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História

Protesto de afro-alemães por igualdade completa 100 anos

Daniel Pelz av
26 de julho de 2019

Liderados pelo camaronês Martin Dibobe, 18 africanos entregaram em 1919 um documento reivindicando direitos iguais, na Alemanha e nas colônias. Numa homenagem tardia, agora uma placa em Berlim lembra a iniciativa.

Martin Dibobe, condutor de trem e ativista dos direitos dos africanos
Martin Dibobe, ativista dos direitos dos africanos, foi o primeiro condutor de trem negro da Alemanha no início do século 20 Foto: BVG-Archiv

O conteúdo da petição que o camaronense Martin Dibobe e seus 17 companheiros apresentaram à Assembleia Nacional e o Ministério Colonial alemão em meados de 1919 representava uma pequena revolução.

Embora jurando "lealdade inquebrantável" à República de Weimar, eles exigiam direitos iguais para alemães e africanos que viviam no país; um deputado africano (o próprio Dibobe) no Reichstag (Parlamento alemão); mais direitos para os habitantes das colônias alemãs na África; fim das punições corporais e do trabalho forçado. "Através dessas reivindicações, eles apontavam indiretamente para todos os erros do colonialismo", comenta à DW a historiadora Paulette Reed-Anderson.

Dibobe sofrera pessoalmente a injustiça do sistema colonial. Nascido em 1876 e filho de um chefe tribal do Camarões, então colônia alemã, ele viajou para Berlim como parte de uma exposição etnológica – os "zoos humanos", como ficaram conhecidos mais tarde –, visando satisfazer a curiosidade da população e fomentar seu entusiasmo pelo colonialismo.

Na capital alemã, o camaronense se esforçou para tornar-se o primeiro condutor negro de trens que trafegavam em linhas elevadas. Vencendo grande resistência, casou-se com a filha de seu senhorio. E tornou-se um combatente incansável pelos direitos dos africanos.

Dibobe era um diplomata habilidoso, que conhecia as condições da época. "Não fazia sentido simplesmente escrever 'Queremos independência', pois para eles estava claro que não a obteriam. Eles eram muito pragmáticos", comenta Reed-Anderson, especialista na história da comunidade africana na Alemanha.

No entanto o protesto dos africanos caiu no vazio, ficando sem resposta tanto a Assembleia Nacional, que elaborava uma nova Constituição democrática em Weimar, quanto do Ministério Colonial. Após a assinatura do Tratado de Paz de Versalhes, meses depois do fim da Primeira Guerra Mundial, a Alemanha teve que entregar suas colônias às potências vencedoras: França e Reino Unido. As 32 reivindicações da Petição Dibobe permaneceram ignoradas.

E foram precisos 100 anos até o empenho dos 18 signatários ser reconhecido publicamente: desde meados de julho de 2019, uma placa comemorativa no prédio do antigo Departamento Colonial do Império Alemão, no bairro berlinense de Mitte, relembra a petição e seu epônimo.

Durante a cerimônia de descerramento, o secretário de Cultura de Berlim, Klaus Lederer, lembrou o que os imigrantes exigiam, na época: "independência, igualdade de direitos e segurança legal" em suas colônias de origem. "Além disso, desejavam participação e representação, em formulações que soavam como reformas, mas implicitamente questionavam o sistema de domínio colonial baseado em desigualdade e violência."

Martin Dibobe não viveu para ver qualquer resultado de seus esforços, é claro. Exasperado pelo racismo em sua pátria eletiva, a Alemanha, ele retornou à África. No Camarões, que passou para a administração francesa, o ativista incômodo teve seu regresso negado. Em 1922 seu rastro foi perdido na Libéria, e ele caiu no esquecimento.

No entanto a petição que leva o nome de Dibobe mantém o significado até hoje, afirma o ativista teuto-tanzaniano Mnyaka Sururu Mboro, cofundador da associação Berlin Postkolonial, responsável pela iniciativa da placa comemorativa. "Eles exigiram, por exemplo, um deputado africano no Parlamento. Demorou quase 100 anos, e agora temos um."

Ele se refere a Karamba Diaby, representante do Partido Social-Democrata (SPD) nascido no Senegal. Outras reivindicações não foram cumpridas até hoje, frisa Mboro, que mora há 30 anos na Alemanha: "Muitos afro-alemães até hoje não são vistos como alemães de pleno direito. Mesmo vivendo aqui e falando o idioma, continuam não sendo aceitos."

Há também inércia na Alemanha para processar a história colonial: ainda não há em Berlim um memorial do colonialismo alemão, como exigem ativistas, e o tema é praticamente ausente dos livros escolares e da mídia. Certos nomes de ruas seguem homenageando senhores e oficiais coloniais, para indignação de parcelas da sociedade civil. Outro ponto de atrito é a devolução de ossadas humanaspreservadas em arquivos alemães, e de tesouros culturais da era colonial.

Para Paulette Reed-Anderson, as exigências do camaronense e seus companheiros só estarão satisfeitas quando a Petição Dibobe for reconhecida como parte do passado do país: "É uma parte importante da história alemã que ainda aguarda para ser pesquisada, discutida e ter examinada a sua influência sobre a sociedade atual."

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