Emenda na berlinda
17 de setembro de 2010Segundo um levantamento recente, quase metade dos norte-americanos é contra a concessão automática de cidadania a filhos de imigrantes ilegais nascidos nos EUA. Enquanto 48% das pessoas sondadas pelo Instituto Quinnipiac University Polling, em Connecticut, se opõem à prática constitucionalmente sancionada, 45% dos entrevistados apoiam a atual agenda política – posições bastante ligadas à orientação partidária.
A pesquisa certamente irá fomentar as iniciativas políticas lançadas pelos republicanos no Congresso, que visam derrubar a antiga regra que garante cidadania para filhos de imigrantes em situação ilegal que nasçam em solo norte-americano.
O princípio da cidadania atrelada ao nascimento no país data de 1865. Como consequência da guerra civil nos Estados Unidos, a 14ª emenda da Constituição norte-americana estendeu o direito à cidadania para ex-escravos, declarando: "todas as pessoas nascidas ou naturalizadas nos Estados Unidos e sujeitas à sua jurisdição são cidadãs norte-americanas e do estado onde elas residem".
O desafio de quebrar uma emenda
Segundo a 14ª emenda, a cidadania automática dada às crianças nascidas em território norte-americano deve ser concedida independentemente da situação legal dos pais. Recentemente, no entanto, aumentaram os pedidos para que a prática seja extinta com o argumento de que filhos de imigrantes ilegais não estão sujeitos à jurisdição dos Estados Unidos e, portanto, a 14ª emenda não se aplica a eles.
Ainda assim, derrubar tal emenda seria quase impossível, uma vez que tal passo requerer dois terços de aprovação no Congresso e ainda precisa ser adotado em três quartos dos estados.
Apesar disso, alguns republicanos argumentam que aprovar um estatuto esclarecendo e revogando a cidadania concedida no nascimento para imigrantes ilegais seria o suficiente.
Tarefa difícil
"Acredito que seja uma interpretação legal errada", afirma Stephen Yale-Loehr, professor de direito da Universidade Cornell e um dos mais renomados especialistas em leis de imigração nos Estados Unidos. Polly Price, professor da Universidade Emory, faz coro com o estudioso.
"O estatuto não seria o bastante para mudar a lei, pois a Suprema Corte dos Estados Unidos lutaria bravamente contra uma violação à Constituição", diz Price.
Mais de 90 membros da Câmara de Deputados norte-americana apoiam o chamado Ato de 2009 do Direito à Cidadania por Nascimento, ambicionando negá-la automaticamente aos herdeiros de imigrantes, mas isso não é suficiente para aprovar a lei, afirma o professor da Universidade Cornell.
"Se o povo norte-americano quer efetivamente mudar esta regra, eles terão que anular a 14ª emenda e aprovar outra no lugar", afirma Yale-Loehr. "E isso é algo muito difícil. Por muitos anos não tivemos emendas constitucionais nos Estados Unidos".
Negar a cidadania não diminuirá a imigração
Anna Triandafyllidou, especialista em imigração e professora do Instituto da Universitário Europeu de Florença, defende que além dos aspectos legais, ainda há razões sociológicas e políticas que ressaltam a imprudência em se mudar a prática atual.
"Isso não irá resolver o problema da imigração irregular e fará das ruas um lugar ainda mais perigoso", afirma.
A especialista sustenta que soluções aparentemente simples, como as medidas contra os imigrantes ilegais instituídas no Arizona ou a revogação do direito de cidadania por nascimento para crianças de pessoas em condição irregular, não corrigem o enorme problema associado com a migração.
Implicações sociológicas
Para Yale-Loehr, a teoria de que, acabando com tal direito, um menor número de pessoas passará a vir aos EUA simplesmente para ter seus filhos lá é errônea. Já que as pessoas deverão continuar a migrar para os Estados Unidos, mesmo que seus herdeiros não tenham garantia de receber a cidadania.
Tal afirmação está embasada, inclusive, em um estudo recente. Realizada pelo Instituto de Políticas Migratórias em Washington DC, uma pesquisa revelou que, caso eliminada a cidadania por nascimento, existe o risco de se aumentar o número de imigrantes ilegais nos Estados Unidos em pelo menos cinco milhões nas próximas quatro décadas. Atualmente estima-se que existam cerca de 11 milhões de pessoas vivendo ilegalmente no território norte-americano.
Segundo Price, as implicações sociológicas também precisam ser consideradas. "Se um grande segmento da população fica sem documentação, você potencialmente cria uma subclasse permanente para os que nasceram e viveram aqui suas vidas inteiras e, ainda assim, não terão oportunidade de se tornarem cidadãos".
Autor: Michael knigge (mda)
Revisão: Carlos Albuquerque