teve uma surpresa.

"Três meses após eu retornar da licença-maternidade, fui demitida. Caí nas estatísticas que apontam que 48% das mulheres são demitidas após a licença", conta a empresária

Ela se refere a uma pesquisa de 2017 da Fundação Getúlio Vargas que mostrou que quase metade das 247 mil mulheres que participaram do estudo foram demitidas em até 12 meses após o nascimento do filho.

Trabalhadoras contratadas pelo regime de Consolidação das Leis do Trabalho têm direito à licença-maternidade de 120 dias, e servidoras públicas federais a 180 dias. Desde 2008, o governo concede benefícios fiscais a empresas privadas que concedam o afastamento de 180 dias.

Além disso, desde 1988, os custos da licença-maternidade são pagos pela Previdência Social, e não pelo empregador, a fim de diminuir preconceitos e discriminações contra trabalhadoras gestantes e lactantes.

A fim de impedir – ou retardar – a demissão durante a licença-maternidade, desde 1988 o código trabalhista concede estabilidade no emprego para gestantes desde o dia de confirmação da gravidez até cinco meses após o parto. Esse período da estabilidade não cobre, contudo, a licença-maternidade das trabalhadoras que tiveram direito a 180 dias de afastamento, que podem ser demitidas no último mês da licença-maternidade.

Para reparar essa irregularidade, em fevereiro foi apresentado o PL 189, que propõe ampliar em um mês a estabilidade no emprego das trabalhadoras que tiveram 180 dias de afastamento. O projeto ainda precisa ser analisado pelas comissões de Cidadania e de Constituição e Justiça da Câmara.

Outro projeto de lei apresentado no Congresso Nacional em 2019 foi o PL 11239, que propõe que gestantes e lactantes se afastem de trabalhos insalubres com direito a receber adicional de insalubridade durante todo o período de afastamento.

Atualmente, o afastamento dessas trabalhadoras de atividades insalubres é permitido após atestado médico. Se aprovado o PL 11239, que tramita em regime de urgência, o afastamento será regra em qualquer caso.

O mais recente projeto sobre trabalhadoras gestantes e lactantes apresentado no Congresso foi o PL 241, de 2017, que prorroga o início de licença-maternidade em caso de internação do recém-nascido ou da mãe.

Pela lei atual, se um recém-nascido prematuro fica internada por 45 dias, por exemplo, este período é contado na licença da mãe. O projeto propõe que o afastamento seja contado a partir do momento que mãe e bebê tiveram alta hospitalar. O PL 241 ainda precisa ser aprovado pelo Senado.

Para a Sociedade Brasileira de Pediatria, além desses projetos, o mais urgente é o PL 10.062, que amplia para 180 dias, ou seis meses, a licença-maternidade para todas as trabalhadoras. O projeto está em tramitação no Congresso desde 2018.

"A defesa pela ampliação da licença-maternidade é uma luta histórica da Sociedade Brasileira de Pediatria, que defende que a licença-maternidade seja, no mínimo, de seis meses, sendo que um ano seria o tempo mais adequado para esse tipo de licença", defende a médica e presidente da entidade, a pediatra Luciana Rodrigues Silva.

Ruptura brusca

Para a mãe e consultora paulistana Eva*, que não quis se identificar, a licença-maternidade de 120 dias é uma ruptura brusca entre mãe e filho. "O bebê que já tem que ir para uma creche aos quatro meses de idade adoece a todo momento”, explica a consultora, contando que o filho, que até então não tinha tido nenhum problema de saúde desde o parto, passou a ter resfriados e viroses constantes desde que começou a frequentar a creche, há seis meses.

"Experimente falar para o seu chefe, depois de voltar da licença-maternidade, que precisará sair mais cedo para levar o filho no pediatra. Ou que terá que começar a sair no horário certo do trabalho para conseguir buscar o filho na saída da creche”, desabafa a profissional paulistana, reclamando que, de todas as rupturas causadas pelo fim da licença-maternidade, a pior delas foi a impossibilidade de continuar amamentando o filho.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que o leite materno seja o único alimento do bebê até os seis meses de vida. A OMS garante que nem mesmo água é preciso ingerir nesse período se a criança estiver recebendo exclusivamente o leite da mãe e em livre demanda.

"Os seis primeiros meses são insubstituíveis para o crescimento e o desenvolvimento integral da criança, sendo que o aleitamento materno nesse período ajuda na prevenção de doenças como a obesidade e infecções durante toda a vida. Já para a mulher, estudos apontam que a amamentação ajuda a reduzir a hemorragia após o parto e previne o câncer de mama e de ovário”, explica Silva.

De acordo com a Sociedade Brasileira de Pediatra, "se o aleitamento materno fosse adotado de uma forma abrangente, o Brasil teria uma redução de número de mortes de crianças abaixo de cinco anos, por ano, de mais de 800 mil bebês”, afirma a pediatra. Segundo os últimos dados do Ministério da Saúde, a taxa de mortalidade entre crianças de zero a 5 anos em 2016 foi de 14,9 em cada mil crianças.

Além da amamentação exclusiva até os seis meses, Silva ressalta que, para que a amamentação seja capaz de promover mudanças na saúde das gerações futuras, também é essencial que o aleitamento nesse período seja em livre demanda.

"Isso significa que o bebê tem que ser amamentado pela mãe em determinados horários que ele escolhe por necessidade biológica, psicológica, afetiva e emocional. A livre demanda imposta por cada bebê deve ser respeitada”.

"Mesmo que empresas mais modernas disponibilizem uma sala para amamentação durante o trabalho, é praticamente impossível interromper o serviço para amamentar em livre demanda o seu filho”, conta a consultora Eva. 

O bem-estar emocional é outra questão que deve orientar o aumento da licença-maternidade no Brasil. "A mãe, ao oferecer o seio ao filho, transmite-lhe segurança, prazer e conforto emocional. O amor e presença materno nesse período é tão importante para o desenvolvimento emocional da criança quanto o leite materno é para o desenvolvimento do organismo”, explica a pediatra.

Se o Governo quer oferecer saúde e qualidade de vida às futuras gerações, deve dar condições para o aleitamento materno exclusivo. Aprovar o PL 10.062 é urgente”, defende Silva.

Penalização

Em 2011, a empresária Ana Laura Castro estava em período de experiência no trabalho. "Ao descobrir que estava grávida, fui dispensada", conta. Sem ter direito a uma licença-maternidade, resolveu que não voltaria mais ao mercado como empregada.

Ela percebeu que muitas brasileiras viviam a mesma situação. Uma pesquisa da Rede Mulher Empreendedora de 2017 relevou que 55% das empreendedoras no Brasil são mães e 75% delas optaram por esse caminho para conseguir recolocação profissional após a maternidade. Ana Laura teve a ideia de criar uma rede de mães empreendedoras, onde pudessem trocar experiências, se capacitarem e encontrar público consumidor para seus produtos.

Nascia assim, em 2015, a Rede Maternativa, uma ponte entre consumidores e mães empreendedoras que conta com 23 mil mulheres de todo o Brasil. Uma dessas mulheres é Vivian, que conheceu Ana Laura por meio da rede e, desde 2018, se tornaram sócias. A Rede Maternativa é a primeira startup de impacto social do Brasil que tem como propósito discutir e transformar a relação entre mães e trabalho.

Desde 2015, a startup cresceu tanto que passou a atender empresas. "Nesses 4 anos escutando as dificuldades enfrentadas pelas mulheres no mercado, desenvolvemos uma metodologia para compartilhar esse conhecimento com as empresas, para que elas repensem suas práticas e melhorem seus ambientes de trabalho”, explicou Vivian.

As empresárias defendem que os projetos de leis sobre licença-maternidade também deveriam olhar para a hostilidade do mercado de trabalho com a maternidade. "Os cuidados básicos com os filhos, como a amamentação, ainda que essencial, é apenas uma face dessa história”, afirma Vivian.

"Seja pelas demissões após o parto, seja pela grande dificuldade de conciliar a maternidade com o trabalho em ambientes corporativos pouco flexíveis, a penalização das mães trabalhadoras no mercado de trabalho é uma realidade vivida por todas".

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