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Site argentino é processado na Polônia sob lei do Holocausto

3 de março de 2018

Portal do jornal "Página 12" é primeiro meio de comunicação denunciado sob polêmica nova lei polonesa que proíbe acusar povo ou Estado da Polônia de responsabilidade ou cumplicidade por crimes do Holocausto.

Jedwabne Polen
Memorial em Jedwabne lembra massacre de centenas de judeus em vilarejo polonêsFoto: picture-alliance/dpa

Um dia após a sua entrada em vigor, a polêmica lei polonesa sobre Holocausto serviu de base para um primeiro processo judicial.

A conservadora Liga Polonesa contra a Difamação (RDI) entrou com queixa contra o site do jornal argentino Página 12, nesta sexta-feira (02/03), porque teria "causado danos à nação polonesa" numa reportagem sobre um ataque contra judeus num vilarejo polonês durante a Segunda Guerra, controlado então pelos nazistas.

Leia também: Futuro incerto para lei polonesa sobre Holocausto

A legislação polonesa sobre o Holocausto, que entrou em vigor na última quinta-feira e provocou fortes reações internacionais, especialmente nos EUA e Israel, pode punir com multas e até três anos de prisão alegações que, "de forma aberta e contrária aos fatos", atribuam à nação polonesa ou ao seu povo culpa por crimes do Terceiro Reich.

A denúncia da RDI se refere a um artigo do Página 12 sobre o massacre de judeus no vilarejo de Jedwabne, que contou com a participação de cidadãos poloneses. O portal ilustrou a reportagem com uma foto de combatentes da oposição polonesa anticomunista no pós-guerra – isso desagradou à RDI.

A queixa afirma que a informação foi ilustrada "de forma tendenciosa" com uma imagem que não corresponde aos eventos narrados, uma vez que a fotografia mostra os cadáveres de quatro membros da resistência polonesa anticomunista após a Segunda Guerra Mundial.

O RDI acusa a mídia argentina e seu autor, o jornalista Federico Pavlosky, de "manipulação" com o objetivo de "prejudicar a nação polonesa e a imagem dos soldados poloneses" e de tentar "conscientemente enganar" seus leitores a fazer "credível a tese do antissemitismo polonês".

O artigo fui publicado em 18 de dezembro e abordou os eventos em Jedwabne, conforme descritos no livro Vizinhos do controverso historiador polonês-americano Jan Gross. Nesse trabalho de 2001, o autor afirmou que os "gentis" habitantes daquele vilarejo trancaram num palheiro cerca de 1.600 vizinhos judeus, incluindo mulheres e crianças, e os queimaram vivos diante do impassível olhar das forças de ocupação nazistas.

De fato, em 2001, o então presidente da Polônia, Aleksander Kwasniewski, pediu perdão oficialmente pelo massacre acontecido no vilarejo no nordeste polonês, numa cerimônia transmitida pela TV e realizada no local em que se situava o galpão no qual os judeus foram queimados vivos. 

Críticas de Israel

Os israelenses receiam que o governo nacional-conservador em Varsóvia queira negar qualquer envolvimento dos poloneses na denúncia e entrega de judeus às forças de ocupação alemãs. Também a data da aprovação da lei, em 26 de janeiro, véspera do Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto, foi tomada como provocação.

Apesar das críticas internacionais, a lei foi aprovada em regime de urgência pelo Senado e assinada pelo presidente polonês, Andrzej Duda. Porém, ele expressou compreensão pelas censuras israelenses e enviou a legislação para avaliação do tribunal constitucional da Polônia. Um veredicto deve ser conhecido em até dois meses. Reformado em 2015, o tribunal é tido como alinhado ao governo conservador.

A tentativa desastrada do primeiro-ministro Mateusz Morawiecki de defender a legislação na Conferência de Segurança de Munique piorou ainda mais as coisas. Indagado por um jornalista, Morawiecki, que é o historiador, disse que, pela nova lei, não seria um crime dizer que "houve perpetradores poloneses, da mesma forma que também houve perpetradores judeus, russos, ucranianos e não somente alemães."

Em reação, o premiê israelense, Benjamin Netanyahu, comentou que o primeiro-ministro polonês falava como um típico negador do Holocausto e acusou Morawiecki de falta de sensibilidade perante a tragédia sofrida pelos judeus.

Na mesma noite após o escândalo, o gabinete do primeiro-ministro polonês publicou uma declaração afirmando que as palavras de Morawiecki não seriam de forma alguma uma negação do Holocausto, mas deveriam ser entendidas como "um apelo a um debate honesto sobre os crimes praticados contra os judeus, respeitando os fatos e independentemente da nacionalidade" dos criminosos.

Oficialmente, o ministro polonês da Justiça, Zbigniew Ziobro, disse em entrevista à agência de notícias polonesa PAP que a decisão do tribunal constitucional ajudará os promotores na aplicação da nova lei. Ziobro assegurou, ao mesmo tempo, que "não haverá penalidades para historiadores, cientistas ou jornalistas" e que a nova legislação "deverá proteger o Estado e o povo polonês como um todo contra falsas acusações de cumplicidade em crimes alemães".

CA/efe/afp/dw

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