O gênio universal da Toscana morreu há 500 anos. Artista e cientista, apesar da origem humilde ele se tornou um dos homens mais conhecidos do Renascimento.
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Em 2019, mais precisamente nesta quinta-feira (02/05), o mundo lembra os 500 anos da morte daquele que foi, talvez, o maior artista do Renascimento: Leonardo da Vinci.
Para lembrar a data, numerosas exposições focam a obra e a vida do artista e cientista. Em Paris, o Louvre mostrará uma retrospectiva no fim do ano. De 24 de maio a 13 de outubro, 200 desenhos estarão expostos no Palácio de Buckingham, em Londres.
Para Leonardo da Vinci, arte e ciência eram inseparáveis. Na verdade, tudo era indissociável para ele: extremamente curioso, queria compreender o mundo e fazer suas descobertas científicas fluírem para sua produção artística.
Ainda criança, sentava-se à porta de casa com um livrinho de esboços, observava as nuvens, desenhava e anotava o que via. Quando adulto, dissecava secretamente cadáveres para expandir seus conhecimentos de estrutura corporal, musculatura, articulações e proporções físicas.
Obras-primas de Leonardo da Vinci
Passados 500 anos de sua morte, pouco menos de 20 pinturas existentes são atribuídas ao grande mestre renascentista. Mas seu trabalho vai além da arte de pintar. Ele fez esboços de arquitetura, anatomia e tecnologia.
Foto: picture-alliance/United Archive
"Mona Lisa"
A pintura mais famosa de Leonardo da Vinci, realizada no auge do Renascimento italiano, está no Louvre de Paris. O ano de sua conclusão é tão incerto quanto a verdadeira identidade da modelo: a florentina Lisa del Giocondo, esposa do comerciante de tecidos Francesco di Bartolomeo de Zanobi del Giocondo, é considerada uma forte candidata, mas muitos historiadores discordam.
Foto: picture-alliance/United Archive
"Salvador do mundo"
O trabalho foi arrematado na casa de leilões Christie's pelo príncipe herdeiro saudita, Mohammed bin Salman, em 2017, pela soma recorde de 450 milhões de dólares. Realizado por volta de 1500, é uma das menos de 20 pinturas existentes do mestre. Em 1958, a obra mudou de proprietário por apenas 60 dólares, pois se acreditava que não era um original. A autenticidade ainda hoje é controversa.
Foto: Getty Images/AFP/T. Akmen
"São João Batista"
João Batista, que segundo o Novo Testamento preparou o caminho de Jesus, reconhecendo-o como o Messias, também está no Louvre. Sua serenidade é uma expressão de seu conhecimento. Entre 1513 e 1515, Leonardo esteve a serviço do Vaticano. Encomendada provavelmente pelo papa Leão 10°, trata-se talvez da última pintura a óleo de Da Vinci.
Foto: picture-alliance/akg-images/A. Held
"Última ceia"
Não a "Mona Lisa", mas a "Última ceia" na parede norte do refeitório no convento dominicano de Santa Maria delle Grazie, em Milão, é considerada a obra-prima de Leonardo da Vinci. Ela foi restaurada várias vezes porque a pintura a seco do final do século 15 é menos durável que os afrescos pintados sobre reboco úmido. A "Última ceia" é um Patrimônio da Humanidade.
Foto: picture-alliance/R. Goldmann
"Virgem do fuso"
A pintura original não foi preservada, mas há duas cópias feitas por discípulos de Leonardo: uma faz parte de uma coleção particular em Nova York e outra foi roubada em 2003 do castelo escocês Drumlanrig Castle. Em 2007, ela reapareceu numa ação de busca e hoje está exposta na Galeria Nacional da Escócia. Mesmo não se tratando de um original, ela foi avaliada na época em 40 milhões de euros.
Foto: Getty Images/J. Mitchell
"Autorretrato"
Obras de arte de 500 anos não conseguem escapar de dúvidas sobre sua autenticidade: no "Autorretrato", propriedade da Biblioteca Real de Turim, nem a autoria nem a identidade da pessoa representada são consideradas seguras. Segundo os especialistas, o desenho a sanguínea, uma espécie de giz vermelho, pode ter sido executado muito depois da morte de Leonardo Da Vinci.
Foto: Getty Images/AFP/M. Bertorello
"Parafuso" voador
O gênio universal investiu menos na pintura do que em outras ciências: Da Vinci fez esboços de arquitetura, biologia, tecnologia e anatomia. Ocasionalmente, sua obsessão pela pesquisa se interpôs em seu caminho criativo. O esboço aqui mostrado, o "Helix Pteron" ou "asa helicoidal", é um prenúncio do helicóptero. Mas ele ainda não dispunha dos materiais apropriados para construí-lo.
Foto: Imago/United Archives
"Homem vitruviano"
O espírito inventivo foi provavelmente uma das razões pelas quais há tão poucos quadros de Leonardo: ele nem sempre se dedicava à pintura. Esse rascunho se baseia na representação ideal de proporções humanas de Vitrúvio, arquiteto da Antiguidade romana. O esboço é considerado símbolo universal de simetria, beleza e consciência corporal.
Foto: picture-alliance/akg-images
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Leonardo nasceu em 15 de abril de 1452 em Anchiano, um distrito do município de Vinci, na Toscana. Seus pais, um tabelião e uma empregada doméstica de 16 anos, não eram casados. Ele cresceu com o avô e gostava de desenhar. Por fim, conseguiu uma vaga de aprendiz na oficina do renomado escultor Andrea del Verrocchio, que trabalhava para os Médici, família de comerciantes e banqueiros que dominou Florença por séculos com seu dinheiro e poder.
Da Vinci adentrou círculos sociais mais elevados e tornou-se membro da associação de artistas florentinos Guilda de São Lucas. Seus meticulosos retratos e imagens de Nossa Senhora logo se destacaram. Ele guardou algumas de suas pinturas consigo, no ateliê, por décadas, retrabalhando-as reiteradamente. Uma dessas obras é a mundialmente famosa Mona Lisa, que hoje pode ser visto no Louvre em Paris.
Quer sonhadoras, quer autoconfiantes e esclarecidas, as mulheres o atraíam – mas apenas na tela: na vida privada ele se interessava por homens. Em seus retratos femininos também contrariava as convenções da época: em vez de pintá-las de perfil, como era o costume, elas encaram o espectador.
Mas seria injusto reduzir Da Vinci apenas à arte de pintar. Por um lado, ele não realizou tantos quadros, pouco mais de uma dezena de pinturas lhe são atribuídas com certeza. Por outro, ele deixou numerosos estudos e esboços de anatomia, com explicações em escrita reversa, assim como plantas construtivas sem qualquer pretensão artística, incluindo desenhos de tanques, equipamentos de voo ou mergulho. Desenhou pontes e projetou uma cidade inteira, porém a maioria de suas ideias jamais foi realizada.
Florença, Milão e Roma, as capitais do Renascimento, foram seus locais de atuação. Lá Leonardo da Vinci encontrou clientes, famílias ricas e até mesmo o papa. Em 1516 foi convidado para morar com o rei francês Francisco 1º, mecenas que lhe proporcionou toda a liberdade para se dedicar a seus projetos.
Uma de suas tarefas era organizar as stravaganze reais, festas esplêndidas e inebriantes. Em 2 de maio de 1519, o gênio universal da província toscana morreu no castelo Château Clos Lucé; segundo a lenda, nos braços do monarca francês.
Seja por terem sido roubadas, proibidas ou por terem pertencido a Hitler, além da qualidade artística, outros motivos podem colaborar para a celebridade de uma pintura.
"Madona Sistina"
Todos os anos, centenas de milhares de pessoas vão a Dresden ver a "Madona Sistina", uma das principais obras do Renascimento, pintada por Rafael Sanzio em 1512. Em 1754, o rei Augusto 3° a comprou de monges italianos, trazendo-a para a Saxônia. Após a guerra, a obra foi levada para Moscou, onde permaneceu por mais de uma década. A fama da pintura, no entanto, se deve a outro motivo.
Foto: picture-alliance/dpa
Anjos rafaelitas
Na parte inferior do quadro, Rafael pintou seus famosos anjos, de forma bastante humana, quase como crianças sem fazer nada e dando espaço a várias interpretações. E logo os querubins apareceram em caixinhas de joias, ou até mesmo como dois porquinhos na propaganda de um açougue em Chicago no fim do século 19, sem falar de camisetas, papéis de carta, bolas de natal, embalagem de chocolate...
Foto: picture-alliance/dpa
"Autorretrado com orelha cortada"
Na véspera de Natal de 1888, Vincent van Gogh foi encontrado ensanguentado em sua casa no sul da França. Ele havia cortado parte da orelha esquerda e entregue a uma prostituta em Arles, onde dividia um ateliê com Paul Gauguin. Este autorretrado foi pintado em 1889 e testemunha o desequilíbrio de Van Gogh diante da partida do amigo. Pela posição da orelha, o quadro foi feito diante de um espelho.
"A arte da pintura"
Jan Vermeer foi um mestre da encenação, não somente pela cortina em "A arte da pintura", onde retrata a si mesmo e a Clio, musa da história, e um mapa da antiga Holanda unida. Um apelo nostálgico, pois o quadro foi pintado entre 1664 e 1673, após a divisão do país. A obra pertenceu a Adolf Hitler, que a havia comprado de um conde austríaco. Após a guerra, foi devolvida à Áustria pelos americanos.
Foto: Wikipedia/Gemeinfrei
"Mona Lisa"
Desde o fim do séc. 18, a "Mona Lisa" está no Museu do Louvre. Mas de lá sumiu em 1911. E a suspeita recaiu sobre Pablo Picasso e o poeta Apollinaire, que estiveram envolvidos num furto de esculturas do museu. Mas a culpa deles não pôde ser comprovada e o quadro foi encontrado só dois anos depois. Ele fora roubado por um operário italiano que trabalhava no Louvre e que tentou vendê-lo na Itália.
Foto: Imago/Cinema Publishers Collection
"Mar de gelo"
Apesar de ter vivido há 200 anos, o fato de ter produzido quadros completamente artificiais faz do alemão Caspar David Friedrich um pintor muito moderno em tempos de mundos virtuais. Sua pintura "Mar de gelo", executada em 1823/1824, poderia ter saído da tela de um computador e comprova que o Romantismo está mais atual do que nunca numa sociedade marcada pela necessidade de segurança e intimidade.
Foto: picture-alliance/akg-images
"A lição de anatomia"
Diz-se que a violência é para nossos dias o que a sexualidade foi para época vitoriana: outra obra icônica e bastante atual é "A lição de anatomia", pintada em 1632 por Rembrandt. Na época, só era permitida uma dissecação pública por ano, realizada no inverno para melhor conservação do corpo, que tinha de ser de um criminoso executado. Por serem raros, tais eventos eram acontecimentos sociais.
Foto: cc
"Melancolia"
Na Idade Média, a melancolia foi um pecado capital. Ela abatia não só pessoas normais, mas também religiosos, que não conseguiam encontrar mais em Deus a resposta para todos os seus problemas. Assim, nada mais que um anjo caído e triste na gravura "Melancolia I", executada em 1514 por Albrecht Dürer, para anunciar o Renascimento e o fato de, a partir daí, a humanidade estar estregue à sua sorte.
Foto: Biblioteca Digital Hispánica
"A origem do mundo"
Gustave Courbet pintou este quadro em 1866 para um diplomata turco e não se sabe quem lhe serviu de modelo. Mas retratar seus órgãos genitais sem nenhum filtro mitológico foi ato decisivo rumo ao modernismo. A obra pertenceu ao psicanalista francês Jacques Lacan e foi mostrada ao público pela primeira vez somente em 1988. Ela está hoje no Museu d'Orsay, em Paris, com direito a vigilante próprio.
Foto: Reuters/P. Wojazer
"Guernica"
Picasso retratou em "Guernica" o bombardeio da cidade basca pelos alemães em 1937. Consta que, ao ver uma pequena foto do quadro no estúdio do pintor em 1944 na Paris ocupada, um oficial alemão perguntou: "Foi você que fez isto?", no que ele respondeu: "Não, foram vocês." Picasso determinou que a obra ficasse sob a guarda do MoMA de Nova York até que a democracia fosse restaurada em seu país.
"Abaporu"
Pintado em 1928 por Tarsila do Amaral, o "Abaporu" (homem que comem gente, em tupi-guarani) não é somente a representação pictórica do modernismo brasileiro, mas também o carro-chefe do acervo do museu Malba, em Buenos Aires. É triste, mas é verdade. Ele não está mais no Brasil. Foi vendido em 1995 para um colecionador argentino, já que na época, não se encontrou um comprador brasileiro.