Conflito completa cinco anos, e grupo de 30 ONGs denuncia aumento drástico na violência nos últimos 12 meses. Relatório aponta que EUA e Rússia também tem responsabilidade no agravamento da crise humanitária no país.
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Um grupo de 30 ONGs publicou nesta sexta-feira (11/03), dia em que a guerra civil da Síria completa cinco anos, um parecer sobre os últimos doze meses de conflito, descrevendo-os como o pior ano até então. O texto contabiliza pelo menos 50 mil mortos e quase um milhão de civis forçados a abandonar suas casas.
O relatório, assinado por organizações como Care International, Oxfam, ActionAid, Save the Children e vários grupos sírios, afirma que cerca de 200 mil casas foram parcialmente ou completamente destruídas no período, o que representa um aumento de 20% em relação a 2014.
Ainda segundo o parecer, intitulado "Fueling the Fire" (Pondo lenha na fogueira, em tradução livre), cerca de 1,5 milhão de pessoas passaram a precisar de ajuda humanitária, e 400 mil crianças deixaram de ir à escola por conta da violência no país.
Críticas a Rússia e EUA
Embora lembre que uma trégua parcial já é realidade em certas regiões da Síria desde 27 de fevereiro, o relatório atesta que algumas resoluções do Conselho de Segurança da ONU têm sido constantemente desrespeitadas por partes do conflito.
O texto também cita vários países-membros do Conselho de Segurança que, através de sua ação militar direta, têm "colocado lenha na fogueira" da guerra civil síria.
"O quinto ano do conflito da Síria foi o pior para as pessoas até então, uma vez que as partes em guerra continuaram a causar estragos, bloqueando cada vez mais a entrada de ajuda e sitiando ainda mais comunidades", escreveram os autores do parecer.
O documento de 33 páginas destaca ainda que a campanha aérea russa, que teve início em setembro, atingiu e danificou diretamente a infraestrutura civil, com relatos de milhares de civis entre as vítimas. Segundo o texto, o apoio de Moscou ao regime do presidente Bashar al-Assad incluiu a remessa de armas e munição aos militares sírios.
Da mesma forma, diz o texto, a coalizão internacional liderada pelos Estados Unidos causou mortes e diversos danos em regiões civis da Síria, por meio de seus bombardeios aéreos, além de ter sido culpada por fornecer armamento a uma série de grupos de oposição sírios.
França e Reino Unido, que mais tarde se juntariam à coalizão americana, também sofreram duras críticas, por ter gasto centenas de milhões de dólares na compra de armas, por exemplo.
"Acabem com o sofrimento"
O texto denuncia que, em 2015, as organizações de ajuda humanitária enfrentaram sérios problemas para prestar socorro às áreas sitiadas na Síria, citando um aumento de 44% nos ataques contra unidades de saúde no país.
"Em 2015, assistiu-se ao maior número de ataques a hospitais num único ano, com pelo menos 112 atentados contra estabelecimentos médicos", afirma Ahmad Tarakji, chefe da Sociedade Médica Sírio-Americana (Sams, na sigla em inglês).
O relatório desta sexta-feira diz que todas as partes – incluindo os membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU – têm responsabilidade direta pelas terríveis consequências desencadeadas pela guerra da Síria.
Os autores apelam para que essas partes "garantam o fim da violência e do sofrimento", além de "viabilizar uma paz sustentável e justa".
Desde a eclosão do conflito, em 11 de março de 2011, mais da metade dos 22,4 milhões de cidadãos sírios foram obrigados a deixar suas casas ou país.
Em agosto de 2015, as Nações Unidas estimaram que o número total de mortos em quase cinco anos de guerra civil já ultrapassava 250 mil pessoas.
A guerra civil na Síria antes do EI
O "Estado Islâmico" inflamou o debate sobre como pôr fim à guerra civil síria. Contudo o grupo só emergiu mais tarde no conflito. Confira alguns momentos dessa guerra que abriram espaço para o avanço dos jihadistas.
Foto: AP
Março de 2011
Enquanto regimes ruem por todo o Oriente Médio, dezenas de milhares de sírios vão às ruas para protestar contra a corrupção, o desemprego elevado e a alta dos preços dos alimentos. O governo da Síria responde com armas de fogo. Até maio, cerca de 400 vidas são ceifadas.
Foto: dapd
Maio de 2011
Sob insistência dos países ocidentais, o Conselho de Segurança da ONU condena a repressão violenta. Nos meses seguintes, os Estados Unidos e a União Europeia impõem embargo de armas, recusa de vistos e congelamento de bens. Com apoio da Liga Árabe, aumenta a pressão para a saída do presidente sírio Bashar al-Assad – embora sem o aval de todos os países-membros da ONU.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Szenes
Agosto de 2011
Em 1970 um golpe pusera Hafez al-Assad no poder. Após sua morte, em 2000, o filho Bashar (à dir.) assume a liderança. De início tido como reformista, ele perde apoio ao manter o estado de emergência que há décadas restringe as liberdades políticas, permitindo vigilância e interrogatórios. Assad tem respaldo da Rússia, que lhe fornece armas e repetidamente veta as resoluções da ONU sobre a Síria.
Foto: picture-alliance/dpa/Stringer/Ap/Pool
Dezembro de 2011
A ONU e outras organizações têm provas de violação dos direitos humanos na Síria. Civis e militares desertores começam a se organizar lentamente para combater as forças do governo, que vêm atacando os dissidentes. Até o fim de 2011, essa luta causa mais de 5 mil mortes. Mesmo assim, ainda transcorrem seis meses até a ONU reconhecer que o país está em guerra.
Foto: Reuters/Goran Tomasevic
Setembro de 2012
O Irã finalmente confirma que tem combatentes em solo sírio, fato que Damasco negava há tempos. A presença de tropas aliadas acentua a hesitação dos Estados Unidos e de outras potências ocidentais em intervir no conflito. Os EUA, marcados pelas intervenções fracassadas no Afeganistão e no Iraque, propõem o diálogo como única solução sensata.
Foto: AP
Março de 2013
As mortes beiram 100 mil, e o total de refugiados em países vizinhos como a Turquia e a Jordânia atinge 1 milhão – número que duplicaria até setembro. Em dois anos de guerra, o Ocidente e a Liga Árabe veem fracassar todas as tentativas de um governo de transição, enquanto o conflito transborda para a Turquia e o Líbano. O pior temor é de que Assad se mantenha no poder a todo custo.
Foto: Reuters/B. Khabieh
Abril de 2013
Há muito Assad alega estar combatendo terroristas. Mas só no segundo ano de guerra se confirma que o Exército Livre Sírio inclui extremistas radicais. O grupo Frente al-Nusra declara apoio à Al Qaeda, fragmentando ainda mais a oposição.
Foto: Reuters/A. Abdullah
Junho de 2013
A Casa Branca afirma ter provas de que Assad está atacando civis com o gás tóxico sarin. Mais tarde a informação é corroborada pela ONU. A partir da revelação, o presidente dos EUA, Barack Obama, e outros líderes ocidentais passam a considerar uma intervenção militar. No entanto a proposta da Rússia para que se retirem as armas químicas da Síria acaba por se impor.
Foto: Reuters
Janeiro de 2014
Ao fim de 2013 surgem relatos sobre um novo grupo autodenominado Estado Islâmico do Iraque e do Levante – o futuro EI. Ao tomar terras no norte da Síria e também no Iraque, os jihadistas despertam lutas internas na oposição, causando 500 mortes até o início de janeiro. Esse terceiro e inesperado fator levaria os EUA, França, Arábia Saudita e outras nações à intervir na guerra em meados do ano.