UE condicionou adesão da Ucrânia ao bloco ao combate à corrupção. Para isso, país precisa reduzir influência dos oligarcas na política.
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Durante uma visita a Bruxelas em 9 de fevereiro, o presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, afirmou que Kiev espera que as negociações sobre a adesão da Ucrânia à União Europeia (UE) comecem ainda em 2023. O bloco salientou, porém, que essa decisão depende de reformas a serem realizadas no país, como o combate à corrupção.
Para isso, é necessário reduzir a influência dos oligarcas na política ucraniana. A chamada lei antioligarca, aprovada em 2021 e que pretende atender a esse requisito, está sendo examinada pela Comissão de Veneza – um órgão consultivo do Conselho da Europa sobre questões constitucionais –, que deverá apresentar as conclusões em março.
Lei antioligarca
De acordo com a lei, serão considerados oligarcas na Ucrânia quem preencher três dos quatro seguintes critérios: possuir um patrimônio de cerca de 80 milhões de dólares; exercer influência política; ter controle sobre a mídia; ou possuir um monopólio em um setor econômico. Aqueles que entrarem para o registro de oligarcas não podem financiar partidos políticos, ficam impedidos de participar de grandes privatizações e devem apresentar uma declaração especial de imposto de renda.
Durante décadas, a política ucraniana girou em um círculo vicioso de corrupção política: os oligarcas financiaram – principalmente de forma secreta – partidos para, por meios de seus políticos, influenciar leis ou regulamentos que maximizariam seus lucros. Por exemplo, era mais lucrativo garantir que os impostos do governo sobre a extração de matérias-primas ou o uso de infraestrutura permanecessem baixos do que investir na modernização de indústrias.
Entretanto, a lei antioligarca já surtiu efeitos. No verão passado, o bilionário Rinat Akhmetov foi o primeiro a desistir das licenças de transmissão de seu grupo de mídia. O líder do partido Solidariedade Europeia, o ex-presidente ucraniano Petro Poroshenko, também perdeu oficialmente o controle sobre seus canais de TV. E o bilionário Vadim Novinsky renunciou ao seu mandato de deputado.
Guerra dilacerou fortunas de oligarcas ucranianos
A destruição da indústria ucraniana após a invasão russa reduziu a riqueza dos oligarcas. Em um estudo publicado no final de 2022, o Centro para Estratégia Econômica (CEE), em Kiev, estimou as perdas dos oligarcas em 4,5 bilhões de dólares. Rinat Akhmetov foi o mais impacto: com a captura de Mariupol pelas tropas russas, sua empresa Metinvest Holding perdeu a importante siderúrgica Azovstal e mais um outro combinat. O CEE estima o valor das plantas industriais em mais de 3,5 bilhões de dólares.
Além disso, a produção na usina de coque de Akhmetov – localizada em Avdiivka, perto de Donetsk, avaliada em 150 milhões de dólares – foi paralisada devido a danos causados por ataques russos. Os bombardeios do Kremlin também destruíram muitas instalações das empresas de energia de Akhmetov, especialmente usinas termelétricas.
Devido à guerra, especialistas da revista Forbes Ucrânia estimam as perdas de Akhmetov em mais de 9 bilhões de dólares. No entanto, ele ainda lidera a lista dos ucranianos mais ricos, com uma fortuna de 4 bilhões de dólares. Já Vadim Novinsky, sócio de Akhmetov na Metinvest Holding, perdeu de 2 bilhões de dólares. Antes da guerra, sua fortuna era estimada em 3 bilhões de dólares.
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Kolomojskyj: sem passaporte ucraniano e refinaria de petróleo
A fortuna do até recentemente influente oligarca Igor Kolomojskyj também diminuiu drasticamente. No ano passado, ataques russos destruíram sua principal empresa, a refinaria de petróleo Kremenchuk, e o CEE estima os danos em mais de 400 milhões de dólares. Kolomoiskyi, juntamente com seu sócio Hennady Boholyubov, controlava uma parte significativa do mercado ucraniano de combustíveis. Eles eram donos, inclusive, da maior rede de postos de gasolina do país.
Por meio de sua influência política, Kolomojskyj conseguiu por muitos anos controlar a administração da petroleira estatal Ukrnafta, na qual possuía apenas uma participação minoritária. O controle da maior petrolífera do país, da maior refinaria e da maior rede de postos de gasolina lhe garantia grandes lucros.
A refinaria foi destruída, e o controle da Ukrnafta e da refinaria de petróleo Ukrtatnafta foi assumido pelo Estado durante o período de lei marcial. O oligarca, que também possui passaportes israelense e cipriota, perdeu ainda a nacionalidade ucraniana, já que apenas uma cidadania é permitida na Ucrânia. Ele ainda responde a um processo por possíveis fraudes na Ukrnafta, na casa dos bilhões.
Dmytro Firtash – que vive há anos na Áustria – é outro oligarca sob investigação. Ele também é conhecido por sua grande influência na política ucraniana. Neste primeiro ano de guerra, ele também perdeu grande parte de sua fortuna. Sua fábrica de fertilizantes Azot, em Sieveirodonetsk, que foi ocupada pela Rússia, foi severamente danificada pelos combates. O CEE estima as perdas em 69 milhões de dólares.
Não existem mais oligarcas ucranianos?
Os oligarcas perderam recursos essenciais para influenciar a política ucraniana, afirmou Dmytro Horyunov, um especialista do CEE. "Os investimentos na política estão se tornando menos relevantes", disse e acrescentou que espera que a lei antioligarca obrigue as grandes empresas a abrir mão de veículos de imprensa e de um papel na política.
Ao mesmo tempo, Horyunov não tem ilusões: muito pouco tem sido feito para eliminar completamente a influência dos oligarcas na política ucraniana. "Enquanto tiverem bens, eles farão de tudo para protegê-los ou aumentá-los".
De acordo com os especialistas do CEE, os oligarcas tradicionalmente defendem seus interesses por meio do sistema judicial. Desde 2014, a autoridade antimonopólio da Ucrânia impôs multas de mais de 200 milhões de dólares às empresas de Rinat Akhmetov e dezenas de milhões de dólares às companhias de Ihor Kolomoiskyi e Dmytro Firtash por abuso de posição dominante. Todas essas multas foram contestadas no tribunal, e nenhuma foi paga até o momento, disse o CEE.
Apesar de alguns oligarcas terem renunciado formalmente a empresas de comunicação, Ihor Feschtschenko, do movimento "Chesno" (Honesto), duvida que as grandes empresas ficarão de fora das eleições após o fim da guerra.
"Acho que a primeira coisa que veremos por parte dos oligarcas é a criação de novos canais de TV e, ao mesmo tempo, partidos políticos ligados a eles", avalia Feshchenko. Ele salienta que, para bloquear o fluxo de fundos não transparentes para as campanhas eleitorais é necessário implementar a legislação sobre partidos políticos.
Os especialistas do CEE esperam que, durante o processo de integração à UE, grandes investidores europeus se dirijam à Ucrânia. Ao mesmo tempo, eles apelam às instituições financeiras internacionais, de cuja ajuda a Ucrânia agora depende extremamente, para vincular o apoio a Kiev a progressos no processo de desoligarquização e apoiar as empresas que competiriam com os oligarcas.
Um ano de guerra da Ucrânia: uma linha do tempo em imagens
Na manhã de 24 de fevereiro de 2022, a Rússia invadiu a Ucrânia. Em um ano de combates, milhares de soldados e civis perderam a vida. Relembre os fatos mais marcantes nesta linha do tempo.
Foto: Anatolii Stepanov/AFP/Getty Images
Um dia sombrio para milhões
Na manhã de 24 de fevereiro de 2022, os ucranianos foram acordados por explosões como esta na capital, Kiev. A Rússia havia iniciado uma invasão em grande escala, marcando o maior ataque de um país contra outro desde a Segunda Guerra Mundial. A Ucrânia imediatamente declarou a lei marcial. Estruturas civis passaram a ser atacadas e logo começaram a ser relatadas as primeiras mortes.
Foto: Ukrainian President s Office/Zuma/imago images
Bombardeios impiedosos
O presidente russo, Vladimir Putin, insiste ainda hoje tratar-se de uma "operação militar especial" e que o objetivo é tomar as regiões de Donetsk e Luhansk, no leste da Ucrânia. Moradores de Mariupol se abrigaram em porões por semanas. Muitos morreram sob os escombros. Um ataque aéreo russo em março a um teatro da cidade onde centenas se refugiavam foi condenado por grupos de direitos humanos.
Foto: Nikolai Trishin/TASS/dpa/picture alliance
Êxodo em massa
A guerra na Ucrânia forçou uma emigração nunca vista na Europa desde a Segunda Guerra Mundial. De acordo com a Acnur, a agência de refugiados da ONU, mais de 8 milhões de pessoas fugiram do país. Só a Polônia acolheu 1,5 milhão de pessoas, mais do que qualquer outro Estado da UE. Milhões de pessoas, principalmente do leste e do sul da Ucrânia, foram forçadas a fugir.
Foto: Anatolii Stepanov/AFP
Cenas de horror em Bucha
Após algumas semanas, o exército ucraniano conseguiu expulsar as forças russas de áreas no norte e nordeste do país. O plano da Rússia de sitiar Kiev fracassou. Depois que as regiões foram libertadas, a extensão das atrocidades tornou-se aparente. Imagens de civis torturados e assassinados em Bucha, perto de Kiev, deram a volta ao mundo. As autoridades relataram 461 mortes.
Foto: Carol Guzy/ZUMA PRESS/dpa/picture alliance
Devastação e morte em Kramatorsk
O número de vítimas civis em Donbass aumentou rapidamente. As autoridades pediram à população civil para recuar para áreas mais seguras, mas os mísseis russos também atingiram as pessoas enquanto tentavam escapar, inclusive em Kramatorsk. Mais de 61 foram mortos e 120 ficaram feridos na estação ferroviária da cidade em abril, quando milhares esperavam para fugir para um local mais seguro.
Durante os ataques aéreos russos, milhões de ucranianos buscaram refúgio em algum tipo de abrigo. Para as pessoas próximas às linhas de frente dentro do alcance da artilharia, os porões se tornaram segundos lares. Moradores de grandes cidades também buscaram abrigo dos mísseis. Em Kiev (foto) e em Kharkiv, as estações de metrô funcionam como locais seguros.
Foto: Dimitar Dilkoff/AFP/Getty Images
Alto risco nuclear em Zaporíjia
Nas primeiras semanas após a invasão, a Rússia ocupou uma grande área das regiões sul e leste da Ucrânia, inclusive as proximidades de Kiev. Os combates se espalharam para as instalações do complexo nuclear de Zaporíjia, no sudeste, que está sob controle russo desde então. A Agência Internacional de Energia Atômica enviou especialistas para a usina e pediu uma zona segura ao redor da instalação.
Foto: Str./AFP/Getty Images
Resistência desesperada em Mariupol
O exército russo manteve Mariupol sob cerco por três meses, impedindo o envio de munição e outros suprimentos. O complexo siderúrgico Asovstal era o último reduto ucraniano na cidade, abrigando milhares de soldados e civis. Depois de um ataque prolongado, em maio de 2022 milhares de soldados russos assumiram o controle da usina, capturando mais de 2 mil pessoas.
Foto: Dmytro 'Orest' Kozatskyi/AFP
Um símbolo de resistência
A Rússia conquistou a Ilha das Cobras, no Mar Negro, no primeiro dia da guerra. Um diálogo entre militares ucranianos e russos, na qual os ucranianos se recusaram a se render, se tornou viral. Em abril, os ucranianos afirmaram ter afundado o navio de guerra russo Moskva, uma das duas embarcações envolvidas no ataque à ilha. Em junho, a Ucrânia disse ter expulsado os russos da ilha.
Foto: Ukraine's border guard service/AFP
Número de mortos incerto
O número exato de mortos na guerra permanece incerto. Segundo a ONU, pelo menos 7.200 civis foram mortos e outros 12 mil, feridos – mas os números reais podem ser muito maiores. A quantidade exata de soldados ucranianos tombados também é incerta. Em dezembro, o conselheiro presidencial da Ucrânia, Mykhailo Podolyak, estimou o número em até 13 mil. Estatísticas imparciais não estão disponíveis.
Foto: Raphael Lafargue/abaca/picture alliance
Divisor de águas para a Ucrânia
O envio de armas ocidentais à Ucrânia tem sido um assunto polêmico desde o começo da guerra, mas elas demoraram a chegar a Kiev. Os lançadores de foguetes Himars, fabricados nos EUA, foram uma ajuda decisiva. Eles permitiram que os militares ucranianos cortassem o abastecimento de munição para a artilharia russa e provavelmente também contribuíram para as contraofensivas bem-sucedidas da Ucrânia.
Foto: James Lefty Larimer/US Army/Zuma Wire/IMAGO
Alívio a cada libertação
No início de setembro, os militares ucranianos conduziram uma contraofensiva bem-sucedida em Kharkiv, no nordeste do país. Os russos, surpreendidos, recuaram rapidamente, deixando para trás equipamentos, munições e até evidências de supostos crimes de guerra. Os militares ucranianos também conseguiram libertar Kherson, no sul, e seus moradores comemoraram a chegada dos soldados ucranianos.
Foto: Bulent Kilic/AFP/Getty Images
Explosão na ponte da Crimeia
No início de outubro, ocorreu uma grande explosão na ponte que a Rússia construiu sobre o Estreito de Kerch, ligando à Crimeia, península ucraniana que Moscou ocupa desde 2014. A ponte foi parcialmente destruída. A Rússia afirma que um caminhão da Ucrânia carregado de explosivos causou os danos, mas as autoridades em Kiev não assumiram a responsabilidade pelo ataque.
Foto: AFP/Getty Images
Ataques maciços à infraestrutura de energia
Poucos dias após a explosão na ponte da Crimeia, a Rússia começou a atacar em grande escala a infraestrutura de energia da Ucrânia. Quedas de energia ocorreram de Lviv a Kharkiv. Desde então, esses ataques se tornaram rotina. Devido aos enormes danos às usinas de energia e outras infraestruturas civis, as pessoas na Ucrânia enfrentam quedas de energia e escassez de água quase diariamente.
Foto: Genya Savilov/AFP/Getty Images
Apoio do mundo ocidental
Mensagens diárias por vídeo do presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, em que ele relata a situação no país e sobre a guerra em andamento, são vistas por milhões de pessoas. Zelenski não só conseguiu unificar a população de seu país, mas também ganhou o apoio do Ocidente. A integração europeia progrediu muito sob a sua liderança, e a Ucrânia está a caminho da adesão à UE.
Foto: Kenzo Tribouillard/AFP
Esperando por tanques Leopard 2
A defesa da Ucrânia depende muito da ajuda externa. Um grupo de países liderado pelos EUA ofereceu um pacote de bilhões de dólares em ajuda humanitária, financeira e militar. O envio de artilharia pesada foi muito debatido no Ocidente, em grande parte devido a preocupações com a reação da Rússia. Mas a Ucrânia acabará recebendo tanques ocidentais, em sua maioria Leopard 2, de fabricação alemã.
Foto: Ina Fassbender/AFP/Getty Images
Uma cidade em ruínas
Há meses, batalhas sangrentas acontecem em Bakhmut, na região de Donetsk. Desde que as tropas ucranianas perderam o controle do vilarejo de Soledar no início de 2023, defender a cidade tornou-se ainda mais difícil. Em janeiro, o serviço secreto da Alemanha relatou perdas diárias de três dígitos do lado ucraniano. Mas acredita-se que o número de mortos na Rússia seja ainda maior.