Síria realiza eleição sem oposição e em meio à guerra
13 de abril de 2016
Com votação somente nas regiões controladas pelo governo Assad, críticos afirmam que pleito é farsa e visa legitimizar o regime. Em Genebra, negociações de paz são retomadas em meio a ceticismo.
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Nas partes da Síria controladas pelo governo Bashar al-Assad, estão sendo realizadas eleições parlamentares, nesta quarta-feira (14/04), mesmo dia em as negociações de paz mediadas pela ONU são retomadas em Genebra, na Suíça. No entanto, além de impraticável em vastas regiões do país, a votação foi boicotada pela oposição síria.
Nas regiões sob controle governamental – que representam um terço do território e onde vive cerca de 60% da população – as urnas abriram às 7h (horário local) e ficarão abertas por 12 horas, salvo se a comissão eleitoral decidir "em razão da afluência" prolongar esse período.
Inicialmente, 11.341 candidatos com mais de 25 anos tinham decidido se apresentar ao pleito – o segundo desde o início da guerra civil em 2011 – para disputar os 250 assentos parlamentares. Contudo, na etapa derradeira, ficaram pouco mais de 3.500 candidatos.
Com mais da metade da população da Síria deslocada e faixas do território sob o controle de uma variedade de grupos armados, a eleição parlamentar têm sido amplamente vista como uma farsa para dar legitimidade ao presidente Assad e ao seu partido Baath.
O resultado da eleição deverá ser semelhante ao da anterior, em maio de 2012, segundo analistas. Naquela ocasião, pela primeira vez diversos partidos, além do Baath, foram autorizados a participar. No entanto, a maioria dos 250 deputados eleitos para um mandato de quatro anos era da sigla de Assad.
Retomada nas negociações de paz
A eleição ocorre no mesmo dia em que o enviado da ONU para a Síria, Staffan de Mistura, visa renovar "conversações de proximidade" entre grupos de oposição e representantes do regime para traçar uma transição política. A ONU refutou as eleições parlamentares na Síria.
Nesta quarta-feira, De Mistura se reúne com o Alto Comitê de Negociações (HNC, na sigla em inglês), que agrupa opositores e rebeldes sírios apoiados por Turquia, Arábia Saudita e Qatar. Em seguida, na sexta-feira, o enviado da ONU terá um encontro com representantes do regime sírio.
Curdos sírios, grupo-chave e que criou zonas autônomas no país, não foram convidados para as negociações.
A última rodada de conversações foi suspensa logo após seu início, em fevereiro, em meio a discordâncias sobre o destino de Assad, que, apesar de um acordo de cessar-fogo, seguia realizando ofensivas militares, com o apoio da Força Aérea russa, e cortou rotas de suprimentos dos rebeldes na região de Aleppo.
A oposição exige a renúncia de Assad e que as negociações se concentrem na criação de um órgão de transição com plenos poderes executivos. O regime de Damasco e seus aliados, sobretudo Rússia e Irã, argumentam que o povo sírio deve decidir o destino de Assad e que o foco deveria ser a luta contra o terrorismo.
PV/lusa/afp/dpa/ap
A guerra civil na Síria antes do EI
O "Estado Islâmico" inflamou o debate sobre como pôr fim à guerra civil síria. Contudo o grupo só emergiu mais tarde no conflito. Confira alguns momentos dessa guerra que abriram espaço para o avanço dos jihadistas.
Foto: AP
Março de 2011
Enquanto regimes ruem por todo o Oriente Médio, dezenas de milhares de sírios vão às ruas para protestar contra a corrupção, o desemprego elevado e a alta dos preços dos alimentos. O governo da Síria responde com armas de fogo. Até maio, cerca de 400 vidas são ceifadas.
Foto: dapd
Maio de 2011
Sob insistência dos países ocidentais, o Conselho de Segurança da ONU condena a repressão violenta. Nos meses seguintes, os Estados Unidos e a União Europeia impõem embargo de armas, recusa de vistos e congelamento de bens. Com apoio da Liga Árabe, aumenta a pressão para a saída do presidente sírio Bashar al-Assad – embora sem o aval de todos os países-membros da ONU.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Szenes
Agosto de 2011
Em 1970 um golpe pusera Hafez al-Assad no poder. Após sua morte, em 2000, o filho Bashar (à dir.) assume a liderança. De início tido como reformista, ele perde apoio ao manter o estado de emergência que há décadas restringe as liberdades políticas, permitindo vigilância e interrogatórios. Assad tem respaldo da Rússia, que lhe fornece armas e repetidamente veta as resoluções da ONU sobre a Síria.
Foto: picture-alliance/dpa/Stringer/Ap/Pool
Dezembro de 2011
A ONU e outras organizações têm provas de violação dos direitos humanos na Síria. Civis e militares desertores começam a se organizar lentamente para combater as forças do governo, que vêm atacando os dissidentes. Até o fim de 2011, essa luta causa mais de 5 mil mortes. Mesmo assim, ainda transcorrem seis meses até a ONU reconhecer que o país está em guerra.
Foto: Reuters/Goran Tomasevic
Setembro de 2012
O Irã finalmente confirma que tem combatentes em solo sírio, fato que Damasco negava há tempos. A presença de tropas aliadas acentua a hesitação dos Estados Unidos e de outras potências ocidentais em intervir no conflito. Os EUA, marcados pelas intervenções fracassadas no Afeganistão e no Iraque, propõem o diálogo como única solução sensata.
Foto: AP
Março de 2013
As mortes beiram 100 mil, e o total de refugiados em países vizinhos como a Turquia e a Jordânia atinge 1 milhão – número que duplicaria até setembro. Em dois anos de guerra, o Ocidente e a Liga Árabe veem fracassar todas as tentativas de um governo de transição, enquanto o conflito transborda para a Turquia e o Líbano. O pior temor é de que Assad se mantenha no poder a todo custo.
Foto: Reuters/B. Khabieh
Abril de 2013
Há muito Assad alega estar combatendo terroristas. Mas só no segundo ano de guerra se confirma que o Exército Livre Sírio inclui extremistas radicais. O grupo Frente al-Nusra declara apoio à Al Qaeda, fragmentando ainda mais a oposição.
Foto: Reuters/A. Abdullah
Junho de 2013
A Casa Branca afirma ter provas de que Assad está atacando civis com o gás tóxico sarin. Mais tarde a informação é corroborada pela ONU. A partir da revelação, o presidente dos EUA, Barack Obama, e outros líderes ocidentais passam a considerar uma intervenção militar. No entanto a proposta da Rússia para que se retirem as armas químicas da Síria acaba por se impor.
Foto: Reuters
Janeiro de 2014
Ao fim de 2013 surgem relatos sobre um novo grupo autodenominado Estado Islâmico do Iraque e do Levante – o futuro EI. Ao tomar terras no norte da Síria e também no Iraque, os jihadistas despertam lutas internas na oposição, causando 500 mortes até o início de janeiro. Esse terceiro e inesperado fator levaria os EUA, França, Arábia Saudita e outras nações à intervir na guerra em meados do ano.