Sérgio Cabral e esposa se tornam réus na Lava Jato
16 de dezembro de 2016
Segundo Ministério Público, casal está envolvido no pagamento de propinas a partir do contrato celebrado entre a Petrobras e um consórcio de empresas investigadas pela Lava Jato.
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O ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral (PMDB) e mais seis pessoas, entre elas a ex-primeira-dama do estado Adriana Ancelmo, viraram réus nesta sexta-feira (16/12) no âmbito da força-tarefa Lava Jato, após o juiz Sérgio Moro acatar denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal (MPF).
Segundo o MPF, o grupo está envolvido no pagamento de propinas a partir do contrato celebrado entre a Petrobras e o Consórcio Terraplanagem do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), formado pelas empresas Andrade Gutierres, Queiroz Galvão e Odebrecht – todas já investigadas pela Operação Lava Jato.
Cabral e a sua mulher foram denunciados pelos crimes de lavagem de dinheiro e corrupção passiva. Na lista de réus da denúncia estão Wilson Carlos (ex-secretário da gestão Cabral) e Carlos Emanuel Miranda (sócio de Cabral), ambos por corrupção ativa e lavagem de dinheiro; também Clóvis Primo e Rogério Nora, denunciados por corrupção ativa, e Mônica Carvalho, esposa de Wilson, citada por lavagem de dinheiro. Estes três estão em liberdade.
Segundo a denúncia, a quantia de 2,7 milhões de reais em propina foi desviada de um contrato da Petrobras com a empreiteira Andrade Gutierrez para realização de serviços de terraplanagem nas obras do Comperj. Após aditivos, o contrato, que no início foi de 819,8 milhões de reais, ultrapassou os 1,17 bilhão de reais, destacaram os procuradores autores da denúncia aceita por Moro.
De acordo com a acusação, a indicação de que os pagamentos deveriam ser feitos a Cabral foi feita pelo ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, que possui acordo de delação premiada com o MPF.
Segundo a denúncia oferecida pelo MPF, juntos, Cabral e sua esposa usaram o dinheiro das propinas para a blindagem de carros, aquisição de móveis e roupas finas. Só na aquisição de roupas da marca Ermenegildo Zegna, por exemplo, foram gastos mais de 232 mil reais em espécie.
Os procuradores disseram que o próprio Cabral participou das negociações visando a propina. "No âmbito dos beneficiários, o próprio governador e seus associados Wilson Carlos Cordeiro da Silva Carvalho e Carlos Emanuel de Carvalho Miranda teriam participado dos acertos e da operacionalização do recebimento de valores”, escreveu o MPF na denúncia aceita por Moro.
Esta é a primeira vez que Sérgio Cabral e Adriana Ancelmo se tornam réus na Lava Jato. O casal já responde como réu na Operação Calicute pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro, formação de quadrilha e organização criminosa.
As denúncias fazem parte da Calicute, desdobramento da operação Lava Jato que apura o desvio de ao menos 224 milhões de reais em obras do governo do Rio de Janeiro, como a reforma do Maracanã e o Arco Metropoliltano, em troca de contratos públicos e incentivos fiscais a diversas empreiteiras.
A Polícia Federal apura, desde 2014, um esquema bilionário de lavagem e desvio de dinheiro envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras e políticos. Entenda a maior investigação sobre corrupção já conduzida no país.
Foto: AFP/Getty Images
O início
A Operação Lava Jato foi deflagrada pela Polícia Federal em 17 de março de 2014. Começou investigando um esquema de desvio de recursos públicos e lavagem de dinheiro e descobriu a existência de uma imensa rede de corrupção envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras do país e políticos. O nome vem de um posto de gasolina em Brasília, um dos alvos da PF no primeiro dia de operação.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Brandt
O esquema
Executivos da Petrobras cobravam propina de empreiteiras para, em troca, facilitar as negociações dessas empresas com a estatal. Os contratos eram superfaturados, o que permitia o desvio de verbas dos cofres públicos a lobistas e doleiros, os chamados operadores do esquema. Eles, por sua vez, eram encarregados de lavar o dinheiro e repassá-lo a uma série de políticos e funcionários públicos.
Foto: Reuters/S. Moraes
As figuras-chave
O esquema na Petrobras se concentrava em três diretorias: de abastecimento, então comandada por Paulo Roberto Costa; de serviços, sob direção de Renato Duque; e internacional, cujo diretor era Nestor Cerveró. Cada área tinha seus operadores para distribuir o dinheiro. Um deles era o doleiro Alberto Youssef (foto), que se tornou uma das figuras centrais da trama. Todos os citados foram condenados.
Foto: imago/Fotoarena
As empreiteiras
As grandes construtoras do país formaram uma espécie de cartel: decidiam entre si quem participaria de determinadas licitações da Petrobras e combinavam os preços das obras. Os executivos da estatal, por sua vez, garantiam que apenas o cartel fosse convidado para as licitações. Entre as empresas investigadas estão Odebrecht, Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa. Vários executivos foram condenados.
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Os políticos
O núcleo político era formado por parlamentares de diferentes partidos, responsáveis pela indicação dos diretores da Petrobras que sustentavam a rede de corrupção dentro da estatal. Os políticos envolvidos recebiam propina em porcentagens que variavam de 1% a 5% do valor dos contratos, segundo os investigadores. O dinheiro foi usado, por exemplo, para financiar campanhas eleitorais.
Foto: J. Sorges
De Cunha a Dirceu...
A investigação só entrou no mundo político em 2015, quando a Lava Jato foi autorizada a apurar mais de 50 nomes, entre deputados, senadores e governadores de vários partidos. Desde então, viraram alvo de investigação políticos como os ex-parlamentares Eduardo Cunha (foto) e Delcídio do Amaral, ambos cassados, os senadores Renan Calheiros, Fernando Collor e o ex-ministro José Dirceu.
Foto: Reuters/A. Machado
... e Lula
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é réu em dez processos relacionados à Lava Jato, sendo acusado pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e obstrução da Justiça. As denúncias indicam que Lula teria recebido benefícios das empreiteiras OAS e Odebrecht, envolvendo imóveis no Guarujá e São Bernardo do Campo. Em 2018, ele foi preso e teve uma nova candidatura à Presidência barrada.
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As prisões
A Lava Jato quebrou tabus no Brasil ao encarcerar altos executivos de empresas e importantes figuras políticas. Entre investigados e aqueles já condenados pela Justiça, estão o executivo Marcelo Odebrecht, ex-presidente da Odebrecht; Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara; Sérgio Cabral, ex-governador do Rio; os ex-ministros José Dirceu (foto) e Antonio Palocci, entre outros.
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As delações
Os acordos de delação premiada são considerados a força-motriz da operação. Depoimentos como o de Marcelo Odebrecht (foto) chegam com potencial para impactar fortemente a investigação. O acordo funciona assim: de um lado, os delatores se comprometem a fornecer provas e contar o que sabem sobre os crimes, além de devolver os bens adquiridos ilegalmente; de outro, a Justiça reduz suas penas.
Foto: Getty Images/AFP/H. Andrey
O juiz
Responsável pela Lava Jato na 1° instância, o ex-juiz federal Sergio Moro logo ganhou notoriedade. Em manifestações, foi ovacionado pelo povo e chegou a ser chamado de "herói nacional". Mas também foi acusado de agir com parcialidade política. Em 2018, deixou o cargo e aceitou ser ministro do presidente Jair Bolsonaro, cuja candidatura foi beneficiada pela prisão de Lula no ano anterior.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Expansão internacional
Se começou num posto de gasolina em Brasília, a Lava Jato ganhou proporções internacionais com o aprofundamento das investigações. Segundo dados do Ministério Público Federal levantados a pedido da DW Brasil, a investigação já conta com a cooperação de pelo menos outros 40 países (veja no gráfico acima). Além disso, 14 países, fora o Brasil, investigam práticas ilegais promovidas pela Odebrecht.
Um terremoto político
Ao longo de cinco anos, a Lava Jato influenciou o impeachment de Dilma Rousseff, enfraqueceu o governo Michel Temer e contribuiu para a derrocada de velhos caciques do PT, MDB e PSDB. Em 2018, Lula, então favorito para vencer as eleições presidenciais, foi preso e teve a candidatura barrada. As investigações também fortaleceram um discurso antissistema que beneficiou a campanha de Bolsonaro.
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Críticas e revelações
A Lava Jato também acumulou acusações de parcialidade e de abusos em seus métodos. Em 2019, os procuradores da força-tarefa foram duramente criticados por tentarem criar uma fundação para gerenciar uma multa bilionária da Petrobras. No mesmo ano, conversas reveladas pelo site "The Intercept" apontaram suspeita de conluio entre Moro e os procuradores na condução dos processos, o que é proibido.