"Selva de Calais" aguarda decisão sobre desocupação
24 de fevereiro de 2016
Tribunal suspende evacuação de acampamento no norte da França enquanto analisa recurso de organizações humanitárias. Bélgica teme ingresso de imigrantes em fuga e reintroduz controle na fronteira francesa.
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Um tribunal francês decidiu nesta terça-feira (23/02) pelo adiamento da desocupação de uma parte do acampamento de migrantes na cidade francesa de Calais, conhecido como "Selva de Calais".
Organizações humanitárias que atuam no local entraram com um recurso num tribunal de Lille para a suspensão da evacuação. Os ativistas denunciam o que consideram uma resposta "desordenada" do governo frente à situação.
Os juízes avaliaram que a decisão sobre a legalidade da operação deverá sair nesta quinta-feira, depois de ouvirem depoimentos de cerca de 250 migrantes e dez organizações não-governamentais. Uma juíza visitou o acampamento nesta terça-feira.
A prefeitura de Calais afirmou que vai aguardar a decisão judicial antes de prosseguir com a desocupação da área. O prazo anterior para a evacuação, estabelecido pelas autoridades, terminou na noite desta terça-feira.
Divergências no número de pessoas afetadas
As autoridades tentam remover os moradores para acampamentos em contêineres em Calais ou em centros de acolhimento em outras regiões da França. Segundo o Ministério do Interior, o objetivo seria convencer os migrantes de que não há futuro em permanecer na "selva".
Milhares de imigrantes se aglomeram em Calais, perto da entrada do Eurotúnel, onde vivem em condições extremamente precárias enquanto aguardam uma oportunidade para tentar chegar de forma ilegal até o Reino Unido, escondendo-se em caminhões ou ônibus que atravessam o Canal da Mancha pelo túnel.
No ano passado as tensões se agravaram, levando as autoridades locais a reforçar a segurança do entorno do porto e da entrada do túnel, com cercas de arame farpado e a presença de centenas de policiais.
O governo estima que 3,7 mil migrantes vivam na "selva", e que a desocupação do local deverá afetar entre 800 e mil pessoas. As ONGs, porém, acreditam que esse número seja muito maior, afirmando que, apenas na parte onde a evacuação deverá ocorrer, existem 3.450 residentes, entre os quais 300 crianças desacompanhadas. Os ativistas dizem que não há acomodações suficientes para o total das pessoas prestes a serem despejadas.
Refugiados em Calais tentam entrar escondidos na Inglaterra
03:10
Os migrantes em Calais são, na maioria, pessoas que fogem de conflitos em países do Oriente Médio ou da África. Eles são atraídos para o Reino Unido em razão de laços familiares ou com a comunidade no país. Muitos dos residentes da "selva" prometem resistir à ordem de desocupação, alegando falta de perspectivas, além da possibilidade de uma nova vida em solo britânico.
Bélgica reintroduz controles de fronteira
A Bélgica reintroduziu nesta terça-feira os controles de fronteira nos limites do país com a França, num esforço para tentar impedir a entrada de migrantes vindos de Calais. O possível destino deles seria o porto de Zeebrigge, de onde muitos podem tentar chegar ao Reino Unido através de balsas.
"Informamos a Comissão Europeia que iremos suspender temporariamente as regras de Schengen", disse o ministro belga do Interior, Jan Jambon, se referindo ao acordo que estabelece o livre trânsito entre 26 países da Europa.
"Vamos realizar controles em diversas localizações estratégicas, em pontos utilizados pelos traficantes e já detectados pela polícia", disse, acrescentando que a ação envolverá entre 250 e 290 policiais ao longo da fronteira em torno de Zeebruge e do porto de Bruges, um local com grande movimento de turistas. .
"Queremos a todo custo evitar na Bélgica acampamentos como o de Calais. É uma questão de manter a ordem", afirmou Jambon.
RC/dpa/afp
A miséria de refugiados no norte da França
Cerca de 2 mil imigrantes padecem no frio e na lama num acampamento perto da cidade portuária de Dunquerque. Enquanto esperam por uma oportunidade de rumar para o Reino Unido, eles dependem da ajuda de voluntários.
Foto: DW/B. Riegert
No meio da lama
Estima-se que um acampamento próximo à comuna de Grande Synthe, perto da cidade portuária de Dunquerque, no norte da França, abrigue 2 mil pessoas em pequenas tendas. À noite, o frio é intenso, e, quando chove, o local fica repleto de lama.
Foto: DW/B. Riegert
Persistência
Lizman vem da região curda do Iraque. "Em casa estamos em guerra", diz ele, que tem como objetivo chegar à Inglaterra. O iraquiano montou um café numa das barracas do acampamento, onde os jovens matam o tempo.
Foto: DW/B. Riegert
Objetivo: Reino Unido
Para proteger a barraca da sujeira e do frio, o iraquiano Asis conseguiu um martelo emprestado. O jovem curdo quer atravessar o Canal da Mancha e chegar à Inglaterra. Para isso, ele teria que pagar até 5.000 euros a um traficante. "Tem que ser melhor do outro lado", espera.
Foto: DW/B. Riegert
Sopro de esperança
O número de crianças que vive no acampamento repleto de lixo e lama não é claro. Voluntários coletaram ursinhos de pelúcia e os distribuíram na "barraca das crianças".
Foto: DW/B. Riegert
Perspectivas
Uma criança perdeu esta boneca na lama. Da mesma maneira, a esperança de muitas pessoas acaba desaparecendo no acampamento. À noite é muito fria, e não há iluminação. Apenas alguns banheiros químicos e chuveiros funcionam.
Foto: DW/B. Riegert
Voluntários do Reino Unido
O britânico Chris Bailey serviu como soldado no Iraque. Agora ele ajuda migrantes que querem chegar ao seu país. "A situação aqui é pior do que a de alguns lugares que vi na guerra", diz o veterano. Ele distribui cobertores e botas de borracha que foram doadas.
Foto: DW/B. Riegert
Bem-vindos à França
Além de chá, Denise (à esq.) e Maryse oferecem um bom papo aos imigrantes. Elas moram em frente ao acampamento. Uma rua separa dois mundos completamente diferentes. "As autoridades não se importam", opina Denise. Muitos vizinhos querem que os migrantes saiam dali.
Foto: DW/B. Riegert
Onde está o governo?
Um voluntário batizou com nomes de políticos europeus algumas das vias que levam até o precário acampamento. Esta, por exemplo, é a "Avenida François Hollande", porque o governo francês não se importa com o local. A polícia não dá segurança alguma. Moradores relatam violência entre grupos de imigrantes, principalmente à noite.
Foto: DW/B. Riegert
Voluntários da Alemanha
O número de refugiados que chegam a Munique diminuiu. "Aqui nós seremos necessários", diz Sinan von Stietencron da Volxküche München, iniciativa que distribui alimentos a migrantes na cidade alemã. Com a cozinha móvel, ele viajou com amigos da Baviera para o Canal da Mancha.
Foto: DW/B. Riegert
Emergência
A organização de ajuda humanitária Médicos sem Fronteiras (MSF) vacinou os moradores do acampamento contra sarampo e gripe. Especialmente as crianças acabam doentes, devido à umidade, ao frio e às péssimas condições de higiene. A MSF montou uma estação de emergência em Grande Synthe, a primeira unidade operacional da organização no coração da Europa.
Foto: DW/B. Riegert
Seguir adiante
Agachado dentro de sua barraca, Asim diz que fugiu do "Estado Islâmico" no Iraque. Ele se esforça para manter o pequeno espaço limpo e até oferece um chá para a repórter da DW. "Todos querem seguir adiante", diz o iraquiano.
Foto: DW/B. Riegert
A última estação
O porto de Dunquerque fica a 10 quilômetros do acampamento. As chances de conseguir chegar à Inglaterra partindo daqui são mínimas. Quase ninguém quer entrar com um pedido de asilo na França. O que fazer agora? Pagar um transporte clandestino para atravessar o Canal da Mancha? Recuar para a Bélgica ou Alemanha? Ou simplesmente esperar?