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Qual o papel da nova Procuradoria de Defesa da Democracia?

24 de janeiro de 2023

Novo órgão da Advocacia-Geral da União visa ampliar as ações e debates para fortalecimento da democracia e ajudar no combate à desinformação nas políticas públicas – mas é alvo de críticas.

Pessoas atrás de uma faixa que diz: Somos pela Democracia
Ato em defesa da democracia em São Paulo, um dia após invasão das sedes do três Poderes em BrasíliaFoto: Nelson Almeida/AFP

Entrou em vigor nesta terça-feira (24/01) o decreto que altera a estrutura da Advocacia-Geral da União (AGU) e cria novos órgãos e unidades, entre elas a Procuradoria Nacional da União de Defesa da Democracia.

O objetivo principal do novo órgão é ampliar o papel da AGU em ações e debates relativos ao fortalecimento da democracia brasileira e ajudar no combate à desinformação nas políticas públicas.

Segundo o advogado-geral da União, Jorge Messias, a instalação do órgão é uma reação à onda de fake news e atentados contra as instituições públicas que vive o Brasil – o novo órgão foi anunciado em 2 de janeiro, antes dos ataques às sedes dos três Poderes, em Brasília.

Embora ainda nem tenha entrado em atividade, a estrutura já é motivo de polêmica, com críticos questionando a competência da AGU para gerir tal questão.

Vinculada à Procuradoria-Geral da União, o órgão será chefiado pelo advogado da União Marcelo Almeida. A forma de funcionamento, no entanto, ainda está em aberto e será definida após um amplo debate com representantes de outras instituições públicas e da sociedade civil, em um grupo de trabalho.

Desinformação x crítica

Apesar de ter sido elogiada por parte da sociedade, a instauração da Procuradoria Nacional de Defesa da Democracia também provocou críticas, sobretudo de políticos da direita, e colocou em voga o papel da AGU no combate à desinformação. Mas mesmo antes da criação da nova estrutura, a AGU já era responsável por representar o governo federal em casos relacionados a fake news.

No entanto, o conceito de "desinformação" ainda é uma incógnita no sistema político e jurídico brasileiro, já que não existe uma definição oficial.

O Congresso terá que aprovar um projeto para definir claramente as diferenças entre "desinformação" e "opinião". Muitas vezes, ao atentar contra instituições públicas, às eleições ou a atores públicos, entre outros, os autores de comentários e postagens alegam que estariam apenas exercendo sua "liberdade de expressão", ou seja, expressando uma opinião. Por isso, a importância de separar claramente os dois conceitos. 

Questionada pelo site Poder360, a AGU disse que considera como desinformação "fatos inverídicos ou supostamente descontextualizados levados ao conhecimento público de maneira voluntária com objetivo de prejudicar a adequada execução das políticas públicas, com real prejuízo à sociedade". Ou seja, de acordo com a AGU, uma notícia falsa disseminada de forma não intencional não acarretaria punição. Não está claro como essa diferenciação será feita.  

Além disso, AGU destaca que decisões recentes do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o assunto também serão usadas como base para os trabalhos da nova procuradoria.

Atos antidemocráticos culminaram com invasão dos três Poderes, em 8 de janeiroFoto: Eraldo Peres/AP Photo/picture alliance

Mais polêmica

Outra polêmica em torno das atribuições do novo órgão foi levantada, entre outras pessoas, pela deputada estadual de São Paulo Janaina Paschoal (PRTB), jurista e uma das autoras do pedido de impeachment contra a ex-presidente Dilma Rousseff.

Em uma postagem na internet, ela questionou quem seriam as autoridades competentes para definir o que seria tratado como desinformação sobre políticas públicas.

De acordo com o argumento, dependendo de quem fosse designado para tal função, a decisão poderia acarretar na proibição indireta de críticas ao governo, por exemplo.

Outro ponto levantado por reticentes ao novo órgão é a diferença entre "crítica" e "desinformação".

Logo ao anunciar o órgão, em 2 de janeiro, o advogado-geral da União se preocupou em deixar claro que a nova estrutura trata-se de instrumento cooperativo "como ponta de lança de uma atuação interinstitucional".

Para o professor de direito público da Universidade de São Paulo (USP), Floriano de Azevedo Marques, a função, no entanto, caberia melhor ao Ministério Público.

"Essa discussão da desinformação, ela vai num nível ainda superior, que é o interesse nem só do Estado, mas da própria sociedade que, pela Constituição, tem como principal guardião o Ministério Público. Então, eu acho que essa atribuição cabe mais como iniciativa judicial ao Ministério Público do a que à Advocacia Pública", afirmou Marques em entrevista à emissora GloboNews.

Questionada pela Agência Lupa, a AGU garantiu que "sob nenhuma hipótese" a nova estrutura "cerceará opiniões, críticas ou atuará contrariamente às liberdades públicas consagradas na Constituição".

Ainda segundo a Agência Lupa, a AGU argumenta que "desinformação mina a confiança nas instituições públicas, além de prejudicar a democracia ao comprometer a capacidade dos cidadãos de tomarem decisões bem informadas, com impactos sociais, políticos, econômicos e jurídicos de cunho negativo".

A nova procuradoria não terá competência para julgar casos – o que segue sendo papel do Poder Judiciário.

Grupo de trabalho

Para definir como a nova Procuradoria vai funcionar, foi criado um grupo de trabalho que visa receber contribuições de entidades da sociedade civil, outras instituições públicas, juristas e especialistas.

"O grupo dará transparência ao trabalho e o debate que ele proporcionará será fundamental para o aprimoramento e esclarecimento dos propósitos da nova Procuradoria", afirmou o Advogado-Geral da União, Jorge Messias.

Serão convidados a participar do grupo de trabalho um representante titular e um suplente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), de associações de jornalistas, além de indicados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).

Mas nem a criação do grupo de trabalho (GT) esteve longe de polêmicas. Inicialmente, a portaria que instituía o GT não incluía representantes de empresas de checagem de fatos e nem ligadas a mídias sociais – o que foi alvo de críticas e corrigido em uma versão do texto publicada posteriormente.

Outro ponto criticado no texto inicial da portaria que criava o GT foi o fato de ele citar nominalmente 12 homens, mas nenhuma mulher – o que também foi corrigido posteriormente em um novo texto. 

Após a conclusão dos trabalhos, a AGU irá elaborar uma minuta de regulamentação que será disponibilizada no portal da instituição para consulta pública e, posteriormente, para apreciação do Advogado-Geral da União.

Outras novidades

Procuradoria Nacional da União de Defesa da Democracia, a nova portaria da AGU que entra em vifor nesta terça-feira institui a Procuradoria Nacional de Defesa do Clima e do Meio Ambiente – que contribuirá com soluções jurídicas relacionadas à transição do Brasil para um modelo sustentável de desenvolvimento econômico e social –, e a Assessoria Especial de Diversidade e Inclusão –  responsável pela promoção de iniciativas relacionadas à igualdade de gênero, ética e racial no âmbito da AGU.

Outras novidades são a Secretaria de Atos Normativos – que contará com um escritório avançado no Palácio do Planalto, a fim de ampliar a participação da AGU na tomada de decisões sobre sanções presidenciais, formulação de políticas públicas e soluções regulatórias –, e a Assessoria de Relações Internacionais, que estará em permanente articulação com as equipes de atuação jurídica na esfera internacional.

le/md (ots)