Após prisão, ex-presidente passa a depender de novos pedidos de habeas corpus, recursos e até possível reversão da prisão em segunda instância.
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Após quase 50 horas de suspense, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi preso neste sábado (07/04) por agentes federais e levado à superintendência da Polícia Federal (PF) em Curitiba para começar a cumprir sua sentença de 12 anos e 1 mês de prisão.
Nos últimos dias, o ex-presidente colecionou uma série de derrotas judiciais antes e depois da decretação da prisão. Agora, com Lula atrás das grades, a estratégia de defesa do ex-presidente ainda deve passar por novos pedidos de habeas corpus e pela expectativa de que o Supremo Tribunal Federal (STF) reverta a regra que autoriza a prisão em segunda instância.
Novos pedidos de habeas corpus e prisão domiciliar
Lula pode apresentar novos pedidos de habeas corpus e ainda recorrer aos tribunais superiores para anular a sentença.
No caso analisado pelo STF nesta quarta-feira, a defesa de Lula havia pedido um habeas corpus preventivo, para impedir sua prisão iminente após a condenação em segunda instância. Depois da ordem de prisão decretada pelo juiz Sérgio Moro, a defesa de Lula apresentou novos pedidos de habeas corpus ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e STF. Todos foram negados em decisões individuais dos ministros responsáveis pela análise.
Agora na prisão, Lula poderá apresentar novos pedidos de habeas corpus, desta vez para ser solto. Os pedidos podem ser apresentados tanto ao STJ quanto ao STF. No entanto, diante de tantas negativas, parece improvável que algum novo pedido venha a ser bem-sucedido nos próximos dias.
A defesa também pode solicitar que o petista cumpra prisão domiciliar. Recentemente, o STF autorizou que condenados como os ex-deputados Paulo Maluf e Pedro Corrêa cumprissem as penas em casa.
Nestes casos, porém, contaram o estado de saúde dos condenados. Maluf, por exemplo, tem 86 anos e é praticamente um inválido. Já Lula, com 72 anos, vinha fazendo atos de pré-campanha e declarou recentemente nas redes sociais que está esbanjando saúde, fatores que devem dificultar uma argumentação similar à de Maluf.
Anular a sentença
No plano estratégico, a defesa ainda conta com várias opções para tentar anular a pena, mas as opções são demoradas e têm pouca garantia de serem bem-sucedidas, podendo se arrastar por anos.
Lula pode ainda recorrer da sentença imposta pelo Tribunal Regional Federal da 4° Região (TRF-4) ao STJ e ao próprio STF. Mas esses tribunais não discutiriam as provas do caso, por exemplo se Lula recebeu mesmo um tríplex como suborno. Em jogo estariam análises como se houve falhas na tramitação ou se o ex-presidente teve algum direito cerceado. Se os tribunais entenderem que houve falhas, o processo será anulado, e Lula ficará solto.
Mas há um histórico pouco promissor de anulação das sentenças nos tribunais superiores. Como lembrou o ministro do Supremo Roberto Barroso durante o julgamento do habeas corpus, nos últimos dois anos apenas 0,62% dos recursos analisados pelo STJ resultaram em absolvição.
STF reverter a prisão em 2° instância
Como ficou claro no julgamento do habeas corpus de Lula na quarta-feira, há uma nova tendência no STF sobre o cumprimento de pena a partir da segunda instância – regra que permitiu a execução da sentença do ex-presidente após a condenação pelo TRF-4. Apesar de ter votado por negar o habeas corpus, a ministra Rosa Weber, voto decisivo da negativa, disse que tomou essa decisão apenas porque essa é a regra vigente desde 2016.
Caso o mérito da questão das prisões volte à mesa, Weber deve votar para reverter a regra. Com o voto de Weber e o de Gilmar Mendes, que mudou de opinião desde 2016, haveria uma maioria de 6 a 5 para que condenados só começassem a cumprir pena quando esgotados todos os recursos. Dessa forma, condenados como Lula, o ex-deputado Eduardo Cunha, o ex-ministro José Dirceu e outros poderiam continuar a recorrer em liberdade.
Por enquanto, a presidente do STF, Cármen Lúcia, vem evitando pautar duas Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADCs) que questionam as prisões em segunda instância. Diante da pressão de outros ministros, que são contra a regra e a ignoram sistematicamente, Cármen Lúcia pode acabar pautando uma nova discussão sobre o tema.
Segundo a imprensa brasileira, a presidente do STF vem afirmando a interlocutores que pode colocar em votação, no plenário, uma eventual questão de ordem sobre o tema, o que permitiria a reabertura da discussão. O ministro Marco Aurélio de Mello, crítico da prisão a partir da segunda instância, já afirmou que pode ser ele o protagonista da apresentação da questão de ordem.
Dessa forma, o tema pode voltar a ser abordado já a partir da semana que vem. Resta saber se os ministros favoráveis a uma mudança de entendimento estão mesmo dispostos a sofrer o desgaste de rever a regra poucos dias após a prisão do ex-presidente, um gesto que pode ser encarado por parte da opinião pública como arquitetado para beneficiar diretamente o petista.
Mesmo que Cármen Lúcia segure uma nova discussão do tema, é certo que a questão voltará para o plenário a partir de setembro, quando ela será substituída na presidência do tribunal por Dias Toffoli, membro da ala do STF que quer rever a regra. Caso isso aconteça, Lula passará apenas alguns meses preso se não conseguir, antes disso, um habeas corpus.
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Ex-governantes na mira da Justiça
Réu em vários processos, condenado e preso, Lula faz parte de uma extensa galeria de antigos governantes acusados de corrupção que cumprem pena ou ainda batalham nos tribunais.
Foto: picture-alliance/AP-Photo/L. Correa
Park Geun-hye (Coreia do Sul)
Presidente entre 2013 e 2016, Park sofreu impeachment por realizar tráfico de influência. Em seguida, foi acusada de desviar milhões de dólares de fundos de serviços de inteligência do país para compras extravagantes, além de pedir propina a grandes empresas sul-coreanas, como a Samsung. Em 2018, foi condenada a 25 anos de prisão.
Foto: picture-alliance/AP Photo/K. Hong-Ji
O quinteto peruano
O ex-presidente Alberto Fujimori (1990-2000) foi preso em 2005 por crimes diversos, e quatro sucessores se viram ligados à Odebrecht: Alejandro Toledo (2001-2006) teve prisão decretada em 2017 e está nos EUA; Alan Gárcia (2006-2011), investigado, se matou em 2019; Ollanta Humala (2011-2016), preso em 2017, foi solto no ano seguinte; e Pedro Pablo Kuczynski (2016-2018) está em prisão domiciliar.
Foto: Getty Images/AFP/P. Ji-Hwan/C. Bournocle/T. Charlier/ J. Razuri
Ricardo Martinelli (Panamá)
Presidente de 2009 a 2014, Martinelli foi preso em Miami em 2017 e extraditado a seu país no ano seguinte, onde era acusado de operar esquema ilegal de espionagem de adversários políticos durante seu governo e de receber subornos da empreiteira brasileira Odebrecht. O acordo de extradição exigiu que ele fosse julgado apenas pelo delito de espionagem, pelo qual foi absolvido em agosto de 2019.
Foto: picture-alliance/dpa/S. Martínez
Carlos Menem (Argentina)
Presidente entre 1989 e 1999, o extravagante Menem foi mantido preso durante cinco meses em 2001 por envolvimento em um escândalo de venda ilegal de armas para a Croácia. Em 2013, foi condenado a sete de anos de prisão pelo caso. Em 2015, voltou a ser condenado por corrupção envolvendo o pagamento de propinas a servidores públicos. Por enquanto, um mandato no Senado lhe mantém fora da cadeia.
Foto: picture-alliance /dpa/S. Goya
Jacob Zuma (África do Sul)
Presidente entre 2009 e fevereiro de 2018, Zuma enfrenta pelo menos 18 acusações de corrupção, extorsão, fraude e lavagem de dinheiro. No dia 6 de abril de 2018, compareceu a um tribunal para prestar depoimento em um processo que o acusa de receber subornos na venda de armamento para o governo.
Foto: Reuters/S. Sibeko
Nicolas Sarkozy (França)
Presidente entre 2007 e 2012, Sarkozy enfrenta acusações de corrupção e financiamento ilegal de campanha. Em 2014, foi detido para prestar depoimento em caso de tráfico de influência envolvendo promessas a um juiz em troca de informações sobre processos. Em março de 2018, foi novamente detido para interrogatório, desta vez por suposta doação ilegal feita pelo antigo ditador líbio Muammar Kadhafi.
Foto: REUTERS
Um trio guatemalteco
O ex-presidente da Guatemala Alfonso Portillo (2000-2004) foi preso em 2010 por receber subornos do governo de Taiwan, e solto em 2015. Alvaro Colom (2008-2012) foi preso em março de 2018 por fraudes no sistema de ônibus da capital e solto cinco meses depois. Otto Pérez Molina (2012-2015) foi detido um dia após renunciar por fraude em esquema de importações e seguia preso até outubro de 2019.
Foto: AP
José Sócrates (Portugal)
Primeiro-ministro entre 2005 e 2011, Sócrates foi preso em novembro de 2014 por suspeita de corrupção, evasão fiscal e lavagem de dinheiro. Segundo a Justiça, Sócrates beneficiou grupos empresariais enquanto esteve no poder e em troca recebeu 24 milhões de euros. Permaneceu na cadeia até setembro de 2015, quando passou para a prisão domiciliar. Em outubro de 2017, foi denunciado por 31 crimes.
Foto: Reuters
Ehud Olmert (Israel)
Premiê entre abril de 2006 e março de 2009, Olmert foi condenado em 2014 por aceitar subornos de construtoras quando era prefeito de Jerusalém. Nos meses seguintes, foi condenado em outros processos. Começou a cumprir pena em fevereiro de 2016 e deixou a prisão 16 meses depois, em liberdade condicional. Ele ainda aguarda o resultado de recursos.
Foto: Getty Images/AFP/G. Tibbon
Svetozar Marovic (Sérvia e Montenegro)
Presidente entre 2003 e 2006 da extinta Comunidade da Sérvia e Montenegro, Marovic foi preso em 2015 por envolvimento em uma rede de corrupção na administração da cidade de Budva. Em 2016, foi condenado a três anos e dez meses de cadeia por um tribunal de Montenegro. É considerado foragido pela Justiça. Vive hoje na vizinha Sérvia e é alvo de um pedido de extradição.
Foto: picture-alliance/AP Photo/D. Vojinovic
Ivo Sanader (Croácia)
Primeiro-ministro entre 2003 e 2009, Sanader foi acusado de receber suborno durante a negociação de empréstimo com um banco austríaco. Fugiu da Croácia em 2010. Extraditado em 2011, foi condenado a dez anos de prisão. Foi solto em 2015, após sua condenação ser anulada. Ainda enfrenta outras investigações e em 2017 voltou a ser condenado a quatro anos e meio de prisão por outro caso de corrupção.
Foto: AFP/Getty Images
Khaleda Zia (Bangladesh)
Primeira-ministra entre 1991 e 1996 e novamente entre 2001 e 2006, Khaleda Zia foi presa em fevereiro de 2018 após ser condenada a 17 anos de cadeia por corrupção e desvio de doações internacionais destinadas a um orfanato. Sua defesa afirma que as acusações têm motivação política.
Foto: picture-alliance/dpa/AP Photo/A. M. Ahad
Vlad Filat (Moldávia)
Primeiro-ministro da Moldávia entre 2009 e 2013, Filat foi acusado de embolsar mais de 200 milhões de euros em um esquema de fraude bancária. Durante seu governo, três bancos do país concederam 1 bilhão de euros em empréstimos para empresas de fachada, lesando milhares de correntistas. Foi preso em 2015 e no ano seguinte foi condenado a nove anos de prisão por corrupção e abuso de poder.
Foto: picture-alliance/dpa
Fernando Collor (Brasil)
Em agosto de 2017, o ex-presidente Collor (1990-1992) se tornou réu por corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa no âmbito da Lava Jato, acusado de cobrar propina em negócios envolvendo a BR Distribuidora. Em maio de 2019, foi denunciado também por peculato. Collor é senador e seus processos correm no Supremo Tribunal Federal.
Foto: picture-alliance/dpa/C. Gomes
Luiz Inácio Lula da Silva (Brasil)
Em janeiro de 2018, o ex-presidente Lula (2003-2010) foi condenado em 2ª instância por corrupção e lavagem de dinheiro, no âmbito da Lava Jato, acusado de receber como suborno um apartamento no Guarujá. Detido em abril de 2018, ele já teria direito a ir ao regime semiaberto, mas segue preso. Em fevereiro de 2019, foi condenado em 1ª instância, desta vez envolvendo reformas num sítio em Atibaia.