Segunda produção alemã da plataforma de streaming tem como pano de fundo o submundo de Berlim e a diversidade cultural da capital alemã. Enredo gira em torno de dois policiais que investigam a morte de um turco-alemão.
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Após o bem-sucedido thriller sobrenatural Dark, a Netflix produziu sua segunda série em língua alemã: Dogs of Berlin, ou Cães de Berlim, em português. Dramática e muitas vezes brutal, a série é conduzida por uma trilha sonora de gangsta rap e mergulha profundamente tanto na face sombria da criminalidade na capital alemã quanto na sua heterogeneidade social.
O enredo labiríntico de Cães de Berlim, que estreia nesta sexta-feira (07/12) em 190 países, gira em torno de dois policiais não convencionais, Erol Birkan e Kurt Grimmer, que investigam o assassinato do jogador de futebol turco-alemão Orkan Erdem.
A lista de suspeitos é longa: neonazistas do bairro de Marzahn, na antiga Berlim Oriental; o clã familiar turco relacionado à vítima; alguns torcedores fanáticos de futebol; ou a máfia de apostas esportivas ilegais. Uma ampla conspiração poderia até levar ao mais alto escalão político da capital.
Para descobrir a verdade, os dois investigadores, muito diferentes um do outro, se aproximam de maneira relutante para uma missão que revela muito sobre seus próprios passados contraditórios.
O criador e diretor da série, Christian Alvart, descreve Kurt Grimmer (interpretado por Felix Kramer, que atuou em Dark) como o "policial de moral questionável que já foi neonazista e escapou desse meio".
Já Erol Birkan (interpretado por Fahri Yardım, mais conhecido por sua atuação no filme Almanya: Bem-vindo à Alemanha), é "um policial superliberal, gay, o herói íntegro, de certa maneira, com princípios e bom caráter", diz Alvart.
"Essas contradições e áreas cinzentas são, para mim, o ponto central da série", afirma o diretor, que também assina o roteiro. A série nasceu do personagem Kurt Grimmer, que Alvart concebeu para um romance que estava escrevendo.
Narrativa alemã contemporânea
Depois de dirigir o bem-sucedido thrillerAntibodies, de 2005, e trabalhar em vários projetos em Hollywood, como Pandorum, com o ator Dennis Quaid, e Case 39, com Renée Zellweger, Alvart voltou à Alemanha e ficou preocupado com o fato de seu país natal estar ficando para trás no boom de séries de TV transmitidas por canais e plataformas como HBO e Netflix. "Eu simplesmente me convenci de que tínhamos que fazer algo do tipo no país", recorda.
Cães de Berlim foi a primeira ideia desenvolvida por Alvart e sua produtora berlinense, a Syrreal Entertainment, e ele decidiu não seguir a rota convencional da TV alemã. "Havia muito interesse, mas a máquina aqui é conhecida por se mover um pouco mais devagar", descreve o diretor e roteirista.
Em vez disso, Alvart entrou em contato com Erik Barmack, da International Originals, da Netflix. Depois de Cães de Berlim e Dark , há rumores de que mais produções alemãs estão nos planos da gigante do streaming.
"Cães de Berlim conta uma história envolvente e moderna da Alemanha, que mergulha no submundo de Berlim", explica Barmack. "Estamos animados com o fato de realizar a segunda produção original da Netflix completamente escrita, produzida e gravada na Alemanha."
Alvart acredita que a abordagem inovadora e aberta da Netflix em relação ao conceito narrativo da série fez da plataforma e produtora de streaming o parceiro perfeito. "Ao contrário da televisão convencional alemã, com a Netflix, quanto mais incomum for o estilo narrativo e quanto mais pessoal for a perspectiva das coisas, melhor", conta.
Para Alvart, isso significa focar "nos roteiros individuais de cineastas que ampliam e enriquecem a oferta da Netflix. Acho que isso é incrivelmente atraente – sem falar na presença e no alcance global que você consegue com eles", descreve.
Berlim como microcosmo
Alvart vive na capital alemã desde 1996 e sempre quis fazer uma série que incorporasse os múltiplos mundos da cidade.
"Em Berlim, mais cedo ou mais tarde, você se dá conta de que não é apenas uma cidade, mas que são várias cidades diferentes em uma", diz. "Isso tem um impacto maciço sobre a sua vida, não importa se você nasceu como Mahmud no bairro de Neukölln, como Siegfried em Zehlendorf ou como Tom em Marzahn."
Cães de Berlim tenta atravessar essas Berlins diferentes, uma cidade que o diretor acredita ser um microcosmo de um mundo mais amplo. "Essa cidade é basicamente outro personagem principal da série", diz Alvart.
Nesse sentido, Cães de Berlim leva o espectador por uma aventura pelo mundo futebolístico da capital e seu submundo, o das apostas esportivas ilegais, para dentro de clubes de motoqueiros ilegais, para celas terroristas neonazistas na antiga Berlim Oriental, pelos vestígios boêmios de Prenzlauer Berg, pela cena gangsta rap, pelas vidas contrastantes de donas de casa da classe média alemã e pelas organizações da máfia teuto-libanesa.
Ao fazer isso, a série, com dez episódios, também se propõe a abordar questões maiores. Alguém consegue escapar do meio em que nasceu? Somos cães ou mestres? Explorando os diversos meios da capital alemã, onde culturas e estilos de vida colidem constantemente, a série gravada exclusivamente em Berlim e seus arredores inspira o espectador a encontrar respostas.
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O mercado alemão de séries floresce, e não só com produções de emissoras locais. Gigantes como Sky, Amazon e Netflix apostam na estratégia de oferecer obras alemãs a um público internacional.
Foto: Netflix
"Dark", a primeira série alemã da Netflix
Em dezembro de 2017 estreou a primeira série alemã da Netflix para o mercado mundial. A temporada, de dez episódios, trata dos destinos de quatro famílias no interior da Alemanha: o sumiço de duas crianças desencadeia investigações que remontam até a década de 1950. A segunda temporada estreou em junho de 2019, e a terceira foi confirmada para 2020. Foi dublada e legendada em português brasileiro.
Foto: Netflix
Êxito artístico com "Im Angesicht des Verbrechens"
Muitos consideram "Im Angesicht des Verbrechens" (Diante do crime) a melhor série alemã da década: o épico de dois policiais investigando os círculos da máfia russa em Berlim. Contudo as vertiginosas sequências de cenas, enquadramentos sombrios e experimentos formais do diretor Dominik Graf foram ousados demais para parte do público, e a produção teve baixa audiência em 2010.
Foto: ARD/Julia von Vietinghoff
"Parfum", uma série criminal brutal e surpreendente
Em 2018, o canal alemão ZDFneo exibiu a série criminal Parfum (O Perfume), de seis episódios. Na trama, a brutal morte de uma antiga amiga leva um grupo a se reunir. Características específicas no cadáver fazem os amigos pensarem que somente um deles poderia ter cometido o crime. Fora da Alemanha, a produção foi disponibilizada pela Netflix, incluindo no Brasil, legendada e dublada em português.
Foto: Filmfest München 2018
How to Sell Drugs Online (Fast), tom de comédia para assunto sério
Em “How to Sell Drugs Online (Fast)”, que estreou em junho na Netflix, um estudante de uma pequena cidade da Alemanha, filho de um policial, decide vender drogas pela internet para se reaproximar da ex-namorada e arrasta o melhor amigo para o negócio. A série, em tom de comédia, foi dublada e legendada em português brasileiro e o título traduzido para "Como Vender Drogas Online (Rápido)".
Foto: picture-alliance/dpa/Netflix
"Weissensee": Berlim Oriental dos anos 80
Lançada em 2010, "Weissensee" é uma vitória da televisão alemã ao abordar temas da história recente. Tratando de duas famílias de Berlim Oriental na década de 1980, a produção da TV ARD teve boa audiência, já está caminhando para a quarta temporada e foi vendida para a Itália e a Rússia, entre outros mercados.
Foto: picture-alliance/dpa/B. Pedersen
"Deutschland 83" e mais
"Deutschland 83" foi exibida em 2015 na Alemanha pelo canal privado RTL. Apesar de premiada no exterior, ela teve baixa audiência na TV comercial e, a sequência, “Deutschland 86”, foi disponibilizada apenas na Amazon Prime, em 2018. No Brasil, a série foi transmitida pelo +Globosat, com o título “Deutschland - Espião Novato” e segue disponível no Globoplay. Os autores já prometem “Deutschland 89”.
Foto: picture alliance/dpa/R. Hirschberger
"Cães de Berlim" e o submundo da capital alemã
Produzida pela Netflix, "Dogs of Berlin" (Cães de Berlim) estreou em dezembro de 2018. A trama mergulha na face sombria da capital alemã e tem como protagonistas dois policiais não convencionais: Kurt Grimmer, um ex-neonazista, e Erol Birkan, homossexual e de ascendência turca. A dupla investiga o assassinato do jogador de futebol turco-alemão Orkan Erdem. É dublada e legendada em português.
Foto: Netflix
"You are wanted" na Amazon
Antecipando-se por alguns meses à rival Netflix, a gigante americana do streaming Amazon Prime lançou em março de 2017 sua primeira série alemça, "You are wanted" (Você é procurado), protagonizada por Matthias Schweighöfer. Focando vigilância digital e teorias da conspiração, a série não encontrou aprovação unânime do público e crítica. Ainda assim, sua segunda temporada já está em preparação.
Foto: picture alliance / Stephan Rabold/Amazon/dpa
Clãs de Berlim em "4 Blocks"
A produção do diretor Marvin Kren pode ser considerada um sucesso entre as séries alemãs e entrará em sua segunda temporada. Tratando dos conflitos entre os clãs familiares rivais do bairro berlinense de Neukölln, ela foi lançada em maio de 2017, em seis episódios, pelo canal de TV a cabo TNT Serie. "4 Blocks" recebeu críticas entusiásticas, chegando a ser comparada à americana "Os Sopranos".
Foto: picture-alliance/dpa/Handout/2017 Turner Broadcasting System Europe Limited & Wiedemann & Berg Television GmbH & Co.
Opulência dos anos 20 em "Babylon Berlin"
Série mais cara da TV alemã, "Babylon Berlin", de 2017, exibida pela Sky, é a prova de que os roteiristas e cineastas alemães são especialmente bons ao abordar temas históricos. Com grande minúcia e em imagens opulentas, três cineastas, entre os quais Tom Tykwer, evocaram a Berlim dos anos 1920. A série já foi vendida para diversos países.
Foto: 2017 X Filme/Frédéric Batier
"Das Verschwinden": drama psicológico
As emissoras de direito público da Alemanha também têm se lançado com sucesso no universo das séries. Em outubro de 2017, a ARD apresentou "Das Verschwinden" (O desaparecimento), uma sinistra história passada na Alemanha, dirigida por Hans-Christian Schmid. Como em "Dark", o tema aqui é o sumiço de uma jovem, e o drama psicológico resultante.
Na trilha das rivais Amazon e Sky, a Netflix conseguiu ampliar com "Dark" a sua parcela no mercado alemão: ao lado de seu enorme sucesso global, a plataforma de streaming persegue a estratégia de aproximar-se ainda mais das plateias nacionais encomendando especialmente séries para os mercados específicos.
Foto: Netflix
Mundos obscuros
O suíço Baran bo Odar dirigiu a série "Dark", escrita a quatro mãos com sua esposa, Jantje Friese. Em 2010, ele levara às telas uma história semelhante: também "Das letzte Schweigen" (O silêncio) é um drama familiar em torno de um desaparecimento, que conecta duas diferentes gerações. "Dark", porém, é bem mais sombrio, numa encenação quase sufocante.