Rocha em memória de vítimas do nazismo ofende poloneses
Jacek Lepiarz
19 de junho de 2025
Há anos a Alemanha planeja um memorial para os milhões de mortos na Polônia ocupada na 2ª Guerra. Atrasos levaram a solução provisória, e "pedra da vergonha" em Berlim desperta antigo clamor por reparação trilionária.
Memorial para vítimas polonesas do regime nazista, no centro de BerlimFoto: Wojciech Szymanski/DW
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Em Berlim, uma rocha de quase 30 toneladas recorda, desde a segunda-feira (16/06), os 5 a 6 milhões de poloneses mortos pelos invasores nazistas durante a Segunda Guerra Mundial(1939-1945). Justamente nesse local do bairro Tiergarten, entre a Chancelaria Federal e o histórico Reichstag, sede do parlamento, ficava a Casa de Ópera Kroll, onde em 1º de setembro de 1939 Adolf Hitler anunciou a invasão da Polônia.
Trata-se de uma iniciativa de sociedade civil, lançada em 2017 por amigos alemães da Polônia, entre os quais políticos de ponta, e agora alvo de críticas cáusticas. O projeto original, de uma Casa Teuto-Polonesa, abrigando, além de um memorial, também um centro de documentação e um polo de encontro, vem sendo adiado há bastante tempo.
A pedra memorial é uma solução provisória, com o fim de polir um pouco a imagem da Alemanha, não só junto à parcela liberal e pró-europeia da sociedade polonesa, como também aos meios conservadores em torno do líder do Partido Lei e Justiça (PiS), Jaroslaw Kaczynski. No fim das contas, porém, o cálculo deu errado.
Pedra da discórdia indigna conservadores poloneses
Como todo projeto teuto-polonês, a bem-intencionada ideia foi parar no redemoinho político entre o governo de centro-esquerda do primeiro-ministro Donald Tusk e a oposição nacional-conservadora. Pois a desconfiança em relação a Berlim é parte inalienável da visão de mundo do PiS.
"Um espetáculo absurdo. Em vez de reparação real, flores debaixo de uma rocha", exclamou na plataforma X um dos afiliados ilustres da legenda populista de direita, o ex-chefe de governo Mateusz Morawiecki. "Nenhum político polonês deve se ajoelhar diante de uma pedra antes que os alemães se ajoelhem diante da verdade e acertem contas por seus crimes."
Inauguração do memorial provisório em 16 de junho de 2025, no bairro Tiergarten de BerlimFoto: Christian Ditsch/epd/IMAGO
Outro político do PiS, o deputado Szymon Szynkowski vel Sek, justificou assim seu rechaço: "Por um lado, os alemães não querem falar de reparações e indenizações pela Segunda Guerra Mundial, por outro, forçam a gente a se alegrar com uma pedra."
O ex-ministro do Exterior Pawel Jablonski condenou o monumento como expressão da "mentirosa política histórica alemã", afirmando que toda presença de um político polonês na inauguração seria "traição dos interesses nacionais da Polônia".
"Depois de 80 anos... uma pedra ao invés de compensação real. Um símbolo indigno, perante a dimensão do sofrimento polonês", queixou-se no X Arkadiusz Mularczyk. De 2022 a 2023, como secretário de Estado no Ministério do Exterior do governo liderado pelo PiS, ele coordenava os esforços pelas reparações alemãs, as quais, segundo cálculos poloneses, chegariam a 1,3 trilhão de euros.
Já o ministro do Exterior do atual governo de coalizão, Wladyslaw Teofil Bartoszewski, defendeu o projeto: "Há anos nos engajamos por esse memorial. É bom que ele vá ser criado. Primeiro vem a pedra, depois o memorial, numa localização muito boa de Berlim. É um marco."
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História sem fim
Nas redes sociais da Polônia há dias se agita uma verdadeira shitstorm: fala-se de "pedra da vergonha", "descaramento alemão", "um espetáculo vergonhoso". Também usuários moderados colocam em dúvida a boa fé dos alemães, perguntando-se se o projeto da Casa Teuto-Polonesa vai mesmo dar em algo.
Até veículos de imprensa não ligados ao PiS veem a homenagem com olhos entre céticos e críticos: "Os alemães não entendem os poloneses", afirmou Estera Flieger no jornal Rzeczpospolita. "Trata-se de estar na mesma altura, olho a olho: ou as relações teuto-polonesas serão de parceria, ou não vai haver relação nenhuma." A Polônia não é mais "a irmã mais pobre da Alemanha na Europa", advertiu, acusando os alemães de não terem registrado essa mudança.
De fato, os esforços por um memorial digno para as vítimas polonesas da Segunda Guerra Mundial lembram uma história sem fim. Como encarregado de Varsóvia para contatos com a Alemanha e Israel, de 2007 a 2015 o ex-prisioneiro do campo de concentração de Auschwitz Wladyslaw Bartoszewski exigiu insistentemente um local de homenagem.
Ex-prisioneiro de Auschwitz Wladyslaw Bartoszewski reivindicou durante oito anos a criação de um memorialFoto: Julien Warnand/dpa/picture alliance
Como esses apelos não encontraram ressonância, em 2017 a sociedade civil alemã tomou a iniciativa. Endossada por líderes políticos, reivindicou do parlamento e da opinião pública um memorial "no centro de Berlim" às vítimas do terror nazista na Polônia ocupada.
Apesar de críticos advertirem contra uma "nacionalização do discurso da vítima", em 2020 o Legislativo aprovou a criação de um "local de recordação e encontro". Mas só em junho de 2024 o governo finalmente deu andamento ao projeto do memorial – até a queda do governo de coalizão liderado pelo social-democrata Olaf Scholz pôr todos os projetos teuto-poloneses no freezer.
O projeto de construção do memorial, porém, foi resgatado no acordo de coalizão de governo do atual chanceler federal Friedrich Merz.
"Os poloneses chateiam"
A rocha da discórdia provisória é uma forma de apresentar algo concreto por ocasião dos 80 anos do fim da Segunda Guerra, pelo menos mostrando que a Alemanha não esqueceu as vítimas polonesas. Porém o presidente polonês eleito, Karol Nawrocki – político independente aliado ao PiS que deverá assumir em 6 de agosto –, já anunciou que manterá a pressão por uma indenização.
"A questão das reparações, ao contrário do que pensa Tusk, esse lacaio do Estado alemão, não está resolvida", disse ele a um jornal antes mesmo do segundo turno das eleições, prometendo lutar pela causa "desde o primeiro dia de sua presidência".
O novo parlamento alemão deverá dar em breve o sinal verde para a realização da Casa Teuto-Polonesa. Porém alguns anos deverão passar até sua inauguração, sendo pouco provável que as últimas testemunhas polonesas dos crimes de guerra alemães possam vivenciar esse momento.
E assim o tema continuará ocupando a política e a mídia. "Os poloneses chateiam, e chateiam com razão: eles fizeram por merecer que a Alemanha os leve a sério", comentou o editor-chefe do jornal Berliner Zeitung, da capital alemã, Tomasz Kurianowicz.
Cronologia da Segunda Guerra Mundial
Em 1° de setembro de 1939, as Forças Armadas alemãs atacaram a Polônia, sob ordens de Hitler. A guerra que então começava duraria até 8 de maio de 1945, deixando um saldo até hoje sem paralelo de morte e destruição.
Foto: U.S. Army Air Forces/AP/picture alliance
1939
No dia 1° de setembro de 1939, as Forças Armadas alemãs atacaram a Polônia sob ordens de Adolf Hitler – supostamente em represália a atentados poloneses, embora isso tenha sido uma mentira de guerra. No dia 3 de setembro, França e Reino Unido, que eram aliadas da Polônia, declararam guerra à Alemanha, mas não intervieram logo no conflito.
1939
A Polônia mal pôde oferecer resistência às bem equipadas tropas alemãs – em cinco semanas, os soldados poloneses foram derrotados. No dia 17 de setembro, o Exército Vermelho ocupou o leste da Polônia – em conformidade com um acordo secreto fechado entre o Império Alemão e a União Soviética apenas uma semana antes da invasão.
Foto: AP
1940
Em abril de 1940, a Alemanha invadiu a Dinamarca e usou o país como base até a Noruega. De lá vinham as matérias-primas vitais para a indústria bélica alemã. No intuito de interromper o fornecimento desses produtos, o Reino Unido enviou soldados ao território norueguês. Porém, em junho, os aliados capitularam na Noruega. Nesse meio tempo, a Campanha Ocidental já havia começado.
1940
Durante oito meses, soldados alemães e franceses se enfrentaram no oeste, protegidos por trincheiras. Até que, em 10 de maio, a Alemanha atacou Holanda, Luxemburgo e Bélgica, que estavam neutros. Esses territórios foram ocupados em poucos dias e, assim, os alemães contornaram a defesa francesa.
Foto: picture alliance/akg-images
1940
Os alemães pegaram as tropas francesas de surpresa e avançaram rapidamente até Paris, que foi ocupada em meados de junho. No dia 22, a França se rendeu e foi dividida: uma parte ocupada pela Alemanha de Hitler e a outra, a "França de Vichy", administrada por um governo fantoche de influência nazista e sob a liderança do general Pétain.
Foto: ullstein bild/SZ Photo
1940
Hitler decide voltar suas ambições para o Reino Unido. Seus bombardeios transformaram cidades como Coventry em cinzas e ruínas. Ao mesmo tempo, aviões de caça travavam uma batalha aérea sobre o Canal da Mancha, entre o norte da França e o sul da Inglaterra. Os britânicos venceram e, na primavera europeia de 1941, a ofensiva alemã estava consideravelmente enfraquecida.
Foto: Getty Images
1941
Após a derrota na "Batalha aérea pela Inglaterra", Hitler se voltou para o sul e posteriormente para o leste. Ele mandou invadir o norte da África, os Bálcãs e a União Soviética. Enquanto isso, outros Estados entravam na liga das Potências do Eixo, formada por Alemanha, Itália e Japão.
1941
Na primavera europeia, depois de ter abandonado novamente o Pacto Tripartite, Hitler mandou invadir a Iugoslávia. Nem a Grécia, onde unidades inglesas estavam estacionadas, foi poupada pelas Forças Armadas alemãs. Até então, uma das maiores operações aeroterrestres tinha sido o ataque de paraquedistas alemães a Creta em maio de 1941.
Foto: picture-alliance/akg-images
1941
O ataque dos alemães à União Soviética no dia 22 de junho de 1941 ficou conhecido como Operação Barbarossa. Nas palavras da propaganda alemã, o objetivo da campanha de invasão da União Soviética era uma "ampliação do espaço vital no Oriente". Na verdade, tratava-se de uma campanha de extermínio, na qual os soldados alemães cometeram uma série de crimes de guerra.
Foto: Getty Images
1942
No começo, o Exército Vermelho apresentou pouca resistência. Aos poucos, no entanto, o avanço das tropas alemãs chegou a um impasse na Rússia. Fortes perdas e rotas inseguras de abastecimento enfraqueceram o ataque alemão. Hitler dominava quase toda a Europa, parte do norte da África e da União Soviética. Mas no ano de 1942 houve uma virada.
1942
A Itália havia entrado na guerra em junho de 1940, como aliada da Alemanha, e atacado tropas britânicas no norte da África. Na primavera de 1941, Hitler enviou o Afrikakorps como reforço. Por muito tempo, os britânicos recuaram – até a segunda Batalha de El Alamein, no outono de 1942. Ali a situação mudou, e os alemães bateram em retirada. O Afrikakorps se rendeu no dia 13 de maio de 1943.
Foto: Getty Images
1942
Atrás do fronte leste, o regime de Hitler construiu campos de extermínio, como Auschwitz-Birkenau. Mais de seis milhões de pessoas foram vítimas do fanatismo racial dos nazistas. Elas foram fuziladas, mortas com gás, morreram de fome ou de doenças. Milhares de soldados alemães e da SS estiveram envolvidos nestes crimes contra a humanidade.
Foto: Yad Vashem Photo Archives
1943
Já em seu quarto ano, a guerra sofreu uma virada. No leste, o Exército Vermelho partiu para o contra-ataque. Vindos do sul, os aliados desembarcaram na Itália. A Alemanha e seus parceiros do Eixo começaram a perder terreno.
1943
Stalingrado virou o símbolo da virada. Desde julho de 1942, o Sexto Exército alemão tentava capturar a cidade russa. Em fevereiro, quando os comandantes desistiram da luta inútil, cerca de 700 mil pessoas já haviam morrido nesta única batalha – na maioria soldados do Exército Vermelho. Essa derrota abalou a moral de muitos alemães.
Foto: picture-alliance/dpa
1943
Após a rendição das tropas alemãs e italianas na África, o caminho ficou livre para que os Aliados lutassem contra as potências do Eixo no continente europeu. No dia 10 de julho, aconteceu o desembarque na Sicília. No grupo dos Aliados estavam também os Estados Unidos, a quem Hitler havia declarado guerra em 1941.
Foto: picture alliance/akg
1943
Em setembro, os Aliados desembarcaram na Península Itálica. O governo em Roma acertou um armistício com os Aliados, o que levou Hitler a ocupar a Itália. Enquanto os Aliados travavam uma lenta batalha no sul, as tropas de Hitler espalhavam medo pelo resto do país.
No leste, o Exército Vermelho expulsou os invasores cada vez mais para longe da Alemanha. Iugoslávia, Romênia, Bulgária, Polônia... uma nação após a outra caía nas mãos dos soviéticos. Os Aliados ocidentais intensificaram a ofensiva e desembarcaram na França, primeiramente no norte e logo em seguida no sul.
1944
Nas primeiras horas da manhã do dia 6 de junho, as tropas de Estados Unidos,Reino Unido, Canadá e outros países desembarcaram nas praias da Normandia, no norte da França. A liderança militar alemã tinha previsto que haveria um desembarque – mas um pouco mais a leste. Os Aliados ocidentais puderam expandir a penetração nas fileiras inimigas e forçar a rendição de Hitler a partir do oeste.
Foto: Getty Images
1944
No dia 15 de agosto, os Aliados deram início a mais um contra-ataque no sul da França e desembarcaram na Provença. As tropas no norte e no sul avançaram rapidamente e, no dia 25 de agosto, Paris foi libertada da ocupação alemã. No final de outubro, Aachen se tornou a primeira grande cidade alemã a ser ocupada pelos Aliados.
Foto: Getty Images
1944
No inverno europeu de 1944/45, as Forças Armadas alemãs reuniram suas tropas no oeste e passaram para a contra-ofensiva em Ardenne. Mas, após contratempos no oeste, os Aliados puderam vencer a resistência e avançar inexoravelmente até o "Grande Império Alemão" – a partir do leste e do oeste.
Foto: imago/United Archives
1945
No dia 8 de maio de 1945, os nazistas se renderam incondicionalmente. Para escapar da captura, Hitler se suicidou com um tiro no dia 30 de abril. Após seis anos de guerra, grande parte da Europa estava sob entulhos. Quase 50 milhões de pessoas morreram no continente durante a Segunda Guerra Mundial. Em maio de 1945, o marechal de campo Wilhelm Keitel assinava a ratificação da rendição em Berlim.