Von Weizsäcker, o presidente que deu brilho à política alemã
2 de fevereiro de 2015Isso nunca tinha acontecido: pessoas de todos os lugares da Alemanha lotando lojas de discos e livrarias para comprar um discurso comemorativo. Um discurso que não pode ser simplesmente lido, mas que deve ser escutado.
A principal fala do ex-presidente da República Federal da Alemanha Richard von Weizsäcker foi proferida diante do Bundestag (câmara baixa do Parlamento alemão) por ocasião dos 40° aniversário do fim da Segunda Guerra Mundial, em 8 de maio de 1985. Foi um balanço crítico e bastante atual da capitulação alemã, o qual chamou atenção e ganhou reconhecimento também no exterior.
"Para nós alemães, o 8 de maio não é um dia de celebração", disse Von Weizsäcker em seu memorável discurso. "As pessoas que o vivenciaram de forma consciente olham, em retrospecto, para experiências bastante pessoais e, assim, bem diferentes. Uns voltaram para casa, outros ficaram sem pátria. Para uns, veio a liberdade; para outros, o cárcere." Segundo Von Weizsäcker, alguns alemães teriam se deparado com ilusões despedaçadas, enquanto outros ficaram gratos pela possibilidade do recomeço.
Von Weizsäcker resumiu em palavras a história vivida – também a sua pessoal. Na ocasião, fazia somente um ano que o ex-prefeito de Berlim havia se tornado o sexto presidente da República Federal da Alemanha.
Marcado pelo nazismo e pelo fim da guerra
A base para a carreira do político foi estabelecida já na sua infância. Nascido em 15 de abril de 1920 em Stuttgart, Richard Freiherr von Weizsäcker cresceu numa família de diplomatas. Entre 1938 e 1943, o pai, Ernst von Weizsäcker, foi secretário adjunto no Ministério do Exterior de Hitler. Depois, até o fim da guerra, foi diplomata na Santa Sé. Após uma educação excelente em vários países da Europa, Richard von Weizsäcker prestou serviço militar – por último como capitão da Wehrmacht (Forças Armadas do Terceiro Reich).
Após a guerra, ele estudou Direito e trabalhou como assistente para um advogado que defendeu o seu pai nos julgamentos de crimes de guerra em Nurembergue. Ernst von Weizsäcker foi condenado a sete anos de prisão.
O filho foi marcado pela crueldade e pela rápida queda do regime nazista. Foram essas vivências que se refletiram em seu célebre discurso e que, em meados da década de 1980, falaram por muitos alemães.
"O 8 de maio foi um dia de libertação." Principalmente por essa frase do discurso comemorativo de 1985, recordando o fim da Segunda Guerra Mundial, Von Weizsäcker é lembrado até hoje. Para muitos, essa libertação significou o início do sofrimento, disse o ex-presidente. Mas os alemães, acrescentou Von Weizsäcker, não devem ver o fim da guerra como motivo de medo, expatriação e falta de liberdade – isso se aplicaria muito mais ao início do conflito.
Reconciliação com o Leste Europeu e Israel
Em seus dez anos de mandato, Von Weizsäcker estabeleceu como principal objetivo a reconciliação com o Leste Europeu e Israel. Ele estava convencido de que não eram o esquecimento e a sublimação que proporcionariam uma oportunidade para o recomeço, mas a lembrança e a reflexão.
Durante seu mandato, aconteceu finalmente a reunificação alemã: Helmut Kohl foi festejado como o "chanceler federal da unidade". Em contrapartida, Von Weizsäcker manteve-se em segundo plano. Ao contrário de muitos outros, ele achou melhor observar com cautela a aproximação dos Estados divididos.
Após o final de seu mandato presidencial, em 1994, Von Weizsäcker continuou a ser um procurado consultor dentro e fora da Alemanha, assim como um defensor apaixonado da democracia e da liberdade. Algumas vezes, ele não poupou até mesmo os seus amigos correligionários da União Democrata Cristã.
No entusiasmado intercâmbio com intelectuais, artistas e empresários, Von Weizsäcker conferiu um pouco de brilho à política alemã. Mas ele não foi nenhum presidente próximo do povo, nenhum cantor amador ou adepto de caminhadas, como seus antecessores Walter Scheel e Karl Carstens. E ele também não foi nenhum pensador jocoso, como seu sucessor Roman Herzog.
Ele foi muito mais um protótipo de representante sério e letrado, que por meio de sua pessoa, sua história e, principalmente, sua forma diplomática ganhou reconhecimento também entre a população. Até a sua morte, no último sábado (31/01), Von Weizsäcker continuou sendo uma importante instância moral.