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Quem diria que também teríamos que nos isolar?

6 de abril de 2020

Há pouco tempo, era difícil imaginar viver uma situação semelhante à da China para conter o coronavírus. Em Berlim, a ficha ainda não caiu para alguns, e a polícia registrou centenas de infrações nas últimas semanas.

Portão de Brandemburgo
Pandemia esvaziou pontos turísticos em Berlim Foto: picture-alliance/AP Photo/M. Schreiber

Quem diria há algumas semanas que enfrentaríamos uma situação como a atual? Quando começaram a surgir os primeiros casos da covid-19 na China, quem imaginava que pouco tempo depois estaríamos numa situação semelhante em todo o mundo?

Lembro de estar na casa de uma amiga em meados de janeiro e de conversarmos sobre a quarentena decretada em Wuhan. "Dificilmente isso poderia ocorrer aqui. Esse tipo de medida só é possível na China", havia sido a nossa ingênua conclusão na época.

Agora, medidas de isolamento social foram adotadas em quase no mundo todo, embora em diferentes níveis. Aqui em Berlim, a ficha demorou a cair para alguns, e para outros ainda não caiu. Em meados de março, o governo local decretou o fechamento de casas noturnas e bares da cidade diante do avanço do surto do novo coronavírus na cidade. Mesmo assim, muitos berlinenses continuaram a lotar parques e promover as chamadas "festas corona".

Supermercados estavam lotados, a população comprando todo o estoque de papel higiênico, produtos de limpeza, desinfetantes, macarrão e farinha disponíveis. Uma semana depois, a Alemanha toda ordenou o fechamento de lojas não essenciais e proibiu interações que envolvam mais de duas pessoas em espaços públicos, com exceção daqueles que dividem o mesmo teto.

Em Berlim, exercícios ao ar livre continuaram permitidos, respeitando as regras de reuniões de, no máximo, dois indivíduos, mas ainda há aqueles que ignoravam as restrições e aproveitavam os dias livres para passar um tempo em parques da cidades com amigos. Em alguns casos, policiais que fazem o controle chegaram a ser atacados por grupos. Desde 23 de março, quando as medidas restritivas foram ampliadas, até 1º de abril, a polícia registrou na capital alemã mais de 460 infrações.

Na quinta-feira passada, o governo local aprovou multas que variam de 25 euros (142 reais) a até 10 mil euros (56 mil reais) para quem desrespeitar as medidas impostas contra o novo coronavírus. Assim como em outros lugares, aqui as regras costumam ser mais respeitadas se pesarem no bolso dos infratores.

As multas serão aplicadas para aqueles que não respeitarem a distância mínima de 1,5 metro em espaços públicos, andarem em grupos com mais de duas pessoas, não respeitarem a quarentena imposta àqueles que foram diagnosticados com a covid-19 ou tiveram contato com infectados, e ainda para quem abrigar turistas em suas residências.

Berlim estendeu até 19 de abril as medidas restritivas. O secretário estadual do Interior, Andreas Geisel, acredita, porém, que somente a partir de maio a cidade poderá começar a voltar ao normal e que algumas restrições e medidas de distanciamento social deverão ser aplicadas até o final do ano.

Essas poucas semanas de isolamento, sobretudo, têm se revelado verdadeiros desafios para muitos. Simplesmente ficar em casa e trabalhar de casa se mostrou bem mais complicado do que o imaginado. O tempo parece passar muito mais rápido do que no escritório muitas vezes.

O dia acaba rapidamente, e mais uma vez tantos planos ficam só no papel. Eu tinha a esperança de assistir a séries, filmes e documentários que ainda não tinha tido tempo e de ler diversos livros, mas ainda não consegui me organizar para ter tempo de fazer tudo o que desejo neste período. Também achei que seria muito tranquilo não precisar sair, afinal, sempre gostei de ficar em casa, mas confesso que me incomoda não ter mais o poder de decidir se quero ficar em casa.

Há também aspectos positivos no isolamento. Com novas tecnologias, alguns hábitos mais antigos, que acabaram se perdendo, estão voltando com força. Não havia mais tempo para telefonar para amigos, sempre a correria do cotidiano atropelava uma conversa, que ia ficando para o dia seguinte e não acontecia, e o papo acabava restrito a aplicativos de mensagens.

Com o isolamento, muitos estão retomando o contato mais frequente com amigos e parentes. Voltamos a telefonar para eles e a receber ligações inesperadas. Transformamos os encontros em cafés ou jantares virtuais. Passamos a trocar fotografias das atividades diárias e a perguntar como passaram o dia. Espero que quando tudo isso acabar, esse contato virtual mais próximo continue fazendo parte da nossa rotina. Até lá, vamos levando o isolamento sem muitas expectativas.

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Clarissa Neher é jornalista da DW Brasil e mora desde 2008 na capital alemã. Na coluna Checkpoint Berlim, escreve sobre a cidade que já não é mais tão pobre, mas continua sexy. Siga-a no Twitter.

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