Em entrevista à DW, a capitã da seleção diz querer propiciar uma despedida em grande estilo para a artilheira brasileira, que já anunciou ser esta a sua última Copa.
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A camisa amarela às vezes pesa sobre os ombros do Brasil nas Copas do Mundo.
Certamente foi assim há quatro anos, quando uma derrota nas quartas de final para a anfitriã França deixou a atacante Geyse soluçando incontrolavelmente no gramado e a goleira Bárbara sentada próxima ao gol com um olhar estupefato.
Mas após uma vitória de 4 a 0 sobre o Panamá em Adelaide, impulsionada por três gols de Ary Borges, a equipe de Pia Sundhage já pode sonhar com uma redenção contra os franceses em Brisbane neste sábado (29/07).
A capitã Rafaelle, no entanto, insiste que as jogadoras não sentem um excesso de pressão.
"Acho que, sendo brasileiras, temos essa pressão do nosso país, pois amamos o futebol. Ele é sempre o esporte número um do nosso país", disse ela à DW.
"Mas não estamos no topo do ranking da Fifa. Então não sentimos essa pressão. Vamos brigar até o fim, mas vencer o torneio não é nossa obrigação. Vamos apenas dar nosso melhor e talvez ter a chance de colocar uma estrela no peito [simbolizando uma vitória na Copa do Mundo]."
Preparação perfeita
O Brasil chegou cedo à Austrália para um treinamento de duas semanas num resort de luxo em Gold Coast, cidade litorânea no sudeste de Queensland. O local foi criteriosamente escolhido para permitir que as jogadoras se sintam em casa no clima quente. Segundo a ex-zagueira do Arsenal, isso permitiu que elas se expressassem bem, sobretudo nos aquecimentos pré-treino.
"Eu sinto que é uma vibe brasileira", disse Rafaelle. "Somos brasileiras, gostamos muito de futebol e nos divertimos jogando. Então esse é [o melhor] aquecimento para nós. Jogando assim, é como se fôssemos crianças, e nos sentimos muito bem quando estamos em campo, quando podemos brincar e nos divertir no aquecimento."
No entanto, sob esta aparência tranquila, pulsa uma séria vontade de vencer uma Copa do Mundo pela primeira vez. E uma equipe que combina a experiência de Debinha, Rafaelle, Tamires e Andressa Alves com novos talentos como Geyse, Borges e Aline Gomes, de 17 anos, certamente tem potencial para tal.
Ninguém duvida disso quando se fala no talismã da equipe: Marta, de 37 anos. Disputando sua sexta Copa do Mundo, a atacante busca quebrar seu próprio recorde de 115 gols em 175 partidas pela seleção.
Marta, talvez a primeira superestrela global do futebol feminino, anunciou que esta Copa será sua última. É difícil fazer justiça ao impacto da atacante no jogo e na equipe, diz Rafaelle.
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Marta, um exemplo a ser seguido
"Ela é muito importante para nós, não apenas dentro de campo, mas também fora dele, pois ela é uma grande referência para o futebol feminino."
Lilie Persson, auxiliar da seleção feminina, acrescentou que, mesmo em sua idade avançada e com as lesões começando a se acumular, Marta continua sendo um exemplo perfeito.
"Ela é tão competitiva. Durante todos os treinos, ela sempre faz o seu melhor, em cada detalhe. Mas, ao mesmo tempo, ela é uma pessoa tão humilde. Acho que foi isso que fez dela a melhor."
Embora Marta, assim como Megan Rapinoe, dos EUA, tenha deixado claras suas intenções pós-Copa, Rafaelle revelou que passará o torneio insistindo para que ela reconsidere a decisão. Se fracassar, ela quer pelo menos propiciar uma despedida em grande estilo para sua companheira de equipe — com um título inédito para o Brasil na Copa do Mundo feminina.
"Temos conversado muito sobre isso", conta. "E seria bom terminar com esta estrela para ela. Mas espero que não seja sua última Copa do Mundo. Ela é uma jogadora tão boa e espero que possa jogar um pouco mais com a seleção."
O Brasil se preparou bem para este torneio. Na América do Sul, a hegemonia da seleção já está garantida há muito tempo. Mas agora, com melhores instalações para os treinos, uma vitória sobre a Alemanha e uma derrota apertada nos pênaltis no jogo contra a Inglaterra na Finalíssima também aumentaram sua autoconfiança contra times europeus.
Independentemente de esta equipe levar ou não Marta para sua primeira final de Copa do Mundo desde a derrota para a Alemanha em 2007, seu legado está garantido. Para Rafaelle e as outras que a seguem na trilha que ela abriu, existe a determinação de ampliá-la ainda mais.
Mulheres pioneiras no esporte
Conheça algumas mulheres que fizeram história no esporte.
Foto: Imago Images/Sven Simon
Só para homens?
Alice Milliat não aceitou que a competição esportiva fosse uma atividade exclusiva do sexo masculino. Nascida na França em 1884, ela praticou hóquei, remo e corrida de carros. Em 1917, ela foi uma das fundadoras da Federação Francesa de Esportes Femininos FSFSF e da Federação Internacional de Esportes Femininos FSFI, que organizou os primeiros Jogos Mundiais Femininos em 1921.
Foto: akg images/picture alliance
Favorita da torcida
A ciclista Alfonsina Strada se inscreveu para o Giro d'Italia em 1924 como Alfonsin Strada. Os organizadores pensaram que ela era um homem. Quando a viram antes da prova, decidiram que mesmo assim ela poderia competir. A italiana fracassou depois de algumas etapas, mas permaneceu na corrida porque o público a aclamava. Ela é a única mulher a já ter competido em um Grand Tour masculino.
Foto: Imago Images/Leemage
A primeira mulher na Fórmula 1
Maria Teresa de Filippis foi a primeira mulher a correr na Fórmula 1. A italiana começou a competir em 1948, aos 22 anos, para a equipe Maserati. Em 1958, ela participou de várias corridas no Campeonato Mundial de Automobilismo, hoje Mundial de F1. Quando um amigo próximo morreu em um acidente um ano depois, ela encerrou sua carreira.
Foto: LATPhotographic/picture alliance
Apesar de todas as adversidades
Embora o furioso diretor de corrida da Maratona de Boston (de casaco preto) tenha tentado arrancar o número dela, Kathrine Switzer foi a primeira mulher a correr uma maratona em 1967 e também a completou. Ela havia se inscrito secretamente. A maior distância permitida para as mulheres na época eram 800m. Alguns anos depois, passou a ser permitido a mulheres participar de provas de longa distância.
Foto: picture alliance/dpa/UPI
Por prêmios iguais
No início dos anos 1970, Billie Jean King lutou por prêmios iguais em dinheiro para profissionais de tênis masculinos e femininos. Em protesto, a 12 vezes vencedora do Grand Slam criou em 1970 com outras jogadoras uma série própria de torneios, que mais tarde virou a Women's Tennis Association WTA. Em 1973, veio o sucesso: o prêmio em dinheiro do US Open foi igual para mulheres e homens.
Foto: Imago Images/Sven Simon
Pelo direito de voar
Até início dos anos 1990, o salto de esqui feminino não era permitido pela associação mundial. Eva Ganster só podia competir com homens. Em 1997, a austríaca foi a primeira mulher a saltar de uma rampa de esqui. Seus esforços surtiram efeito: desde 2011, há a modalidade feminina na Copa do Mundo, e desde 2014 a modalidade feminina é olímpica.
Foto: Imago Images/WEREK
Com frequência "a primeira"
Em 2003, Meredith Michaels-Beerbaum se tornou a primeira e única mulher a liderar o ranking mundial de saltos. Ela também é a primeira mulher da equipe alemã de hipismo a participar de um grande campeonato e, assim, abriu portas para jovens amazonas. "Quando vim para a Alemanha, ficou muito claro que as mulheres tinham um papel secundário no meu esporte", disse Meredith, nascida nos EUA.
Foto: Rau/Imago Images
Respeitada no apito
A suíça Nicole Petignat foi a primeira mulher a apitar um jogo masculino da Uefa em 2003: na qualificação para a Copa da Uefa entre AIK Solna e Fylkir Reykjavik. Petignat também é árbitra de jogos da Primeira Divisão masculina na Suíça e na Áustria, mas apita principalmente jogos femininos. Os destaques foram a final do Campeonato Europeu de 2001 e a final da Copa do Mundo de 1999.
Foto: picture-alliance/Pressefoto ULMER
Autoridade reconhecida
Mas demorou mais de duas décadas para uma mulher arbitrar um jogo masculino da Copa do Mundo. A francesa Stéphanie Frappart foi escalada pela Fifa na partida entre Alemanha e Costa Rica na Copa do Catar. Ela já apitou jogos masculinos na Liga das Nações, na Liga dos Campeões e nas eliminatórias da Copa do Mundo, mas continua sendo uma exceção em sua área.
Foto: Stanley Gontha/PRO SHOTS/picture alliance
Vencendo preconceitos
Em 2021, Sarah Thomas foi a primeira mulher a integrar uma equipe de arbitragem da final da American Football League NFL, o Super Bowl. Ela precisou lutar contra muitos preconceitos. "Colegas, treinadores e jogadores agora simplesmente me veem como árbitra. É assim que quero que seja", diz. "Nunca permiti que meu gênero fosse uma desculpa ou um pretexto para as pessoas."
Foto: Aaron Josefczyk/Newscom/picture alliance
"Não me sinto ser humano"
"Não me sinto mulher, homem ou mesmo ser humano agora", disse Rachael Blackmore após sua vitória no Grand National. A irlandesa de 31 anos acabara de entrar para a história com o cavalo Minella Times, ao se tornar a primeira mulher a vencer a corrida de galope com obstáculos mais difícil do mundo, realizada desde 1839. Já Charlotte Brew foi a primeira mulher a participar do Grand National em 1977.
Foto: Tim Goode/empics/picture alliance
Na poeira do deserto
Calor, poeira, terreno acidentado e inúmeros competidores masculinos – nada disso impediu a piloto de rali alemã Jutta Kleinschmidt de se tornar a primeira mulher a vencer o Rally Dakar em 2001. Após a vitória, ela também foi eleita a "Esportista do Ano" na Alemanha. A engenheira participou do rali mais difícil do mundo por 18 vezes, além de várias outras corridas.
Foto: picture alliance/dpa
Rápida sobre duas rodas
A motociclista alemã Katja Poensgen é uma das poucas mulheres a competir no Campeonato Mundial. Algumas marcam pontos na série Moto3, que vai até 125cc, mas Poensgen é a única entre os 15 melhores na categoria 250cc. Em 2001 e 2003, ela competiu em uma Honda e fez um total de 25 corridas pelo Mundial.
Foto: Sven Simon/picture alliance
Boa de pontaria
Quando seu último dardo atingiu o alvo em dezembro de 2019 em Londres, "Ally Pally" ficou fora de si. Pela primeira vez, uma mulher venceu um duelo no campeonato mundial de dardos. Fallon Sherrock, cabeleireira da Inglaterra, escreveu história na primeira rodada do torneio de dardos e só falharia na terceira rodada.
Foto: Getty Images/J. Mansfield
Incentivo ao esporte feminino
Uma verdadeira pioneira é a técnica de futebol alemã Monika Staab. Há anos, ela viaja pelo mundo se engajando pelo futebol e organiza programas de treinamento para mulheres e meninas, especialmente em países onde os direitos das mulheres não desempenham um papel importante. "O feedback positivo nos esportes aumenta a autoconfiança", diz ela. "Você precisa disso para enfrentar a vida".
Foto: picture alliance/dpa/N.Mughal
Treinando homens
Quando Corinne Diacre começou a treinar o Clermont Foot, clube da 2ª Divisão francesa, em 2014, ela logo convenceu seus críticos. Na época, a ex-jogadora da seleção foi a primeira mulher a comandar uma equipe masculina profissional. Em três anos no cargo, ela foi bem-sucedida. No entanto, Diacre é uma rara exceção. Mesmo muitas equipes femininas de sucesso continuam sendo treinadas por homens.
Foto: picture-alliance/dpa
Clara vitória contra concorrentes masculinos
Com uma vantagem de nove tacadas no Torneio Misto Escandinavo de 2022, a sueca Linn Grant foi a primeira mulher a vencer um torneio oficial de golfe DP World Tour, superando inclusive os concorrentes masculinos. "Durante toda a semana eu senti que eram as garotas contra os rapazes, e quem quer que pegasse aquele troféu representaria as mulheres", disse.