Nos últimos 30 anos, tucanos rivalizaram com PT como uma das principais forças nas disputas pelo Planalto, mas candidatura de Alckmin alcança menos de 5% diante do fenômeno Bolsonaro e da associação com governo Temer.
Anúncio
As eleições presidenciais de 2018 marcaram um recorde negativo para o PSDB, que por três décadas foi uma das principais forças políticas na disputa pelo Planalto: nunca o partido recebeu uma percentagem tão baixa dos votos em um primeiro turno desde a sua criação, em 1988. O candidato Geraldo Alckmin recebeu menos de 5% dos votos na eleição deste domingo (07/10), com 95% das urnas apuradas.
O percentual de Alckmin está bem atrás da votação de Aécio Neves em 2014, que havia obtido 33,5% dos votos válidos no primeiro turno de 2014. Também contrasta com a votação obtida pelo próprio Alckmin no primeiro turno de 2006, que chegou a 41,64%. Também está atrás dos resultados obtidos por José Serra em 2002 e 2010, de 23,19% e 32,61%, respectivamente.
Nas derrotas entre 2006 e 2014, o partido teve como principal adversário o PT, que tinha a vantagem de contar com a máquina federal. Desta vez, os tucanos não conseguiram polarizar com o PT e viram boa parte do seu eleitorado migrar para o direitista Jair Bolsonaro (PSL), um novato em eleições presidenciais que concorre por uma sigla nanica.
A proporção de votos recebidas pelos tucanos em 2018 é até mesmo menor do que a do candidato Mário Covas em 1989, que terminou o primeiro turno em quarto lugar, com 11,51% dos votos válidos. À época, o PSDB tinha apenas um ano de existência.
Essa é também a primeira vez desde 2002 que o partido fica de fora de um segundo turno presidencial. Em 1994 e 1998, o tucano Fernando Henrique Cardoso venceu as eleições ainda no primeiro turno.
A fraca votação nacional do PSDB também se refletiu em São Paulo, estado que foi governado por Alckmin por quatro mandatos. Ele nunca esteve à frente de Bolsonaro no estado ao longo da campanha, segundo o Ibope. Na última pesquisa, tinha 14% das intenções nesse tradicional bastião tucano, atrás do ex-capitão e de Fernando Haddad (PT).
Campanha fragilizada
O mau desempenho de Alckmin no pleito de 2018 ficou muito abaixo das expectativas do partido e de analistas. Em julho, o tucano havia conseguindo montar a coligação mais ampla das candidaturas que se apresentaram ao pleito ao se acertar com mais oito siglas. A aliança garantiu aos tucanos 43% do tempo de TV diário reservado aos presidenciáveis, além de uma série de palanques regionais.
Mas a campanha de Alckmin acabou tendo desempenho semelhante a de Ulysses Guimarães (PMDB) em 1989. À época, o ex-presidente da Câmara contava com impressionantes 22 minutos diários no horário eleitoral, mas acabou em sexto lugar na disputa, com pouco mais de 4% dos votos.
Assim como ocorreu com Ulysses, problemas internos começaram a pipocar na coligação logo na largada da campanha. Até garantir a candidatura, Alckmin teve que lidar com a insatisfação de membros do seu partido que preferiam a indicação do ex-prefeito João Doria como postulante à Presidência. Já a escolha da senadora Ana Amélia (PP-RS) para vice rachou o PP gaúcho. Uma ala do partido anunciou publicamente apoio a Bolsonaro.
Nesta semana, com Alckmin ainda acumulando resultados decepcionantes nas pesquisas, os tucanos passaram a sofrer com uma série de deserções de aliados. Vários declararam apoio a Bolsonaro. Na sexta-feira, em um ato de campanha em São Paulo, Alckmin só teve a companhia de um punhado de membros das siglas que fazem parte da sua coligação.
As deserções atingiram até mesmo membros das fileiras tucanas. Na quarta-feira, Xico Graziano, um dos fundadores do partido e que atuou como chefe de gabinete de Fernando Henrique, anunciou sua desfiliação e declarou apoio a Bolsonaro. Já João Doria, candidato do PSDB ao governo de São Paulo, não fez nada ao longo da campanha para conter apoiadores que promoviam um voto "bolsodoria" entre os eleitores.
A fragilização do PSDB tem se intensificado desde 2016, quando o partido passou, a exemplo do PT, a ser atingido pela Operação Lava Jato. Aécio, que disputou uma eleição acirrada com a ex-presidente Dilma Rousseff em 2014, acabou sendo atingido em cheio pelas denúncias e chegou a ser afastado temporariamente da sua cadeira no Senado. À época, ele também era presidente nacional do PSDB. Desgastado, abandonou nestas eleições pretensões de concorrer à reeleição e decidiu se lançar para uma vaga de deputado federal. Apesar da gravidade das denúncias, ele continua filiado ao partido.
O partido também se viu desgastado pela sua associação com o impopular governo do presidente Michel Temer. Ao longo da campanha, Alckmin lançou críticas a Temer e disse que o PSDB não tinha nada que ver com o governo. As falas geraram reação do próprio Temer, que lembrou, num vídeo direcionado a Alckmin, que o PSDB teve três ministros em sua administração. Um deles, Aloysio Nunes (Relações Exteriores) ainda está no cargo.
Durante a campanha de 2018, o partido ainda acumulou mais fatos negativos. O ex-governador do Paraná Beto Richa, filho de um dos fundadores mais destacados da sigla, foi preso por suspeita de corrupção.
Diante do quadro, Tasso Jereissati, ex-presidente nacional da sigla, chegou a fazer uma auto-crítica numa entrevista concedida em setembro. "O grande erro, e boa parte do PSDB se opôs a isso, foi entrar no governo Temer. Foi a gota d’água, junto com os problemas do Aécio (Neves). Fomos engolidos pela tentação do poder", disse ele.
Treze candidatos se apresentaram para disputar o Planalto. O líder das pesquisas acabou fora da corrida, e vários nomes tentam contornar isolamento partidário. Veja os principais episódios da disputa.
Foto: Reuters/A. Machado
Bolsonaro é eleito presidente
Em segundo turno, os brasileiros elegeram Jair Bolsonaro (PSL) como presidente. Após uma campanha eleitoral polarizada, o militar reformado de extrema direita recebeu 55,13% dos votos, contra 44,87% de Fernando Haddad (PT). Com bandeiras do Brasil e vestidos nas cores verde e amarelo, eleitores comemoram pelo país. No discurso da vitória, Bolsonaro prometeu um governo constitucional e democrático.
Foto: picture-alliance/AP Photo/S.Izquierdo
TSE abre investigação contra Bolsonaro
A pouco mais de uma semana do segundo turno, o Tribunal Superior Eleitoral abriu uma ação para investigar suspeitas de compra de disparos de mensagens antipetistas no WhatsApp por parte de empresários aliados a Bolsonaro. O pedido de investigação foi feito pelo PT, após uma reportagem do jornal "Folha de S. Paulo". A PF também abriu inquérito para investigar a disseminação em massa de "fake news".
Foto: Reuters/R. Moraes
Bolsonaro e Haddad vão ao segundo turno
Numa das eleições mais polarizadas da história, em 7 de outubro os brasileiros levaram ao segundo turno os dois candidatos que, segundo sondagens, são também os mais rejeitados: Bolsonaro (PSL) e Haddad (PT). Favorito no Sul e Sudeste, o ex-militar teve 46% dos votos válidos contra 29% do petista, que foi o mais votado em oito estados do Nordeste e no Pará. Em terceiro, Ciro Gomes (PDT) teve 12%.
Foto: Reuters/P. Whitaker/N. Doce
Bolsonaro cresce nas pesquisas
Já líder nas pesquisas, o candidato do PSL ampliou sua vantagem no início de outubro, ultrapassando pela primeira vez a marca de 30% em sondagens do Ibope e do Datafolha. Ao longo da semana que antecedeu as eleições, o ex-capitão foi subindo e, na véspera do pleito, cruzou a barreira de 40% dos votos válidos. Após ser esfaqueado, a campanha do candidato se concentrou nas redes sociais.
Foto: Reuters/P. Whitaker
A troca de Lula por Haddad
Após meses de suspense e com aval de Lula, Fernando Haddad foi oficializado candidato à Presidência pelo PT em 11 de setembro, a menos de um mês do primeiro turno, após se esgotarem as chances de o ex-presidente concorrer. Preso e virtualmente inelegível pela Ficha Limpa, Lula era líder nas pesquisas de intenção de voto. O desafio agora será transferir votos para o ex-prefeito.
Foto: Agencia Brasil/R. Rosa
Ataque a Bolsonaro
O candidato do PSL foi esfaqueado durante um ato de campanha em Juiz de Fora, um ataque que prometia mudar os rumos da corrida presidencial. Seus adversários condenaram a agressão, e alguns chegaram a mudar o tom da campanha. Não houve, contudo, um impacto decisivo sobre o eleitorado. Ele segue líder das intenções, mas com percentual praticamente igual. A rejeição a ele, por outro lado, aumentou.
Foto: picture-alliance/dpa/Agencia O Globo/A. Scorza
O "plano B" do PT
Com Lula virtualmente inelegível, a escolha do seu vice passou a ser encarada como um trampolim para um candidato substituto. No início de agosto, o PT acabou indicando Fernando Haddad, que desde o início do ano era cotado como "plano B". Manuela D'Ávila (PCdoB) ficou com a curiosa posição não oficial de "vice do vice", assumindo a posição com Lula candidato ou não.
Foto: Agência Brasil/F.Rodrigues Pozzebom
A novela dos vices
A fase de convenções começou no fim de julho sem que a maioria dos pré-candidatos tivesse um vice. Bolsonaro teve três convites recusados até fechar com o general Mourão (PRTB). Henrique Meirelles (MDB) e Ciro Gomes (PDT) se contentaram com nomes do próprio partido. Alckmin teve convite recusado pelo empresário Josué Alencar, cuja família é ligada a Lula, antes de optar por Ana Amélia (PR).
Foto: Agência Brasil/F.Frazão
Os candidatos isolados
A jogada de Alckmin com o "centrão" acabou isolando outros candidatos. Jair Bolsonaro (PSL) tentou negociar com o PR, mas teve que se contentar com o nanico PRTB. Ciro Gomes (PDT) também viu suas investidas no grupo naufragarem. Marina Silva (Rede) e Ciro também não conseguiram apoio do PSB, que ficou neutro numa manobra do PT. Os três terminaram a fase de convenções com pouco apoio e tempo de TV.
Alckmin fecha com o "centrão"
Em julho, o tucano Geraldo Alckmin ainda patinava nas pesquisas, mas criou um fato novo na campanha ao conseguir o apoio do "centrão", as siglas que costumam emprestar seu apoio a governos em troca de cargos e verbas. Ao se aliar com PR, PP, PSD, DEM e SD, Alckmin passou a dominar 44% da propaganda eleitoral na TV. Sua coligação também recebe 48% do novo fundo de campanhas.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Candidaturas descartadas
A eleição de 2018 parecia destinada a superar o número de candidatos de 1989, quando 22 disputaram. Em abril, 23 manifestavam interesse em concorrer, entre eles o presidente Michel Temer, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e o ex-presidente Fernando Collor. Mas eles logo desistiram ou foram abandonados por seus partidos. Outros aceitaram ser vices. Em agosto, só 13 permaneciam na corrida.
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Os "outsiders" saem de cena
A possibilidade de Lula ficar de fora e o sentimento antipolítico entre a população sinalizavam que esta seria a eleição dos "outsiders". O ex-ministro do Supremo Joaquim Barbosa e o apresentador Luciano Huck chegaram a ser incluídos em pesquisas. O empresário Flávio Rocha anunciou candidatura. Em julho, todos já haviam desistido, e a disputa ficou restrita a velhos nomes da política.
Foto: Imago/ZUMA Press/M. Chello
Lula é condenado e preso
Quando anunciou, em 2016, a intenção de disputar a eleição, Lula se tornou o líder nas pesquisas. Em janeiro, porém, sua situação se complicou após uma condenação em segunda instância que o deixou virtualmente inelegível. Em abril, foi preso. Com a possibilidade de a candidatura ser barrada, o PT passou a ter dificuldades em formar alianças, e o desfecho do pleito ficou ainda mais imprevisível.
Foto: Reuters/L. Benassatto
Entra em cena o fundo de campanhas
Diante da proibição das doações por empresas, o Congresso criou em outubro de 2017 um novo fundo de R$ 1,7 bilhão para financiar candidaturas, já definindo a capacidade financeira de várias campanhas. Quase 60% do valor ficou concentrado em seis legendas: MDB, PT, PSDB, PP, PSB e PR, deixando candidatos à Presidência de pequenas e médias siglas com menos recursos na largada.