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"Religião é só pretexto para jovens se radicalizarem"

Friedel Taube (IP)23 de setembro de 2014

Estudioso do islã na Europa vê crescente número de adolescentes que aderem ao "Estado Islâmico" como uma busca por aceitação e identidade, algo que nem sempre possuem no país onde vivem.

Foto: Reuters

Estima-se que 12 mil estrangeiros estejam entre os combatentes do "Estado Islâmico" na Síria e no Iraque, muitos deles europeus descendentes de estrangeiros. O recrutamento de adolescentes é motivo de crescente preocupação na União Europeia.

O alemão Jochen Müller, estudioso do islã especializado em jovens imigrantes, diz que a razão para a radicalização de adolescentes vai além da religião. Segundo ele, ao deixarem a Europa rumo ao Oriente Médio, esses jovens buscam sobretudo aceitação na sociedade, o que não possuem no país onde vivem.

"Eles apresentam problemas sociais ou escolares, estão desempregados ou não são aceitos. Eles estão atrás de uma comunidade, de uma orientação, de respostas claras", afirma. "A religião é apenas um pretexto – a possibilidade de, em nome de algo, atacar de forma gratuita.

Deutsche Welle: Acredita-se que, entre os alemães recrutados pelo "Estado Islâmico", 24 sejam menores de idade. Qual é o perigo potencial que eles representam?

Jochen Müller: Isso é difícil de avaliar. Claro que existe um perigo potencial que não deve ser subestimado. É de se supor que alguns recebam treinamento de combate na Síria e no Iraque e que possivelmente também viajem a Alemanha em missões terroristas. Os órgãos de segurança precisam ficar em alerta.

Apesar dos riscos à segurança, não vejo esses adolescentes e esses jovens adultos apenas como uma ameaça em potencial ou como possíveis transportadores de armas, mas também como uma juventude carente. Minha preocupação é negligenciarmos o fato de que são pessoas em busca de respostas e orientação. Muitos vão voltar frustrados e desiludidos. Seus problemas continuarão a existir depois de seu retorno. É preciso considerar o que os levou à Síria ou ao Iraque e só então pensar em como eles poderão ser reintegrados na sociedade alemã.

Os vídeos da propaganda do EI na internet são assustadores. Por que os adolescentes são receptivos a essas imagens?

As motivações dos jovens são variadas. Aqueles mais radicais e violentos, que também se dispõem a participar da guerra, geralmente vêm de uma situação familiar difícil, onde frequentemente a figura do pai é ausente. Além disso, eles apresentam problemas sociais ou escolares, estão desempregados ou não são aceitos. Eles estão atrás de uma comunidade, de uma orientação, de respostas claras.

Também me refiro à geração 11 de Setembro. São jovens que cresceram na Alemanha em um tempo em que o islã é cada vez mais questionado. Eles precisam lidar com isso – e mais ainda depois do 11/9, em relação à violência e ao terrorismo. Trata-se de jovens com histórico de imigração buscando uma identidade. Mas entre os combatentes, também há uma grande parcela de convertidos.

Onde eles encontram tais respostas?

Faltam oportunidades para as famílias, associações e mesquitas – e também para mim – de se aproximarem dos jovens. Com frequência, eles vão parar na internet, seguem procurando, e acabam caindo nas respostas dos salafistas, que inundam a rede com suas ofertas. Os salafistas dão respostas simples e claras. A sociedade precisa criar espaços onde os jovens consigam lidar naturalmente com sua religião – na escola, por exemplo. O islã é parte da Alemanha e obviamente que os jovens, sejam eles religiosos ou não, também pertencem a ela.

Há alguns anos as autoridades monitoram a cena salafista na Alemanha, seja ela pacífica ou voltada ao terrorismo. Existe uma ligação entre os jihadistas do Iraque e da Síria e os salafistas?

Quando falamos em radicalização, pensamos imediatamente nesses 6 mil salafistas radicais [na Alemanha]. Eu diria que uma grande parte dos salafistas segue uma ideologia e apresenta uma ameaça à democracia, à concepção democrática. Apenas algumas centenas são tão radicais a ponto de se prontificarem à violência. Nesse caso, a sociedade precisa intervir: na escola, em centros para jovens, na formação política, alertando para esses perigos e sensibilizando os mais novos.

Foto: DW/U. Hummel

Fala-se que o jihadista alemão mais jovem teria apenas 13 anos de idade.

Isso é assustador. Eu faço uma comparação com atiradores solitários que querem se livrar de frustrações e de uma agressividade acumuladas. O desejo de aventura também desempenha um papel, mas isso são casos isolados. Nas escolas, também lido com jovens de 13 anos prestes a se radicalizarem que afirmam querer economizar suas mesadas e aderir à Jihad islâmica.

Essa radicalização se dá de formas bem diferentes. Às vezes, leva muito tempo. Eles são abordados em algum lugar e se juntam a uma comunidade, onde se radicalizam. A partir de então, eles confirmam cada vez mais suas convicções e sempre chegam a posições extremas. Em algum momento, surge o desejo de fazer algo, e não apenas de falar. Nessas radicalizações muito rápidas de alguns poucos jovens também é possível observar que a crença religiosa não desempenha um papel importante. Antes de tudo, são histórias familiares, sociais e individuais que desequilibram a balança. A religião é apenas um pretexto – a possibilidade de, em nome de algo, atacar de forma gratuita.

O monitoramento de mídias como Twitter e Facebook por parte do governo provocou grande revolta alguns meses atrás. A radicalização se dá sobretudo através das redes sociais. A vigilância pode ajudar esses jovens em situação vulnerável?

Só é possível chegar aos jovens quando as pessoas ao redor se sensibilizam com as mudanças e as entenderem. Nesse caso, precisamos ser sensíveis a tais desenvolvimentos e interagir com os jovens de forma individual e presencial e ver quem pode fazer algo. Essa pessoa pode ser a irmã, o técnico de futebol ou até o próprio pregador religioso, como o imã.

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