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Rússia e Ucrânia prorrogam acordo de grãos – sob incertezas

Arthur Sullivan
18 de maio de 2023

Pacto com Moscou que permite que Kiev continue exportando grãos e outros alimentos pelo Mar Negro é estendido por 60 dias. Mas dúvidas persistem sobre a questão a longo prazo.

Máquina agrícola em funcionamento
Sem o acordo de grãos, a Rússia não teria compradores para sua safra de grãos farta de 2022/2023Foto: Ukrinform/dpa/picture alliance

Cinco meses depois de a Rússia invadir a Ucrânia, em fevereiro de 2022, os dois países firmaram um acordo para permitir que Kiev – um dos principais produtores de grãos e outros produtos agrícolas – continuasse exportando grãos para mercados internacionais através do Mar Negro.

Também conhecido como Iniciativa de Grãos do Mar Negro, o pacto expiraria nesta quinta-feira (18/05), e o fluxo de navios já havia parado nos últimos dias. Mas o acordo foi prorrogado por mais 60 dias, segundo confirmou a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, Maria Zakharova, nesta quarta-feira (17/05).

Ela ressaltou, contudo, que a avaliação geral de Moscou sobre a situação em torno do acordo não mudou. A Rússia havia ameaçado desistir do pacto a menos que uma lista de condições fosse cumprida.

As demandas eram:

  • a readmissão do estatal Banco Agrícola Russo (Rosselkhozbank) no sistema internacional de pagamentos bancários SWIFT;
  • a retomada do fornecimento à Rússia de máquinas agrícolas e peças sobressalentes;
  • o fim das restrições de seguro e acesso a portos para navios e cargas russas;
  • o restabelecimento de um oleoduto bombeando amônia da cidade russa de Togliatti para o porto ucraniano de Odessa;
  • o desbloqueio de contas e atividades financeiras de empresas russas de fertilizantes.

Não ficou claro se alguma das demandas foi garantida com a prorrogação do acordo. A porta-voz Zakharova disse apenas que os trabalhos continuarão. "Prosseguimos com a obrigação de implementar os parâmetros que declaramos", afirmou a russa.

Especialistas em segurança alimentar vêm dizendo repetidamente que o fluxo contínuo de produtos ucranianos é fundamental para manter os preços globais estáveis e ajudar a evitar a fome em muitos países em desenvolvimento.

No entanto, o acordo tem sido permanentemente marcado por incertezas.

Protestos russos

A Rússia, também grande exportadora de alimentos, insiste que suas próprias exportações foram afetadas por sua exclusão do sistema de pagamentos SWIFT. Moscou também afirma que as restrições de seguro e logística para seus navios limitaram sua capacidade de exportação.

O que é Swift?

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Contudo, não há sanções específicas sobre as exportações agrícolas russas, e o país teve uma safra abundante de grãos em 2022/23, exportando um recorde de 43 milhões de toneladas. A colheita foi fortemente impulsionada pelo fato de que as exportações de trigo da Ucrânia caíram 37% em 2022 por causa da guerra.

William Moseley, professor de geografia no Macalester College, nos Estados Unidos, e membro do Painel de Especialistas de Alto Nível do Comitê de Segurança Alimentar Mundial da ONU, afirma que não é do interesse da Rússia deixar o acordo expirar.

"Como qualquer bom negociador, a Rússia quer chegar ao melhor acordo possível", disse ele à DW. "Nenhum acordo prejudicará a capacidade da Rússia de cultivar amigos no Oriente Médio e na África que dependem dos grãos do Mar Negro."

O acordo de grãos permitiu que milhões de toneladas de grãos saíssem de portos como o de Odessa Foto: BePress/abaca/picture alliance

Preços caem, mas fome global preocupa

Desde que foi introduzido, em julho de 2022, o acordo de grãos ajudou a estabilizar o preço global dos alimentos. Eles atingiram um recorde histórico após a invasão russa, mas desde então recuaram drasticamente.

"A Iniciativa de Grãos do Mar Negro proporionou um alívio muito necessário aos mercados globais, e isso se refletiu em uma redução dos preços", disse um porta-voz do Programa Mundial de Alimentos (PMA) à DW. O Índice de Preços de Alimentos da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) retornou ao nível registrado no fim de 2021.

Ainda assim, a organização humanitária afirma que a guerra, a crise climática e outros choques econômicos fazem com que os preços globais dos alimentos permaneçam no nível mais alto em dez anos.

"Os preços dos alimentos subiram pelo menos 15% em 66 países, enquanto a inflação está chegando a três dígitos na Venezuela, Líbano, Zimbábue, Síria e Argentina", diz o porta-voz do PMA.

O especialista Moseley afirma que a situação da segurança alimentar global "não é boa", apontando para os números do PMA que dizem que 345 milhões de pessoas enfrentam insegurança alimentar aguda atualmente.

Sistema alimentar enfrenta desafios sísmicos

O Programa Mundial de Alimentos havia afirmado ser vital que o acordo de grãos fosse renovado, mas que a incerteza contínua em torno dele criará volatilidade nos mercados globais de alimentos.

"O principal aqui é a sustentabilidade do comércio dos principais alimentos básicos do mundo", disse o porta-voz do PMA. "Trata-se de manter o fluxo global de alimentos e estabilizar os mercados para todos os consumidores, para que não vejamos os preços subindo novamente e atingindo mais duramente as pessoas mais pobres."

William Moseley diz que não prorrogar o acordo seria especialmente prejudicial para os países importadores de grãos no Oriente Médio, Norte da África e Chifre da África, já que o sistema global de alimentos continua basicamente o mesmo do ano passado.

"O sistema global de alimentos é como um enorme navio oceânico que leva tempo para ser redirecionado", afirma o especialista. Mas ele acredita que isso pode não ser tão perturbador quanto teria sido em 2022.

"A guerra na Ucrânia, juntamente com as interrupções na cadeia de suprimentos relacionadas à covid-19, definitivamente iniciou uma conversa sobre a necessidade de construir um sistema global de alimentos que não seja tão dependente do comércio e de alguns grandes celeiros globais", diz Moseley.

Segundo ele, muitos governos nacionais em todo o mundo têm dado muito mais ênfase à produção doméstica de alimentos.

Outro fator em potencial que tornaria um fim do acordo menos prejudicial são as rotas alternativas de fornecimento através do Leste Europeu, segundo vários representantes do setor.

"Com uma safra menor neste ano, tudo poderia ir para o oeste através do Leste Europeu. O problema é que isso custará de 15% a 20% a mais", afirmou o especialista em commodities Dan Basse à agência de notícias Reuters nesta semana.

Tais rotas mais caras poderiam ter um impacto prejudicial sobre os preços a longo prazo, caso desestimulem alguns produtores.

Além disso, há também sérias tensões entre a Ucrânia e vários países do Leste Europeu sobre o trânsito de grãos através de seus países e como isso está afetando os produtores domésticos.

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