Simone Biles: a dramática história de um ícone do esporte
Thomas Klein
Publicado 2 de agosto de 2024Última atualização 4 de agosto de 2024
Quando Simone Biles salta, as arquibancadas aplaudem efusivamente, deixando público em geral e também famosos maravilhados. Mas a história da atleta americana também tem um lado sombrio.
Anúncio
Quando as primeiras notas do hit "Are you ready for it?", da cantora americana Tailor Swift, bradaram na última quinta-feira (01/08) dos alto-falantes da Arena Bercy, em Paris, Simone Biles parou por alguns segundos para ouvir a música. A tensão e a concentração da atleta de 27 anos eram evidentes antes de ela começar sua última apresentação na final da categoria individual geral – em sua modalidade favorita, o exercício de solo.
Campeã olímpica nos Jogos Olímpicos do Rio 2016, ela já havia feito um salto chamado Yurchenko duplo, que nenhuma outra atleta executa. Nas barras irregulares, sua menor especialidade, cometeu um erro. Mas compensou na trave de equilíbrio. Resultado: o segundo ouro em Paris 2024.
Biles venceu, entre outras competidoras, uma de suas maiores rivais, a brasileira Rebeca Andrade, que ficou com a prata no individual geral. Rebeca, aliás, tem grande respeito e admiração de Biles. No documentário O Retorno de Simone Biles, disponível na Netflix, a atleta americana diz ter medo de Rebeca. No sábado (04/08), as duas votlaram a se enfrentar na final do salto sobre a mesa – e repetiram o resultado: ouro pra Biles, prata para Rebeca.
"O ouro significa o mundo para mim"
No solo, ao som da música de Swift, Biles mostrou mais uma vez por que é a melhor ginasta do mundo. Em seu primeiro salto, ela se projetou a uma altura de dois, três metros, rolou e girou várias vezes antes de aterrissar sobre os dois pés novamente. O largo sorriso junto com os intensos aplausos vindos das arquibancadas não deixaram dúvida: foi um salto perfeito.
Outras apresentações de tirar o fôlego se seguiram e, no final, Biles foi recompensada com a vitória olímpica no individual geral: "Esse ouro hoje significa muito para mim. Estou muito orgulhosa do meu desempenho, é uma experiência maravilhosa." O outro triunfo de Biles nos Jogos Olímpicos de Paris havia sido o ouro por equipes.
Aplausos hollywoodianos
Difícil encontrar alguém que discorde que a americana levou a ginástica a um novo patamar. E não são apenas os diversos espectadores que batem palmas e se emocionam, mas também a elite política, artística e de Hollywood.
Quando ela saltou na Arena Bercy durante sua primeira competição, o ex-presidente dos EUA, Barack Obama, disse que, em casa, em frente à televisão, estava prendendo a respiração. Nas mídias sociais, Obama homenageou a estrela da ginástica classificando-a como "GOAT" – sigla em inglês para "greatest of all time", ou seja, a maior de todos os tempos. Nas arquibancadas em Paris, o astro Tom Cruise, o rapper Snoop Dogg e as cantoras Lady Gaga e Ariana Grande estavam torcendo pela compatriota.
"Acho isso muito legal", comentou a ginasta alemã Helen Kevric, de 16 anos, que terminou em um excelente oitavo lugar em sua primeira competição olímpica. "Snoop Dogg estava lá, Ariana Grande também. Eles me viram competindo. Nem todo mundo pode dizer isso sobre si mesmo, é algo enorme", acrescentou.
Anúncio
Luta contra a depressão
Mas a popularidade de Biles não se deve apenas a razões esportivas. A história da ginasta tem também um lado sombrio. Nos Jogos Olímpicos de 2021, em Tóquio, a ideia era ter acrescentado mais um capítulo dourado às quatro medalhas de ouro conquistadas no Rio 2016. Mas, de repente, ela perdeu o rumo durante um salto. E a confiança se foi.
Biles se retirou da final devido a problemas mentais e não competiu por dois anos até se recuperar. Olhando para trás, Biles diz que teve uma espécie de pressentimento: "Eu provavelmente sabia que entraria em depressão. Mas havia um mecanismo em mim que bloqueava isso".
Abusos
Em entrevista à revista New York Magazine, Biles declarou o seguinte: "Se você olhar para tudo o que passei nos últimos sete anos, eu nunca deveria ter feito parte da equipe olímpica novamente. Eu deveria ter desistido muito antes de Tóquio", afirmou.
Em janeiro de 2018, ela tornou público que havia sido abusada sexualmente pelo ex-médico de sua equipe, Larry Nassar, que foi processado por Biles e centenas de outras ginastas, e acabou condenado a 175 anos de prisão.
A atleta admitiu que isso lhe causou um "grande impacto emocional": "Foi demais. Mas eu não deixaria que ele me tirasse algo pelo qual trabalhei duro desde os seis anos de idade", afirmou.
Depois de uma pausa de dois anos nas competições, Biles lutou para voltar ao cenário mundial. Agora, como um ícone absoluto da ginástica, ela ofusca mais uma vez as concorrentes.
Mulheres pioneiras no esporte
Conheça algumas mulheres que fizeram história no esporte.
Foto: Imago Images/Sven Simon
Só para homens?
Alice Milliat não aceitou que a competição esportiva fosse uma atividade exclusiva do sexo masculino. Nascida na França em 1884, ela praticou hóquei, remo e corrida de carros. Em 1917, ela foi uma das fundadoras da Federação Francesa de Esportes Femininos FSFSF e da Federação Internacional de Esportes Femininos FSFI, que organizou os primeiros Jogos Mundiais Femininos em 1921.
Foto: akg images/picture alliance
Favorita da torcida
A ciclista Alfonsina Strada se inscreveu para o Giro d'Italia em 1924 como Alfonsin Strada. Os organizadores pensaram que ela era um homem. Quando a viram antes da prova, decidiram que mesmo assim ela poderia competir. A italiana fracassou depois de algumas etapas, mas permaneceu na corrida porque o público a aclamava. Ela é a única mulher a já ter competido em um Grand Tour masculino.
Foto: Imago Images/Leemage
A primeira mulher na Fórmula 1
Maria Teresa de Filippis foi a primeira mulher a correr na Fórmula 1. A italiana começou a competir em 1948, aos 22 anos, para a equipe Maserati. Em 1958, ela participou de várias corridas no Campeonato Mundial de Automobilismo, hoje Mundial de F1. Quando um amigo próximo morreu em um acidente um ano depois, ela encerrou sua carreira.
Foto: LATPhotographic/picture alliance
Apesar de todas as adversidades
Embora o furioso diretor de corrida da Maratona de Boston (de casaco preto) tenha tentado arrancar o número dela, Kathrine Switzer foi a primeira mulher a correr uma maratona em 1967 e também a completou. Ela havia se inscrito secretamente. A maior distância permitida para as mulheres na época eram 800m. Alguns anos depois, passou a ser permitido a mulheres participar de provas de longa distância.
Foto: picture alliance/dpa/UPI
Por prêmios iguais
No início dos anos 1970, Billie Jean King lutou por prêmios iguais em dinheiro para profissionais de tênis masculinos e femininos. Em protesto, a 12 vezes vencedora do Grand Slam criou em 1970 com outras jogadoras uma série própria de torneios, que mais tarde virou a Women's Tennis Association WTA. Em 1973, veio o sucesso: o prêmio em dinheiro do US Open foi igual para mulheres e homens.
Foto: Imago Images/Sven Simon
Pelo direito de voar
Até início dos anos 1990, o salto de esqui feminino não era permitido pela associação mundial. Eva Ganster só podia competir com homens. Em 1997, a austríaca foi a primeira mulher a saltar de uma rampa de esqui. Seus esforços surtiram efeito: desde 2011, há a modalidade feminina na Copa do Mundo, e desde 2014 a modalidade feminina é olímpica.
Foto: Imago Images/WEREK
Com frequência "a primeira"
Em 2003, Meredith Michaels-Beerbaum se tornou a primeira e única mulher a liderar o ranking mundial de saltos. Ela também é a primeira mulher da equipe alemã de hipismo a participar de um grande campeonato e, assim, abriu portas para jovens amazonas. "Quando vim para a Alemanha, ficou muito claro que as mulheres tinham um papel secundário no meu esporte", disse Meredith, nascida nos EUA.
Foto: Rau/Imago Images
Respeitada no apito
A suíça Nicole Petignat foi a primeira mulher a apitar um jogo masculino da Uefa em 2003: na qualificação para a Copa da Uefa entre AIK Solna e Fylkir Reykjavik. Petignat também é árbitra de jogos da Primeira Divisão masculina na Suíça e na Áustria, mas apita principalmente jogos femininos. Os destaques foram a final do Campeonato Europeu de 2001 e a final da Copa do Mundo de 1999.
Foto: picture-alliance/Pressefoto ULMER
Autoridade reconhecida
Mas demorou mais de duas décadas para uma mulher arbitrar um jogo masculino da Copa do Mundo. A francesa Stéphanie Frappart foi escalada pela Fifa na partida entre Alemanha e Costa Rica na Copa do Catar. Ela já apitou jogos masculinos na Liga das Nações, na Liga dos Campeões e nas eliminatórias da Copa do Mundo, mas continua sendo uma exceção em sua área.
Foto: Stanley Gontha/PRO SHOTS/picture alliance
Vencendo preconceitos
Em 2021, Sarah Thomas foi a primeira mulher a integrar uma equipe de arbitragem da final da American Football League NFL, o Super Bowl. Ela precisou lutar contra muitos preconceitos. "Colegas, treinadores e jogadores agora simplesmente me veem como árbitra. É assim que quero que seja", diz. "Nunca permiti que meu gênero fosse uma desculpa ou um pretexto para as pessoas."
Foto: Aaron Josefczyk/Newscom/picture alliance
"Não me sinto ser humano"
"Não me sinto mulher, homem ou mesmo ser humano agora", disse Rachael Blackmore após sua vitória no Grand National. A irlandesa de 31 anos acabara de entrar para a história com o cavalo Minella Times, ao se tornar a primeira mulher a vencer a corrida de galope com obstáculos mais difícil do mundo, realizada desde 1839. Já Charlotte Brew foi a primeira mulher a participar do Grand National em 1977.
Foto: Tim Goode/empics/picture alliance
Na poeira do deserto
Calor, poeira, terreno acidentado e inúmeros competidores masculinos – nada disso impediu a piloto de rali alemã Jutta Kleinschmidt de se tornar a primeira mulher a vencer o Rally Dakar em 2001. Após a vitória, ela também foi eleita a "Esportista do Ano" na Alemanha. A engenheira participou do rali mais difícil do mundo por 18 vezes, além de várias outras corridas.
Foto: picture alliance/dpa
Rápida sobre duas rodas
A motociclista alemã Katja Poensgen é uma das poucas mulheres a competir no Campeonato Mundial. Algumas marcam pontos na série Moto3, que vai até 125cc, mas Poensgen é a única entre os 15 melhores na categoria 250cc. Em 2001 e 2003, ela competiu em uma Honda e fez um total de 25 corridas pelo Mundial.
Foto: Sven Simon/picture alliance
Boa de pontaria
Quando seu último dardo atingiu o alvo em dezembro de 2019 em Londres, "Ally Pally" ficou fora de si. Pela primeira vez, uma mulher venceu um duelo no campeonato mundial de dardos. Fallon Sherrock, cabeleireira da Inglaterra, escreveu história na primeira rodada do torneio de dardos e só falharia na terceira rodada.
Foto: Getty Images/J. Mansfield
Incentivo ao esporte feminino
Uma verdadeira pioneira é a técnica de futebol alemã Monika Staab. Há anos, ela viaja pelo mundo se engajando pelo futebol e organiza programas de treinamento para mulheres e meninas, especialmente em países onde os direitos das mulheres não desempenham um papel importante. "O feedback positivo nos esportes aumenta a autoconfiança", diz ela. "Você precisa disso para enfrentar a vida".
Foto: picture alliance/dpa/N.Mughal
Treinando homens
Quando Corinne Diacre começou a treinar o Clermont Foot, clube da 2ª Divisão francesa, em 2014, ela logo convenceu seus críticos. Na época, a ex-jogadora da seleção foi a primeira mulher a comandar uma equipe masculina profissional. Em três anos no cargo, ela foi bem-sucedida. No entanto, Diacre é uma rara exceção. Mesmo muitas equipes femininas de sucesso continuam sendo treinadas por homens.
Foto: picture-alliance/dpa
Clara vitória contra concorrentes masculinos
Com uma vantagem de nove tacadas no Torneio Misto Escandinavo de 2022, a sueca Linn Grant foi a primeira mulher a vencer um torneio oficial de golfe DP World Tour, superando inclusive os concorrentes masculinos. "Durante toda a semana eu senti que eram as garotas contra os rapazes, e quem quer que pegasse aquele troféu representaria as mulheres", disse.