Trump considera recorrer à via militar em reação a suposto ataque químico na Síria. Para analista político, na realidade, possível resposta americana a Assad tem Teerã como alvo final.
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Após um suposto ataque químico contra civis na Síria, o presidente americano, Donald Trump, classificou nesta segunda-feira (09/04) o ocorrido de "ato bárbaro" e prometeu uma decisão sobre uma resposta dos EUA em até 48 horas. Segundo o secretário de Defesa americano, opções militares não foram descartadas.
Diante das tensões, potências elevaram o tom sobre a Síria. A China advertiu os Estados Unidos contra uma opção militar na Síria e defendeu um acordo político como solução, enquanto a França afirmou que haverá uma resposta se for provado que forças leais ao regime sírio são responsáveis por um ataque químico.
Nesta terça-feira, Trump cancelou sua viagem à Colômbia e ao Peru, onde iria participar da Cúpula das Américas, para supervisionar a resposta à situação na Síria.
Em entrevista, Josef Braml, especialista em Estados Unidos da Sociedade Alemã para Política Externa (DGAP, na sigla em alemão), fala sobre as opções de Trump para responder à Síria. "Acredito que, para os EUA, a Síria seja apenas um teatro de guerra secundário para lidar com o Irã", afirma.
DW: Trump disse que os EUA não descartam uma resposta ao suposto ataque químico na cidade de Duma, na região de Ghouta Oriental. Que opções ele tem?
Josef Braml: Suponho que ataques aéreos dos EUA contra a Síria. Mas diferentemente do observado um ano atrás – na ocasião, os americanos já haviam atacado a Síria pelo uso de armas químicas –, os ataques não serão apenas simbólicos. Na época, Trump queria mostrar que não era marionete dos russos. Ao mesmo tempo, ele não queria ir longe demais e, portanto, avisou a Rússia com antecedência. Os russos, por sua vez, alertaram a Síria. Desta vez, não haverá tais informações preliminares.
DW: Trump também ameaçou os aliados do governo sírio dizendo que eles "irão pagar um preço alto". O que Rússia e Irã têm a temer?
Josef Braml: Sobretudo o Irã deve estar preparado, pois já está na mira dos EUA por outras razões. As forças apoiadas pelo Irã na Síria provavelmente serão bombardeadas. Além disso, o transporte aéreo dessas tropas, em parte através do espaço aéreo iraquiano, pode ser interrompido pelos Estados Unidos.
DW: E quanto às ações contra a Rússia?
Josef Braml: Elas serão mínimas. Trump tem muito menos opções militares em relação à Rússia e fará, por meio de sanções econômicas, por exemplo, o necessário para não ser pressionado internamente. Afinal, ele continua sendo investigado pelo procurador especial Robert Mueller [responsável pela investigação sobre a suposta interferência da Rússia nas eleições de 2016 e as possíveis ligações da campanha de Trump com o Kremlin].
DW: Por que o Irã, por outro lado, deve ser tratado de maneira tão dura?
Josef Braml: Acredito que, para os EUA, a Síria seja apenas um teatro de guerra secundário para lidar com o Irã. A próxima coisa que deve acontecer será o cancelamento do acordo nuclear em maio, e então o conflito se intensificará. A interferência do Irã na Síria poderia servir de justificativa moral e geoestratégica para a ação dos EUA. Não podemos esquecer que Trump recentemente fez do crítico ao Irã John Bolton um assessor de segurança nacional. Eu levo isso muito a sério.
DW: Recentemente, o presidente dos EUA sugeriu que pretende retirar as tropas americanas da Síria o mais rápido possível depois que o "Estado Islâmico" for derrotado. Como as ameaças de Trump após o ataque químico se encaixam nesses planos?
Josef Braml: Não vejo contradição alguma. Trump ainda quer retirar da Síria as tropas terrestres, as quais poderiam ser tomadas como reféns. As medidas de retaliação ao ataque com armas químicas dizem respeito apenas a ataques aéreos.
DW: O senhor acredita que haja uma estratégia de longo prazo do governo americano para a questão síria?
Josef Braml: Sim, certamente. Minha hipótese, como disse, é de que, na realidade, o que importa para os Estados Unidos é o Irã. E quanto mais apertado ficar para Trump no fronte doméstico político, mais eu vejo risco de guerra contra o Irã.
Não podemos esquecer que haverá eleições para o Congresso em novembro. O pior cenário para Trump seria perder ambas as câmaras. Nesse caso, uma guerra contra um inimigo externo o ajudaria a obter mais consenso bipartidário.
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Cronologia da guerra na Síria
O que se iniciou com protestos pacíficos em 2011 virou uma guerra civil brutal que já matou centenas de milhares de pessoas e fez milhões de refugiados. Reveja os principais acontecimentos.
Foto: Reuters/Stringer
2011: O início
Em 15 de março de 2011, protestos pacíficos contra a detenção de jovens acusados de fazer pichações antigoverno em sua escola, na cidade de Daraa, são reprimidos por forças de segurança, que abrem fogo contra manifestantes desarmados, matando quatro. Os protestos continuam por vários dias, fazendo 60 mortos e se espalham por todo o país. Segue-se um período de repressão violenta.
Foto: Anwar Amro/AFP/Getty Images
2011/2012: Isolamento internacional
O ex-presidente Barack Obama insta o presidente Bashar al-Assad a renunciar, e os EUA anunciam sanções a Assad em maio e congelam bens do governo sírio nos EUA em agosto de 2011. A União Europeia também anuncia sanções, em setembro. Em novembro, a Liga Árabe suspende a Síria e impõe sanções ao regime. Também a Turquia anuncia uma série de medidas, incluindo sanções, em dezembro.
Foto: AP
2012: Observadores internacionais desistem
Em dezembro de 2011, a Síria permite a entrada de observadores da Liga Árabe para monitorar a retirada de tropas e armas de áreas civis. A missão é suspensa em janeiro de 2012. Em fevereiro, os EUA fecham sua embaixada em Damasco. Em abril de 2012, chegam observadores da ONU, que partem dois meses depois por falta de segurança.
Foto: REUTERS
2013: Ataque com gás
Em março, um ataque com gás mata 26 pessoas, ao menos a metade deles soldados do governo, na cidade de Khan al-Assal. Investigação da ONU conclui que foi usado gás sarin. Em agosto, outro ataque com gás mata centenas em Ghouta Oriental, um subúrbio de Damasco controlado pelos rebeldes. A ONU afirma que mísseis com gás sarin foram lançados em áreas civis. Os EUA e outros países culpam regime sírio.
Foto: picture-alliance/AP Photo
2013: Destruição de armas químicas
Em agosto, investigadores da ONU chegam à Síria para averiguar o uso de armas químicas, em meio a denúncias de médicos e ativistas. EUA afirmam que 1.429 pessoas morreram num ataque, e Obama pede ao Congresso autorização para ação militar. Em setembro, o Conselho de Segurança da ONU ameaça usar a força e, em outubro, Damasco inicia a destruição de seu arsenal declarado de armas químicas.
Foto: AFP/Getty Images
2014: EUA atacam "Estado Islâmico"
Em setembro, os EUA iniciam ataques aéreos a alvos do "Estado Islâmico" na Síria. Em outubro, o mediador da ONU, Staffan de Mistura, começa a negociar uma trégua ao redor de Aleppo, mas o plano fracassa meses depois.
Foto: picture-alliance/AP Photo/V. Ghirda
2015: Rússia entra no conflito
Em setembro, a Rússia, que desde o início fornecera ajuda militar ao governo sírio nos bastidores, entra ativamente no conflito, bombardeando opositores do regime. A ajuda se mostra decisiva, e a guerra civil passa a pender para o lado de Assad, que nos meses seguintes recupera território perdido para os rebeldes.
Foto: Reuters/Rurtr
2016: Governo controla Aleppo
A ONU e a Opac afirmam que tanto militares sírios quanto o "Estado Islâmico" usaram gás em ataques a opositores. O ano é marcado por várias tentativas de tréguas. Em setembro, a cidade de Aleppo é alvo de 200 ataques aéreos por forças pró-Assad num fim de semana. Em dezembro, as forças governamentais assumem controle de Aleppo, encerrando quatro anos de domínio dos rebeldes.
Foto: Getty Images/AFP/G. Ourfalian
2017: Ataque em Idlib
Em fevereiro, Rússia e China vetam resolução do Conselho de Segurança da ONU pedindo sanções ao governo sírio pelo uso de armas químicas. Em abril, ao menos 58 pessoas morrem na província de Idlib, dominada pelos rebeldes, no que aparenta ser um ataque com gás. Testemunhas afirmam que o ataque foi executado por jatos sírios e russos, mas tanto Moscou quanto Damasco negam bombardeio.
Foto: Getty Images/AFP/O. H. Kadour
2017: Resposta dos EUA
Em abril, os EUA lançam dezenas de mísseis sobre a base militar de onde se acredita ter saído o ataque em Idlib. Em maio, o presidente Donald Trump aprova planos para armar combatentes das milícias curdas YPG na luta contra o "Estado Islâmico". A medida enfurece a Turquia, que vê as YPG como um grupo terrorista. Em outubro, o "Estado Islâmico" perde o controle de Raqqa, sua autoproclamada capital.
Em janeiro, aviões turcos bombardeiam a região curda de Afrin, dando início à operação contra as YPG intitulada "Ramo de Oliveira". A Turquia anuncia a morte de centenas de "terroristas", mas entre os mortos estão dezenas de civis, dizem ativistas. Em fevereiro, as milícias YPG chegam a acordo com o regime sírio para o envio de tropas pró-governo para auxiliar no combate aos turcos em Afrin.
Foto: picture alliance/AA/E. Sansar
2018: Ofensiva em Ghouta Oriental
Em 21 de fevereiro, tropas pró-regime executam ofensiva em larga escala contra enclave rebelde localizado ao leste de Damasco. Em torno de 400 mil civis ficam sitiados, com acesso limitado a alimentos e cuidados médicos. Os ataques matam centenas de pessoas. No dia 24 de fevereiro, o Conselho de Segurança da ONU aprova trégua humanitária de 30 dias vigente em todo o território sírio. Ela fracassa.
Foto: Reuters/B. Khabieh
2018: O bombardeio ocidental
Após dias de ameaça, em 14 de abril Trump anuncia o lançamento de mais de cem mísseis, em conjunto com França e Reino Unido, na Síria. O ataque é uma retaliação ao ataque químico na cidade de Duma, que matou dezenas de civis e que o Ocidente atribui ao regime de Bashar al-Assad.
Foto: picture-alliance/AP Photo/L. Matthews
2019: Estados Unidos começam a se retirar da Síria
Em janeiro de 2019, os Estados Unidos começaram a se retirar da Síria. O presidente americano afirmou que o Estado Islâmico havia sido derrotado e, por isso, a presença dos EUA não seria mais necessária. A decisão foi contestada dentro do próprio governo e também pelas milícias curdas na Síria, aliadas dos EUA, que temiam enfraquecer-se.
Foto: Getty Images/AFP/D. Souleiman
2019: fim do autoproclamado califado do EI
Em março de 2019, as Forças Democráticas Sírias (FDS), aliança liderada por curdos, anunciaram que o autoproclamado califado do Estado Islâmico foi totalmente eliminado, após combates em Baghouz, considerado o último reduto jihadista na Síria. Militantes curdos e árabes das FDS, apoiados pela coalizão internacional liderada pelos EUA, combatiam há várias semanas os jihadistas.