Condenação de separatistas provoca protestos na Catalunha
14 de outubro de 2019
Manifestantes bloqueiam principal aeroporto de Barcelona, além de ruas e uma via férrea, após nove líderes catalães serem condenados pela tentativa de independência da região. Confrontos com a polícia deixam feridos.
Anúncio
A condenação de nove líderes separatistas da Catalunha provocou uma série de protestos na região autônoma da Espanha nesta segunda-feira (14/10). Atos interditaram três vias de Barcelona, um aeroporto, várias estradas e uma via férrea.
Membros da polícia nacional espanhola foram enviados para reforçar a segurança do aeroporto El Prat, o principal de Barcelona. Ao longo do dia, um grupo chamado Tsunami Democrático distribuiu cartões de embarque falsos para tumultuar as operações.
Milhares de manifestantes também se dirigiram ao local para bloquear os acessos. Alguns chegaram a montar barricadas com carrinhos de transporte de bagagens.
Pelo menos 108 voos acabaram sendo cancelados porque as tripulações não conseguiram passar belos bloqueios.
Por volta das 18h (13h em Brasília), a polícia local, a Mossos d'Esquadra, iniciou uma operação para expulsar os manifestantes do aeroporto, provocando confrontos. Foram disparadas balas de borracha para liberar os acessos. Pelo menos 13 pessoas ficaram feridas, embora nenhuma com gravidade.
O serviço de trens que leva até o aeroporto também foi interrompido por ordem da polícia, com o objetivo de impedir que mais manifestantes chegassem ao local.
Manifestantes ainda bloquearam no início da tarde uma via férrea em Girona, a 100 quilômetros de Barcelona, que serve ao trem de alta velocidade AVE. Um pequeno grupo também protestou em frente à basílica da Sagrada Família, principal símbolo de Barcelona.
Em Tarragona, a 80 quilômetros ao sul de Barcelona, manifestantes bloquearam a rodovia A7. Várias estradas regionais da Catalunha tiveram o tráfego interrompido.
Os protestos já estavam sendo organizados desde domingo por meio do aplicativo Telegram. Mensagens foram distribuídas para mais de 150 mil pessoas com instruções para eclosão de manifestações assim que uma eventual sentença desfavorável para os líderes separatistas fosse anunciada. "Amanhã vamos estar todos prontos! A resposta à sentença será imediata!", dizia uma mensagem.
No início da noite, o governo espanhol disse esperar que a situação na Catalunha se "tranquilize nos próximos dias". "A Catalunha faz parte da Espanha, que é um país com um Estado de direito, onde as sentenças devem ser acatadas", afirmou a ministra do Trabalho, Migrações e Segurança Social, Magdalena Valério.
O primeiro-ministro socialista espanhol, Pedro Sánchez, por sua vez, disse que a situação será tratada com "firmeza serena, proporcionalidade e unidade".
Condenações
Mais cedo, o Tribunal Supremo da Espanha condenou nove líderes separatistas envolvidos na tentativa de independência da Catalunha, promovida em outubro de 2017, a penas que variam entre nove e 13 anos de prisão. Todos os réus foram, porém, absolvidos da acusação mais grave, de rebelião.
O grupo foi condenado por crimes de sedição e desvio de recursos públicos, numa decisão já esperada. Três acusados foram considerados apenas culpados pelo crime de desobediência e não foram sentenciados a prisão.
A pena de detenção mais longa, de 13 anos, foi dada ao ex-vice-chefe do Executivo catalão Oriol Junqueras. Outros três outros membros do governo regional foram condenados a 12 anos de prisão: Raul Romeva, Jordi Turull e Dolors Bassa.
A ex-presidente do Parlamento regional Carme Forcadell pegou uma pena de 11,5 anos de prisão, e os conselheiros regionais Joaquim Forn e Josep Rull, penas de 10,5 anos de detenção. Os líderes de associações independentistas Jordi Sánchez e Jordi Cuixart foram condenados a nove anos de prisão.
Os nove condenados, que já estão presos preventivamente, também não poderão exercer qualquer cargo público durante o período da sentença.
Líderes separatistas catalães afirmaram que a decisão é uma "atrocidade" e um "ataque à democracia". "Um total de 100 anos de prisão. Que horrível. Agora mais do que nunca estaremos com vocês", comentou o ex-líder catalão Carles Puigdemont, que fugiu para a Bélgica após a declaração de independência.
Horas depois de anunciar a sentença, o Tribunal Supremo da Espanha emitiu um novo mandado europeu de prisão contra Puigdemont, que vive exilado na cidade belga de Waterloo. O juiz Pablo Llarena ativou o mecanismo para solicitar a extradição do ex-governante catalão.
Desejo de independência da Espanha é acalentado pelos catalães há muito tempo. Ao longo dos séculos, região experimentou vários graus de autonomia e repressão.
Foto: picture-alliance/dpa/AP/F. Seco
Antiguidade rica
A Catalunha foi habitada por fenícios, etruscos e gregos, que estiveram nas áreas costeiras de Rosas e Ampúrias (acima). Depois vieram os romanos, que construíram mais assentamentos e infraestrutura. A Catalunha foi uma parte do Império Romano até ser conquistada pelos visigodos, no século 5.
Foto: Caos30
Condados e independência
A Catalunha foi conquistada pelos árabes no ano 711. O rei franco Carlos Magno interrompeu o avanço deles em Tours, no rio Loire, e em 759 o norte da Catalunha se tornou novamente cristão. Em 1137, os condados que compunham a Catalunha iniciaram uma aliança com a Coroa de Aragão.
Foto: picture-alliance/Prisma Archiv
Guerra e perda de território
No século 13, as instituições de autoadministração catalã foram criadas sob o nome Generalitat de Catalunya. Depois da unificação da Coroa de Aragão com a de Castela, em 1476, Aragão pôde manter suas instituições autônomas. No entanto, a revolta catalã – de 1640 a 1659 – fez com que partes da Catalunha fossem cedidas à atual França.
Foto: picture-alliance/Prisma Archivo
Lembrando a derrota
No final da Guerra da Sucessão, Barcelona foi tomada, em 11 de setembro de 1714, pelo rei espanhol Felipe 5°, as instâncias catalãs foram dissolvidas e a autoadministração chegou ao fim. Todos os anos, em 11 de setembro, os catalães fazem uma grande comemoração para lembrar o fim do seu direito à autonomia.
Foto: Getty Images/AFP/L. Gene
República passageira
Após a abdicação do rei Amadeo 1°, da Espanha, a primeira república espanhola foi declarada em fevereiro de 1873. Ela durou apenas um ano. Os partidários da república estavam divididos, com um grupo apoiando uma república centralizada e outros, um sistema federal. A foto mostra Francisco Pi y Maragall, um partidário do federalismo e um dos cinco presidentes da república de curta duração.
Foto: picture-alliance/Prisma Archivo
Tentativa fracassada
A Catalunha tentou estabelecer um novo Estado dentro da república espanhola, mas isso apenas exacerbou as diferenças entre os republicanos e os enfraqueceu. Em 1874, a monarquia e a Casa de Bourbon, liderada pelo rei Afonso 12 (foto), retomaram o poder.
Foto: picture-alliance/Quagga Illustrations
Direitos de autonomia
Entre 1923 e 1930, o general Primo de Rivera liderou uma ditadura – com o apoio da monarquia, do Exército e da Igreja. A Catalunha se tornou um centro de oposição e resistência. Após o fim do regime, o político Francesc Macia (foto) conseguiu impor direitos importantes de autonomia para a Catalunha.
Fim da liberdade
Na Segunda República Espanhola, os legisladores catalães trabalharam no Estatuto de Autonomia da Catalunha, aprovado pelo Parlamento espanhol em 1932. Francesc Macia foi eleito presidente da Generalitat de Catalunha pelo Parlamento catalão. No entanto, a vitória de Franco no fim da Guerra Civil Espanhola (1936 a 1939) acabou com tudo isso.
Foto: picture-alliance/AP Photo
Opressão
O ditador Francisco Franco governou com mão de ferro. Partidos políticos foram proibidos, e a língua e a cultura catalãs, reprimidas.
Foto: picture alliance/AP Photo
Novo estatuto de autonomia
Após as primeiras eleições parlamentares que se seguiram ao fim da ditadura de Franco, a Generalitat da Catalunha foi provisoriamente restaurada. Sob a Constituição democrática espanhola de 1978, a Catalunha recebeu um novo estatuto de autonomia, apenas um ano depois.
O novo estatuto de autonomia reconheceu a autonomia da Catalunha e a importância da língua catalã. Em comparação com o estatuto de 1932, ele apresentou avanços nos campos da cultura e educação, mas restrições no âmbito da Justiça. A foto é de Jordi Pujol, que foi por longo tempo chefe de governo da Catalunha depois da ditadura.
Foto: Jose Gayarre
Anseio por independência
O desejo por independência da Espanha se tornou mais forte nos últimos anos. Em 2006, a Catalunha recebeu um novo estatuto, que ampliou ainda mais os poderes do governo catalão. No entanto, eles são perdidos após uma queixa levada pelo conservador Partido Popular ao Tribunal Constitucional espanhol.
Foto: Reuters/A.Gea
Primeiro referendo
Um referendo sobre a independência estava previsto para 9 de novembro de 2014. A primeira questão era "você quer que a Catalunha se torne um Estado?" No caso de uma resposta afirmativa, a segunda pergunta era "você quer que esse Estado seja independente?" No entanto, o Tribunal Constitucional suspendeu a votação.
Foto: Reuters/G. Nacarino
Luta de titãs
Desde janeiro de 2016, Carles Puigdemont é o presidente do governo catalão. Ele deu continuidade ao curso separatista de seu antecessor, Artur Mas, e convocou um novo referendo para 1° de outubro de 2017. O primeiro-ministro espanhol, Mariano Rajoy, disse que a consulta é inconstitucional.