Estudo acusa alta global do autoritarismo e cita Bolsonaro
10 de fevereiro de 2022
Presidente brasileiro é incluído entre líderes que contribuem para deterioração mundial da democracia em análise publicada por grupo britânico. Apenas 45% da população do planeta vivia numa democracia em 2021, aponta.
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Um relatório divulgado nesta quinta-feira (10/02) aponta que a democracia continua a se deteriorar mundialmente em meio à pandemia e ao crescente apoio ao autoritarismo. A análise da Economist Intelligence Unit (EIU) aponta Bolsonaro como um exemplo de líder populista que provoca a erosão da democracia atacando as instituições.
Sediada em Londres e vinculada ao grupo The Economist, a EIU elabora anualmente seu Índice de Democracia conforme indicadores separados em cinco categorias: processo eleitoral e pluralismo, funcionamento do governo, participação política, cultura política e liberdades civis.
O grupo afirma que o índice "lança luz sobre os desafios contínuos à democracia em todo o mundo, sob pressão da pandemia de coronavírus e crescente apoio a alternativas autoritárias".
Nesta edição, o relatório anual, chamado Índice de Democracia, registra sua maior queda desde 2010 e estabelece "outro recorde sombrio", com a pior pontuação global desde que a análise foi produzida pela primeira vez em 2006.
"Os resultados refletem o impacto negativo da pandemia na democracia e na liberdade no mundo pelo segundo ano consecutivo, com a extensão considerável do poder do Estado e a erosão das liberdades individuais", diz o estudo.
Bolsonaro e a piora recorde na América Latina
Citando o presidente Jair Bolsonaro como um dos exemplos no continente, a EIU afirma que América Latina teve nesta edição a maior queda anual no índice de democracia entre todas as regiões do globo desde que o relatório é elaborado.
O documento afirma que a "pontuação da região piorou em todas as categorias", atribuindo a isso sobretudo "um declínio acentuado na cultura política".
"O compromisso cada vez mais fraco da América Latina com uma cultura política democrática abriu espaço para o crescimento de populistas iliberais, como Jair Bolsonaro no Brasil, Andrés Manuel López Obrador no México e Nayib Bukele em El Salvador, além de fomentar regimes autoritários na Nicarágua e na Venezuela", aponta o relatório.
O texto lembra os ataques do presidente brasileiro ao Supremo Tribunal Federal e suas investidas contra o sistema eletrônico de votação.
"O presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, exigiu a renúncia de dois membros do Supremo Tribunal Federal após uma investigação sobre alegações de que grupos pró-Bolsonaro estavam espalhando 'fake news'", diz o relatório.
"Bolsonaro chegou ao ponto de dizer que ignoraria os resultados das eleições presidenciais e legislativas de 2022 – comentários que ele retirou posteriormente", acrescenta.
A análise aponta o governante brasileiro como uma ameaça para a campanha eleitoral deste ano. "Bolsonaro provavelmente continuará com seus ataques às instituições democráticas e minará a confiança na integridade eleitoral, diante das eleições de outubro de 2022."
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Impacto da pandemia
Menos da metade (45,7%) da população mundial agora vive em algum tipo de democracia, um declínio significativo em relação a 2020, quando o número era de 49,4%.
Ainda menos (6,4%) residem agora em uma "democracia plena" - categoria que inclui apenas 21 de 167 países e territórios analisados -, depois que Chile e Espanha foram rebaixados para "democracias imperfeitas".
Mais de um terço da população mundial (37,1%) vive sob regime autoritário, grande parte na China. "A China não se tornou mais democrática porque se tornou mais rica. Pelo contrário, tornou-se menos livre", disse a EIU. Dos países analisados, 59 foram incluídos nessa categoria.
Os três primeiros lugares do índice são ocupados por Noruega, Nova Zelândia e Finlândia, enquanto os três últimos países são Coreia do Norte, Mianmar e Afeganistão.
Junto com a Tunísia, Mianmar e Afeganistão registraram as maiores quedas no índice após o golpe militar e a tomada do Talibã nesses dois últimos países.
md/lf (AFP, DPA, ots)
Vírus verbal: frases de Bolsonaro sobre a pandemia
"E daí?", "gripezinha", "não sou coveiro", "país de maricas": desde que o coronavírus chegou ao Brasil, presidente tratou publicamente com desdenho a crise. Enquanto a epidemia avança, suas falas causam ultraje.
Foto: Andre Borges/dpa/picture-alliance
"Superdimensionado"
Em 9 de março, em evento durante visita aos EUA, Bolsonaro disse que o "poder destruidor" do coronavírus estava sendo "superdimensionado". Até então, a epidemia havia matado mais de 3 mil pessoas no mundo. Após o retorno ao Brasil, mais de 20 membros de sua comitiva testaram positivo para covid-19.
Foto: Reuters/T. Brenner
"Europa vai ser mais atingida que nós"
A declaração foi dada em 15 de março. Precisamente, ele afirmou: "A população da Europa é mais velha do que a nossa. Então mais gente vai ser atingida pelo vírus do que nós." Segundo a OMS, grupos de risco, como idosos, têm a mesma chance de contrair a doença que jovens. A diferença está na gravidade dos sintomas. O Brasil é hoje o segundo país mais atingido pela pandemia.
Foto: picture-alliance/ZUMA Wire/GDA/O Globo
"Gripezinha" e "histórico de atleta"
Ao menos duas vezes, Bolsonaro se referiu à covid-19 como "gripezinha". Na primeira, em 24 de março, em pronunciamento em rede nacional, ele afirmou, que, por ter "histórico de atleta", "nada sentiria" se contraísse o novo coronavírus ou teria no máximo uma “gripezinha ou resfriadinho”. Dias depois, disse: "Para 90% da população, é gripezinha ou nada."
Foto: Youtube/TV BrasilGov
"Todos nós vamos morrer um dia"
Após visitar o comércio em Brasília, contrariando recomendações deu seu próprio Ministério da Saúde e da OMS, Bolsonaro disse, em 29 de março, que era necessário enfrentar o vírus "como homem". "O emprego é essencial, essa é a realidade. Vamos enfrentar o vírus com a realidade. É a vida. Todos nós vamos morrer um dia."
Foto: Reuters/A. Machado
"A hidroxicloroquina tá dando certo"
Repetidamente, Bolsonaro defendeu a cloroquina para o tratamento de covid-19. Em 26 de março, quando disse que o medicamento para malária "está dando certo", já não havia qualquer embasamento científico para defender a substância. Em junho, a OMS interrompeu testes com a hidroxicloroquina, após evidências apontarem que o fármaco não reduz a mortalidade em pacientes internados com a doença.
Foto: picture-alliance/NurPhoto/F. Taxeira
"Vírus está indo embora"
Em 10 de abril, o Brasil ultrapassou a marca de mil mortos por coronavírus. No mundo, já eram 100 mil óbitos. Dois dias depois, Bolsonaro afirmou que "parece que está começando a ir embora essa questão do vírus". O Brasil se tornaria, meses depois, um epicentro global da pandemia, com dezenas de milhares de mortos.
Foto: Reuters/A. Machado
"Eu não sou coveiro"
Assim o presidente reagiu, em frente ao Planalto, quando um jornalista formulava uma pergunta sobre os números da covid-19 no Brasil, que já registrava mais de 2 mil mortes e 40 mil casos. “Ô, ô, ô, cara. Quem fala de... eu não sou coveiro, tá?”, afirmou Bolsonaro em 20 de abril.
Foto: picture-alliance/AP Images/A. Borges
"E daí?"
Foi uma das declarações do presidente que mais causaram ultraje. Com mais de 5 mil mortes, o Brasil havia acabado de passar a China em número de óbitos. Era 28 de abril, e o presidente estava sendo novamente indagado sobre os números do vírus. “E daí? Lamento. Quer que eu faça o quê? Eu sou Messias, mas não faço milagre...”
Foto: Getty Images/A. Anholete
"Vou fazer um churrasco"
Em 7 de maio, o Brasil já contava mais de 140 mil infectados e 9 mil mortes. Metrópoles como Rio e São Paulo estavam em quarentena. O presidente, então, anunciou que faria uma festinha. "Estou cometendo um crime. Vou fazer um churrasco no sábado aqui em casa. Vamos bater um papo, quem sabe uma peladinha...". Dias depois, voltou atrás, dizendo que a notícia era "fake".
Foto: Reuters/A. Machado
"Tem medo do quê? Enfrenta!"
Em julho, o presidente anunciou que estava com covid-19. Disse que estava "curado" 19 dias depois. Fora do isolamento, passou a viajar. Ao longo da pandemia, ele já havia visitado o comércio e participado de atos pró-governo. Em Bagé (RS), em 31 de julho, sugeriu que a disseminação do vírus é inevitável. "Infelizmente, acho que quase todos vocês vão pegar um dia. Tem medo do quê? Enfrenta!”
Foto: Reuters/A. Machado
"País de maricas"
Em 10 de novembro, ao celebrar como vitória política a suspensão dos estudos, pelo Instituto Butantan, da vacina do laboratório chinês Sinovac após a morte de um voluntário da vacina, Bolsonaro afirmou que o Brasil deveria "deixar de ser um país de maricas" por causa da pandemia. "Mais uma que Bolsonaro ganha", comentou.
Foto: Andre Borges/NurPhoto/picture alliance
"Chega de frescura, de mimimi"
Em 4 de março de 2021, após o país registrar um novo recorde na contagem diária de mortes diárias por covid-19, Bolsonaro afirmou que era preciso parar de "frescura" e "mimimi" em meio à pandemia, e perguntou até quando as pessoas "vão ficar chorando". Ele ainda chamou de "idiotas" as pessoas que vêm pedindo que o governo seja mais ágil na compra de vacinas.