Lista contém 316 nomes da oposição e da situação. Relação, isolada, não prova nada, mas é lembrete do potencial explosivo de eventual delação premiada da cúpula da empresa, que tem laços estreitos com o poder.
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O mundo político brasileiro foi mais uma vez apanhado de surpresa na tarde desta quarta-feira (24/03) por revelações da Operação Lava Jato. Desta vez, os investigadores revelaram a existência de uma planilha com os nomes de 316 políticos de 24 partidos – do governo e da oposição –, ao lado de indicações de valores que teriam sido repassados pela Odebrecht, a maior empreiteira do país, que está profundamente implicada no esquema de desvios da Petrobras.
Vasta, a lista inclui governadores, prefeitos, ministros, senadores, deputados e vereadores. Entre os nomes que se destacam estão os do senador oposicionista e candidato derrotado à Presidência Aécio Neves (PSDB) e seu colega José Serra (PSDB); do ex-presidente José Sarney (PMDB); do ministro Jaques Wagner (PT); dos presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB), e da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB); e até mesmo do ex-governador Eduardo Campos (PSB), que morreu num acidente aéreo em 2014.
O PT da presidente Dilma Rousseff lidera o número de pessoas na lista, com menção de ao menos 75 nomes. Em seguida vem o PMDB, com 45.
Segundo os investigadores, a lista, que foi apreendida em fevereiro na casa de um ex-diretor da Odebrecht, indica valores que teriam sido repassados nas campanhas eleitorais de 2012 e 2014. Os valores sugerem repasses que vão de 50 mil até 3 milhões de reais.
No entanto, o real significado dos dados da planilha ainda é uma incógnita e não é possível identificar se os valores indicados são ilegais e se foram efetivamente repassados para os políticos. Eles podem indicar repasses legais, como doações nominais e ocultas (quando o dinheiro é repassado para o comitê do partido, e não para o candidato) ou pagamentos ilegais, como Caixa 2 (doações não contabilizadas) e propina. O juiz Sérgio Moro, responsável pela Lava Jato, declarou em despacho que qualquer conclusão sobre a natureza dos pagamentos é "prematura".
Só que reportagens na imprensa brasileira já apontam que existem algumas discrepâncias entre as doações oficialmente declaradas pela Odebrecht nessas campanhas e os números que aparecem na lista, o que reforça a tese de repasses ilegais. Em 2012, por exemplo, a Odebrecht declarou ter doado 38 milhões de reais para candidatos, mas a lista sugere que o montante pode ter chegado a 75 milhões.
Também causa estranheza menções de nomes de políticos que não concorreram nessas eleições, como a senadora Gleisi Hoffmann (PT) e o ex-presidente Sarney.
Entre as curiosidades, a planilha também revelou uma relação de apelidos criada pelos funcionários da Odebrecht para se referir aos políticos. Nela, a deputada comunista Manuela d'Ávila era chamada de "Avião"; Eduardo Cunha, de "Caranguejo"; o prefeito Eduardo Paes (PMDB), de "Nervosinho".
"Sensação de que todos são iguais"
O impacto da lista no meio político foi imediato. Dezenas de políticos ouvidos pela imprensa afirmaram que todas as suas doações em campanhas passadas foram regulares. Alguns, como o deputado Paulinho da Força (SD), não negaram relação com a Odebrecht, mas afirmaram que as doações foram totalmente registradas. Outros afirmaram que a lista provavelmente mistura o "legal com o ilegal". O prefeito de Florianópolis, Junior (PSD), chegou a sugerir que a lista pode ter sido forjada com o objetivo de implicar a oposição e assim prejudicar o processo de impeachment e talvez a própria Lava Jato.
Nas horas seguintes, políticos que não constavam na lista trataram de atacar rivais que tiveram seus nomes citados. Em redes sociais, usuários afirmaram que o episódio só aumentou o desgosto que sentem pelo cenário político. A citação de opositores e governistas na mesma lista reforçou ainda mais a "sensação de que todos são iguais".
Apesar das dúvidas que ainda cercam a planilha, ela parece indicar uma prévia do potencial explosivo de uma eventual delação premiada da cúpula do Odebrecht, que por décadas cultivou laços com centenas de políticos e hoje está quase toda na cadeia (o presidente da empresa, Marcelo Odebrecht, já foi condenado a 19 anos de prisão).
Na terça-feira, a empresa divulgou nota afirmando que havia finalmente cedido e estava pronta para colaborar com os investigadores. Segundo o jornal Folha de S.Paulo, desde que as notícias sobre uma eventual colaboração da Odebrecht apareceram, um clima de "fim do mundo" se instalou em Brasília por causa da ligação da empresa com o meio político.
No entanto, os procuradores da Lava Jato afirmaram que ainda não há um acordo. Segundo o Ministério Público, ele só seria possível caso a empresa não só admita o que já foi descoberto, como também revele outras ilegalidades que tenha cometido e "que ainda não sejam de conhecimento das autoridades".
Mas caso as negociações finalmente comecem, o potencial de estrago é imprevisível. Executivos de outras empreiteiras, como a Andrade Gutierrez e a UTC, já fecharam acordos de delação premiada que abalaram a imagem do governo, mas uma eventual confissão e colaboração da Odebrecht poderia gerar consequências ainda mais danosas para o Planalto.
Maior construtora do país, a Odebrecht mantém laços estreitos com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ela foi responsável por doar milhões de reais ao instituto do ex-presidente e pagou 4 milhões de reais para que ele fizesse dez palestras, segundo investigações da Lava Jato. A empresa também está envolvida com as reformas do sítio em Atibaia, que a Polícia Federal suspeita ser de propriedade do ex-presidente. Uma eventual delação poderia esclarecer se esses pagamentos foram mesmo legais ou se eram resultado de uma troca de favores para que Lula usasse sua posição para agir como lobista da construtora.
A colaboração também poderia implicar fortemente o PMDB do vice-presidente Michel Temer e embaralhar ainda mais os possíveis cenários da sucessão caso Dilma perca o mandato.
Mas o impacto da delação não seria sentido só em Brasília, já que a Odebrecht possui centenas de contratos com todas as esferas do Poder Executivo no Brasil. Seus engenheiros e máquinas marcaram presença na renovação da zona portuária do Rio de Janeiro, nos estádios da Copa do Mundo e em centenas de obras pelo país, o que pode ampliar ainda mais o alcance da Lava Jato, que ainda está concentrada em investigar esquemas de corrupção na Petrobras e outras estatais.
Sigilo
A divulgação da planilha também levantou questões sobre o sigilo da investigações da Lava Jato. Inicialmente, Moro determinou que os documentos apreendidos com funcionários da Odebrecht em fevereiro fossem tornados públicos. Só que após a divulgação da planilha, o juiz voltou atrás e decretou sigilo mais uma vez – uma medida inócua depois da divulgação. Em seu despacho, o juiz alegou que só soube que a planilha estava nos autos após a divulgação pela imprensa.
Ao determinar novo sigilo, Moro pediu aos procuradores para que se manifestassem sobre o envio do documento para o Supremo Tribunal Federal, já que uma boa parte dos nomes citados possui foro privilegiado. Críticos de Moro se apressaram em apontar que o juiz não adotou o mesmo procedimento quando determinou a divulgação dos grampos telefônicos de Lula, que incluía conversas com pessoas que possuíam foro privilegiado, incluindo Dilma.
Os envolvidos na Operação Lava Jato
A operação que investiga um megaesquema de corrupção na Petrobras já acusou mais de 200 pessoas, sendo que metade delas foi condenada. Relembre as principais ações penais da Lava Jato e seus envolvidos.
Foto: picture-alliance/AP Photo/N. Antoine
Youssef absolvido
Denúncia: Evasão de 124 mil dólares não declarados, lavagem de dinheiro proveniente do tráfico de drogas e tráfico de 700 kg de cocaína.<br/> Resultado: Dois condenados (René Luiz Pereira e Carlos Habib Chater, dono do posto que deu nome à operação), um absolvido em 1ª instância (o doleiro Alberto Youssef, na foto) e um absolvido em 2ª instância (André Catão).<br/> Data: 21 de outubro de 2014.
Foto: cc-by/Valter Campanato/ABr
Primeira condenação de Youssef e Costa
Denúncia: Lavagem de dinheiro e formação de grupo criminoso organizado. Houve desvio de dinheiro público na construção da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, por meio de contratos superfaturados.</br> Resultado: Oito condenados (entre eles, Alberto Youssef e o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, na foto) e dois absolvidos.</br> Data: 22 de abril de 2015.
Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agencia Brasil
Youssef e o dinheiro do mensalão
Denúncia: Lavagem de dinheiro. Os recursos, que ultrapassam 1 milhão de reais, pertenciam ao ex-deputado federal José Janene, morto em 2010, e eram provenientes do esquema do mensalão.</br> Resultado: Quatro condenados: Alberto Youssef, Carlos Habib Chater, Ediel Viana da Silva (funcionário do Posto da Torre) e Carlos Alberto Pereira da Costa (laranja de Youssef).</br> Data: 6 de maio de 2015.
Foto: Reuters
Cerveró é condenado
Denúncia: Lavagem de dinheiro. Nestor Cerveró (foto), ex-diretor da área Internacional da Petrobras, comprou um apartamento de luxo no Rio de Janeiro – hoje avaliado em 7,5 milhões de reais – com dinheiro de propina da Petrobras.</br> Resultado: Um condenado.</br> Data: 26 de maio de 2015.
Foto: José Cruz/ABr
A primeira sentença a empreiteiros
Denúncia: Corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa, envolvendo contratos da construtora Camargo Corrêa com as refinarias Abreu e Lima e Getúlio Vargas. As propinas pagas pela empresa ultrapassam os 50 milhões de reais.</br> Resultado: Seis condenados (entre eles, Youssef, Costa e três ex-dirigentes da Camargo Corrêa) e três absolvidos.</br> Data: 20 de julho de 2015.
Foto: AFP/Getty Images/Y. Chiba
Próximo alvo: executivos da OAS
Denúncia: Corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa, envolvendo contratos da empreiteira OAS com as refinarias Abreu e Lima e Getúlio Vargas. As propinas pagas somam quase 30 milhões de reais.</br> Resultado: Sete condenados (Youssef, Costa, na foto, e mais cinco executivos ligados à OAS, entre eles, o presidente, José Aldemário Pinheiro Filho).</br> Data: 5 de agosto de 2015.
Foto: picture-alliance/AP/E. Peres
Novo operador: Fernando Baiano
Denúncia: Corrupção e lavagem de dinheiro, envolvendo pagamento e recebimento de propina em contratos com a Petrobras. As vantagens indevidas superam 50 milhões de reais.</br> Resultado: Três condenados (Nestor Cerveró, em sua segunda condenação, o lobista Fernando Baiano e um ex-consultor da Toyo Setal, Júlio Camargo) e um absolvido (Youssef).</br> Data: 17 de agosto de 2015.
Foto: Reuters/S. Moraes
Um petista e mais dois ex-Petrobras
Denúncia: Corrupção, lavagem de dinheiro e associação criminosa. As propinas negociadas chegaram a 40 milhões de reais.</br> Resultado: Dez condenados (entre eles, o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, na foto, o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque, o ex-gerente da estatal Pedro Barusco e Alberto Youssef) e um absolvido (Paulo Roberto Costa).</br> Data: 21 de setembro de 2015.
Foto: picture-alliance/dpa/C. Villalba Racines
Primeiro político condenado
Denúncia: Corrupção e lavagem de dinheiro, envolvendo propinas de pelo menos 1 milhão de reais, por meio de contratos de publicidade firmados com a Caixa e o Ministério da Saúde.</br> Resultado: Três condenados: o ex-deputado federal André Vargas (foto), o irmão dele, Leon Vargas, e o publicitário Ricardo Hoffmann.</br> Data: 22 de setembro de 2015.
Foto: José Cruz/ABr
O segundo político
Denúncia: Corrupção e lavagem de dinheiro, envolvendo propinas de pelo menos 11 milhões de reais.</br> Resultado: Três condenados (entre eles, o ex-deputado federal Pedro Corrêa, que chegou a receber propina enquanto era julgado na Ação Penal 470, o mensalão, processo em que também foi condenado) e dois absolvidos.</br> Data: 29 de outubro de 2015.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Brandt
Mais empreiteiras na mira
Denúncia: Lobistas, doleiros, ex-diretores da Petrobras e executivos ligados à construtora Andrade Gutierrez (entre eles, o presidente da empresa, Otávio Marques de Azevedo, na foto) foram denunciados por formação de quadrilha, corrupção, organização criminosa e lavagem de capitais, após envolvimento no esquema da Petrobras.</br> Resultado: Denúncia aceita pela Justiça; réus aguardam sentença.
Foto: Reuters/F. de Holanda TPX Images of the day
Agora, a Odebrecht
Denúncia: Preso desde junho de 2015, Marcelo Odebrecht – então presidente da empreiteira Odebrecht – é acusado de envolvimento com o esquema de corrupção. A empresa pagava propina, que era repassada a funcionários da Petrobras.</br> Resultado: Foi condenado a 19 anos de prisão por crimes como corrupção e organização criminosa.</br> Data: 8 de março de 2016.
Foto: Reuters/E. Castro-Mendivil/Files
Mais uma vez condenado
Denúncia: O ex-ministro José Dirceu passou a ser réu da Lava Jato enquanto cumpria pena pelo mensalão. Ele e outras 14 pessoas foram denunciadas por vários atos de corrupção dentro da Petrobras.</br> Resultado: Dirceu foi condenado a 23 anos de prisão por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Outras dez pessoas também foram condenadas.</br> Data: 18 de maio de 2016.
Foto: picture-alliance/dpa/H. Alves
Outra denúncia contra Odebrecht
Denúncia: Marcelo Odebrecht é reu outra vez, junto a outros executivos do grupo, em processo que investiga irregularidades em oito contratos firmados pela empresa com a Petrobras. Segundo o MPF, as propinas chegaram a 137 milhões de reais.</br> Resultado: Denúncia aceita pela Justiça; réus aguardam sentença.
Foto: picture alliance/ZUMAPRESS.com
Collor acusado de corrupção
Denúncia: O senador Fernando Collor de Mello (PTB-AL) é acusado de cometer crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, tendo recebido pelo menos 3 milhões de reais em propinas de contratos da Petrobras. Em julho, a Polícia Federal fez buscas em suas propriedades e confiscou três carros de luxo.</br> Resultado: Denúncia apresentada ao Supremo Tribunal Federal (STF), aguarda decisão.
Foto: ROBERTO SCHMIDT/AFP/Getty Images
Repasses ao PT
Denúncia: O pecuarista José Carlos Bumlai é acusado de corrupção, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro, por fraudes na compra de um navio-sonda pela Petrobras. Em depoimento, confessou ter feito um empréstimo de 12 milhões de reais no Banco Schahin para repassar ao PT. Entre os outros dez réus, estão Cerveró, Vaccari e executivos do Grupo Schahin.</br>Resultado: Denúncia aceita pela Justiça.
Foto: Valter Campanato/Agência Brasil
A denúncia contra Cunha
Denúncia: O ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, é acusado de receber milhões de reais em propina no esquema de corrupção na Petrobas, que teriam sido depositados em contas em seu nome na Suíça. Ele responde pelos crimes de corrupção, evasão de divisas e lavagem de dinheiro.</br> Resultado: Denúncia aceita pela Justiça; réu aguarda julgamento.
Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil
Mulher de Cunha também é ré
Denúncia: A jornalista Cláudia Cordeiro Cruz, mulher de Eduardo Cunha, é acusada de esconder, em conta secreta no exterior, valores provenientes do esquema criminoso instalado na diretoria internacional da Petrobras. Ela responde pelos crimes de lavagem de dinheiro e evasão de divisas.<br> Resultado: Denúncia aceita pela Justiça; ré aguarda julgamento.
Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado
Lula e Delcídio
Denúncia: O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ex-senador Delcídio do Amaral e outras cinco pessoas são acusados de terem tentado atrapalhar as investigações da Lava Jato ao negociar para impedir que o ex-diretor da área internacional da Petrobras Nestor Cerveró assinasse acordo de delação premiada.</br> Resultado: Denúncia aceita pela Justiça; réus aguardam julgamento.
Foto: picture-alliance/AP Photo/F. Dana
Ex-ministro e senadora denunciados
Denúncia: A senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) e seu marido, o ex-ministro Paulo Bernardo (foto), são acusados de pedir e receber propina no valor de 1 milhão de reais oriundos da Petrobras. O montante teria sido usado na campanha de Gleisi ao Senado em 2010.</br> Resultado: Denúncia apresentada ao Supremo Tribunal Federal (STF), aguarda decisão.
Foto: Reuters/U. Marcelino
Lula e o tríplex
Denúncia: O ex-presidente Lula é acusado de corrupção passiva e lavagem de dinheiro por ter supostamente recebido 3,7 milhões de reais em vantagens indevidas da construtora OAS. Parte do montante está relacionada a um tríplex no Guarujá. Também são alvos da ação a mulher do petista, Marisa Letícia, e mais seis pessoas.<br> Resultado: Denúncia apresentada pelo MPF, aguarda decisão.