Antes da posse, presidente eleito enfrenta suspeitas em escândalo financeiro que envolve também seu filho senador e futura primeira-dama. Enquanto o país espera respostas, ele admite ter de pagar "se tiver algo errado".
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"Agora vão começar a bater nos meus filhos". A frase do presidente eleito Jair Bolsonaro, durante um encontro com parlamentares no início de dezembro, pode ter soado vaga para os presentes na ocasião.
Mas o que ele quis dizer ficou claro logo depois, em 6 de dezembro, quando a imprensa brasileira noticiou sobre uma lista de 75 nomes de servidores e ex-servidores de membros Alerj, a casa legislativa do estado do Rio, com contas com movimentações suspeitas.
Na lista, elaborada pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), órgão ligado ao Ministério da Fazenda, aparecia o nome de um ex-assessor de Flávio Bolsonaro, o filho mais velho de Jair Bolsonaro eleito para o Senado em outubro com votação recorde.
Antes de tomar posse em janeiro, Flávio terá que se ocupar do primeiro escândalo envolvendo suspeita de corrupção a atingir o círculo mais próximo do presidente eleito desde a avassaladora vitória em outubro. A lista do Coaf é fruto da Operação Furna da Onça, desdobramento da Lava Jato no Rio que em dezembro levou à prisão de dez deputados da Alerj.
Bolsonaro e seus três filhos ativos na política centraram boa parte da campanha eleitoral no combate à corrupção. Venderam-se como "outsiders" e declararam o ex-presidente Lula e seu partido, o PT, como inimigos e responsáveis pelos males da corrupção no país. A retórica surtiu efeito entre os eleitores.
O relatório do Coaf cita nove assessores e ex-assessores que faziam depósitos na conta de Fabrício de Queiroz, ex-motorista de Flávio Bolsonaro. A investigação aponta uma movimentação suspeita de 1,2 milhão de reais na conta dele entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017, soma incompatível com seus ganhos.
Ao mesmo tempo, Queiroz fez sucessivos saques em dinheiro de sua conta – para quem, ainda não está claro. Certo é que um cheque de 24 mil reais foi depositado na conta de Michele, futura primeira-dama do Brasil. Segundo a família Bolsonaro, tratou-se do pagamento de uma dívida pessoal do policial militar com o presidente eleito.
Mesmo antes da posse, o escândalo já respinga em Jair Bolsonaro. Isso porque Queiroz não era só um "faz-tudo" de Flávio – ele aparece também em fotos ao lado do presidente eleito, pescando, por exemplo. Queiroz seria amigo da família há mais de 30 anos.
Essa não é, porém, a primeira mancha na imagem de anticorrupto que Bolsonaro vende. Ao longo do ano, o jornal Folha de S. Paulo publicou relatos sobre uma vendedora de açaí oficialmente empregada como assessora no gabinete parlamentar do futuro presidente. Porém, em vez de Brasília, a mulher vive no litoral fluminense, onde Bolsonaro possui uma casa de praia. O marido da mulher presta serviços de caseiro para Bolsonaro, de acordo com o diário.
Apesar de a vendedora de açaí ter admitido para a Folha que o emprego de servidora de Bolsonaro é apenas uma fachada, o futuro presidente vem insultando o jornal, chamando-o de "fake news". Os últimos acontecimentos, porém, reforçam a suspeita de que o clã Bolsonaro empregaria funcionários fantasmas. Uma artimanha popular na política brasileira, usada para tirar dinheiro do bolso do contribuinte.
Políticos brasileiros gostam de empregar amigos ou parentes que, como agradecimento, precisam ceder parte de sua renda aos parlamentares por baixo do pano. Não está provado que isso aconteceu com os Bolsonaro. Mas é notório que duas filhas de Queiroz também foram contratadas do gabinete de Flávio Bolsonaro – assim como a esposa do ex-motorista, que trabalhou para Flávio durante nove anos antes de ser transferida para o gabinete parlamentar de Jair Bolsonaro em Brasília, trabalhando como secretária.
Na quarta-feira (12/12), o Jornal Nacional revelou que o relatório do Coaf cita Wellington Sérvulo Romano da Silva como um dos nove assessores e ex-assessores que faziam depósitos na conta de Queiroz. Segundo o programa, o tenente-coronel da Polícia Militar do Rio de Janeiro passou 248 dias em Portugal enquanto "trabalhou" como parlamentar na Alerj. Procurado pela equipe do jornal, Flávio Bolsonaro negou que Silva morasse na Europa.
No momento, o futuro presidente precisa responder diariamente a perguntas incômodas de repórteres sobre as misteriosas transferências. Entre seus ministros nomeados, os nervos também parecem estar à flor da pele. O futuro ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, interrompeu abrupta e visivelmente irritado uma coletiva de imprensa quando os jornalistas começaram a fazer perguntas insistentes sobre a lista do Coaf.
O futuro ministro da Justiça, Sérgio Moro, se esquiva em silêncio. Assim como para Bolsonaro, há muito em jogo para Moro. Como juiz anticorrupção, ele condenou o ex-presidente Lula em 2017. Agora, Bolsonaro o nomeou ministro da Justiça com amplos poderes. Moro também deverá passar a controlar o Coaf. Será que ele terá de investigar o próprio chefe no futuro?
Na próxima semana, Queiroz deverá ser interrogado pelos investigadores. Ele e sua família seguem em silêncio. Com uma transmissão ao vivo no Facebook, o futuro presidente Bolsonaro já preparou seus apoiadores para mais más notícias. "Se tiver algo errado, que paguemos", afirmou. O caso "dói no coração", já que "o que tem de mais firme [no projeto do governo] é o combate à corrupção".
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Com diplomação, presidente eleito conclui primeira fase da transição e já tem o gabinete formado. Durante a campanha, ele prometeu reduzir número de ministros de 29 para 15, mas acabou com 22. Veja quem são.
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Redução modesta
Durante a campanha, Jair Bolsonaro prometeu reduzir o número de ministérios de 29 para 15. Mas, durante a transição, o presidente voltou atrás e promoveu uma redução bem menor do que a prometida. Ao todo, há 22 pastas no novo governo. Entre os ministros, há filiados do DEM, PSL e MDB, além de dez com laços militares, dois discípulos de Olavo de Carvalho e apenas duas mulheres.
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Paulo Guedes
Guru econômico e ministro anunciado ainda durante a campanha, Paulo Guedes comanda o superministério da Economia, formado pela junção das pastas da Fazenda, do Planejamento e da Indústria e Comércio Exterior. O economista é investigado pelo Ministério Público Federal (MPF), suspeito de ter cometido fraudes na captação de recursos de fundos de pensão de estatais entre 2009 e 2013.
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Onyx Lorenzoni
Deputado federal do DEM, Onyx Lorenzoni articulou a campanha de Bolsonaro desde 2017 e foi indicado para assumir a Casa Civil. Em sua carreira política, já foi deputado estadual no Rio Grande do Sul e, desde 2003, tem mandatos na Câmara. Após ser citado na delação da JBS, ele admitiu ter recebido caixa dois de campanha, e está sendo investigado pela Procuradoria-Geral da República.
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Sérgio Moro
Juiz federal que foi responsável pela Lava Jato em primeira instância, Sérgio Moro comandará o Ministério da Justiça. Seu decisão de entrar para a política causou polêmica. Foi ele quem condenou Lula pela primeira vez em 2017, o que marcou o início dos problemas do ex-presidente em registrar sua nova candidatura ao Planalto em 2018. Fato que ajudou Bolsonaro a assumir a liderança nas pesquisas.
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Marcos Pontes
Astronauta que chegou a ser cotado para vice da chapa do PSL, Marcos Pontes chefiará o Ministério da Ciência Tecnologia. Formado em engenharia aeronáutica pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica, Pontes se tornou o primeiro astronauta brasileiro da história e foi enviado ao espaço pela Missão Centenário, em 2006, durante o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele é filiado ao PSL.
A deputada federal Tereza Cristina (DEM) comandará o Ministério da Agricultura. Engenharia agrônoma e empresária, Tereza Cristina foi presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária e indicada pela bancada ruralista para o cargo. Ela defende a aprovação do projeto lei que flexibiliza as regras para a fiscalização e aplicação de agrotóxicos no país.
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Ernesto Araújo
Diplomata de carreira, Ernesto Araújo assumirá o Ministério das Relações Exteriores. Discípulo de Olavo de Carvalho, ele atuou no Itamaraty em várias áreas, porém, nunca chefiou uma embaixada. Araújo mantinha um blog no qual fez campanha para Bolsonaro, chamou o PT de "Partido Terrorista" e disse querer libertar o mundo da "ideologia globalista". Admira Donald Trump e nega o aquecimento global.
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Luiz Henrique Mandetta
Deputado federal do DEM (MS), Luiz Henrique Mandetta ficou com o comando do Ministério da Saúde. Médico ortopedista e ligado a Lorenzoni, ele era crítico do Programa Mais Médicos. Entre 2005 e 2010, Mandetta foi secretário municipal de saúde de Campo Grande. A passagem pelo cargo lhe rendeu um inquérito por suspeita de fraude em licitação, tráfico de influência e caixa dois.
Foto: Agência Brasil
Fernando Azevedo e Silva
O general da reserva Fernando Azevedo e Silva foi escolhido para o Ministério da Defesa. Natural do Rio, ele deixou o Alto Comando do Exército em 2018 e passou a assessorar o presidente do STF, Dias Toffoli. Azevedo e Silva foi chefe do Estado-Maior do Exército e comandante da Brigada Paraquedista, onde serviu ao lado de Bolsonaro. Chefiou ainda operações na Missão de Paz da ONU no Haiti.
Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil
Ricardo Vélez Rodríguez
Escolha do colombiano antipetista Ricardo Vélez Rodríguez para assumir o Ministério da Educação foi indicação de Olavo de Carvalho. Nascido em Bogotá e naturalizado brasileiro, Vélez Rodríguez é formado em filosofia e mostrou apoiar várias das bandeiras defendidas por Bolsonaro, como a expansão de escolas militares no país e o combate a uma suposta predominância de ideias esquerdistas no ensino.
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Tarcísio Gomes de Freitas
O ex-diretor do Dnit Tarcísio Gomes de Freitas chefiará o novo Ministério da Infraestrutura, que deve englobar a atual pasta de Transportes, Portos e Aviação Civil. No governo Temer, Freitas foi secretário de Coordenação de Projetos do Programa de Parceria em Investimentos e consultor legislativo da Câmara dos Deputados. O engenheiro civil iniciou a carreira no Exército e atuou no Haiti.
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Gustavo Canuto
Servidor efetivo do Ministério do Planejamento, Gustavo Henrique Rigodanzo Canuto comandará o novo Ministério do Desenvolvimento Regional. Servidor sem filiação partidária, Canuto é formado em engenharia da computação e direito e já atuou na Secretaria Geral da Presidência da República, na Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e na Secretaria de Aviação Civil.
Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Osmar Terra
Ex-ministro do governo Temer, Osmar Terra assumiu o novo Ministério da Cidadania e Ação Social. Médico, Terra é deputado federal pelo MDB desde 2001. Já foi prefeito de Santa Rosa (RS) e secretário de Saúde do RS. Terra poderá ser um dos ministros que trará dor de cabeça a Bolsonaro. O deputado apareceu na superplanilha da Odebrecht, que indicaria propinas pagas a políticos.
Foto: Viola Jr/Camara dos Deputados
Marcelo Álvaro Antônio
Deputado do PSL Marcelo Álvaro Antônio assumirá o Ministério do Turismo. Integrante da frente parlamentar evangélica, ele foi o candidato mais votado em Minas Gerais, reeleito para o segundo mandato neste ano. Antes de ser deputado, Antônio foi vereador de Belo Horizonte. Antônio é o segundo filiado do PSL escolhido por Bolsonaro para integrar seu governo.
Foto: Agência Brasil/Valter Campanato
Bento Costa Lima Leite de Albuquerque Júnior
O almirante Bento Costa Lima Leite de Albuquerque Júnior chefiará o Ministério de Minas e Energia. Ele atuou como diretor-geral de Desenvolvimento Nuclear e Tecnológico da Marinha, foi observador do Brasil na Força de Paz das Nações Unidas em Sarajevo, na Bósnia-Herzegovina, e comandante de submarinos.
Foto: Getty Images/AFP/H. Retamal
Damares Alves
Pastora evangélica e assessora do senador Magno Malta (PR), Damares Alves foi escolhida para chefiar o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos. A advogada trabalha há mais de 20 anos no Congresso. Ela já declarou que a mulher nasceu para ser mãe, se posicionou contra o feminismo e políticas voltadas a diminuir a discriminação de homossexuais. É contra a legalização do aborto e das drogas.
Foto: Agência Brasil/V. Campanato
Ricardo de Aquino Salles
Advogado e criador do Endireita Brasil, Ricardo de Aquino Salles será o ministro do Meio Ambiente. Salles foi secretário estadual do Meio Ambiente no governo de Geraldo Alckmin. É réu por improbidade administrativa, acusado de esconder alterações em mapas do zoneamento ambiental do rio Tietê, numa ação que teria favorecido mineradoras. Foi ainda diretor da Sociedade Rural Brasileira.
Foto: Imago/Fotoarena
Ministérios dentro do Planalto
Além da Casa Civil, outros três ministérios funcionam dentro do Planalto. Ex-presidente do PSL e aliado próximo de Bolsonaro, Gustavo Bebianno será o chefe da Secretaria-Geral. O general reformado que comandou a Missão ONU para a Estabilização no Haiti Augusto Heleno ficou com o Gabinete de Segurança Institucional. Já o general Carlos Alberto dos Santos Cruz ficará com a Secretaria de Governo.
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AGU e CGU
A Advocacia-Geral da União (AGU) ficará sob o comando do advogado André Luiz de Almeida Mendonça, que, ao longo da carreira, atuou em áreas de transparência e combate à corrupção. O Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União (CGU) continuará a ser chefiado por Wagner Rosário (foto). O servidor de carreira ocupa o cargo desde junho de 2017, indicado pelo ex-presidente Michel Temer.
Foto: Agência Brasil/Marcelo Camargo
Roberto Campos Neto
O chefia do Banco Central ficou com o economista Roberto Campos Neto, neto do ex-ministro do Planejamento Roberto Campos, que comandou a pasta entre 1964 e 1967, durante a ditadura militar. Próximo de Paulo Guedes, já atuou no banco Santader, no banco Bonzano Simonsen e na gestora de fundos Claritas.