Ofensiva em Aleppo, apoiada por Moscou, agrava drama da população e emperra negociações de paz. Membros do Conselho de Segurança defendem pausa humanitária, e Kremlin se mostra aberto a discutir proposta.
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A denúncia de que a ofensiva das tropas de Bashar al-Assad, com apoio aéreo russo, já deixou mais de 500 mortos em Aleppo aumentou a pressão para que Moscou permita um cessar-fogo humanitário na Síria. Após dias de aparente indiferença, o Kremlin acenou nesta quinta-feira (11/02) com a possibilidade de discutir a proposta.
O anúncio veio um dia depois de uma reunião do Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre a escalada do conflito na Síria. Alguns membros, liderados por França e Reino Unido, pediram à Rússia que interrompa os ataques aéreos, alegando que a ação piorou a já grave situação humanitária na região, e permita a entrada de ajuda.
"Os ataques aéreos da Rússia causaram essa crise em torno de Aleppo", ressaltou o embaixador da Nova Zelândia na ONU, Gerard van Bohemen.
Em defesa, o embaixador da Rússia na ONU, Vitaly Churkin, disse que os ataques aéreos são transparentes e acusou alguns membros do Conselho de Segurança de explorar politicamente questões humanitárias.
Potências internacionais, incluindo Rússia, Estados Unidos, além de Arábia Saudita e Irã, devem se reunir nesta quinta-feira em Munique, na Alemanha, para tentar traçar novas diretrizes para retomada as negociações de paz sobre o conflito na Síria, que foram suspensas no início do mês.
Sem cessa-fogo, sem negociação
O retorno das negociações está marcado para o dia 25 de fevereiro. Diplomatas afirmam, no entanto, que Moscou precisa interromper os ataques para que as conversas possam continuar. Rebeldes disseram que só participariam da mesa de discussões se os bombardeios pararem.
"O regime sírio e seus aliados não podem fingir que estão estendendo as mãos para a oposição, enquanto estão tentando destruí-la", disse o embaixador da França na ONU, François Delattre.
O chanceler russo, Serguei Lavrov, deve apresentar uma proposta de cessar-fogo no encontro em Munique. De acordo com o vice-ministro russo do Exterior, Gennady Gatilov, a pausa nos ataques será tema central da reunião. Gatilov disse ainda nesta quinta-feira que as negociações de paz sobre o conflito na Síria poderiam ser retomadas antes do previsto.
Segundo autoridades americanas, Moscou vai propor uma pausa nos ataques na Síria a partir do dia 1° de março. Washington acredita que a Rússia e i governo sírio tentam ganhar tempo para continuar a ofensiva contra os rebeldes por mais um período.
Ofensiva em Aleppo
De acordo com as Nações Unidas, a ofensiva em Aleppo, que teve início no começo do mês, levou mais de 35 mil sírios a deixarem a região e 10 mil deles a se dirigiram à Turquia, onde estão sendo barrados na fronteira.
Segundo a agência de notícias Tass, citando o Ministério da Defesa russo, Moscou conduziu 510 missões militares na Síria entre 4 e 11 de fevereiro. Os bombardeios teriam destruído cerca 1,9 mil alvos extremistas.
Moscou alega que os ataques aéreos são voltados para destruir grupos terroristas, porém, países Ocidentais afirmam que o governo russo não faz distinção entre jihadistas e grupos rebeldes moderados que combatem o regime sírio.
De acordo com uma reportagem publicada nesta quinta-feira pelo jornal britânico The Guardian, em cinco anos, a guerra civil na Síria já matou mais de 470 mil pessoas. A ONU afirma que o conflito obrigou 11 milhões de sírios a abandonarem suas casas. O conflito também teve um impacto na Europa, causando a maior crise de refugiados desde a Segunda Guerra Mundial.
CN/rtr/afp/ap
A guerra civil na Síria antes do EI
O "Estado Islâmico" inflamou o debate sobre como pôr fim à guerra civil síria. Contudo o grupo só emergiu mais tarde no conflito. Confira alguns momentos dessa guerra que abriram espaço para o avanço dos jihadistas.
Foto: AP
Março de 2011
Enquanto regimes ruem por todo o Oriente Médio, dezenas de milhares de sírios vão às ruas para protestar contra a corrupção, o desemprego elevado e a alta dos preços dos alimentos. O governo da Síria responde com armas de fogo. Até maio, cerca de 400 vidas são ceifadas.
Foto: dapd
Maio de 2011
Sob insistência dos países ocidentais, o Conselho de Segurança da ONU condena a repressão violenta. Nos meses seguintes, os Estados Unidos e a União Europeia impõem embargo de armas, recusa de vistos e congelamento de bens. Com apoio da Liga Árabe, aumenta a pressão para a saída do presidente sírio Bashar al-Assad – embora sem o aval de todos os países-membros da ONU.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Szenes
Agosto de 2011
Em 1970 um golpe pusera Hafez al-Assad no poder. Após sua morte, em 2000, o filho Bashar (à dir.) assume a liderança. De início tido como reformista, ele perde apoio ao manter o estado de emergência que há décadas restringe as liberdades políticas, permitindo vigilância e interrogatórios. Assad tem respaldo da Rússia, que lhe fornece armas e repetidamente veta as resoluções da ONU sobre a Síria.
Foto: picture-alliance/dpa/Stringer/Ap/Pool
Dezembro de 2011
A ONU e outras organizações têm provas de violação dos direitos humanos na Síria. Civis e militares desertores começam a se organizar lentamente para combater as forças do governo, que vêm atacando os dissidentes. Até o fim de 2011, essa luta causa mais de 5 mil mortes. Mesmo assim, ainda transcorrem seis meses até a ONU reconhecer que o país está em guerra.
Foto: Reuters/Goran Tomasevic
Setembro de 2012
O Irã finalmente confirma que tem combatentes em solo sírio, fato que Damasco negava há tempos. A presença de tropas aliadas acentua a hesitação dos Estados Unidos e de outras potências ocidentais em intervir no conflito. Os EUA, marcados pelas intervenções fracassadas no Afeganistão e no Iraque, propõem o diálogo como única solução sensata.
Foto: AP
Março de 2013
As mortes beiram 100 mil, e o total de refugiados em países vizinhos como a Turquia e a Jordânia atinge 1 milhão – número que duplicaria até setembro. Em dois anos de guerra, o Ocidente e a Liga Árabe veem fracassar todas as tentativas de um governo de transição, enquanto o conflito transborda para a Turquia e o Líbano. O pior temor é de que Assad se mantenha no poder a todo custo.
Foto: Reuters/B. Khabieh
Abril de 2013
Há muito Assad alega estar combatendo terroristas. Mas só no segundo ano de guerra se confirma que o Exército Livre Sírio inclui extremistas radicais. O grupo Frente al-Nusra declara apoio à Al Qaeda, fragmentando ainda mais a oposição.
Foto: Reuters/A. Abdullah
Junho de 2013
A Casa Branca afirma ter provas de que Assad está atacando civis com o gás tóxico sarin. Mais tarde a informação é corroborada pela ONU. A partir da revelação, o presidente dos EUA, Barack Obama, e outros líderes ocidentais passam a considerar uma intervenção militar. No entanto a proposta da Rússia para que se retirem as armas químicas da Síria acaba por se impor.
Foto: Reuters
Janeiro de 2014
Ao fim de 2013 surgem relatos sobre um novo grupo autodenominado Estado Islâmico do Iraque e do Levante – o futuro EI. Ao tomar terras no norte da Síria e também no Iraque, os jihadistas despertam lutas internas na oposição, causando 500 mortes até o início de janeiro. Esse terceiro e inesperado fator levaria os EUA, França, Arábia Saudita e outras nações à intervir na guerra em meados do ano.