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Reconhecer, compreender e preservar

30 de janeiro de 2013

Os pesquisadores do Centro Moses Mendelssohn dedicam-se à herança cultural dos judeus de língua alemã em todo o mundo. A diretora do projeto, Elke Kotowski, fala sobre o trabalho de preservação da memória cultural.

Quando uma pessoa – e uma sociedade – só está em condições de se lembrar daquilo que é reconstruível no contexto presente, então está fadado ao esquecimento exatamente aquilo que não tem, em tal presente, mais referências. (Jan Assmann)

Sair em busca dos rastros dos judeus de língua alemã significa partir para uma procura em mais de 60 países do mundo. Primeiro, rumo aos países nos quais esses judeus já viviam no início do século 20. Ao observar um mapa do mundo hoje, já ficam evidentes os primeiros obstáculos, pois muitas das fronteiras entre os países daquela época foram modificadas e alguns Estados até desapareceram.

Um exemplo: centros importantes do judaísmo de língua alemã, como a região de Bucovina, a província de Poznań (na atual Polônia) ou o Império Austro-Húngaro de então não existem mais como tais. Hoje, só é possível reconstruir na imaginação o espírito cultural presente nas famílias judias de Berlim, Wrocław, Chernivtsi, Lemberg, Praga ou Viena.

Despedida e recomeço

Mesmo quando a situação para os judeus que tinham alguma influência sobre a ditadura nazista foi se tornando mais ameaçadora, muitos ainda tinham dificuldades de deixar o país. E eles não podiam levar consigo muita coisa da vida pregressa. Por isso, tanto mais importantes eram os objetos que, em seus novos países, serviriam de lembrança e criariam uma espécie de pátria cultural, em momentos de futuro tão incerto.

As primeiras estações do exílio eram com frequência acampamentos transitórios em países nos quais eles permaneciam provisoriamente, já que nos destinos desejados eram proclamadas leis que proibiam a entrada de imigrantes. Sendo assim, era mais fácil conseguir um visto para a Bolívia, República Dominicana, Cuba ou Xangai, do que para os EUA ou para a Argentina, para onde queria ir a maioria dos emigrantes.

Quando eles chegavam, enfim, à nova terra, para levar uma vida que não haviam escolhido de livre e espontânea vontade, a meta era sempre criar um ambiente próprio, aceitar a situação como era e reconstruir um pedacinho do próprio país ao redor.

As nações que recebiam imigrantes judeus os acolhiam de maneiras distintas. Isso fez com que sua integração nas sociedades locais se desse de maneira diferente. Era comum que os judeus de língua alemã morassem próximos uns dos outros, em determinadas regiões das cidades nas quais viviam, trabalhavam e mantinham as tradições culturais do antigo país, como ocorreu em Washington Heights, em Nova York, ou no bairro Belgrano, em Buenos Aires.

Um poema, um sentimento

Há aproximadamente dez anos, Robert(o) Schopflocher, escritor que foi obrigado a deixar com 14 anos sua cidade natal Fürth e hoje vive em Buenos Aires, escreveu em um poema:

Há mais de 60 anos / vivo na Argentina, / mas ao ouvir a palavra 'árvore' / me vem primeiro à mente, até hoje / a tília do rio Ranna, / na Francônia, / às vezes também um carvalho / ou um pinheiro alemão…

Embora Schopflocher, hoje com quase 90 anos, já viva há mais de 75 anos na Argentina, ele ainda se sente marcado e conduzido pela floresta "alemã", bem como pela literatura, ciência e arte "alemãs".

Schiller, Goethe e o Romantismo, / Art Noveau, Bauhaus e o Expressionismo, / me marcaram com sua chancela, / não menos que a floresta alemã, / o professor alemão / ou a aula de religião judaica…

Versos como esse demonstram uma ligação profunda com uma cultura que até as três primeiras décadas do século 20 foi também muito cultivada e marcada pelo judaísmo, tanto em metrópoles como Berlim, Praga ou Viena, quanto na província, como Eisenstadt, Fürth ou Poznań.

Pátria no exílio

O poema de Robert Schopflocher, intitulado Confissão, explicita de maneira impressionante o hiato de sentimentos do autor. A cultura alemã marcou emigrantes como Schopflocher e continua significando para ele, também no exílio, uma parte do que se entende como pátria. Apesar das experiências com o Holocausto e da política de extermínio nazista, praticada em nome dos alemães. Ao mesmo tempo, o local do exílio já se transformou há muito em nova pátria. Com estas palavras o escritor termina seu poema: E onde fica, agora, minha pátria?

A pátria cultural e seu legado expressam-se de diversas formas. O objetivo de nosso projeto acadêmico é, por isso, reconhecer, compreender e preservar essa herança, até hoje vivenciada e cultivada pelos judeus de língua alemã. E que nem na Alemanha nem em outros países está, de fato, ancorada na consciência coletiva.

Memória digital

O conceito de "herança cultural" não se refere, portanto, apenas a inventários em arquivos, bibliotecas ou museus, mas também às lembranças pessoais e àquilo que é transmitido para as próximas gerações – sejam habilidades manuais, uma formação cultural ampla ou costumes tradicionais, que remetem às tradições culturais e religiosas dos países de origem.

A historiadora Elke KotowskiFoto: DW/Rabitz

Para manter essa herança cultural na memória coletiva, e torná-la, desta forma, também acessível para as próximas gerações, está sendo criado um banco de dados de acesso aberto, inserido numa rede internacional. Todas as instituições que de alguma forma lidam com esse tema e com tais fontes deverão se tornar parte desta rede.

Elke-Vera Kotowski é historiadora do Centro Moses Mendelssohn e diretora do projeto "Legado Cultural Judaico-Alemão".

Autora: Elke-Vera Kotowski (sv)
Revisão: Roselaine Wandscheer

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