Revelações de violência sexualizada abalam esporte alemão
20 de agosto de 2022
Ex-campeão olímpico revela em documentário como sofreu abusos de seu treinador dos 11 aos 25 anos. E denuncia rede de silêncio em torno dos delitos: "Associação de Natação passa por cima de cadáveres", afirma Jan Hempel.
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"Me dá nojo", foi o comentário de Karla Borger, presidente da organização Athleten Deutschland, às mais recentes acusações de abuso sexual no esporte alemão, desencadeadas por um documentário da emissora de TV ARD, em que, o ex-campeão mundial de salto ornamental Jan Hempel revela que sofrera abusos repetidos por seu treinador Werner Langer desde os 11 anos de idade, de 1982 até 1996.
No programa sobre violência sexualizada na natação profissional alemã, transmitido neste sábado (20/08) pela emissora de direito público, Hempel acusou responsáveis da Associação Alemã de Natação (DSV) de saberem dos delitos, sem nada terem feito.
"Eu sofri no próprio que para a DSV só o sucesso esportivo importa. Simplesmente se passa por cima de cadáveres. Não importa como. E quem não vai nessa onda é simplesmente chutado para fora." Pelo menos era assim na época – mas algumas personagens ainda estão lá: o atleta menciona explicitamente Lutz Buschkow, há 20 anos treinador-chefe federal dos saltadores alemães.
Borger, de 33 anos – que representa os interesses dos atletas alemães e atualmente compete no Campeonato Europeu de Vôlei de Praia, em Munique – declarou-se "abalada" pela revelações, exigindo que se investigue "o que acontece nos bastidores".
"Ele nunca deixava de satisfazer seus desejos e necessidades"
Jan Hempel foi medalha de prata dos Jogos Olímpicos de Atlanta, em 1996. Pouco antes de competir, ele comunicara a Langer que não podia e não queria mais trabalhar com ele. Só então a violência continuada teve fim. Langer se suicidou em 2001.
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No documentário da TV ARD, o ex-campeão fala baixo, passa as mãos diversas vezes pelo rosto: sua luta interna é visível. "Sofri abuso pelo meu treinador. Ele nunca perdia uma oportunidade de dar livre vazão aos seus desejos e necessidades", revela Hempel, atualmente com 50 anos. E acrescenta: "Acredito que falar é um dever para com os outros, também para o futuro."
O ex-saltador Heiko Meyer, parceiro de longos anos de Hempel no salto sincronizado, conta que o amigo se confidenciara com ele, mas "nunca entrou em detalhes: "Eu sabia do que estava acontecendo. Mas em que medida... fiquei acabado."
Maximilian Klein, da Athleten Deutschland, afirma à DW que quem silencia "está protegendo as instituições e, desse modo, dos criminosos". "Em parte, pensam que sua ação impedirá que os atingidos sofram novos danos. Às vezes há relações de dependência ou redes de relações estreitas, que dão aos que estão sabendo a sensação de serem impotentes, e assim bloqueiam o esclarecimento."
Seria necessário "uma espécie de separação de poderes, com estruturas independentes", pois "sozinho e apenas com seus próprios meios, o esporte não vai efetuar um combate eficiente contra a violência e o abuso", alerta Klein.
"É que no sistema imperam demasiados conflitos de interesses, relações de dependência, estruturas isoladas ou laços de proximidade familiar. Acontece demais não se querer ou não se poder agir, não se acredita nos atingidos, denúncias dão em nada ou não têm consequências insuficientes."
Violência sexualizada no esporte é problema disseminado
Após a divulgação das acusações, a DSV dispensou Buschkow de suas funções, "até o esclarecimento final da questão". O presidente da associação, Marco Troll, comentou à ARD que o treinador federal estava sendo "retirado do fogo, o que inicialmente indica uma suposição de inocência": "Estamos chocados com esses fatos, de que tomamos conhecimento hoje, pela primeira vez, nesta forma", assegurou Troll.
Nos últimos anos, vieram à tona no esporte alemão escândalos de violência sexualizada também em outras modalidades, como no judô. Porém o problema é internacional, como provam outras revelações partindo da ginástica americana, ou do futebol britânico, afegão ou haitiano.
"No lugar de uma cultura de silenciar, é preciso se instaurar uma cultura de observar, reconhecer e agir", reivindica Maximilian Klein. "Até que isso chegue à superfície e, portanto, até o último ginásio do país, vai passar um tempo. Vai exigir processos de evolução longos e dolorosos nos clubes e associações."
Ao tomar a penosa decisão de falar sobre suas experiências traumáticas, o ex-campeão olímpico Jan Hempel disse que esperava ter "colocado a pedra em movimento": "Simplesmente tem que acontecer alguma coisa."
av (DW,ots)
Desculpas curiosas para o doping
Seja a sogra, o irmão gêmeo não nascido ou a pasta de dente: esportistas que se dopam procuram, geralmente, pôr a culpa nos outros ou contam as histórias mais miraculosas. Aqui uma seleção de explicações curiosas.
Foto: picture-alliance/dpa/L. Coch
Lista negligenciada
"Tomo este medicamento desde 2006", disse a tenista Maria Sharapova, sem explicar por que ela, uma atleta saudável, precisa de um remédio cardiovascular. Desde o início de 2016, o meldonium, usado pela tenista, está na lista de doping. A explicação da atleta: "Eu não vi a lista."
Foto: picture-alliance/dpa/M.Murat
O abacate
Com 39 anos, Linford Christie (2° da esq. para dir.) já estava no outono de sua carreira, quando foi pego num exame antidoping em 1999. O agente dopante nandrolona foi encontrado no organismo do campeão olímpico de 1992. A explicação dele é interessante: ele não tomou o esteroide, mas comeu abacates. Somente Christie sabe o que essas frutas têm a ver com a nandrolona.
Foto: picture-alliance/Sven Simon
A dieta
Um fato inédito na Espanha: um esquiador de cross-country ganhou três medalhas de ouro para os ibéricos nos Jogos Olímpicos de Inverno de 2002. Johann Mühlegg se juntou à equipe espanhola após um desentendimento com a federação alemã. Ele foi pego devido ao hormônio EPO. Sua explicação: "Nos últimos cinco dias, fiz uma dieta especial, somente com proteínas e carboidratos". Ou seja, sem EPO.
Foto: Zoom Agence/Getty Images
O uísque
Inicialmente como auxiliar precioso à sombra de Lance Armstrong (dir.), o ciclista Floyd Landis (esq.) se tornou, de repente, vencedor da Volta da França após a saída de Armstrong: em 2006, Landis foi testado positivamente para testosterona. Após um colapso total, ele retornou de forma espetacular. Na ocasião, o ciclista disse que havia tomado muito uísque, mas depois admitiu o doping.
Foto: picture-alliance/dpa
A potência
Adrian Mutu só tinha boas intenções. Em 2004, o então atacante do Chelsea consumiu cocaína, mas naturalmente não para aumentar a sua perfomance em campo, mas para satisfazer o parceiro. "Só fiz isso para elevar minha potência sexual". A Corte Arbitral do Esporte (CAS) reagiu com indiferença às histórias de cama de Mutu e lhe condenou a multa de 17,2 milhões de euros.
Foto: picture-alliance/dpa
O suco
Numa coletiva de imprensa convocada às pressas, Martina Hingis anunciou a sua despedida do tênis em 2007, devido a dores nas costas e a um teste positivo. No campeonato de Wimbledon, ela foi pega por cocaína. Doping? Não, Hingis viu uma conspiração em curso. "Alguém a colocou no meu suco."
Foto: Getty Images/Michael Dodge
O espaguete
O atleta de bobsled britânico Lenny Paul foi pego em 1997 com um nível elevado de nandrolona – um clássico entre as substâncias dopantes. A sua desculpa para o teste positivo foi menos habitual: "eu comi espaguete à bolonhesa, a carne era de bovinos tratados com hormônios". Também o ciclista Alberto Contador usou o bife contaminado para explicar o seu caso.
Foto: Getty Images/P.Rondeau
A bombinha de asma
A ciclista Ivonne Kraft foi testada positivamente em 2007. A substância encontrada: fenoterol. Kraft a teria supostamente inalado: "A bombinha de asma da minha mãe estourou. Estava do lado e respirei toda a nuvem de spray." Uma coincidência muito infeliz.
Foto: picture-alliance/dpa/S.Simon
A sogra
Quase como do nada, Raimundas Rumsas subiu ao pódio da Volta da França. Enquanto os especialistas se mostravam surpresos, Edita, esposa de Rumsas, era pega na alfândega com diversas substâncias dopantes. O casal Rumsas afirmou que os medicamentos seriam para a sogra enferma do profissional do ciclismo.
Foto: picture-alliance/dpa/Repro
O romance
O ciclista Mario de Clercq era considerado, em 2003, um dos melhores na sua profissão. Então, foram encontrados com ele registros sobre medicamentos, planos de treinamento e tabelas de hematócrito (quantidade de hemácias no sangue). De Clercq negou veementemente o doping, alegando que tudo seria usado nas pesquisas para o romance que estaria escrevendo.
Foto: picture-alliance/dpa/Y.Boucau
A pasta de dente
Uma das histórias de doping mais contadas foi a do atleta alemão Dieter Baumann. O campeão olímpico de 1992 foi testado positivamente em 1999 e tentou vender a versão de uma pasta de dente manipulada. O renomado especialista em doping Werner Franke considera a ousada teoria como digna de credibilidade. Mas os dois ainda continuam devendo as devidas provas.
Foto: picture-alliance/dpa
O irmão gêmeo não nascido
Nos Jogos Olímpicos de 2004, o ciclista Tyler Hamilton conseguiu sua maior proeza: medalha de ouro na corrida contra o relógio. Então veio o choque: teste positivo para doping sanguíneo. "As hemácias estranhas no meu corpo foram produzidas pelas células estaminais do meu irmão gêmeo que morreu antes de nascer." Uma história fantástica, que posteriormente o próprio Hamilton afirmou ser mentira.
Foto: picture alliance / dpa
O presente sexual
Em maio de 1992, o velocista americano Dennis Mitchell (dir.) ganhou a medalha de ouro por equipe. Seis anos mais tarde, ele foi testado positivamente para testosterona. O atleta justificou o achado com quatro garrafas de cerveja e muito sexo. "Era o aniversário da garota. Ela merecia algo especial."
Foto: picture-alliance/dpa/S.Simon
Bombons e chá
Cuidado com as guloseimas provenientes de familiares: em 2004, o ciclista italiano Gilberto Simoni foi pego por cocaína. Segundo ele, isso não tinha nada a ver com doping. "Minha mãe me enviou bombons do Peru que estavam embrulhados em folha de coca." Numa outra declaração, ele colocou a culpa no chá da tia.