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Queda de governo conservador gera impasse em Portugal

Jochen Faget, de Lisboa (av)11 de novembro de 2015

Parlamento rejeita programa do premiê recém-eleito Passos Coelho, impedindo-o de governar. Formação de um governo esquerdista depende agora de decisão do presidente e esbarra em resistência.

Prédio do Parlamento português, em Lisboa
Foto: DW/J.Faget

A segunda legislatura do primeiro-ministro português Pedro Passos Coelho só durou dez dias. Nesta terça-feira (10/11), foi dissolvido o governo de coalizão formado pelo liberal de direita Partido Social Democrata (PSD) e o Partido Popular (CDS-PP), de tendência de extrema direita.

O Partido Socialista (PS), o Partido Comunista Português (PCP) e o Bloco de Esquerda (BE) usaram sua maioria no Parlamento para rejeitar o programa de governo dos direitistas e querem formar um novo governo que dê fim ao regime de austeridade rigorosa em Portugal.

Já nos dias seguintes às eleições de 4 de outubro, estava claro que uma manobra assim estava em andamento. Com 107 de 230 assentos, a coligação governamental podia ser a principal força no novo Parlamento, porém, a maioria ficara com a esquerda, representada por um total de 122 deputados.

Desde o momento em que, seguindo a tradição, o presidente Aníbal Cavaco Silva encarregou Passos Coelho, como representante da bancada mais numerosa, da constituição do governo, tudo indicava que a coisa não daria certo. E não importava quantas vezes Cavaco Silva apelasse aos socialistas e aos direitistas no governo para, de alguma forma, se arranjarem entre si.

Em vez disso, o líder do PS, António Costa, fechou um acordo de tolerância mútua com os demais esquerdistas: menos austeridade em troca do apoio deles para um governo socialista de minoria. "Uma solução estável para os próximos anos", assegurou Costa, e agora aguarda que o presidente o designe para formar o governo.

Governo de esquerda

O conceituado economista João Duque é da opinião que "um governo de esquerda certamente não seria o fim do mundo", mas ressalva que "a longo prazo, ele vai ter problemas". Pois, por um lado, os socialistas acatam as regras de austeridade da zona do euro, a qual não querem abandonar de forma alguma. Por outro lado, prometem elevar os salários e as aposentadorias especialmente baixos e voltar a ampliar o Estado social em Portugal.

Segundo Duque, trata-se de algo impossível: "Não vejo como isso poderá ser feito sem aumentar os impostos." O fim gradativo dos impostos e taxas adicionais já aprovados, a rápida elevação para 600 euros do salário mínimo garantido pelo Estado, pensões mais altas para os aposentados carentes: tudo isso custará dinheiro, muito dinheiro, de que Portugal, na verdade, não dispõe.

Premiê Pedro Passos Coelho sob pressão após rejeição no ParlamentoFoto: picture-alliance/AP Photo/A.Franca

"Um governo de minoria dos socialistas que seja apoiado pelos demais partidos de esquerda vai ter que tentar a quadratura do círculo", resume José Maria Castro Caldas, do Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra.

As principais metas seriam retroceder no curso de austeridade, ampliar o serviço de saúde estatal e a educação – tudo isso, contudo, sem agravar o déficit orçamentário e as dívidas do país. Para tal, é estreito demais o espaço de ação de que dispõe um governo de esquerda. As declarações dos líderes esquerdistas indicam como pretendem, ainda assim, cumprir suas tarefas: elevação dos impostos, sim, mas só para os muito ricos e as empresas.

Eleições antecipadas como solução possível

Aurora Teixeira, professora de Economia da Universidade do Porto, objeta que "a experiência mostrou que isso não dá certo". "Os ricos levam o dinheiro deles para os paraísos fiscais, as empresas transferem suas sedes para países de baixa tributação. E quem paga a conta é o homem comum, que não tem como se defender."

A professora cita, ainda, um problema fundamental: ninguém sabe se os eleitores do Partido Socialista teriam mesmo conferido um mandato a António Costa, se fosse para ele governar com o apoio dos comunistas ou do Bloco de Esquerda.

Pelo menos internamente, os socialistas, com maioria esmagadora, responderam "sim" a essa questão. Cabe ver se o presidente Cavaco Silva também vê a situação da mesma forma. Pois é ele quem deve decidir agora se confiará a formação do governo ao líder socialista Costa. A alternativa seria manter o atual premiê conservador no cargo até janeiro, quando transcorre o pleito presidencial português. O novo chefe de Estado poderia, então, decretar eleições antecipadas.

Espera pelo presidente

É fato conhecido o desejo de Cavaco Silva de manter os comunistas e o Bloco de Esquerda longe do poder. Ainda antes da posse do agora fracassado governo de direita, ele advertiu contra o caos e a instabilidade, caso os esquerdistas alcançassem o poder.

Socialistas, comunistas e o BE, por sua vez, prometem para os próximos quatro anos uma política responsável e um governo com capacidade de ação, assegurado por meio de acordos entre os três partidos. Tanto comunistas como esquerdistas se comprometeram por escrito a não derrubar um governo de minoria do PS.

Líder socialista António Costa promete governo estável nos próximos quatro anosFoto: DW/J.Faget

Do ponto de vista do professor de Duque, contudo, os socialistas é que provocariam a própria queda. "O PS entraria em atrito, se formasse um governo de minoria tolerado pela esquerda", prevê. Pois o PCP e o Bloco reivindicariam para si os eventuais êxitos, atribuindo as medidas impopulares aos socialistas.

Duque tem como certo o fim precoce de um eventual governo de esquerda, com os portugueses tendo, de qualquer forma, que retornar às urnas antes do fim da nova legislatura. Nesse caso, não seriam más as chances dos direitistas de reconquistar o poder. Agora, contudo, o presidente Cavaco Silva precisa primeiro decidir quem será o próximo chefe de governo. E isso pode demorar alguns dias.

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