Em videoconferência a partir de Moscou, ex-analista da NSA afirma que sua condenação pode "corroer a democracia" dos EUA. Organizações de direitos humanos lançam campanha pedindo que Obama conceda perdão ao ativista.
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"Estou confortável com as decisões que tomei", diz Snowden
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O ex-analista da Agência de Segurança Nacional americana (NSA) Edward Snowden declarou nesta quarta-feira (14/09) que não se arrepende de ter revelado, em 2013, um amplo esquema de espionagem do governo dos Estados Unidos – o que pode lhe custar até 30 anos de prisão.
"Estou feliz com as decisões que tomei", afirmou Snowden a jornalistas em Nova York por meio de uma videoconferência a partir de Moscou, onde está asilado desde 2013. O whistleblower disse que, se for condenado a passar anos na prisão, "a qualidade da democracia" americana seria "corroída".
Snowden acrescentou que seu caso não diz respeito a ele, mas a todo o povo americano. "Trata-se de nosso direito de discordar. Trata-se do tipo de país que queremos ter, o tipo de mundo que queremos construir. Trata-se do tipo de amanhã que nós queremos ver", argumentou ele.
O pronunciamento desta quarta-feira coincidiu com uma campanha lançada por várias organizações e personalidades internacionais pedindo que o presidente dos EUA, Barack Obama, conceda o perdão a Snowden antes de deixar a Casa Branca, em janeiro de 2017. "Nem nos meus sonhos mais loucos eu havia imaginado apoio semelhante", admitiu o ex-analista durante a videoconferência.
Entre os organizadores da campanha estão a Anistia Internacional, a União Americana pelas Liberdades Civis (ACLU, na sigla em inglês) e a Human Rights Watch. Para o grupo, Snowden "enfrenta a possibilidade de décadas na prisão por falar em defesa dos direitos humanos".
"Snowden levantou um dos mais importantes debates sobre vigilância governamental em décadas e deu origem a um movimento global em defesa da privacidade na era digital", declarou o secretário-geral da Anistia Internacional, Salil Shetty. "Castigá-lo por isso enviaria a perigosa mensagem de que aqueles que são testemunhas de violações dos direitos humanos não devem denunciá-las."
Personalidades como o linguista Noam Chomsky, a atriz Susan Sarandon e o senador americano Bernie Sanders, que foi rival de Hillary Clinton na disputa pela candidatura democrata à Casa Branca, também demonstraram apoio ao ex-colaborador da NSA.
"A informação revelada por Edward Snowden permitiu que o Congresso e o povo americano entendessem como a NSA abusou da sua autoridade e violou nossos direitos constitucionais", disse Sanders ao jornal britânico The Guardian. "Na minha opinião, o interesse da justiça estaria melhor servido se nosso governo lhe garantisse alguma forma de clemência."
O americano de 33 anos vive há três anos na capital da Rússia, desde que divulgou milhares de documentos secretos da NSA, expondo o sistema de vigilância mundial americano. Nos EUA, ele foi acusado de divulgar segredo de Estado e pode pegar até 30 anos de prisão.
Enquanto Snowden clama pelo perdão do governo americano, a Casa Branca insiste que ele volte aos Estados Unidos para enfrentar as acusações. Na segunda-feira, o porta-voz da Casa Branca, Josh Earnest, já havia declarado que os vazamentos feitos pelo ex-analista "prejudicaram os EUA" e constituem "crimes sérios" contra o país, por isso pediu a extradição do americano.
"Estou confortável com as decisões que tomei", diz Snowden
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Nos próximos dias, estreia nos cinemas mundiais o filme Snowden, do diretor Oliver Stone, que relata a história por trás dos vazamentos. O cineasta veterano também já declarou publicamente sua opinião favorável ao perdão de Snowden por parte de Obama.
EK/dpa/ap/efe/lusa
Perseguidos e celebrados
O maior temor de serviços secretos, governos e empresas desonestas é a revelação de seus segredos pelos funcionários. Para desencorajar imitadores, os delatados perseguem os "whistleblowers", em certos casos até a morte.
Foto: picture-alliance/dpa
Herói ou traidor?
Para muitos, Edward Snowden é um herói – para o governo dos EUA ele é um traidor. O ex-consultor da CIA tornou público o programa sigiloso de vigilância da agência de segurança NSA. Snowden está foragido, vários países lhe negaram o asilo político, inclusive o Brasil. A história mostra que denunciantes ("whistleblowers") não devem esperar benevolência por parte das instâncias superiores.
Foto: Getty Images
Mal-estar entre amigos
O soldado dos Estados Unidos Bradley Edward Manning foi preso em maio de 2010, por publicar na plataforma Wikileaks vídeos e correspondência da embaixada norte-americana. Especialmente desagradável para Washington foi a divulgação de certos e-mails que criticavam e ridicularizavam governos parceiros. Manning foi condenado à prisão perpétua.
Foto: picture-alliance/dpa
Pai de todos os "whistleblowers"
Em 1974, ao longo de meses, Mark Felt, então vice-presidente do FBI, explicou detalhadamente a dois repórteres do jornal "Washington Post" como a equipe da campanha eleitoral de Richard Nixon teria espionado o escritório da oposição democrata. O relato levou à renúncia de Nixon, mas Felt consegui manter-se anônimo por mais de 33 anos.
Foto: AP
Proteção de repórteres leais
A revelação do caso Watergate é geralmente atribuída aos dois repórteres do jornal "Washington Post", Bob Woodward e Carl Bernstein. Contudo, seu principal mérito foi proteger o anonimato de Mark Felt, além de verificarem as informações em outras fontes. Assim o vice-presidente do FBI ficou livre de perseguições, só se revelando em 2005. Três anos mais tarde, ele falecia.
Foto: AP
Processo sumário na Rússia
Ao retornarem ao tribunal em 2013, os advogados do denunciante russo Serguei Leonidovitch Magnitsky se confrontaram com uma cela vazia. O réu morrera em 2009, numa prisão de Moscou, em circunstâncias não esclarecidas. Magnitsky revelara à imprensa certas práticas de corrupção dentro de empresas públicas russas. Ele foi preso por ter supostamente cometido fraude fiscal.
Foto: Reuters
Motivação complexa
Em 2011, o ex-gerente bancário Rudolf Elmer entregou ao fundador do WikiLeaks, Julian Assange, os dados de 2 mil presumíveis sonegadores de impostos. Assim como tantos outros "whistleblowers", o suíço foi movido por vingança, ganância, senso de justiça. Ele responde a inquérito por quebra de sigilo bancário; contra Assange corre um mandado de prisão por suposto crime sexual cometido na Suécia.
Foto: AFP/Getty Images
Lei da UE protege denunciantes
Em 1996, o funcionário da União Europeia Paul van Buitenen tentou informar seus superiores sobre certas irregularidades financeiras. Como estes preferiram ignorar as denúncias, ele recorreu a deputados da UE. No fim das contas, 17 comissários europeus tiveram que renunciar – mas Van Buitenen também foi coagido a deixar a Comissão. Desde 2000 existe na UE uma lei que protege os "whistleblowers".
Foto: Getty Images
Fim de viagem para uma denunciante
Karen Silkwood, que trabalhava numa unidade de tratamento de plutônio em Oklahoma, constatou graves falhas nas medidas de segurança para os operários. Ela preparou um dossiê para a imprensa contendo as irregularidades constatadas, mas, a caminho de entregar o documento, morreu num acidente de carro. Causa oficial do acidente: estafa.
Foto: picture-alliance/UPI
Lutador incorrigível
O artigo para o "Sunday Times", no qual Mordechai Vanunu denunciava o programa nuclear israelense, nem tinha sido impresso, quando o jornalista foi sequestrado pelo serviço secreto Mossad. Em Israel, foi condenado a 18 anos de prisão por traição da pátria. Libertado em 2004, declarou que iria continuar a luta pela paz e contra as armas nucleares. No entanto, está proibido de deixar Israel.
Foto: AFP/Getty Images
Vingança contra a indústria do cigarro
Uma das motivações de Jeffrey Wigand pode ter sido vingança contra seu antigo empregador. A empresa British-American Tobacco o havia demitido em 1993. Quatro anos depois, ele revelava na televisão que muitos cigarros contêm aditivos visando aumentar a dependência dos fumantes. Na foto, ele participa de um evento antifumo, ao lado do prefeito de Nova York, Michael Bloomberg.
Foto: Getty Images
Destino final: zona de trânsito?
Desde que chegou de Hong Kong, Edward Snowden está confinado à zona de trânsito do aeroporto de Moscou. O governo norte-americano procura lhe barrar as possibilidades de asilo político. O denunciante expôs os EUA às críticas de todo o mundo, e é preciso desencorajar eventuais imitadores. Washington até ameaça o Equador com o fim das negociações de livre comércio, caso conceda asilo a Snowden.