Demissões, cortes, protestos, declarações controversas: uma semana após tomar posse, gabinete do presidente interino coleciona série de episódios de tensão. Muitos deles devido a seus próprios ministros.
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Uma semana após a posse, o governo interino de Michel Temer colecionou elogios pela escolha da equipe econômica e pelas primeiras medidas tomadas nessa área. Em outros setores, no entanto, vem sofrendo críticas, muitas delas resultado de declarações dos próprios membros do gabinete. Em poucos dias, vários deles se viram forçados a recuar. Nesse período, Temer também enfrentou seus primeiros protestos e um “panelaço”.
Veja abaixo sete episódios de tensão que o novo governo enfrentou na última semana:
Montagem do novo ministério
O novo ministério passou longe dos planos iniciais de Temer, que havia anunciando um time de “notáveis” para chefiar as pastas. No final, ele acabou cedendo à pressão dos partidos e indicou políticos para a maioria delas, mostrando que a disputa por espaço que vigorou no governo Dilma deve continuar sob Temer.
Houve uma enxurrada de críticas pela falta de negros e mulheres entre os novos ministros. Também sobraram reclamações sobre a ficha de alguns novos ministros – nove deles foram citados na Lava Jato. A própria montagem revelou um processo caótico de escolha. Uma série de nomes cogitados foi vazada para a imprensa, mas diante das repercussões, o governo voltou atrás nas escolhas.
Cunha e baixo clero da Câmara impõem investigado
Temer teve que se render a escolha do deputado André Moura (PSC-SE) como líder do governo na Câmara. Não bastasse a ficha do deputado, que é investigado por tentativa de homicídio e envolvimento na Lava Jato, a indicação revelou que o presidente afastado da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), continua a comandar o jogo político entre os deputados. Moura é um aliado de Cunha e está entre os membros da tropa de choque que tentam salvar o seu mandato.
Além de Cunha, sua indicação foi apoiada por diversos partidos do chamado “Centrão” e centenas de deputados do baixo clero da Câmara. Vários deles já começam a entrar em choque com o governo pela indicação de cargos e mais verbas. A indicação de Moura acabou irritando partidos que faziam oposição ao governo Dilma, como o DEM e o PSDB, que acusaram Temer de se submeter à pressão de Cunha.
Demissões, cortes e protestos
Para abrir espaço para acomodar os aliados, Temer promoveu demissões em massa em vários órgãos do governo. Algumas delas causaram barulho, como a do presidente da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), Ricardo Melo, que ocorreu sem aprovação do conselho da empresa. Seu mandato previa que ele ficasse no cargo até maio de 2020. Houve protestos de funcionários e Melo afirma que considera entrar na Justiça para recuperar o cargo.
Servidores da antiga Controladoria-Geral da União também ficaram insatisfeitos com as mudanças e ameaçam entrar em greve se elas não forem revertidas. A CGU, que era ligada diretamente à Presidência, foi extinta e passou a ser o Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle.
Recuo do ministro da Saúde
O novo ministro da Saúde, Ricardo Barros (PP-PR), um deputado sem experiência na área, disse ao jornal Folha de S.Paulo que quanto mais pessoas puderem ter planos de saúde, maior será o alívio do governo para manter o Sistema Único de Saúde (SUS). Barros também afirmou que a capacidade financeira para suprir garantias constitucionais como a saúde “não são suficientes”.
Várias associações médicas repudiaram as declarações e acusaram o novo governo de planejar a redução do sistema. Horas depois, diante da repercussão negativa, Barros disse que o SUS não será alterado. No mesmo dia, uma reportagem apontou que a campanha de Barros em 2014 recebeu 100 mil reais do presidente de uma das maiores operadores de planos de saúde do país.
Tensão com a extinção do Ministério da Cultura
Temer extinguiu o Ministério da Cultura (Minc) e determinou que suas atribuições fossem incorporadas ao Ministério da Educação (MEC), pasta que passou a ser chefiada por um político do DEM. A medida revoltou vários membros da classe artística. Manifestantes tomaram prédios públicos em dez capitais. Diante da repercussão, o governo considerou permitir que a pasta seguisse separadamente. Depois, recuou do recuo e decidiu mesmo incorporar o Minc como uma secretária vinculada ao MEC.
Também houve dificuldades em nomear um chefe para a nova secretaria. O presidente interino queria uma mulher, mas diante de uma série de recusas, acabou escolhendo o secretário de Cultura municipal do Rio de Janeiro, Marcelo Calero. Por fim, o ministro da Educação, Mendonça Filho, disse que pretende trabalhar para ampliar o orçamento da Cultura em 2017.
Recuo do ministro da Justiça
O novo ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, afirmou em entrevista que a escolha do procurador-geral da República não deve seguir necessariamente a lista tríplice elaborada por votação entre membros do Ministério Público.
A declaração repercutiu mal entre procuradores. Desde o início das administrações petistas, em 2003, a escolha do procurador-geral tem sido feita com base na lista. Horas mais tarde, Moraes foi desautorizado pelo próprio Temer. A assessoria do presidente interino declarou que ele pretende manter a escolha pela lista. O próprio Moraes admitiu depois que não havia conversado sobre o tema com o presidente.
Descompasso sobre a recriação da CPMF
Na semana passada, o novo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, deixou em aberto a questão da recriação da CPMF, afirmando que “caso necessário” o governo trabalharia para instituir um novo tributo como forma de equilibrar as contas públicas. Três dias depois, o ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, uma das pontes de Temer com o Congresso, disse ser contra a volta do tributo, afirmando que “esse não é o momento”. Logo depois, foi a vez de Meirelles recuar e afirmar que a discussão sobre o assunto é “prematura”.
Os ministros do governo Temer
Gabinete do presidente interino tem nomes conhecidos da política, vários alvos da Justiça e nenhuma mulher. Confira uma minibiografia de cada um deles.
Foto: Geraldo Magela/Agencia Senado
Gilberto Kassab
Ministro das Cidades até abril de 2016 e prefeito de São Paulo por dois períodos, Gilberto Kassab foi escolhido para comandar o Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações. O fundador do Partido Social Democrático (PSD) é réu em processo de improbidade administrativa e foi condenado em 2014 por não pagar precatórios judiciais previstos em leis, mas recorre da decisão.
Foto: Marcelo Camargo/Agencia Brasil
Raul Jungmann
O deputado federal Raul Jungmann (PPS-PE) é o novo ministro da Defesa. Durante o governo Fernando Henrique Cardoso, foi o principal responsável por questões fundiárias, presidindo o Incra e comandando o Ministério de Desenvolvimento Agrário. Jungmann é alvo de ações movidas pelo Ministério Público por improbidade administrativa e por dano ao erário na época que chefiava o Incra.
Foto: Edilson Rodrigues/Agencia Senado
Geddel Vieira Lima
Figura próxima de Temer, Geddel Vieira é o novo ministro-chefe da Secretaria de Governo. Em sua carreira política, foi deputado federal por cinco mandatos consecutivos, além de ministro da Integração Nacional no segundo mandato de Lula. O peemedebista é investigado na Operação Lava Jato e, em 2014, foi condenado por realizar propaganda eleitoral irregular.
Foto: Valter Campanato/Agencia Brasil
Bruno Araújo
Sem experiência ministerial, o deputado federal Bruno Araújo (PSDB-PE) foi escolhido para comandar o Ministério das Cidades. Responsável por proferir o voto que selou a votação do impeachment na Câmara, o parlamentar teve seu nome citado na lista da Odebrecht, apreendida pela Polícia Federal, que mostra centenas de políticos que receberam doações da empreiteira.
Foto: Gustavo Lima/Camara dos Deputados
Blairo Maggi
Ex-governador do Mato Grosso, o senador Blairo Maggi (PR-MT) assume o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Dono do grupo que é um dos principais exportadores de soja do país, é considerado por ambientalistas um dos grandes promotores do desmatamento. Maggi é alvo de inquérito que apura lavagem de dinheiro e também de ações do Ministério Público por improbidade administrativa.
Foto: Geraldo Magela/Agencia Senado
Henrique Meirelles
O novo ministro da Fazenda foi eleito deputado federal pelo PSDB em 2002, mas abriu mão de assumir a cadeira quando foi chamado pelo então presidente Lula para presidir o Banco Central – ele permaneceu no cargo entre 2003 e 2011. Atualmente, Meirelles vinha presidindo o Conselho de Administração da holding J&F, que controla a empresa de alimentos JBS.
Foto: Antonio Cruz/ABr
Mendonça Filho
O deputado federal assume o Ministério da Educação e Cultura. Ex-governador de Pernambuco – depois da renúncia do titular Jarbas Vasconcelos –, Mendonça Filho (DEM-PE) é parte em processos relacionados a contas eleitorais de seu partido e está entre as centenas de políticos citados na lista da Odebrecht, apreendida pela Lava Jato.
Foto: Gustavo Lima/Camara dos Deputados
Eliseu Padilha
Novo ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha comandou o Ministério dos Transportes no governo FHC e a Aviação Civil durante a gestão Dilma. Pediu demissão um dia antes de o deputado Eduardo Cunha aceitar o pedido de impeachment da presidente petista. Indiciado por formação de quadrilha em 2011, Padilha foi recentemente citado na delação de Delcídio do Amaral.
Foto: Wilson Dias/Agencia Brasil
Osmar Terra
Sem experiência ministerial, Osmar Terra é deputado federal (PMDB-RS) e agora assume o Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário, responsável pelo Bolsa Família. Também citado na lista da Odebrecht, o político teve suas contas contestadas pelo TCE quando chefiava a Secretaria Estadual da Saúde do Rio Grande do Sul.
Foto: Viola Jr/Camara dos Deputados
Leonardo Picciani
Também sem experiência ministerial, o deputado federal Leonardo Picciani (PMDB-RJ) foi escolhido para comandar o Ministério do Esporte. Aos 36 anos, ele está em seu quarto mandato na Câmara e ocupa o posto de líder da bancada do PMDB da Casa. Picciani é alvo de representação (sob segredo de Justiça) por captação e gastos ilícitos na campanha de 2014, com pedido de cassação de diploma.
Foto: Agência Brasil/J. Cruz
Ricardo Barros
Novo ministro da Saúde, o deputado federal Ricardo Barros (PP-PR) não tem experiência comandando ministérios, mas foi secretário de Indústria e Comércio e Assuntos do Mercosul no Paraná. Também citado na lista da Odebrecht, Barros foi condenado por fraude em venda de equipamentos e por danos causados aos cofres públicos referentes ao período em que foi prefeito de Maringá.
Foto: Antonio Cruz/Agencia Brasil
José Sarney Filho
Filho do ex-presidente José Sarney, o deputado federal (PV-MA) assume o Ministério do Meio Ambiente. No governo tucano, foi ministro da mesma pasta entre 1999 e 2002. No passado, Sarney Filho chegou a ser condenado ao pagamento de uma multa em representação movida pelo Ministério Público Eleitoral por prática de conduta vedada.
Foto: Agência Brasil/M. Camargo
Henrique Alves
Figura muito próxima a Temer, Henrique Alves foi escolhido para o Ministério do Turismo. Foi ministro da pasta durante o governo Dilma, mas renunciou ao cargo duas semanas antes da aprovação do processo de impeachment pelo Senado. Alves foi deputado federal pelo Rio Grande do Norte por 11 mandatos consecutivos, chegando à presidência da Câmara. Ele é investigado pela Operação Lava Jato.
Foto: Tomaz Silva/Agencia Brasil
José Serra
Novo ministro da Relações Exteriores, o senador José Serra (PSDB-SP) comandou o Ministério da Saúde no governo FHC e foi prefeito e governador de São Paulo, sendo derrotado nas eleições presidenciais de 2002 e 2010. É alvo de ação civil pública por improbidade administrativa de quando era ministro tucano, e teve seu nome associado ao escândalo das licitações no transporte público paulista.
Foto: Moreira Mariz/Agencia Senado
Ronaldo Nogueira
Com breve carreira política, o deputado federal Ronaldo Nogueira (PTB-RS) foi escolhido por Temer para chefiar o Ministério do Trabalho. Administrador por formação, ele exercia seu primeiro mandato na Câmara quando foi convidado pelo vice-presidente. Nogueira teve reprovadas as contas referentes à campanha eleitoral de 2014.
Foto: Lucio Bernardo Junior/Câmara dos Deputados
Alexandre de Moraes
O advogado e consultor jurídico Alexandre de Moraes, ligado ao PSDB, ocupava a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo quando foi escolhido para assumir o Ministério da Justiça e Cidadania. Teve carreira de destaque no Ministério Público paulista, tendo chegado ao posto de procurador-geral da Justiça. Moraes atuou como advogado do deputado Eduardo Cunha.
Foto: Elza Fiuza/Agencia Brasil
Maurício Quintella Lessa
Quem assume o Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil é o deputado federal Mauricio Quintella (PR-AL), ex-líder do partido na Câmara. O político foi condenado em 2014 por ter participado, enquanto secretário de Educação de Alagoas, de um esquema que desviou dinheiro destinado ao pagamento de merenda escolar. Quintella foi multado pela Justiça em 4,2 milhões de reais.
Foto: Agência Brasil/J. Cruz
Fabiano Augusto Martins Silveira
O advogado foi escolhido para comandar o Ministério da Fiscalização, Transparência e Controle, recém-criado por Temer para substituir a Controladoria-Geral da União. Fabiano Augusto Martins Silveira é doutor em Direito e conselheiro no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) pelo segundo mandato, além de consultor legislativo do Senado Federal desde 2002.
Foto: Geraldo Magela/Agencia Senado
Fábio Osório Medina
O substituto de José Eduardo Cardozo no comando da Advocacia-Geral da União é Fábio Osório Medina. Advogado e professor, ele é ex-promotor de Justiça do Rio Grande do Sul e especializado em leis sobre combate à corrupção. No início de maio, Medina foi um dos convidados pela oposição para falar em sessão da comissão especial do impeachment no Senado.
Foto: Marcelo Camargo/Agencia Brasil
Sérgio Etchegoyen
O novo ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional de Temer é chefe do Estado-Maior do Exército (EME) desde março de 2015. Assinou, junto a outros familiares, uma carta em que critica a Comissão Nacional da Verdade – o pai de Etchegoyen foi denunciado por graves violações aos direitos humanos durante o regime militar brasileiro.
Foto: cc-by-Neal Snyder/US Army
Marcos Pereira
Bispo da Igreja Universal do Reino de Deus e ex-executivo da rede Record de Televisão, Marcos Pereira é o novo ministro da Indústria, Comércio e Serviços. Cotado para a Ciência e Tecnologia, o evangélico enfrentou forte resistência entre acadêmicos. O presidente do Partido Republicano Brasileiro (PRB) é advogado e foi sócio de escritórios de contabilidade e advocacia.
Foto: Imago
Fernando Coelho Filho
Deputado federal há três mandatos com apenas 32 anos, o novo ministro de Minas e Energia Fernando Coelho Filho (PSB-PE) é herdeiro político do senador Fernando Bezerra Coelho, seu pai, que ocupou a pasta de Integração Nacional no governo Dilma e está sob investigação na operação Lava Jato. Foi o mais jovem parlamentar eleito no Brasil, com apenas 22 anos.
Foto: Agencia Brasil/M. Camargo
Helder Barbalho
À frente da cobiçada pasta de vasto orçamento e impacto na região Nordeste está outro herdeiro político, filho de Jader e Elcione Barbalho. O novo ministro da Integração Nacional Helder Barbalho (PMDB-PA) comandou a Secretaria de Portos do governo Dilma até abril. Também foi secretário da Pesca e Aquicultura. Na saída, afirmou acreditar na inocência da presidente.
Foto: picture-alliance/dpa/A. Lacerda
Dyogo Oliveira
O economista ocupou vários cargos no Ministério da Fazenda, desde 2006, até chegar a secretário-executivo. Mais tarde, assumiu a posição equivalente no Planejamento. Ele se manteve no cargo durante o governo interino. É citado em investigações da Operação Zelotes e teve seus sigilos bancário e fiscal entre 2008 e 2015 quebrados a pedido do Ministério Público Federal.
Foto: Agência Brasil/J. Cruz
Marcelo Calero
O posto foi recriado seis dias após ser extinto no primeiro dia do governo interino. Marcelo Calero é formado em direito, trabalhou na Petrobras, em empresas privadas e no setor de energia do Itamaraty. Candidatou-se a deputado federal pelo PSDB-RJ em 2010, mas não foi eleito. Foi secretário municipal de Cultura do Rio de Janeiro de 2013 até assumir o ministério.
Foto: Agência Brasil/ V. Campanato
Romero Jucá
Foi ministro do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão por 11 dias no governo interino. Senador do PMDB, ele teve uma conversa gravada, em que defendia uma mudança de governo para "estancar a sangria" de políticos citados na Lava Jato. Foi líder dos governos FHC, Lula e Dilma no Congresso e é investigado por formação de quadrilha, além de ter seu nome envolvido na Operação Zelotes.