Ruanda vai taxar igrejas e acusa pastores de enganarem fiéis
Chrispin Mwakideu
18 de novembro de 2024
Proliferação de igrejas neopentecostais no país africano levou governo de Paul Kagame a acusar pastores de "espremerem dinheiro" de ruandeses mais pobres. Milhares de templos foram fechados e críticos denunciam repressão
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Todos os domingos em Kigali, a capital de Ruanda, pequena nação da África central, cristãos elegantemente vestidos vão às igrejas para assistir aos cultos, nos quais cantam, oram, ouvem sermões e fazem ofertas, principalmente em dinheiro.
A quantia arrecadada com essas ofertas costuma ser usada para pagar as despesas de funcionamento da igreja e os salários dos que para ela trabalham. Em Ruanda, igrejas não pagam impostos.
Porém, se os planos do governo forem aprovados, elas poderão ser obrigadas a pagarem impostos sobre as ofertas em dinheiro dos fiéis. O projeto de lei para isso já teria sido concluído pela agência encarregada de regulamentar as organizações religiosas, o Conselho de Governança de Ruanda (RBG), informou a imprensa local.
Segundo o censo de 2022 de Ruanda, mais de 90% da população do país se identifica como cristã. Entretanto, a proliferação de igrejas neopentecostais, que muitos críticos acusam de visar os pobres com a pregação da teologia da prosperidade, tem levado o governo do presidente Paul Kagame, que governa Ruanda com mão de ferro desde 1994, a agir contra as igrejas.
Regular em vez de taxar?
A ativista e advogada Marie Louise Uwimana disse ser contra a taxação das ofertas e do dízimo, argumentando que esse dinheiro é usado para pagar as despesas da igreja, assim como obreiros e pastores. "Em vez de tributar as igrejas, o governo deveria criar regulamentações e leis para colocar esse setor na linha e evitar que alguns líderes religiosos possam extorquir fiéis inocentes e desavisados", afirma.
O RBG fechou quase 8 mil igrejas e mesquitas após um processo de avaliação, sob o argumento de que muitas não cumpriam os padrões de infraestrutura, como protocolos de segurança, e outras estariam operando ilegalmente.
As igrejas estão lucrando com seus seguidores?
"Eles vão começar a taxar as igrejas, que não têm fins lucrativos, mas querem taxá-las porque acham que elas estão lucrando às custas das pessoas", comenta o jornalista político Ivan Mugisha. "Então o governo agora está tentando cobrar impostos de pessoas que exploram pessoas? Isso meio que não faz sentido."
Para Mugisha, a repressão às igrejas é mais uma medida autoritária do presidente Kagame. Segundo o jornalista, muitos líderes religiosos estão insatisfeitos com a decisão. "Alguns deles que expressaram sua opinião foram mandados se calar. Então, isso está acontecendo porque todos se calaram, porque você sabe que, se disser algo, sua igreja estará em apuros."
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Os motivos de Kagame
Kagame há muito tenta regulamentar as igrejas, acusando alguns pastores de "espremerem" fiéis pobres "até o último centavo". "Para dizer a verdade, essas igrejas que aparecem por todo lado existem apenas para espremer até o último centavo de ruandeses pobres, enquanto os donos delas enriquecem", disse Kagame.
Então a ação do governo de Ruanda contra as igrejas é justificada? "De certa forma, o governo ultrapassou uma fronteira quando se trata de liberdade de culto e expressão", diz Mugisha. "Mas sempre há uma justificativa para tudo, por exemplo [o governo] diz que as igrejas estão controlando e confundindo pessoas."
O governo de Ruanda também quer que os líderes religiosos obtenham pelo menos um diploma de bacharel antes de serem autorizados a subir ao púlpito.
Vai funcionar?
"A ideia de tributar as igrejas não funcionará", comenta o estudante universitário Charles Kamanzi. "O governo pretende coibir a extorsão por esses líderes de igrejas e igrejas que estão recebendo muito dinheiro dessas pessoas. A ideia pode ser boa, mas como ela será implementada?", questiona.
Ele argumentou que outras igrejas, como a Católica, a protestante e demais igrejas tradicionais, têm escolas, hospitais e outras instituições de interesse público que administram. "Elas também serão tributadas? Acho que não. Isso torna a tributação desigual. Então quem será tributado? É muito difícil de entender", disse o jovem de 24 anos, acrescentando que a ideia de taxar mostra o fracasso do governo em regulamentar as igrejas.
"Quando as pessoas se unem a grupos religiosos, não se trata apenas de manipulação, mas de sua fé", diz Mugisha, enfatizando que atacar a fé das pessoas "significa restringir uma liberdade muito especial que elas têm".
O mês de novembro em imagens
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Foto: Fotoarena/IMAGO
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Foto: Manaure Quintero/AFP/Getty Images
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Foto: Alberto Saiz/AP Photo/picture alliance
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