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Sem Merkel, Alemanha parece órfã

Astrid Prange de Oliveira | Autorenfoto DW Brasil
Astrid Prange de Oliveira
10 de agosto de 2021

Perto da atual governante, candidatos parecem pequenos demais para o tamanho dos problemas enfrentados pelo país, escreve Astrid Prange, no primeiro texto de sua coluna sobre a eleição alemã.

Merkel e seu gesto característico: líder alemã tornou-se símbolo de força, confiança e humanidadeFoto: picture-alliance/dpa/M. Kappeler

"Mutti" está de saída, e agora? Após as eleições parlamentares de 26 de setembro, Angela Merkel deixará o governo alemão. É uma sensação estranha quando uma mãe sai de casa: geralmente é o contrário – são os filhos que deixam o ninho.

Mas com Merkel é diferente. Ela não é apenas a primeira chanceler mulher da história da Alemanha, mas também a mais jovem entre todos os seus antecessores no cargo: foi eleita aos 51 anos de idade. E ela é, também, a primeira chefe de governo a deixar o cargo voluntariamente.

Independentemente disso: "Mutti" vai embora. A "mamãezinha", o apelido originalmente depreciativo que ela ganhou das fileiras de seu próprio partido, a conservadora União Democrata Cristã (CDU), tornou-se uma marca global para a gestão de crises, um símbolo de força, confiança e humanidade ao longo dos últimos 16 anos.

A colunista Astrid PrangeFoto: DW/P. Böll

A jovem da Alemanha Oriental, que começou a carreira em 1991 como ministra da Mulher e da Juventude no gabinete do então chanceler federal Helmut Kohl, cresceu cada vez mais no papel de uma mulher pragmática, que sempre se coloca de forma protetora diante de seus filhos, ao mesmo tempo que às vezes exige algo deles.

Após 16 anos, os filhos de Merkel podem ter passado a pior fase da puberdade. Mas eles sabem que sem ela as coisas podem ficar desconfortáveis. Como o país continuará a enfrentar a pandemia? E as mudanças climáticas, que geram cada vez mais enchentes e ondas de calor na Alemanha?

Sob a sombra de Merkel

A saída de Merkel se desenha diferente daquela de seu padrinho político, Helmut Kohl (1982-1998). O "chanceler da Reunificação alemã" chegou a concorrer nas eleições de 1998, mesmo depois de 16 anos no cargo. Merkel, por sua vez, desde 2020 já disse que não tentaria um novo mandato.

Enquanto o último mandato (1994-1998) de Kohl foi ofuscado por debates sobre o financiamento ilegal de partidos e o impasse de reformas políticas, Merkel deixa o cargo com a imagem de uma bem-sucedida gestora de crises. Quando Kohl saiu, muitos desejavam um recomeço político. A partida de Merkel, por outro lado, está mais associada à melancolia.

E agora, quem vai assumir o governo? Armin Laschet (CDU), Annalena Baerbock (Partido Verde) ou Olaf Scholz (Partido Social-Democrata)? Ninguém está dizendo isso, mas a verdade é que, ao lado de "Mutti", os três candidatos parecem anões políticos.

A mulher que salvou o euro várias vezes e fala com Vladimir Putin, que conduziu a Alemanha e a Europa para fora da crise financeira em 2008, e que acolheu um milhão de refugiados em 2015, faz com que todos os sucessores potenciais pareçam iniciantes. Como figuras políticas, eles simplesmente parecem pequenos demais para os grandes problemas enfrentados pela Alemanha e pela comunidade internacional.

Por quê? Os verdes estão colocando em campo uma candidata a chanceler sem experiência em cargos executivos. Seu currículo floreado sublinha esta falha, em vez de encobri-la, como era planejado. E a falta de fontes em um livro preparado apressadamente para a campanha eleitoral terminou o serviço para que o partido e sua candidata, que haviam iniciado a campanha eleitoral como favoritos, despencassem nas urnas.

Candidatos derrapam

O candidato de Merkel, Armin Laschet, no entanto, não conseguiu lucrar com esses erros e fraquezas. Mesmo em seu livro Die Aufsteigerrepublik (A república em ascensão, em tradução livre), publicado em 2009, os caçadores de plágio encontraram passagens de outros autores - sem que a fonte fosse citada.

O que é ainda mais grave é a capacidade do democrata-cristão de cometer gafes. Por razões que ainda não foram explicadas, ele foi tomado por um ataque de riso durante o discurso do presidente alemão para as vítimas do recente desastre das enchentes na Alemanha. Apesar de Laschet ter pedido desculpas por isso, o incidente desencadeou uma shitstorm nas redes sociais.

Laschet tem experiência em cargos executivos, assim como o ministro das Finanças Olaf Scholz, o candidato a chanceler dos social-democratas. No entanto, apesar da generosa ajuda financeira anunciada para as vítimas das enchentes, Scholz também está encontrando dificuldades para engrenar nas pesquisas.

O ministro das Finanças não só carece de carisma. Ele também tem que suportar acusações de que uma autoridade sob seu ministério violou seus deveres de supervisão e assim possibilitou a evasão fiscal sistemática de algumas grandes empresas de investimento durante anos.

Secretamente, muitos alemães gostariam de ver Merkel permanecer no cargo por outro mandato, mas ela não quer. "Mutti" está finalmente saindo da chancelaria federal e largando de mão - como uma mãe que ensina o filho a andar de bicicleta e em algum momento desatarraxa as rodinhas e tira as mãos do selim.

Espero que, acima de tudo, os três candidatos a chanceler amadureçam rapidamente. E que "Mutti" não tenha que ter vergonha de seus filhos.   

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Astrid Prange de Oliveira trabalhou como correspondente no Brasil e na América Latina por oito anos. Para a DW Brasil, ela escreveu a coluna Caros Brasileiros durante três anos. Agora, com a coluna Alemanha vota ela retorna como observadora da campanha eleitoral alemã. 

O texto reflete a opinião do autor, não necessariamente a da DW.

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