Julgamento iniciado pelo Tribunal Superior Eleitoral, por suspeita de abuso de poder político e econômico, pode movimentar a política brasileira. Entenda as eventuais consequências do processo.
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O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) começou a analisar nesta terça-feira (04/04) a ação que pede a cassação da chapa Dilma-Temernas eleições de 2014 por suspeita de abuso de poder político e econômico. Não há prazo para o fim do julgamento, que pode resultar em uma série de cenários, a depender do entendimento dos ministros do tribunal.
A chapa é absolvida ou recebe punição leve
Os sete ministros do TSE decidem que não houve irregularidades nas contas da chapa em 2014 ou que eventuais ilegalidades não foram fundamentais para alterar o resultado das eleições. Eles também podem entender que houve irregularidade, mas aplicar uma sanção mais leve, como o pagamento de uma multa. Nesse cenário, tanto Dilma quanto Temer teriam os direitos políticos preservados e poderiam concorrer em uma nova eleição.
A chapa é dividida
Com Dilma fora do governo, a defesa de Michel Temer tem argumentado que as contas do vice durante a campanha devem ser analisadas separadamente daquelas da petista. O argumento é que apenas 6% dos recursos totais da campanha foram arrecadados por Temer e que as ilegalidades ocorreram no núcleo petista. Normalmente, o TSE não costuma acatar esse entendimento e recentemente negou um pedido semelhante feito por um vice-prefeito. Mas caso a separação passe, os casos de Dilma e Temer vão ser analisados à parte, abrindo um outro leque de possibilidades.
Dilma é condenada, mas Temer é absolvido
Com o entendimento que a chapa pode ser dividida, os ministros podem entender que os maiores abusos ocorreram no núcleo de Dilma. Dessa forma, podem cassar os direitos políticos da ex-presidente, tornando-a inelegível pelos próximos oito anos. Temer pode acabar sendo preservado e continuar a governar.
Tanto Dilma quanto Temer são cassados
Independentemente da separação das contas, os ministros podem decidir que tanto Dilma e Temer cometeram abusos e que a chapa deve ser cassada na sua totalidade. Temer então perde o cargo. Caberá então aos ministros decidir se tanto Temer quanto Dilma devem ter os direitos políticos cassados. Eles podem eventualmente entender que a campanha usou dinheiro sujo, mas que os candidatos não participaram das decisões ou não tinham conhecimento sobre irregularidades. Assim, eles podem ter os direitos políticos preservados. Nesse cenário, Temer perde o cargo, mas pode se candidatar novamente.
Recursos
Caso o TSE decida neste julgamento que Temer deve perder o cargo, ele não deverá deixar a Presidência imediatamente, já que raramente a Justiça Eleitoral determina o afastamento imediato de um condenado. A defesa do presidente vai provavelmente entrar com recursos no próprio TSE e no Supremo Tribunal Federal (STF). Até que os recursos sejam analisados, Temer poderá seguir governando.
Nesse cenário, não é possível prever quando sairia a sentença final. O governo aposta na morosidade e em estratégias para postergar uma decisão definitiva com o objetivo de levar o processo até o fim de 2018, quando o mandato do peemedebista chegar ao fim. E mesmo que a Justiça Eleitoral determine seu afastamento imediato, Temer poderá entrar com alguma liminar pedindo efeito suspensivo.
Durante a fase de recursos, também é possível que os responsáveis pelos novos julgamentos façam uma leitura política do caso, avaliando se a queda de outro presidente não resultaria em mais impactos negativos para o país. O ministro Gilmar Mendes, por exemplo, já disse que o TSE deve avaliar o caso levando em conta a "estabilidade política" do Brasil.
Temer perde de forma definitiva antes de 2018
Finalmente, se Temer acabar sendo cassado de forma definitiva antes do término do seu mandato, abre-se a possibilidade da realização de novas eleições. Até lá, a Presidência da República seria assumida interinamente pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM). Cenários como o do candidato derrotado Aécio Neves (PSDB) assumir a Presidência parecem descartados por causa do artigo 81 da Constituição, que prevê a realização de uma nova eleição no caso de os cargos de presidente e vice ficarem vagos nos dois últimos anos do mandato. No entanto, há dúvidas sobre se essa eleição seria direta ou indireta.
Eleição indireta
A Constituição prevê que novas eleições presidenciais a partir da segunda metade de um mandato devem ser indiretas, ou seja, realizadas pelo Congresso Nacional. Caso Temer seja cassado, mas preserve seus direitos políticos, é possível supor que ele estaria apto a concorrer nesse eventual pleito indireto. O problema é que a Constituição é vaga sobre como seria feita essa eleição. Ela define apenas que o pleito deve ocorrer 30 dias após a vacância dos cargos. Não se sabe quem poderia concorrer e como seria a campanha.
Eleição direta
O cenário das eleições diretas era mais provável se Temer tivesse sido cassado de forma definitiva até o fim de 2016. Nesse caso, se o posto de presidente e vice ficarem vagos nos primeiros dois anos de mandato, novas eleições diretas são convocadas. Só que embora a Constituição estabeleça que esse prazo já tenha terminado, o Código Eleitoral permite que novas eleições diretas sejam convocadas até no máximo seis meses antes do término do mandato de cargos do Executivo. Com duas regras opostas em vigor, o STF passou a analisar qual deve ser a aplicação válida. Até agora não houve qualquer decisão.
O estrago de uma delação
Somente na delação do ex-diretor de relações institucionais da Odebrecht Claudio Mello Filho 39 políticos foram citados. Há ainda revelações de 78 executivos, e é por isso que são chamadas de "delações do fim do mundo".
Foto: Imago/Fotoarena
No topo do poder: Michel Temer
O nome de Michel Temer aparece 43 vezes na delação, de 82 páginas. O delator diz que o conheceu em 2005, por intermédio de Geddel Vieira Lima. Relata encontros com Temer, um deles jantar no Palácio do Jaburu com Marcelo Odebrecht, em que foi solicitada ajuda financeira de 4 milhões. Revela que Temer atuava indiretamente. Temer alega que pediu auxílio formal à construtora, quando comandava o PMDB.
Foto: Reuters/A. Machado
Eliseu Padilha, o "Primo"
O ministro da Casa Civil é apontado como coordenador "de contribuições de campanha que o PMDB recebeu da Odebrecht" em 2014. O delator o classifica como o "preposto" de Temer. "Nas vezes que me foi solicitada qualquer agenda com Michel Temer, procurava Eliseu Padilha, que viabilizava os encontros para as demandas da empresa. Sempre soube que Padilha representava a figura política de Temer", diz.
Foto: Getty Images/AFP/E.Sa
Moreira Franco, agora ministro: o "Angorá"
Moreira Franco, que Temer alçou a ministro para ter foro privilegiado, tem codinome que se refere aos cabelos grisalhos. O delator fala de encontro entre ele, Moreira e Temer, quando disse a ambos que Graça Foster, então presidente da Petrobras, queria saber quem do PMDB recebia dinheiro da Odebrecht. O ministro diz que nunca conversou com Melo Filho sobre doações.
Foto: picture alliance/AP Images/H. Ammar
Geddel Vieira Lima, o ex-ministro "Babel"
O delator diz ter sido próximo do ex-ministro e que ele "recebia
pagamentos qualificados em períodos eleitorais e não
eleitorais; e fazia isso oferecendo contrapartidas claras". Um exemplo foi a liberação de recursos do Ministério da Integração Nacional a obra de interesse da Odebrecht. Geddel foi ministro de Dilma e de Temer, mas durou pouco no cargo por conta de denúncias de corrupção. Ele nega.
Foto: Valter Campanato/Agencia Brasil
"Núcleo dominante": Jucá, Renan e Eunício
O diretor da Odebrecht disse na delação que o PMDB tinha dois núcleos de arrecadação, um no Senado e outro na Câmara. No Senado, Eunício Oliveira (na cabeceira), hoje presidente da Casa, Renan Calheiros (à esq) e Romero Jucá (à dir.) eram o trio poderoso. "Esse grupo é bastante coeso e possui enorme poder de influência sobre outros parlamentares, tanto do
partido como de outras legendas."
Foto: Marcos Brandao
Romero Jucá ou "Caju", o "homem de frente"
O delator diz que o senador , codinome Caju, era o mais procurador por "agentes privados interessados na sua atuação estratégia". Por conta desta ponte com o setor privado, diz, o gabinete de Jucá é concorrido. O delator diz ter pago 22 milhões só a Jucá, que coordenava a distribuição do dinheiro no PMDB. O senador teria articulado a aprovação de propostas de interesse da Odebrecht no Congresso.
Foto: Jose Cruz/Agencia Brasil
Renan Calheiros, o "Justiça"
Ex-presidente do Senado e ex-ministro da Justiça, é citado como peça crucial do esquema do PMDB. Em 2010, teria recebido 500 mil da Odebrecht. Logo que assumiu o Senado, Marcelo Odebrecht pediu que fosse agendada "visita de cortesia". Na ocasião, Renan disse estar afinado com pleitos da construtora. Teria pedido ajuda à campanha do filho em Alagoas (2014). O senador nega irregularidades.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Eduardo Cunha, o "Caranguejo" preso
Delator diz que se aproximou dele em 2007. O deputado teria recebido 7 milhões da Odebrecht para campanha de 2010. Seu nome constava em planilhas de executivos da empresa. Reuniões para tratar de votações e interesses da Odebrecht eram frequentes. "Ele sabia que receberia pagamentos a pretexto de contribuição de campanha." Cassado em setembro, está preso em Curitiba desde outubro de 2016.
Foto: Reuters/U. Marcelino
Rodrigo Maia, o "Botafogo"
Delator disse que Maia, hoje presidente da Câmara, era "ponto de interlocução na defesa dos interesses da Odebrecht". Diz que pediu ajuda na votação de medida provisória que interessava à empreiteira e Maia aproveitou para solicitar recursos e liquidar pendências da campanha de 2012. "Decidi contribuir com o valor aproximado de 100 mil". Em 2010, teria recebido outros 500 mil. Maia nega.
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Marco Maia, em outro time: o "Gremista"
Ex-presidente da Câmara, o petista Marco Maia é identificado pelo time. Delator diz que se aproximou dele em viagem a NYC, promovida pela Braskem. Na presidência, ofereceu jantar de cortesia a Marcelo Odebrecht. Pediu contribuições quando se lançou para a presidência da Casa. "A referida solicitação foi autorizada por Marcelo Odebrecht e transmitida por mim ao referido parlamentar."
Foto: Agencia Brasil/José Cruz
Delcídio Amaral, a "Ferrari" detida
O senador, ex-líder do PT, teria se empenhado para aprovar norma de tributos que ajudaria a Odebrecht. Após a votação, reclamou da "pouca atenção" recebida. O delator relata encontro com Delcídio no Hotel Fasano, em SP, quando lhe informou que receberia 500 mil reais. Naquele mesmo dia, colegas lhe contaram que o petista "tinha ficado absolutamente satisfeito e tinha pressa no recebimento".
Foto: Reuters/U. Marcelino
Agripino, o "Gripado": comandante do DEM
Relator disse que presidente do DEM tem relação pessoal com Emílio
Odebrecht e sempre foi muito cordial com empresa. Afirmou que em 2014 Marcelo Odebrecht fez pagamento de 1 milhão de reais a ele. O valor, disse, "teria sido solicitado pelo Senador Aécio Neves como uma forma de apoio
ao DEM, que era presidido à época pelo Senador José Agripino". Agripino era cotado para ser vice de Aécio na chapa.
Sob esse codinome, o então senador teria pedido "apoio diferenciado" da Odebrecht em 2010 e 2014. Presidia o PTB no Distrito Federal. O delator relata autorização de Marcelo Odebrecht para repassar a ele 1,5 milhão em 2010 e 1,3 milhão em 2014. "Não tenho como dizer se os pagamentos em dinheiro foram utilizados por Gim Argello para fins eleitorais." Argello deixou o PTB e a política em 2016.
Foto: CC-by-NC-flicker/Senado Federal
Jaques Wagner, o "Polo"
Relator diz que fez a ponte da Odebrecht com o político de 2006 a 2010. Conta que Marcelo Odebrecht tinha dúvidas sobre êxito da carreira política do petista. O primeiro pedido de recursos foi para campanha ao governo da BA (2006). "Acredito que tenha ocorrido pagamentos de até 3 milhões de forma oficial e caixa 2." Ajudou a Odebrecht a resolver "pendências" do pólo petroquímico de Camaçari.