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Análise

17 de maio de 2009

Para o sociólogo Richard Sennett, a passividade da maioria frente à crise resulta de um perfil social nascido com a 'new economy': falta de identidade e solidariedade, além de amor pelo efêmero e pelo lucro rápido.

Richard Sennett: 'sociedade de camaleões'Foto: picture-alliance/ dpa

Para os trabalhadores comuns, os últimos 20 anos não foram dos melhores. Mesmo nos momentos mais estáveis, com um mercado acionário em ascensão, a maioria dos trabalhadores quase não teve aumento salarial, enquanto o volume de trabalho crescia continuamente.

Essa foi uma das análises feitas pelo norte-americano Richard Sennett, professor de Sociologia e História na London School of Economics, quando participou de um congresso de comemoração dos 30 anos do diário taz, die tageszeitung, em Berlim. Segundo Sennett, a tendência de aumentar o lucro rápido, em vez de se orientar por uma produção de valores de longo prazo, gerou um déficit social nas empresas.

"E uma das características mais essenciais das mudanças na organização do trabalho da new economy dos últimos 15 anos foi o enfraquecimento das relações e vínculos entre as pessoas. Elas perderam a identidade, estão concentradas somente no efêmero, transformaram-se em camaleões. Fizeram de tudo para aumentar seu valor de mercado, orientando-se não pelo lucro de longo prazo, mas somente pelas cotações imediatas de suas ações", explica o sociólogo.

Solidariedade minguante

No universo da 'new economy', solidariedade nunca esteve na ordem do diaFoto: AP

Principalmente no âmbito atraente das altas finanças, na mídia, na indústria de criatividade e high tech, a fidelidade à empresa e aos funcionários perdeu o valor. Isso, contudo, modifica fundamentalmente o cotidiano das pessoas.

"Quando se vive numa organização que funciona como uma porta giratória – com pessoas entrando e saindo incessantemente – fica difícil criar um vínculo com o lugar. As relações com outras pessoas, que se encontram na mesma situação, não se aprofundam, pois o período de convivência diminui. As pessoas não criam uma base de confiança entre si e o resultado disso é uma solidariedade cada vez menor. Aí está, por exemplo, a grande dificuldade de integrar pequenos e médios funcionários da new economy em sindicatos. Eles simplesmente não compreendem o que é isso", analisa Sennett.

Humilhação e degradação

Para o sociólogo, outro problema crucial é a forma como é hoje feita a seleção de profissionais para um cargo e sob qual tipo de liderança eles são obrigados a funcionar. Quando há 20 candidatos a uma determinada vaga, por exemplo, só é aceito aquele especialmente talentoso, o mais extraordinário de todos. Dos outros 19 nem se toma conhecimento. Essa perversão da sociedade voltada apenas para o desempenho leva, segundo Sennett, a uma humilhação e a uma degradação dos outros 19 candidatos, que não recebem nem mesmo um voto de confiança de que podem executar um bom trabalho.

"Isso não signfica, porém, que você [estando entre os 19 restantes] seja ruim, mas simplesmente que ninguém percebe a sua existência, não tem interesse por você. E é exatamente isso que os empregadores fazem: eles estão interessados apenas em achar uma pessoa entre 20. Essa é uma situação extraordinariamente deprimente para os que ficam de fora. E rouba também energia das pessoas que têm autoconfiança. Como já disse, isso não é apenas um fenômeno que ocorre no ambiente de trabalho, mas corresponde também à forma como organizamos hoje nosso sistema de formação profissional. Isso ocorre no Reino Unido, nos EUA – espero que na Alemanha não – mas com certeza também na França", critica Sennett.

Isenção de responsabilidade

Altos executivos: nenhuma responsabilidade sobre as consequências dos próprios atosFoto: picture-alliance/chromorange

E isso não é tudo. Para compreender a falta de energia dos trabalhadores na atual crise financeira, basta, segundo o sociólogo, dar uma olhada na elite do conselhos de administração e da cúpula das empresas. Na maioria dos casos, todas essas pessoas se conhecem muito bem entre si.

"Ao fracassar numa empresa, você sai pela porta e entra a seguir em outra, ocupando a mesma posição, talvez até mesmo com melhores salários. Não há nenhum tipo de responsabilidade na esfera do alto executivo. Essas pessoas não são chamadas à responsabilidade. O problema é que os funcionários nos escalões inferiores sabem que quando as coisas dão errado, os chefões lá de cima não precisam prestar contas", completa Sennett.

Dissociação entre poder e autoridade

Isso, para o sociólogo, leva a uma dissociação entre poder e autoridade. Quanto mais poder uma pessoa tiver, mais facilmente ela consegue escapar; quanto menos poder um funcionário tiver e mais baixa for sua posição na hierarquia da empresa, mais dependente e inflexível é sua situação. Estes, no entanto, acabam sofrendo com os erros dos executivos.

"O que aconteceu nos últimos 30 anos é que se construiu um sistema muito precário. A arquitetura, a infra-estrutura e a estrutura institucional são pouco engenhosas. Como todos os anglo-saxões, espero que, primeiramente na Alemanha, se torne possível chamar as pessoas à responsabilidade por sua incompetência. Isso possibilitará uma mudança social fundamental no sistema", completa Sennett.

Por fim, o sociólogo norte-americano ainda deu alguns conselhos aos sindicatos, durante sua visita a Berlim. Eles deveriam iniciar reformas imediatamente e optar, no futuro, por uma organização que se oriente menos por setores e profissões e mais pelos lugares onde as pessoas vivem e trabalham. Assim, acredita Sennett, talvez seja possível haver de novo mais solidariedade em prol de interesses comuns.

Autora: Ulrike Mast-Kirschning

Revisão: Simone Lopes

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