Sete panes, anedotas e lendas da Assembleia Geral da ONU
Malte Rohwer-Kahlmann av
18 de setembro de 2017
Em seus mais de 70 anos de debates gerais, Nações Unidas têm histórias curiosas para contar, tendo também o Brasil como protagonista: de discursos intermináveis a eventos de marketing inesperados e sapatadas lendárias.
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1) Brasil em primeiro lugar
Desde 1955, o Brasil tem sido (quase) sempre a primeira nação a se pronunciar nos debates gerais da Organização das Nações Unidas. Nos primórdios da ONU, o Brasil abriu as duas primeiras assembleias, e, com o passar do tempo, essa se tornou uma tradição.
Fora isso, não há uma ordem fixa, com uma exceção: os Estados Unidos, como país anfitrião, são o segundo a falar. Quer dizer, quase sempre: em 2016, o presidente do Chade, Idriss Déby, passou à frente, porque seu homólogo americano, Barack Obama, estava atrasado.
2) Igualdade de gêneros – mas nem tanto
Antes de os países ocuparem a tribuna no debate geral, o presidente da Assembleia Geral faz um pronunciamento. Em 1953, a indiana Vijaya Lakshmi Pandit foi a primeira mulher eleita para essa posição – sete anos antes de Sirimavo Bandaranaike, do Sri Lanka, ser nomeada a primeira chefe de governo do mundo. Nada mau para a ONU em termos de equiparação de gêneros. Dito isso, no entanto, desde então a organização só teve duas outras presidentes – contra mais de 70 do sexo masculino.
3) Paciência na plateia, muita paciência
As nações concordaram unanimemente que os discursos não devem durar mais do que 15 minutos. Há até mesmo semáforos na tribuna, para avisar aos oradores quando seu tempo está se esgotando.
Contudo muitos consideram esse limite antes uma diretiva facultativa do que uma regra rigorosa. O ex-líder líbio Muammar Kadafi falou por 96 minutos em sua primeira participação na Assembleia Geral, em 2009. O discurso mais longo registrado, porém, foi o do então primeiro-ministro de Cuba, Fidel Castro, em 1960: quatro horas e 29 minutos.
4) Agora chega, vamos embora
Discordâncias são inevitáveis, se 193 países obtêm a chance de expressar suas opiniões diante de diplomatas de todo o mundo. Quando, em 2011, o então presidente iraniano, Mahmud Ahmadinejad, lançou uma estocada contra o Ocidente, os representantes dos EUA e de alguns países da União Europeia simplesmente se levantaram e foram embora.
Esse procedimento é uma forma comum de demonstrar desaprovação no debate geral. Em 2016, diversos delegados da América do Sul se levantaram durante o discurso do presidente do Brasil, Michel Temer, o qual, segundo eles, chegara ao poder por meio de um golpe de Estado.
5) Sapatadas lendárias
Deixar a sala de reuniões é uma coisa, bater repetidamente com o sapato de couro na mesa, de raiva, é outra. Mas isso é o que, segundo consta, o então premiê soviético, Nikita Khrushchev, fez em 1960, em protesto contra o discurso antissoviético do delegado das Filipinas.
Esse rompante costuma ser citado como metáfora perfeita para a Guerra Fria. Mas será que aconteceu, mesmo? Testemunhas oculares contam versões conflitantes, algumas afirmam que Khrushchev só brandiu o sapato. Os registros filmados do evento aparentemente desapareceram. Segundo relato da neta do líder soviético, em 2000, a família acreditava que ele tenha, de fato, martelado a mesa com seu sapato.
6) Assista ao discurso, leia o livro
No debate de 2006, o então presidente da Venezuela, Hugo Chávez, transformou o palco político da ONU num evento de marketing. Durante um discurso em que também tachou o ex-chefe de Estado dos EUA George W. Bush de "o diabo", o revolucionário bolivariano empunhou um livro do autor americano de esquerda Noam Chomsky, instando os presentes a lê-lo: O império americano – Hegemonia ou sobrevivência. Em seguida, a publicação lançada três anos antes disparou na lista de best-sellers.
7) Primórdios modestos
Antes de se estabelecer em Nova York, em 1952, a Assembleia Geral da ONU se realizava cada ano numa cidade diferente. Sua primeira reunião foi em 1946, no Westminster Central Hall, uma igreja metodista situada diante da Catedral de Westminster, em Londres.
O emblema da ONU, um mapa-múndi flanqueado por ramos de oliveira, adornava a sala – pendurado ao contrário. Ao fim, os delegados das 51 nações reunidas ficaram tão gratos por ter podido usar as dependências que decidiram patrocinar a pintura das paredes.
Bens culturais imateriais da Unesco
Além de patrimônios materiais, a agência da ONU protege 366 bens imateriais da humanidade, como ioga, falcoaria e fado. Do Brasil, por exemplo, estão protegidos a capoeira e o frevo.
Foto: Getty Images
Ioga da Índia
Na Índia, a ioga é muito mais do que exercício físico, afinal ela é uma das seis escolas clássicas da filosofia indiana – e em suas formas mais variadas, seja meditação e concentração mental, seja posições do corpo e exercícios respiratórios, ou ainda enfatizando o ascetismo. Agora, a ioga indiana foi reconhecida pela Unesco como patrimônio imaterial da humanidade.
Foto: Colourbox/D. Shevchenko
Prática da falcoaria
Ainda hoje a falcoaria, com aves de rapina bem treinadas, é considerada uma grande arte de caça. Apesar de o nome se referir ao falcão, na falcoaria também são usadas outras aves de rapina. Desde 2010, a falcoaria está na lista de patrimônios culturais imateriais da Unesco. Agora foram reconhecidas também as de Alemanha, Cazaquistão, Itália, Paquistão e Portugal.
Foto: Hannes Lenhart
Cultura cervejeira belga
A Unesco reconheceu que a produção e a importância dada à cerveja na Bélgica são parte da herança viva de muitas comunidades. A bebida desempenha um papel importante no dia a dia e em festividades, sendo usada até para a preparação de alimentos. Há cerca de 1.500 cervejas belgas no mercado, e a história da cerveja belga começou na Idade Média.
Foto: picture-alliance/W. Roth
Cooperativas criam participação
Também a ideia de cooperativa foi incluída na lista do Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade pela Unesco. A sugestão havia sido apresentada pela Alemanha. "Uma cooperativa é uma associação voluntária de pessoas com interesses semelhantes, e que promove o engajamento individual e a autoconfiança, promovendo a participação social, cultural e econômica", segundo a Unesco.
Foto: Fotolia/pilatoida
A festa persa de Ano Novo
A Unesco também reconheceu a tradicional festa de Ano Novo celebrada em países como Irã, Afeganistão e Índia. Ela se destaca pelos tradicionais alimentos e rituais. Na Alemanha é conhecida pelo nome de Nowruz, mas também é chamada Festival da Primavera, pois é comemorada no dia 20 ou 21 de março.
Foto: DW/S. Amini
Ópera de Pequim, um ideal estético
A Ópera de Pequim também é Patrimônio Cultural Intangível da Humanidade. Esta forma de ópera muito apreciada na China reúne não só música, teatro e dança, mas também acrobacia e artes marciais. As óperas narram fatos da política, sociedade ou da história, seguindo uma rima rigorosa. Em trajes extravagantes, os atores movem as mãos, os olhos e os pés seguindo uma coreografia tradicional.
Foto: Getty Images
A prática coreana kimchi
A conservação de vegetais através da fermentação é prática comum na Coreia e faz parte da maioria dos pratos. Cada família guarda a própria receita, que passa de geração em geração. Na época da colheita, comunidades inteiras se reúnem para preparar grandes quantidades de seus legumes favoritos para o inverno. Este trabalho é chamado "Kimjang" e contribui para a coesão social.
Foto: picture-alliance/dpa/S. Trumpf
Fado português, a música da alma
No fado se encontra toda a herança multicultural de Lisboa. Sua origem está no século 19. As canções muitas vezes falam de amor não correspondido ou injustiça social, anseiam por tempos passados ou reivindicam melhorias sociais. Quem canta geralmente é acompanhado por um violão de 12 cordas e um baixo.
Foto: Adriao/GNU
Capoeira do Brasil
Ao lado da capoeira, são bens culturais imateriais brasileiros a procissão do Círio de Nazaré, de Belém; o frevo; o yaokwa, ritual do povo enawene nawe; o museu vivo do fandango; as expressões orais e gráficas dos indígenas wajapis e o samba de roda do Recôncavo Baiano.
Foto: dapd
Carnaval tradicional de Imst, no Tirol
Enquanto a Alemanha tenta, em vão, o reconhecimento de seu Carnaval pela Unesco, a entidade reconheceu como bem imaterial o peculiar Carnaval de Imst, no Tirol, em 2012. A festa, que se chama Schemenlaufen ou Fasnacht, acontece a cada quatro anos no domingo antes da Quaresma. Grupos de homens mascarados e fantasiados saltam pelas ruas tocando sinos.
Foto: Melitta Abber/UNESCO
Mariachi, os embaixadores da cultura mexicana
Com o seu som inconfundível, a música dos mariachis é parte essencial da cultura mexicana. As canções em espanhol e em idiomas indígenas ajudam a preservar o patrimônio cultural do México. Em suas canções, os grupos mariachi falam de batalhas e de relacionamentos amorosos. Os músicos usam trajes típicos e o original chapéu mexicano.
Foto: 2006 by Cámara de Comercio de Guadalajara, by permission of UNESCO
Botes chineses que afastam o mal
Festivais são presença constante na lista do patrimônio cultural imaterial. É o caso do milenar Festival do Barco do Dragão na China. A festa combina uma corrida de barcos enfeitados como se fossem dragões com rituais de saúde, comida típica e danças. Durante o festival, os participantes tomam banho em água perfumada e vestem seda para afastar o mal.