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Quais os riscos à segurança de Tchernobil durante a guerra?

Ajit Niranjan
10 de março de 2022

Chance de catástrofe nuclear é baixa, mas especialistas temem pelos funcionários que cuidam da usina desativada. Comunicações com o local foram interrompidas, e eletricidade sofreu corte.

Soldado em frente a Chernobyl
Soldados russos tomaram o controle da usina nuclear desativada de ChernobylFoto: ITAR-TASS/imago images

No final de fevereiro, tropas russas que invadiram a Ucrânia ocuparam a usina nuclear desativada de Tchernobil, local do pior desastre nuclear da história, e assumiram o controle de uma zona de exclusão que abriga reatores desativados e instalações de resíduos radioativos.

Desde então, os 210 técnicos e guardas responsáveis por manter o local em segurança não conseguiram fazer uma pausa adequada.

A Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), órgão das Nações Unidas, diz que um pilar fundamental da segurança nuclear é dar ao pessoal operacional a capacidade de tomar decisões livres de "pressão indevida". Mas os funcionários sobrecarregados de trabalho em Tchernobil estão tentando cumprir suas obrigações em meio a uma invasão que já obrigou mais de 2 milhões de pessoas a fugirem do país.

Uma combinação de fatores aumentou o medo de vazamentos radioativos de Tchernobil. Mas não há nenhuma chance de um acidente nuclear – o último reator foi fechado há mais de duas décadas. Por enquanto, as principais preocupações são com os funcionários.

"Estou profundamente preocupado com a situação difícil e estressante que os funcionários da usina nuclear de Tchernobil enfrentam e com os riscos potenciais que isso implica para a segurança nuclear", disse o diretor-geral da AIEA, Rafael Grossi, em uma declaração à imprensa na terça-feira. "Apelo às forças com o controle efetivo do local para que facilitem urgentemente a troca de turno segura dos funcionários de lá."

A cidada abandonada de Pripyat, perto de TchernobilFoto: Gleb Garanich/REUTERS

Falhas de comunicação e energia

Além da questão dos funcionários, há preocupações com falhas nas comunicações e no fornecimento de eletricidade. Na terça-feira, a AIEA disse que a transmissão de dados dos sistemas de monitoramento instalados em Tchernobil havia sido interrompida e que a autoridade reguladora da Ucrânia só podia se comunicar com a usina via e-mail.

No dia seguinte, a empresa estatal de energia nuclear Ukrenergo informou que uma linha de eletricidade de alta tensão que liga Kiev a Tchernobil havia sido desligada. Isso forçou os trabalhadores a usarem geradores a diesel para restabelecer a eletricidade, e há preocupações de que isso poderia afetar as bombas de resfriamento do local onde se armazena combustível radioativo usado.

As barras de combustível radioativo continuam emitindo calor após terem sido retiradas dos reatores e precisam ser resfriadas em água durante anos antes de poderem ser movidas para instalações de armazenamento a seco. Mais de 20 mil barras de combustível usado estão em instalações de armazenamento úmido e seco no local.

Grande estrutura de aço e concreto envolve o reator nuclear 4 da usina de TchernobilFoto: ITAR-TASS/imago images

Se as piscinas de resfriamento secarem, a radiação poderia afetar os trabalhadores. Mas especialistas dizem que é improvável uma grande liberação de radiação e que isso não "teria consequências fora do local da usina".

"Também é importante observar que secar as piscinas não causaria uma reação nuclear ou explosão", disse Mark Foreman, professor associado de química nuclear da Universidade de Tecnologia de Chalmers, na Suécia, em uma declaração.

Um relatório de 2011 do regulador estatal ucraniano testou diferentes cenários que poderiam levar a falhas. E constatou que, se a eletricidade fosse cortada, a perda da refrigeração da água elevaria as temperaturas, mas não o suficiente para causar um acidente.

Em uma mensagem no Twitter na quarta-feira, a AIEA confirmou que as condições térmicas da piscina de armazenamento de combustível usado e o volume da água de resfriamento eram suficientes para remover efetivamente o calor sem a necessidade de eletricidade.

"O combustível usado lá é tão antigo que a evaporação provavelmente não será o problema", disse Jan Haverkamp, especialista nuclear da organização ambiental Greenpeace. Ainda assim, ele acrescentou, "uma explosão que atinja a piscina poderia causar superaquecimento".

O corte de eletricidade também poderia afetar o sistema de ventilação e tornar mais difícil o manejo de poeira radioativa.

"Pode se tornar muito mais difícil para os trabalhadores entrarem em algumas partes do local sem roupas de proteção completas", disse Foreman. "Eles também podem ter maior dificuldade para vestir e tirar suas roupas de proteção. Algumas partes do local podem se tornar inacessíveis para os trabalhadores até que a energia seja restaurada."

Segurança nuclear

A decisão do presidente russo, Vladimir Putin, de invadir a Ucrânia em fevereiro, lançou a segurança da energia nuclear para o centro dos debates.

"Se houver um acidente nuclear, a causa não será um tsunami causado pela mãe natureza", disse Grossi na segunda-feira, referindo-se ao terremoto que inundou em 2011 o reator da usina nuclear em Fukushima, no Japão. "Em vez disso, será resultado de uma falha humana em agir."

Tchernobil é um poderoso símbolo de uma catástrofe nuclear. Em 1986, um súbito aumento de energia durante um teste de reator destruiu a Unidade 4 da usina nuclear mal projetada, que ficava em território da então União Soviética. O incêndio que ocorreu em seguida liberou nuvens de material radioativo no ambiente, que levaram as autoridades a criar uma zona de exclusão e a retirar centenas de milhares de pessoas da região. Acredita-se que dezenas de pessoas tenham morrido como resultado direto do desastre.

Os níveis de radiação caíram desde então. Alguns residentes da zona de exclusão voltaram para suas casas e vivem em áreas com níveis de radiação acima da média, mas não fatais. A radiação do local subiu inesperadamente em fevereiro, quando as tropas russas entraram na área, possivelmente por causa de veículos pesados levantando uma camada de solo superficial e lançando poeira no ar.

A AIEA concluiu que os níveis não representaram perigo para o público. Mas a realidade sem precedentes de uma guerra em um país que opera usinas nucleares levantou o fantasma da catástrofe nuclear.

"Nós entramos em algo sobre o qual o setor estava em completa negação", disse Haverkamp. "A energia nuclear simplesmente não é uma fonte de energia que cabe em uma situação de guerra."

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