Retirada dos EUA da OMS seria "gol contra" de Trump
Matthew Ward Agius
15 de janeiro de 2025
Muitos esperam que Trump retire os Estados Unidos da Organização Mundial da Saúde após retornar à Casa Branca. Especialistas avaliam que isso seria uma perda para a saúde global e o próprio país.
Trump, que será empossado para um segundo e último mandato como presidente dos EUA em 20 de janeiro, já tentou retirar o país da OMS em julho de 2020, no final da sua primeira administração.
No entanto, cortar totalmente os laços com a OMS não é algo que possa ocorrer da noite para o dia devido a uma resolução de longa data do Congresso americano que exige que o presidente envie um aviso prévio de um ano e pague quaisquer obrigações pendentes.
Esse cronograma permitiu que a decisão de Trump pudesse ser revertida com a vitória de Joe Biden nas eleições de 2020, poucos meses após o decreto de Trump.
Dessa vez, no entanto, Trump não enfrentaria as mesmas barreiras. Em seu primeiro dia no cargo, ele poderia notificar a saída dos EUA da OMS já a partir de janeiro de 2026.
EUA são maior contribuinte
Uma provável saída dos EUA da OMS seria um golpe duro para o orçamento da organização e sua capacidade de coordenar programas e políticas internacionais de saúde.
A OMS é uma agência da ONU composta por 196 Estados-membros que a financiam por meio de contribuições fixas baseadas nos tamanhos do Produto Interno Bruto (PIB) e da população num ciclo de financiamento de dois anos.
Os EUA respondem por quase um quarto desses fundos, à frente da China, do Japão e da Alemanha.
Os países também podem fazer contribuições voluntárias, o que os EUA também fazem. No ciclo atual, os americanos já contribuíram com quase 1 bilhão de dólares (R$ 6,1 bilhões) para o orçamento da OMS.
Porém, em torno de metade do financiamento da OMS vem de organizações não governamentais. Por exemplo, centenas de milhões de dólares foram doados pela Fundação Bill & Melinda Gates, o que, em termos gerais, a torna a segunda maior doadora.
Contribuições direcionadas por doadores ou "específicas" – nas quais o doador determina como e onde o dinheiro deve ser utilizado – respondem por mais de 70% do orçamento total.
Isso representa um grave problema estrutural para as operações da OMS, de acordo com Gian Luca Burci, um ex-advogado da entidade que trabalha atualmente como especialista em direito da saúde global no Graduate Institute de Genebra.
"Os doadores impõem muitas condições, o que faz com que a OMS se torne demasiadamente orientada por eles", diz Burci. "Os EUA recebem muito em termos de retorno por relativamente pouco dinheiro."
"Há muitas questões às quais os EUA dão muita importância, independentemente de quem esteja na Casa Branca", acrescenta o especialista. "Em particular no que diz respeito a emergências de saúde, pandemias, surtos de doenças, mas também em termos de obter dados sobre o que ocorre dentro dos países."
A perda de seu principal contribuinte financeiro deixaria a OMS com poucas opções para compensar o déficit: os demais Estados-membros teriam de aumentar suas contribuições, ou seu orçamento para atuar precisaria ser reduzido.
Prejuízo também para os EUA
A relação entre a OMS e Trump começou a se deteriorar em 2020, quando ele acusou a entidade de ser uma "marionete da China" devido a suas ações durante a pandemia de covid-19.
"Ele continua a criticar a China e a afirmar que a OMS está no bolso dos chineses, e que a China a influencia", disse Lawrence Gostin, professor de direito da saúde global na Universidade de Georgetown e diretor do Centro Colaborador da OMS para Direito da Saúde Pública e Direitos Humanos.
Gostin avalia que sair da OMS seria um "gol contra" dos EUA e custaria a "enorme influência" que o país exerce sobre a instituição.
"Acho que seria profundamente adverso aos interesses de segurança nacional dos EUA. Abriria a porta para a Federação Russa, China e outros. Ou ainda África do Sul, Índia e México", diz Gostin.
Maior risco de surtos de doenças
A saída americana também tornaria o mundo um lugar menos saudável e seguro. Ao se isolar da comunidade global de saúde, os EUA iriam se colocar em desvantagem no que diz respeito à proteção durante surtos de doenças.
"Há muitas coisas que os Estados Unidos podem fazer sozinhos, mas impedir que novos patógenos cruzem suas fronteiras não é uma delas", diz Gostin.
Como exemplo, ele destaca as preocupações atuais com a gripe aviária H5N1 nos EUA. "Não teremos acesso às informações científicas de que precisamos para poder combater a doença, uma vez que a gripe aviária é um patógeno que circula globalmente."
"A OMS tem um centro para gripes que monitora todas as cepas ao redor do mundo. [Os Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA] são um parceiro muito próximo, e usamos esses dados para desenvolver vacinas e tratamentos. Estaríamos voando às cegas", diz Gostin.
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Ameaça poderia levar a reformas
A saída dos EUA da OMS certamente mudaria o relacionamento entre o país e a entidade, mas não necessariamente iria encerrá-lo. Burci mantém um certo otimismo em relação ao futuro dessas relação. Ele sugere que os EUA poderiam agir como as organizações não governamentais e instituições de caridade, fazendo contribuições voluntárias para programas que apoiam.
"[Eles] podem continuar a financiar alguns projetos e atividades, então é possível que a OMS não perca a totalidade da contribuição americana", afirmou.
Trump também se apresenta como um líder negociador, o que significa que ele poderia usar a saída americana como um instrumento para forçar reformas endossadas pelos EUA em Genebra.
O desempenho da OMS vem sendo criticado há muito tempo, e não apenas pelos EUA. Gostin observa que algumas reformas começaram na esteira da forma como a entidade lidou com a pandemia de covid-19.
A "agenda de transformação" da OMS está em vigor há quase oito anos, e Trump poderia ser capaz de forçar outras mudanças.
Gostin preferiria ver Trump assumindo um papel de negociador em vez de adotar atitudes isolacionistas em suas negociações com a OMS. "Ele poderia fazer um acordo com a OMS para torná-la uma organização melhor, mais resiliente, mais transparente, o que seria uma vitória para os Estados Unidos, para a OMS e para o mundo", afirma o especialista.
O mês de janeiro em imagens
Reveja alguns dos principais acontecimentos do mês
Foto: Kenny Holston/The New York Times/AP/picture alliance
Ataque a faca deixa dois mortos no sul da Alemanha
Um homem de 41 anos e um menino de dois anos foram mortos e duas outras pessoas ficaram feridas em um ataque a faca em um parque na cidade de Aschaffenburg, no estado da Baviera, no sul da Alemanha. Um afegão de 28 anos, requerente de asilo, foi detido ao tentar escapar por trilhos de trem. A indignação com o crime pode impactar a campanha eleitoral, a um mês das eleições antecipadas. (22/01)
Foto: Ralf Hettler/dpa/picture alliance
Incêndio mata dezenas em resort de esqui na Turquia
Mais de 70 pessoas morreram e ao menos 51 outras ficaram feridas no incêndio num hotel localizado em uma popular área de esqui nas montanhas de Bolu, no noroeste na Turquia. O incêndio começou durante a madrugada no Grand Kartal, um hotel de 12 andares construído de madeira na estação de esqui de Kartalkaya, a uma altitude de 2.200 metros. (21/01)
Foto: IHA/AP/picture alliance
Trump de volta à Casa Branca
O republicano Donald Trump tomou posse em seu segundo mandato como presidente dos EUA. Em seu primeiro dia de governo, o republicano anunciou um pacote de medidas conservadoras, reverteu dezenas de decisões de seu antecessor, Joe Biden, concedeu perdão a 1.500 condenados pelo 6 de janeiro de 2021 e prometeu dar início a uma nova "era de ouro" no país. (20/01)
Foto: Julia Demaree Nikhinson/AP/dpa/picture alliance
Alívio e emoção dos primeiros reféns liberados
Doron Steinbrecher, uma das três reféns israelenses libertadas no primeiro dia de cessar-fogo entre Israel e o grupo extremista Hamas, reencontra sua mãe após 15 meses de cativeiro. Hamas também libertou Romi Gonen e Emily Damaria, dando início ao processo previsto no acordo. Em troca, cerca de 95 prisioneiros palestinos deverão ser libertados, a maioria mulheres e adolescentes. (19/01)
Foto: Israeli Army/AP/picture alliance
Milhares vão às ruas de Washington contra Trump
Dois dias antes da volta de Donald Trump à Casa Branca, milhares protestaram contra políticas anunciadas pela próxima gestão. Chamada "Marcha do Povo", a manifestação foi organizada por movimentos de defesa dos direitos civis em defesa de pautas como o acesso ao aborto, proteção climática e direitos dos imigrantes. Mais de 350 marchas semelhantes aconteceram em todo o país. (18/01)
Foto: Amanda Perobelli/REUTERS
Gabinete israelense aprova cessar-fogo em Gaza
O governo israelense aprovou o acordo de cessar-fogo e libertação de reféns em Gaza, após horas de consultas que se estenderam até a madrugada de sábado (18/01)."O governo aprovou o plano de devolução dos reféns", disse o gabinete do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu em comunicado. As armas deverão ser silenciadas inicialmente por seis semanas a partir do próximo domingo. (17/01)
Foto: Koby Gideon/AFP
David Lynch, diretor de "Cidade dos sonhos", morre aos 78 anos
Conhecido por produções como "Cidade dos Sonhos", "Twin Peaks" e obras surrealistas, o renomado diretor americano acumulou quatro indicações ao Oscar durante sua carreira. Causa da morte não foi divulgada. Em 2024, ele afirmou que foi diagnosticado com enfisema pulmonar. (16/01)
Hamas e Israel chegam a acordo para encerrar conflito em Gaza
Israel e Hamas chegaram a um acordo de cessar-fogo para encerrar o conflito na Faixa de Gaza após 15 meses de combates, segundo informaram mediadores nesta quarta-feira. O texto prevê troca de reféns por prisioneiros e a retirada de militares israelenses. População foi às ruas em Gaza e em Israel para comemorar a decisão. (15/01)
Foto: Abdel Kareem Hana/AP/picture alliance
Procurador diz que havia evidências para condenar Trump
Em relatório tornado público, o procurador especial Jack Smith afirma que havia evidências suficientes para condenação do presidente eleito dos EUA por tentar anular o resultado da eleição de 2020. Parte do documento foi enviado ao Congresso pelo Departamento de Justiça – não sem que antes Trump tentasse impedir que isso acontecesse. Republicano reagiu tachando Smith de "perturbado". (14/01)
Foto: Jacquelyn Martin/AP Photo/picture alliance
Lula sanciona lei que proíbe uso de celular nas escolas
Lei restringe uso de aparelhos eletrônicos portáteis, sobretudo telefones celulares, nas salas de aula de escolas públicas e privadas em todo o país. Há exceções para uso pedagógico, sob supervisão dos professores, ou em casos excepcionais de acessibilidade ou necessidade de saúde. Medida ainda será regulamentada por decreto a tempo de entrar em vigor no início do ano letivo, em fevereiro. (13/01)
Sobe para 16 número de mortos em incêndios em Los Angeles
O número de mortos nos incêndios florestais que atingem a região de Los Angeles aumentou para 16, enquanto as equipes lutam para conter as chamas antes da chegada prevista de novas rajadas de ventos fortes capazes, potencialmente, de empurrar o fogo em direção a outras regiões da cidade. (12/01)
Foto: Jae C. Hong/AP Photo/picture alliance
Milhares protestam contra convenção da ultradireita na Alemanha
Mais de 10 mil pessoas participam de uma manifestação em uma pequena cidade do leste alemão contra a convenção nacional do partido ultradireitista Alternativa para a Alemanha (AfD). A convenção é parte da campanha do partido para as eleições federais de 23 de fevereiro, convocada após o colapso do governo de coalizão do chanceler federal, Olaf Scholz. (11/01)
Foto: EHL Media/IMAGO
Trump é sentenciado e será 1º presidente condenado dos EUA
O presidente eleito dos EUA, Donald Trump, foi sentenciado por sua condenação criminal decorrente do pagamento em dinheiro para silenciar uma atriz pornô. A penalidade, porém, não inclui multa, prisão ou liberdade condicional. O juiz aplicou ao republicano uma sentença de "dispensa incondicional", que reconhece a culpa do réu, mas não impõe uma pena específica. (10/01)
Foto: Brendan McDermid-Pool/Getty Images
"Sinceramente, estou morrendo", diz ex-presidente do Uruguai José Mujica
Mujica, de 89 anos, revelou que o câncer em seu esôfago se espalhou para o fígado e que a progressão da doença não pode mais ser interrompida. "Não posso fazer nem um tratamento bioquímico nem uma cirurgia porque meu corpo não aguenta", disse. "O que eu peço é que me deixem em paz. O guerreiro tem direito ao descanso." (09/01)
Foto: Santiago Mazzarovich/AFP
Incêndios deixam rastro de destruição na Califórnia
Incêndios florestais de enormes proporções atingiram a Califórnia e deixaram ao menos cinco mortos e dezenas de feridos. No condado de Los Angeles, cerca de 180 mil pessoas tiveram que deixar suas casas por ordem das autoridades, com as chamas consumindo uma área de 117 quilômetros quadrados. (08/01)
Foto: Ringo Chiu/REUTERS
Morre o extremista francês Jean-Marie Le Pen
Líder histórico da extrema direita francesa e pai da ultradireitista Marine Le Pen morreu aos 96 anos. Ele foi um dos fundadores do partido Frente Nacional, renomeado em 2018 para Reunião Nacional. Figura polarizadora na política francesa, Le Pen era conhecido por sua retórica inflamada contra a imigração e o multiculturalismo. (07/01)
Congresso dos EUA certifica vitória eleitoral de Trump
O Congresso dos EUA certificou Donald Trump como vencedor da eleição de 2024. A cerimônia aconteceu sem interrupções – em contraste à violência de 6 de janeiro de 2021, quando, com pelo menos aquiescência de Trump, uma multidão invadiu o Capitólio para impedir certificação de Joe Biden. Os legisladores se reuniram sob forte segurança para cumprir a data exigida pela lei eleitoral. (06/01)
Foto: Chip Somodevilla/Getty Images/AFP
Neve traz caos à Europa e aos Estados Unidos
Após um fim de ano com temperaturas relativamente amenas, nevou no Reino Unido e em outras partes da Europa. Pistas congeladas geraram transtorno nas estradas e levaram ao cancelamento de voos e fechamento de aeroportos, inclusive na Alemanha. Nos Estados Unidos, algumas áreas devem ter a pior nevasca da década. (05/01)
Foto: Danny Lawson/PA Wire/dpa/picture alliance
Trens de longa distância operados pela alemã Deutsche Bahn batem recorde de atraso
Em 2024, 37,5% dos trens de longa distância registraram atraso superior a seis minutos – a maior taxa em 21 anos. Empresa atribuiu piora no desempenho à "infraestrutura ultrapassada e sobrecarregada", obras na rede ferroviária, aumento do tráfego, falta de mão de obra e eventos climáticos extremos, mas disse trabalhar em um plano de ação para melhorar sua pontualidade. (04/01)
Foto: Sebastian Gollnow/dpa/picture alliance
Milhares de alemães assinam petição contra uso de fogos de artifício
Mais de 270 mil alemães assinaram uma petição online pedindo a proibição de fogos de artifício particulares em todo o país, após um Ano Novo marcado por cinco mortes e dezenas de feridos pelo uso incorreto dos fogos. Em várias cidades, equipes de emergência foram atingidas pelos explosivos. Em Berlim, um policial ficou gravemente ferido e precisou ser operado. (03/01)
Foto: Christian Mang/REUTERS
Multidão protesta contra prisão de presidente afastado da Coreia do Sul
Uma centena de pessoas se reuniram em Seul para protestar contra o mandado de prisão imposto ao presidente deposto da Coreia do Sul, Yoon Suk Yeol, acusado de insurreição. Apoiadores se posicionaram em frente à residência de Yoon, que se propôs a "lutar até o fim". Agentes já se posicionam no local para cumprir a ordem judicial. (02/01)
Foto: Philip Fong/AFP
Homem atropela multidão em Nova Orleans e deixa 10 mortos
Ataque ocorreu na Bourbon Street, uma rua turística com bares e clubes noturnos. Condutor do veículo morreu em confronto com policiais e FBI investiga "ato de terrorismo". Suspeito, um cidadão americano do Texas, carregava bandeira do Estado Islâmico. (01/01)