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Tunísia, um ano depois

16 de dezembro de 2011

A autoimolação de um jovem desempregado tunisiano desencadeou toda uma série de protestos e quedas de regimes no mundo árabe. Como se encontra a Tunísia em seu caminho rumo à democracia?

Protestos em Sidi Bouzid, cidade natal de Bouazizi
Protestos em Sidi Bouzid, cidade natal de BouaziziFoto: DW

Quando o jovem feirante Mohamed Bouazizi se embebeu em gasolina e ateou fogo no próprio corpo na pequena cidade tunisiana de Sidi Bouazid, em 17 de dezembro de 2010, nenhum de seus compatriotas poderia imaginar que menos de um mês mais tarde o ditador de longa data Zine El Abidine Ben Ali deixaria o país em fuga.

O ato simbólico de Bouazizi provocou uma reação em cadeia de protestos no pequeno país. Apoiada pelo sindicato único UGTT, espalhou-se primeiramente no interior do país uma onda de manifestações, que foi violentamente reprimida pela polícia.

No final de dezembro, ela chegou à capital, Túnis, e, no começo deste ano, às universidades. "O país era como uma panela de pressão prestes a explodir", declarou na ocasião um jovem manifestante. Desemprego, corrupção e opressão se mesclavam para formar uma mistura explosiva, que o regime Ben Ali a princípio subestimou, não conseguindo mais controlar posteriormente.

Na noite de 13 de janeiro de 2011, após milhares de pessoas terem ido às ruas nas cidades de Sousse e Sfax, Ben Ali ainda tentou alterar o curso dos acontecimentos. "Eu cometi erros. Agora, eu entendo vocês", disse ele em discurso televisionado. Ele anunciou então que não usaria mais armas de fogo e prometeu abolir a censura na internet. O que aconteceu nas 24 horas seguintes é motivo de especulação até hoje na Tunísia.

Retrato de Mohamed Bouazizi em avenida da capital TúnisFoto: cc-by-sa-cbj22

Na manhã de 14 de janeiro, dezenas de milhares de pessoas protestavam diante do Ministério do Interior em Túnis. Durante o toque de recolher, e apesar do bloqueio do espaço aéreo, dois aviões decolaram do aeroporto de Túnis-Cartago. A família do presidente deixava o país e, logo depois, o primeiro-ministro Mohamed Ghannouchi, visivelmente nervoso, lia uma declaração na TV estatal, afirmando a incapacidade temporária de governar de Ben Ali. Em 15 de janeiro, foi nomeado um primeiro governo interino, seguido posteriormente por muitos outros.

O abismo fica visível

"Se tivéssemos sabido que todo este sistema era apenas uma fachada de papelão, que se quebra quando se bate de leve, então teríamos nos arriscado muito mais cedo", declara hoje o informático Skander. Mas durante muitos anos o regime Ben Ali incutiu o medo na população, fazendo-a acreditar que seu Estado policial era onipotente.

Desde 2008, protestos contra o poder estatal eclodiam nas pobres regiões mineradoras do interior da Tunísia. Mas naquela época a polícia conseguia ainda reprimir e limitar regionalmente as manifestações. O fato de os novos protestos terem se espalhado por todo o país se deve também ao poder das redes sociais, que apesar da intensa censura estatal substituíram a mídia monitorada pelo Estado, divulgando informações com toda rapidez para todo o país.

Um ano após a autoimolação de Bouazizi, a Tunísia deu um passo gigante à frente. Em outubro, foram realizadas as primeiras eleições livres no país, e um mês depois a Assembleia Constituinte iniciou seus trabalhos. Sua tarefa é criar, no prazo de um ano, uma base para o desenvolvimento do país. No entanto, neste ano, também se tornou visível um abismo que atravessa a sociedade – e que ficou encoberto, enquanto se partilhava um inimigo comum com o regime Ben Ali.

As eleições, em que o partido islâmico moderado Ennahda obteve 89 assentos – ou seja, 40% dos mandatos na Assembleia Constituinte –, expressam a fragmentação na oposição secular. A maioria dos partidos apostou nos temas da economia e trabalho. Durante a campanha, o projeto de Constituição desempenhou apenas um papel subordinado. "Perdemos de vista o mais importante. Que tipo de governo queremos no futuro para a Tunísia, como queremos viver?", critica o filósofo e estudioso islâmico Youssef Seddik, que participou das eleições como candidato independente.

Desafios à frente

A Assembleia Constituinte, de onde também irá sair um novo governo de transição, está diante de grandes desafios. O Banco Central da Tunísia projeta, para 2011, um crescimento zero da economia. A taxa de desemprego no país está por volta de 18%, chegando a mais de 50% em algumas regiões do interior do país.

Seddik disse estar convencido de que "Ennahda ganhou as eleições porque prometeu ao povo o que ele queria ouvir – trabalho e estabilidade". O filósofo de 68 anos acredita que muitos dos eleitores do Ennahda não concordam com a orientação religiosa do partido. Seddik encara de forma relativamente relaxada uma suposta islamização do país.

Mas não somente a economia deve ser impulsionada, particularmente os Ministérios da Justiça e do Interior têm de ser reformados, pois ainda são ocupados pelas antigas forças. Também tem sido lenta a renovação do temido aparato policial. Por esse motivo, muitos tunisianos ainda temem uma contrarrevolução. É preciso estar atento, adverte Youssef Seddik seus concidadãos.

Ele relembra a Revolução Francesa, que precisou de anos para se afirmar. "Um ponto de interrogação permanece, durante um período relativamente longo de tempo, por trás de quase todas as revoluções. Mas eu sou otimista. O antigo sistema desmoronou e as pessoas se atrevem a expressar suas opiniões sem medo!". Ele acredita que esse é o passo mais importante rumo à democracia.

Autora: Sarah Mersch (ca)
Revisão: Roselaine Wandscheer

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