Quem era o líder da Al Qaeda morto pelos EUA no Afeganistão
2 de agosto de 2022
Braço direito de Bin Laden e um dos mentores dos atentados de 11 de setembro de 2001, Ayman al-Zawahiri chefiava a organização terrorista há uma década.
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Médico descrito por seus colegas de faculdade como tímido, o egícpio Ayman al-Zawahiri tinha 71 anos e era um dos terroristas mais procurados do mundo. Na noite desta segunda-feira (01/08), mais de uma década depois de assumir o posto de líder da rede Al Qaeda no lugar de Osama Bin Laden, ele foi declarado morto pelo governo americano.
Al-Zawahiri morreu após um ataque executado por um drone dos EUA em Cabul, capital do Afeganistão, no final de semana. A confirmação ocorreu somente no início desta semana.
De acordo com o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, abater Al-Zawahiri era essencial para assegurar que as regiões controladas por talibãs em território afegão não sirvam mais de base para o planejamento de ataques terroristas em todo o mundo.
Al-Zawahiri assumiu o controle da Al Qaeda depois que Bin Laden foi morto por forças especiais dos EUA no Paquistão, em 2011. Uma década antes, ele havia ajudado a coordenar os ataques de 11 de setembro, que mataram cerca de 3 mil pessoas.
Após esse atentado, a Interpol ordenou a busca e a captura do egípcio, que nasceu em uma família próspera no bairro de Gizé, no subúrbio da cidade do Cairo.
As acusações de ações terroristas no seu país natal e também de ser um dos chefes da Al Qaeda levaram o FBI a colocá-lo na lista dos criminosos mais procurados do mundo, com uma recompensa de 25 milhões de dólares a quem repassasse informações que levassem a sua prisão.
Autoridades internacionais acreditavam que ele vivia escondido entre o Afeganistão e o Paquistão. Ele costumava aparecer em vídeos defendendo a causa islâmica em sites sobre o tema, comentando eventos atuais e também lembrando seu compromisso contra aqueles que ele considerava inimigos do islã.
Uma das últimas aparições ocorreu justamente em uma gravação feita no ano passado, em ocasião do 20º aniversário dos ataques de 11 de setembro. No vídeo, intitulado "Jerusalém nunca será judaizada", Al-Zawahiri, vestido com uma túnica e uma longa barba branca, fala por mais de uma hora sobre diversos temas, especialmente a respeito da causa palestina.
Durante os anos em que liderou a Al Qaeda, na última década, Al-Zawahiri viu a organização enfraquecer e sofrer várias ramificações. Com isso, presenciou, por exemplo, o surgimento do grupo Estado Islâmico (EI), a partir de uma divisão da própria Al Qaeda.
Suspeito e preso desde a adolescência
Observador religioso desde a infância, Al-Zawahiri teve o seu nome associado a militantes islâmicos desde a adolescência, quando passou a seguir os ensinamentos de Sayyid Qutb, o pai do moderno jihadismo salafista. Aos 15 anos, foi preso, acusado de integrar a Irmandade Muçulmana, uma organização fundada em 1928 e que se difundiu com mais força nos anos 70 no mundo islâmico.
Alguns anos depois, Al-Zawahiri juntou-se ao grupo terrorista Jihad (Guerra Santa), que foi criado no Egito no fim da década de 60.
O primeiro atentado do qual ele foi acusado ocorreu em 1981: o assassinato do presidente egípcio Anwar el Sadat, então líder do país desde 1970, durante um desfile militar na cidade do Cairo. Por isso, foi condenado a três anos de prisão, onde teria sido torturado, o que, segundo seus biógrafos, teria lhe radicalizado ainda mais.
Depois de cumprir a pena, viajou à Arábia Saudita – centro do islamismo mais radical – e ao Paquistão. Em 1985, encontrou-se pela primeira vez com Osama Bin Laden, líder e fundador da Al Qaeda, que surgiu oficialmente no final dos anos 80, mas que já atuava em frentes paramilitares contra a invasão soviética no Afeganistão (1979-1989).
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Passaportes falsos em busca de doações
No início dos anos 90, Al-Zawahiri seguiu junto com Bin Laden para o Sudão, uma vez que o então chefe da Al Qaeda havia sido expulso da Arábia Saudita. No meio da década, ele foi um dos responsáveis por buscar doações financeiras para o grupo.
Estima-se que o uso de passaportes falsos o levou inclusive aos Estados Unidos e ao Reino Unido à procura de suporte financeiro.
Em 1995, Al-Zawahiri apareceu em um vídeo, ao lado de Bin Laden, no qual ambos ameaçavam os Estados Unidos pela prisão do xeque egípcio Omar Abdel Rahman, acusado de participação no atentado à bomba de 1993 no World Trade Center, em Nova York.
Já no fim da década, em 1998, foi um dos signatários, junto com Bin Laden, de um documento em que ambos ordenavam ataques a alvos americanos em todo o mundo.
Um ano depois, ele, Bin Laden e outros 14 integrantes da Al Qaeda foram indiciados pelos EUA devido aos ataques terroristas nas embaixadas americanas na Tanzânia e no Quênia que causaram cerca de 240 mortes.
Nesse mesmo ano, em um julgamento contra jihadistas no Egito, Al-Zawahiri e seu irmão Mohammed foram condenados à morte.
Depois dos ataques de 11 de setembro de 2001, em Nova York, a Al Qaeda promoveu uma série de outros atentados em todo o mundo, a exemplo de Bali e Jacarta, na Indonésia; Mombaça, no Quênia; Riade, na Arábia Saudita; Istambul, na Turquia; Madri, Espanha; e Londres, Reino Unido.
Como ocorreu a morte de Ayman al-Zawahiri
A morte de Ayman al-Zawahiri teria ocorrido na manhã do último domingo, quando ele havia saído para a varanda da casa onde estava escondido – um hábito que já vinha sendo observado pelos serviços secretos dos EUA. Via drone, dois mísseis Hellfire atingiram a residência e mataram o líder da Al Qaeda.
Segundo analistas e autoridades americanas, havia a suspeita de que Al-Zawahiri estava no Afeganistão porque a mulher e familiares dele tinham se mudado para Cabul.
A partir de agora, a Al Qaeda busca um sucessor para o então líder. Conforme o ex-agente libanês-americano e perito sobre a organização, Ali Soufan, o também egípcio Saif al-Adl é um dos candidatos mais temidos pelo Ocidente para assumir o cargo. Venerado dentro do grupo, ele teria a experiência e o carisma necessários para atrair antigos desertores.
No entanto, a Al Qaeda enfrenta uma crise devido a essa sucessão e, por isso, tem um possível futuro instável. Além das rivalidades com outros grupos extremistas, os conflitos no Oriente Médio, na África e na Ásia têm facilitado a atuação de organizações jihadistas locais em vez de globais, como é a Al Qaeda, aponta o especialista em redes de extremistas violentos, Charles Lister.
gb (EFE, Lusa)
A intervenção dos EUA no Afeganistão
Há 20 anos, após o 11 de Setembro, os EUA enviavam seus primeiros soldados ao país. Reveja os principais acontecimentos desde então: da operação Liberdade Duradoura à retomada do país pelos fundamentalistas do Talibã.
Foto: Evan Vucci/AP Photo/picture alliance
Operação Liberdade Duradoura
Em outubro de 2001, menos de um mês após aos ataques de 11 de Setembro, o presidente George W. Bush lança no Afeganistão a operação Liberdade Duradoura, depois que o regime Talibã se recusa a entregar Osama bin Laden. Em semanas, os americanos derrubam o Talibã, que ocupava o poder desde 1996. Cerca de mil soldados são enviados ao país em novembro, aumentando para 10 mil um ano depois.
Foto: picture-alliance/DoD/Newscom/US Army Photo
Talibã se reagrupa
A invasão do Iraque em 2003 se torna a maior preocupação dos EUA e desvia a atenção do Afeganistão. O Talibã e outros grupos islamistas se reagrupam em seus redutos no sul e leste do Afeganistão. Em 2008, Bush concorda em enviar soldados adicionais ao país em meio a pedidos por uma estratégia efetiva contra o Talibã. Em meados de 2008, há 48.500 soldados americanos no país.
Foto: picture alliance/Photoshot
Obama é eleito
Em sua campanha, Barack Obama promete encerrar as guerras no Iraque e no Afeganistão. Mas nos primeiros meses de sua presidência, em 2009, há um aumento no número de soldados no Afeganistão para cerca de 68 mil. Em dezembro, o número cresce ainda mais, para 100 mil, com o objetivo de conter o Talibã e fortalecer instituições afegãs.
Foto: AP
Morte de Bin Laden
Osama bin Laden, líder da Al Qaeda que esteve por trás dos ataques de 11 de Setembro, é morto em maio de 2011 em seu esconderijo, durante uma operação de forças especiais americanas no Paquistão.
Foto: picture-alliance/dpa
Acordo com Afeganistão
O Afeganistão assina em setembro de 2014 um acordo bilateral de segurança com os EUA e texto similar com a Otan: 12.500 soldados estrangeiros, dos quais 9.800 norte-americanos, permaneceriam no país em 2015. Mas a situação de segurança piora. Em meio à ressurgência do Talibã, Obama diminui a velocidade de retirada em 2016, afirmando que 8.400 soldados permaneceriam no Afeganistão.
Foto: Reuters
Bombardeio de hospital em Kunduz
Em outubro de 2015, no auge do combate entre insurgentes islâmicos e o Exército afegão, apoiado por forças da Otan, um ataque aéreo dos EUA atinge um hospital dirigido pela organização Médicos Sem Fronteiras na província de Kunduz. O ataque deixa 42 mortos, inclusive 24 pacientes e 14 membros da ONG.
Foto: Getty Images/AFP
"Mãe de todas as bombas"
Em abril de 2017, forças americanas atingem posições do "Estado Islâmico" (EI) no Afeganistão com a maior bomba não nuclear já usada pelo país em combate, matando 96 jihadistas. Em julho, é morto o novo líder do EI no país.
Foto: Reuters/U.S. Department of Defense
"Estamos diante de um impasse"
Em fevereiro de 2017, um relatório do governo dos EUA mostra que as perdas entre as forças de segurança afegãs subiram 35% em 2016 em relação ao ano anterior. Pouco depois, o general americano à frente das forças da Otan, John Nicholson (esq., ao lado do secretário da Defesa John Mattis), alerta que precisa de mais milhares de soldados: “Acredito que estamos diante de um impasse."
Foto: Reuters/J. Ernst
Trump anuncia nova estratégia
Em 21 de agosto de 2017, o presidente Donald Trump anuncia nova estratégia para o Afeganistão, fazendo da caça a terroristas a principal prioridade. Trump não especifica um aumento do número de soldados como esperado, mas diz que os objetivos incluem "obliterar" o Estado Islâmico, "esmagar" a Al Qaeda e impedir o Talibã de dominar o Afeganistão.
Foto: picture-alliance/Pool via CNP/MediaPunch/M. Wilson
EUA negociam com rebeldes
Em julho de 2018, sob o governo do presidente Donald Trump, os EUA entram em negociação com o Talibã, sem envolver o governo afegão eleito ou os parceiros da Otan.
Foto: picture-alliance/dpa/AP Photo/Qatar Ministry of Foreign Affairs
Trump cancela encontro com Talibã
Em setembro de 2019, o presidente Trump cancela na última hora uma reunião marcada em sigilo com líderes do Talibã e do Afeganistão, após o grupo islamista assumir a autoria de um ataque em Cabul que matou um soldado americano e outras 11 pessoas.
Foto: Getty Images/M. Wilson
EUA e Talibã assinam acordo de paz
Em fevereiro de 2020, sob o regime Trump, os governos dos EUA e do Afeganistão anunciam a retirada completa das tropas americanas e de outros países da Otan. O pacto assinado pelo negociador especial dos EUA para a paz, Zalmay Khalilzad, e pelo líder político talibã mulá Abdul Ghani Baradar, prevê que o número de militares estrangeiros seria reduzido gradualmente, ao longo de 14 meses.
Foto: AFP/G. Cacace
Biden anuncia retirada total das tropas
Em 14 de abril de 2021, o presidente Joe Biden comunica à população americana que a guerra mais longa do país terá fim, com as tropas dos EUA e da Otan se retirando inteiramente do Afeganistão até 11 de setembro, 20º aniversário dos ataques terroristas em Nova York.
Foto: Andrew Harnik/AFP/Getty Images
EUA e Otan iniciam retirada
EUA e Otan iniciam formalmente, em 1º de maio de 2021, a retirada de todas as suas tropas do Afeganistão. A previsão era retirar até 11 de setembro entre 2.500 e 3.500 soldados americanos e cerca de outros 7 mil soldados da Otan. Estima-se que os EUA tenham gasto mais de 2 trilhões de dólares no país, em 20 anos, de acordo com o projeto Costs of War da Universidade Brown.
Foto: Michael Kappeler/dpa/picture alliance
Americanos entregam base ao governo afegão
Em 2 de julho de 2021, tropas dos EUA partem da base aérea de Bagram, ponto focal da guerra, e entregam o local ao governo afegão. Permanecem no país asiático alguns poucos soldados, numa pequena base na capital Cabul.
Foto: Rahmat Gul/AP/picture alliance
Talibã toma capitais regionais
Aproveitando o vácuo deixado pela retirada das tropas de paz internacionais do Afeganistão, guerrilheiros do Talibã tomam, no inicio de agosto de 2021, capitais regionais como Sheberghan, Kunduz e Zaranj, num duro golpe para o governo afegão, que lutava para defender as cidades mais importantes da ofensiva do grupo extremista.
Foto: Abdullah Sahil/AP Photo/picture alliance
EUA retiram seus cidadãos do Afeganistão
Em meados de agosto, Estados Unidos e outros países começam a retirar seus cidadãos do Afeganistão, enquanto forças militares americanas se esforçam para proteger e manter funcionando o aeroporto de Cabul. Com todos os voos comerciais cancelados, milhares de afegãos invadem a pista do aeroporto desesperados, tentando embarcar em qualquer aeronave que fosse decolar.
Foto: Wakil Kohsar/AFP
Talibã ocupa palácio presidencial
O Talibã toma a capital Cabul, em 15 de agosto de 2021, dissolvendo o governo e estendendo seu controle sobre todo o Afeganistão. A capital era um dos últimos redutos ainda sob a autoridade do presidente Ashraf Ghani. Assim como ocorreu com dezenas de outras cidades, ele é tomada sem resistência efetiva das tropas governamentais. Ghani foge do país.
Foto: Zabi Karim/AP/picture alliance
Biden defende retirada das tropas
Um dia depois da tomada de Cabul, o presidente dos EUA, Joe Biden, defende a decisão de pôr fim à presença americana no Afeganistão e condena líderes e políticos afegãos que abandonaram o país, abrindo caminho para a tomada de poder pelo Talibã. Biden culpa ainda o ex-presidente Donald Trump, por ter fortalecido o grupo rebeldes e deixado os talibãs em sua melhor situação militar desde 2001.