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"Querendo ou não, Facebook faz controle editorial"

26 de julho de 2018

Após plataforma tirar do ar dezenas de páginas e perfis no Brasil, acusados de espalhar desinformação, especialista em direito à privacidade na área digital aponta brechas na regulação de redes sociais no país.

Facebook
Facebook justificou a exclusão de dezenas de páginas e perfis no Brasil com o "uso de contas falsas"Foto: picture-alliance/dpa/empics/D. Lipinski

A decisão do Facebook de excluir 196 páginas e 87 perfis integrantes de uma "rede de desinformação", anunciada pela plataforma nesta quarta-feira (25/07), gerou um debate no Brasil quanto aos limites que cabem a uma empresa do setor.

O Facebook não divulgou quais páginas e perfis foram removidos, mas reportagens e comunicados ajudaram a identificar alguns dos punidos. Fontes ouvidas pela agência de notícias Reuters afirmam que a rede que foi alvo do Facebook era operada por membros do Movimento Brasil Livre (MBL). Foi o suficiente para críticos apontarem um caráter ideológico na ação.

Em entrevista à DW Brasil, Demócrito Reinaldo Filho, desembargador do Tribunal de Justiça de Pernambuco e doutor em direito à privacidade na área digital, analisa a atuação da gigante americana e o que está previsto na legislação brasileira quanto à regulação de empresas controladoras de redes sociais.

Ex-presidente do Instituto Brasileiro de Direito e Informática (IBDI), Reinaldo Filho afirma que o Facebook pode excluir contas que não cumpram as normas internas da plataforma.

"Querendo ou não, quando o Facebook remove contas, ele está fazendo um controle editorial, como qualquer veículo de mídia tradicional", afirma. O especialista critica o Marco Civil da Internet, em vigor no Brasil desde 2014, que não atribui a redes sociais a responsabilidade pelo conteúdo publicado em suas plataformas.

DW Brasil: O Facebook divulgou que páginas e perfis foram removidos pelo "uso de contas falsas", contrariando a regra de autenticidade da empresa. Muitas pessoas criticaram um possível teor ideológico nas punições. Um procurador da República chegou a pedir explicações da empresa com prazo de 48 horas e o ministro da Cultura, Sérgio Sá Leitão, chamou a ação de "censura política". O Facebook pode ou não deletar contas dessa forma?

Demócrito Reinaldo Filho: É claro que pode. Ele é o controlador da página, e quem faz uma conta se responsabiliza a obedecer as exigências da empresa. Se os termos de uso não foram obedecidos, nesse caso a questão de falta de identificação dos usuários, o Facebook tem todo o direito legal de excluir as contas. Hoje no Brasil não há uma lei que impeça a plataforma de fazer isso.

Há alguma previsão legal de controle de empresas que operam redes sociais no Brasil?

Querendo ou não, quando o Facebook remove contas dessa forma, ele está fazendo um controle editorial do seu conteúdo. Isso é uma contradição a tudo o que eles defendem quando são acionados na Justiça brasileira. Sempre que há uma reclamação sobre conteúdo inapropriado, a defesa desse tipo de empresa é que eles não fazem controle de conteúdo, apenas disponibilizam uma plataforma.

Eles fazem sim controle editorial, como qualquer veículo de mídia tradicional. Então, deveriam ser responsabilizados como tal. Mas isso não ocorre porque o Marco Civil da Internet permite uma brecha no seu artigo 19, segundo o qual essas empresas só serão responsabilizadas civilmente pelo conteúdo das postagens se desobedecerem uma ordem judicial. É o melhor dos mundos para eles.

Em janeiro deste ano, entrou em vigor na Alemanha a lei conhecida como NetzDG, que tem o objetivo de restringir o discurso de ódio e conteúdos ilegais e ofensivos na internet. A lei estabelece regras e exige medidas das empresas que controlam redes sociais, inclusive com previsão de multas milionárias, mas sofreu críticas de diversas entidades, que acusam o governo alemão de deixar às empresas a tarefa de punir conteúdo impróprio, em vez da Justiça. Como o senhor vê a lei alemã? Acredita que algo similar poderia ser implantado no Brasil?

O que o legislador da NetzDG pretendeu foi atribuir ao provedor de rede social um  mínimo de responsabilidade editorial pelo que é publicado em seu sistema. A lei alemã é boa, mesmo que seja de forma tímida. As empresas podem excluir páginas e perfis, mas precisam também prestar contas para a sociedade e para o governo sobre como fazem isso.

Escândalos recentes nos EUA e no Reino Unido envolvendo o uso de dados do Facebook mostraram que as redes sociais podem ter um papel importante em eleições. No Brasil, já há algumas iniciativas de observação e checagem de notícias falsas. Como o senhor vê essas ações e o que acha que poderia ajudar?

A melhor solução para fake news é dar responsabilidade a quem controla a plataforma. Isso não é feito de forma completa hoje. Ações pontuais como a do Facebook não vão solucionar o problema. Pelo contrário, só mostram que eles não são tão neutros quanto dizem ser.

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