Queda de prédio realça precariedade de indústria-chave para Bangladesh
29 de abril de 2013O desabamento de um prédio de oito andares que abrigava cinco fábricas têxteis em Bangladesh, matando mais de 370 pessoas, chama, mais uma vez, a atenção para as precárias condições de segurança e de trabalho da indústria de vestuário do país – a segunda maior do mundo, depois da China, e fundamental para a economia nacional.
"O colapso do edifício foi o último de uma série de acidentes em fábricas de roupas de Bangladesh", ressalta Brad Adams, da ONG Human Rights Watch. "O governo, donos de fábricas e a indústria internacional de vestuário pagam os trabalhadores em Bangladesh com salários que estão entre os mais baixos do mundo. Mas não têm a decência de criar condições seguras de trabalho para aqueles que costuram as roupas de pessoas de todo o mundo".
Estima-se que nos últimos três anos mais de 500 trabalhadores morreram em acidentes em fábricas da indústria do setor em Bangladesh. Em novembro passado, 112 pessoas morreram num incêndio em uma outra fábrica, no polo industrial de Ashulia, subúrbio de Daca, onde eram produzidos artigos para grupos como Walmart e C&A. O acidente de quarta-feira (24/04) já contabiliza, além dos mais de 370 mortos, quase 2.500 feridos. Cerca de 600 pessoas ainda estão desaparecidas.
Menos de 40 dólares por mês
A indústria têxtil responde por 80% das exportações e por mais de 40% da força de trabalho industrial de Bangladesh. Um trabalhador têxtil típico do país ganha menos de 40 dólares por mês. A maioria deles trabalha cerca de 10 horas por dia, seis dias por semana.
Bangladesh exporta anualmente cerca de 15,6 bilhões dólares em em peças de vestuário. Do total, 60% são destinados à Europa, enquanto os Estados Unidos importam 23%, e o Canadá, 5%, de acordo com dados do Ministério para Indústria e Comércio do país.
O acidente mais recente mostra que muitas dessas tragédias poderiam ter sido ser evitadas. Apenas dois dias antes, um funcionário do governo da cidade havia encontrado rachaduras em seis colunas de sustentação do prédio, localizado no subúrbio de Savar, a 30 quilômetros de Daca.
Depois disso, as autoridades municipais pediram aos inquilinos que desocupassem o Rana Plaza, como a construção era chamada. O dono, Mohammed Sohel Rana, um político local do partido governista Liga Awami, interveio e garantiu que sua propriedade estava em bom estado. Ele teria mandado pessoalmente as operárias voltarem ao trabalho. Pouco tempo depois, tudo veio abaixo.
Nos dois pisos inferiores da construção, havia um banco privado, lojas e escritórios. Os andares superiores eram alugados por cinco fábricas que produziam roupas prontas para os países ocidentais. Entre os clientes, estão empresas do Reino Unido e da Espanha. Outras, de Alemanha, França, Itália e Estados Unidos, estão atualmente revisando seus registros para confirmar se comprava daquelas fábricas.
Aparentemente, Sohel Rana tinha permissão para a construção do edifício. Mas ele acrescentou ilegalmente mais três andares aos cinco que estavam previstos. Além disso, o prédio fora construído ilegalmente num terreno onde antes havia um lago. Segundo especialistas, o solo instável pode ser uma das causas do desastre, além da utilização de materiais de baixa qualidade e, possivelmente, também o grande peso das máquinas de costura nos andares superiores.
Práticas ilegais
Há anos, sabe-se que tais práticas ilegais de construção são parte do cotidiano de Bangladesh, onde frequentemente normas de segurança são simplesmente ignoradas. Fios elétricos ficam expostos ou pendurados em tetos e paredes. Para economizar dinheiro, as fundações não são construídas em profundidade segura. Prédios construídos para um determinado fim acabam, com frequência, sendo usados com outros objetivos.
Quando são descobertas falhas no momento da autorização do projeto, muitas vezes funcionários públicos são intimidados ou subornados. O resultado é que edifícios caem ou se incendeiam com uma regularidade assustadora.
"Cerca de um quinto dos 360 mil prédios de Daca são considerados sob alto risco de desabamento e podem cair a qualquer momento", afirma o professor ASM Maksud Kamal, especialista em gestão de desastres em Daca, em entrevista à DW. Além deles, afirma, mais 135 mil edifícios são classificados como parcialmente comprometidos ou perigosos. "Os prédios não foram construídos de acordo com as regras."
O fato de o proprietário, Sohel Rana, pertencer ao partido do governo, torna o incidente ainda mais delicado. "Muitos donos de fábricas em Bangladesh são políticos ou pertencem a um grande partido. Mais de 10% dos deputados têm participação em fábricas de peças de vestuário", observa Brad Adams, da Human Rights Watch. Ele afirma não conhecer um único caso em que o proprietário de uma fábrica acidentada tenha sido processado.
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